Raquel Vilaça (coordenação)
Estelas e estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Actas das IV Jornadas Raianas (Sabugal, 2009)
Sabugal, 2011
Índice
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Nota introdutória. António dos Santos Robalo
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Preâmbulo. Raquel Vilaça
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Estátuas-menires antropomórficas da Região de Évora. Novos testemunhos e problemáticas. Mário Varela Gomes
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Identidades y estelas en el calcolítico peninsular. Memorias funerarias en la cuenca del Tajo. Primitiva Bueno Ramirez, Rosa Barroso Bermejo, Rodrigo de Balbín Behrmann
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Iconografía, lugares y relaciones sociales: Reflexiones en torno a las estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce en la Península Ibérica. Marta Díaz-Guardamino
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A estela antropomórfica de Monte dos Zebros (Idanha-a-Nova): seu enquadramento nas estelas peninsulares com diademas e “colares”. João Luís Cardoso
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As estátuas-menires da serra da Nave (Moimenta da Beira, Viseu) no contexto da ocupação pré-histórica do Alto Paiva e da Beira Alta. Domingos J. Cruz, André Tomás Santos
143 As estelas antropomórficas de Picote – Miranda do Douro (Trás-os-Montes). Maria de Jesus Sanches 175
Novos métodos de registo digital de arte rupestre: digitalização tridimensional e fotografia multiespectral. Hugo Pires, Paulo Lima, L. Bravo Pereira
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Memoriais de pedra, símbolos de Identidade. Duas novas peças escultóricas de Cervos (Montalegre, Vila Real). Lara Bacelar Alves e Mário Reis
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A estatua menhir do Tameirón no contexto dos resultados do proxecto de intervención arqueolóxica no Monte Urdiñeira e o seu contorno (A Gudiña- Riós, Ourense). Beatriz Comendador Rey, Víctor Rodríguez Muñiz, Alejandro Manteiga Brea
245 Mobilidade e materialidade: uma aproximação à análise da localização das estátuas-menir transfronteiriças (Norte de Portugal e Sul da Galiza). Pastor Fábrega-Álvarez, João Fonte, Francisco J. González García 271
Nuevos hallazgos sobre viejas ideas. Una reflexión sobre las representaciones “atípicas” en las estelas del Bronce Final del Suroeste de la Península Ibérica. Eduardo Galán
293 As estelas de “Pedra da Atalaia” (Celorico da Beira, Guarda) no seu contexto geo-arqueológico. Raquel Vilaça, André Tomás Santos, Sofia de Melo Gomes 319 As estelas do Baraçal, Sabugal (Beira Interior, Portugal). André Tomás Santos, Raquel Vilaça, João Nuno Marques 343 Nova peça insculturada da região raiana do Sabugal (Beira Interior, Portugal): uma primeira abordagem. Raquel Vilaça, Marcos Osório, André Tomás Santos 369 La estela decorada del Puerto de Honduras (Cabezuela del Valle, Cáceres). Primitivo Sanabria Marcos 389 Las estelas grabadas de La Bienvenida-Sisapo (Ciudad Real, España): nuevas aportaciones para la caracterización del contexto cultural del Bronce Final en el reborde suroccidental de la Meseta. Mar Zarzalejos Prieto, Germán Esteban Borrajo, Patricia Hevia Gómez 417
Nuevas metodologías para la distribución espacial de las estelas del Oeste peninsular. Sebastián Celestino Pérez, José Ángel Salgado Carmona
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Nota introdutória O concelho do Sabugal tem um vasto património arqueológico a que o Município tem dedicado particular atenção, nomeadamente no desenvolvimento de uma série de iniciativas que o Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal tem levado a cabo. As estelas e as estátuas-menires da Pré e da Proto-história descobertas nesta região são em número significativo, estando três delas expostas no Museu do Sabugal. Algumas apresentam configurações e simbologias distintas, quase únicas, factos que têm despertado e estimulado os investigadores ao seu estudo. Partiu do Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto e do Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra o desafio à Empresa Municipal Sabugal+ e à Câmara Municipal do Sabugal de se organizarem umas jornadas de reflexão, debate e apresentação de estudos sobre estelas e estátuas-menires. Deu-se corpo à iniciativa com a organização das IV Jornadas Raianas, realizadas em 23 e 24 de Outubro de 2009, que reuniram um importante número de estudiosos e de participantes, especialmente estudantes universitários. A presente publicação das excelentes comunicações apresentadas é uma forma de partilhar, com o público em geral e os investigadores em particular, os estudos já realizados, ponto de partida para novas investigações. A Câmara Municipal e a Sabugal+, E.M. congratulam-se pela dedicação, interesse e entusiasmo de todos os que mais directamente se envolveram nesta iniciativa, merecendo particular destaque o papel que a Professora Raquel Vilaça teve na organização, no desenvolvimento dos trabalhos das Jornadas e na coordenação das presentes actas. António dos Santos Robalo Presidente da Câmara Municipal do Sabugal
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Preâmbulo Entre os testemunhos mais peculiares da Pré e da Proto-história do Ocidente Peninsular contam-se, sem dúvida, as estelas e as estátuas-menires. O assunto é investigado há bem mais de um século e o seu interesse é manifesto, desde logo, pela copiosa bibliografia existente. Todavia, até 2009, nunca tinha merecido discussão em reunião temática. Mas a 23 e 24 de Outubro desse ano realizaram-se no Auditório do Museu do Sabugal, com indiscutível êxito, as IV Jornadas Raianas dedicadas às “Estelas e estátuas-menires: da Pré à Proto-história”, onde diversos investigadores, portugueses e espanhóis, discutiram algumas das questões subjacentes, de natureza metodológica, iconográfica, geográfica, cronológica, interpretativa, espacial, etc., não tendo sido esquecido o problema das representações iconográficas similares em suportes permanentes. Ao mesmo tempo, foi a oportunidade de se apresentarem achados recentes — em parte exibidos na exposição especificamente preparada no âmbito deste encontro —, alguns inéditos ou insuficientemente divulgados, que se enquadraram em abordagens de carácter regional ou global. Merece destaque — e não por acaso foi escolhida a cidade do Sabugal para a realização deste fórum científico — esta região da Beira Interior onde se verificou, nos últimos anos, um inusitado número de novas descobertas, do Calcolítico a finais da Idade do Bronze. Algumas, mesmo em cima do acontecimento, como a estátua-menir de Corgas (Fundão), identificada cerca de um ano antes mas só noticiada já a programação destas Jornadas estava em curso adiantado, motivo pelo qual se fez dela apenas muito sumária apresentação. Cientes da actualidade e acuidade das problemáticas inerentes a essas entidades arqueológicas, a iniciativa partira do Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto (Linha de Proto-história do Grupo da Lusitânia) e do Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, tendo sido de imediato acolhida pela Sabugal+, Empresa Municipal e Câmara Municipal do Sabugal, estruturas de natureza e vocação muito distintas, mas que em boa hora conjugaram esforços, agora traduzidos nesta colectânea. Regozijamo-nos por as comunicações apresentadas durante esta reunião internacional tomarem forma de letra, conjuntamente com outras colaborações de colegas que, entretanto, vieram ter connosco manifestando vontade de enriquecer este livro com os seus contributos. A todos o nosso sincero reconhecimento. Ao privilegiarmos um encontro de carácter monográfico subordinado a tema desde sempre controverso, tínhamos a certeza de que o resultado teria de traduzir-se sob a forma de perspectivas várias. Por isso, este livro só aparentemente, atendendo às imagens, é a preto e branco. Na realidade, nas páginas que se sucedem espelham-se olhares multifacetados e multicolores tradutores de diferentes modelos interpre-
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tativos, mas também reveladores das inúmeras potencialidades de abordagem que estelas e estátuas-menires encerram. E, naturalmente, dos problemas que subsistem, desde logo porque as mensagens que expressam, tendo recorrido a linguagem metafórica, se perderam. Mas também porque traduzem um processo de longa duração, com descontinuidades e distintos processos filogenéticos, i.e. independentes uns dos outros, ou até mesmo com muito discutíveis possibilidades de se poderem consubstanciar num modelo daquela natureza. Com efeito, nem a quantidade nem a qualidade de alguns dos monólitos têm proporcionado a resolução de questões que se mantêm, que se problematizam, ou ainda que se recuperam dos primórdios da investigação. Se, então, foi a identificação dos motivos representados e a determinação da sua origem que pautaram as principais linhas de pesquisa dos investigadores, hoje valorizam-se outras problemáticas, como diacronias, reutilizações, simbologias, relações com o espaço e lugares naturais, etc., sem renegar, obviamente, aquelas. Efectivamente, para além de todas as diferenças formais, iconográficas, estilísticas e simbólicas, por um lado, e das distintas interpretações que cada um lhes atribui, por outro, ou ainda dos tipos de sociedade que as enquadraram, o certo é que todas elas expressam a ancestral necessidade das comunidades memorizarem, ou seja, de não esquecerem, inscrevendo de forma perene, e por isso “na pedra”, determinadas mensagens simbólicas. Tal praxis deverá ter sido particularmente assertiva em sociedades sem escrita como forma de registar o tempo e a sua própria história, i.e. conhecimento do (e com o) seu passado. Estelas e estátuas-menires são, assim, entidades (mas também lugares) de memória, logo de integração social e de reforço identitário, com os quais as comunidades se identificavam e em função das quais terão desenvolvido um sentido de lugar, de pertença, de apropriação. E são ainda, e sempre, encenações, porque quase tudo o que congregam correspondem a coisas ou entidades que não estão lá, mas tão-só simbolicamente presentes. Entre as novidades e contributos que as IV Jornadas Raianas trouxeram, poderemos salientar, quatro, entre outros que obrigariam a comentários mais desenvolvidos e que ultrapassariam os propósitos desta introdução. Um é que as tradicionais distribuições geográficas de determinados tipos de estelas e estátuas-menires sem estarem em causa, no sentido de terem perdido significado, terão de ser necessariamente reavaliadas, ou seja, estamos a assistir, com novos achados e sua natureza, a uma transgressão das fronteiras antes estabelecidas. Mas, simultaneamente, a verdadeira explosão de achados nos últimos tempos, inclusive já após a realização deste fórum científico, não deixa de sublinhar a significativa concentração de determinados tipos em certas regiões, como sucede, precisamente, na zona raiana das serras de Gata / Malcata, coincidente com uma das principais áreas de recursos metalíferos (estanho, ouro e algum cobre) do Ocidente peninsular. Outro é que, sem se contestar, bem pelo contrário, a expressiva presença, porque repetitiva e normativa, de determinadas figurações (por ex. a trilogia, escudo,
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espada e lança nas estelas de “tipo extremeño”), a verdade é que não deixam de surgir elementos nunca antes encontrados e, de resto, nem sempre fáceis de interpretar. Finalmente, verifica-se um esforço em relacionar os diversos achados, quer com o quadro geomorfológico imediato e paisagístico, quer com os demais itens arqueológicos — numa perspectiva simultaneamente sincrónica como diacrónica — com os quais elas se articulariam, na curta ou longa duração. Sugestiva é a hipotética relação de proximidade de certas estelas e estátuas-menires, desde as mais antigas às mais recentes, com determinado tipo de estruturas, potencializando a existência de “cenários construídos”, independentemente da sua natureza, em que, por vezes, se integrariam. Assumindo que as problemáticas inerentes a este mundo das estelas e das estátuas-menires são das mais complexas da investigação arqueológica pré e proto-histórica, e que muitas das respostas já encontradas têm, como é próprio da construção do conhecimento, um prazo de validade e um necessário contraditório, os contributos deste livro são, tão-só, ainda que indispensáveis, uma etapa no caminho que todos percorremos. A terminar, merece-nos um especial agradecimento a Empresa Municipal Sabugal+ nas pessoas do Dr. Norberto Manso e Eng.º António Robalo, anterior e actual Presidente do Conselho de Administração (e agora também Presidente da Câmara Municipal), respectivamente, entidade que, desde o início, se comprometeu a custear a publicação das actas das IV Jornadas Raianas. Recordamos igualmente com apreço o entusiasmo do Sr. Manuel Rito Alves, na altura da realização das Jornadas, Presidente em exercício da Câmara Municipal do Sabugal. A colaboração recebida do Município do Fundão, onde os participantes puderam visitar, acompanhados pelo seu Director, Dr. João Mendes Rosa, o Museu Arqueológico Municipal José Monteiro, deve ser também referida. Cumpre-nos ainda registar a eficiência da equipa de apoio às Jornadas, constituída pelo Dr. Jorge Torres, Dr. Marcos Osório, Dr.ª Carla Augusto, Sr. Bruno Santos, Dr.ª Vera Duarte e Dr. Paulo Pernadas. Por fim, uma palavra de congratulação pelo interesse e entusiasmo dos cerca de 120 participantes, entre estudantes, nomeadamente das Universidades de Coimbra e do Porto, e público em geral.
Coimbra, Inverno de 2011 Raquel Vilaça
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Estátuas-menires antropomórficas da Região de Évora. Novos testemunhos e problemáticas Mário Varela Gomes1
Resumo Demos a conhecer, em 1997, conjunto de estátuas-menires, por nós identificado em cromeleques da Região de Évora, onde aquelas reutilizam menires, talhados em rochas graníticas. Trabalhos ulteriores haveriam de revelar novas ocorrências e permitir aprofundar algumas problemáticas então levantadas. Tais monólitos antropomórficos, que hoje totalizam, pelo menos, quinze exemplares (Almendres 7, Portela de Mogos 6, Vale Maria do Meio 2), mostram face, com olhos circulares, nariz longo e largo, tal como, mais raramente, boca, oferecendo, ainda, representações de adereços lunulares, de cinturões e de báculos, entre outras. Aqueles monumentos integram arquitecturas abertas e fazem parte de importante fenómeno cultural, cuja dispersão possui maior expressão na faixa meridional da Europa, da Ucrânia à Península Ibérica, ocorrido a partir de meados do IV milénio a.C., com a consolidação das economias agro-pastoris, tendo alcançado o II milénio a.C., momento em que, na Península Ibérica, se irá repercutir em estelas com função funerária. As estátuas-menires tardo-neolíticas da Região de Évora, evidenciando estrutura iconográfica tripartida, devem figurar seres transcendentes, próprios de um tempo mítico, ou constituírem imagens de antepassados, divinizados e/ou heroicizados. Elas reflectirão essencialmente, como construções sociais, o contexto criado aquando da utilização de grandes inovações técnicas (carro, arado, exploração dos produtos secundários), que permitiram o desenvolvimento económico, novas relações sociais e significativas transformações ideológicas, sobretudo de âmbito político-religioso, como a antropomorfização e monumentalização de entidades sobrenaturais. Palavras-chave: Neolítico Final, cromeleque, estátua-menir, face oculada, lúnula. Abstract In 1997 we made known a group of menhir-statues which we had identified in cromlechs in the Évora region where menhirs, carved out of granite, had been reused. Later research work has revealed further new occurrences and has enabled us to explore in greater depth some of the issues raised at that time. 1 Membro da Academia Portuguesa da História e da Academia Nacional de Belas-Artes. Docente do Departamento de História da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa (Av. de Berna, 26C, 1069-061 Lisboa; [emailprotected]).
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história These anthropomorphic monoliths, of which at least fifteen examples (Almendres 7, Portela de Mogos 6, Vale Maria do Meio 2) are now known, present a face with circular eyes, a long wide nose and, on rare occasions, a mouth. They also display representations of lunular ornaments, belts and crosiers among others. These monuments are integrated in open architectural spaces and are part of an important cultural phenomenon that is most widespread in the southern belt of Europe, from Ukraine to the Iberian Peninsula, and which lasted from the middle of the 4th millennium BC, with the consolidation of agro-pastoral economies, up to the 2nd millennium BC, the moment when in the Iberian Peninsula it would be reflected in stelae with a funerary function. The Late Neolithic menhir-statues of the Évora region display a tripartite iconographic structure and are most likely figurative representations of transcendental beings belonging to a mythical age or were images of ancestors, divinised and/or heroicised. As social constructions, they would essentially reflect the context that arose at the time of the utilisation of the great technical innovations (the cart, the plough, exploitation of secondary products) which enabled economic development, new social relationships and significant ideological transformations, especially of a political-religious nature, such as the anthropomorphisation and monumentalisation of supernatural entities. Key words: Late Neolithic, cromlech, menhir-statue, eyed face, lunule.
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Antecedentes Entendemos como estátuas-menires, seguindo numerosos autores, monólitos naturais ou afeiçoados, de forma subcilíndrica ou ovóide, em alguns casos reutilizando menires, contendo, em geral, apenas uma face plana, onde foram representadas, através de gravuras e/ou relevos, entidades físicas ou sobrenaturais, acompanhadas pelos seus atributos. No caso das estátuas-menires antropomórficas, encontra-se presente, e em posição dominante, a figuração da denominada face oculada, com olhos e nariz ou, mais raramente, possuindo boca. A forma dos suportes iconográficos permite concluir tratar-se de monumentos realizados para serem vistos de frente e são muito pouco comuns aqueles que mostram iconografia, nas faces laterais ou na posterior. São semelhantes às estátuas-menires as estátuas-estelas, monumentos que oferecem duas faces paralelas e aspecto lajiforme como, não raro, recorte antropomórfico. Podem conter iconografia em uma ou em mais faces. Um terceiro tipo de monólitos, as composições monumentais, mostram imagética afim da acima mencionada, embora tenham como suporte as superfícies, verticais ou sub-verticais, de afloramentos rochosos. Ilustra este tipo de testemunho a rocha 147 de São Simão, no Vale do Tejo, com enorme face oculada e outros elementos gravados. Para autores como E. Anati (1990: 13) os três tipos de monumentos referidos integram conceitos artísticos e ideológicos semelhantes, pelo que devem de ser estudados em conjunto. Trabalhos arqueológicos por nós dirigidos no Cromeleque dos Almendres e no Cromeleque da Portela de Mogos, conduziram à identificação de treze estátuas-menires antropomórficas, existindo pelo menos duas outras no Cromeleque de Vale Maria do Meio. Os três recintos integram zona geográfica situada a poente da cidade de Évora (Gomes, 1997a) (Estampa 1). Contextos de origem Contrariamente ao que acontece com a esmagadora maioria das estátuas-menires e das estátuas-estelas, registadas na Europa, incluindo os três grandes grupos do Sul de França, dos Alpes Italianos e da Lunigiana (Noroeste de Itália), os monumentos afins da Região de Évora encontravam-se, sem excepção, in situ ou in loco, isto é, erguidos ou tombados no local onde primitivamente se instalaram. Todavia, constituem excepção àquele panorama as estelas do Petit-Chasseur (Sion), na Suíça, embora reutilizadas em construções ulteriores, as estelas do Val de Aosta (SaintMartin-de-Corléans), em Itália, encontradas caídas in loco, tal como ocorreu com as estátuas-menires de Ossimo, no Valcamónica (Itália), ou da Córsega (Fedele, 1988; Grosjean; 1975; Mezzena, 1988). O monumento megalítico comummente denominado Cromeleque dos Almendres (Estampa 2A) situa-se próximo do cimo de encosta suave, voltada a nascente,
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com 413 m de altitude, localizada a 1250 m a sudoeste do monte dos Almendres e a cerca de 12 km a poente de Évora. Inicialmente constituindo por mais de uma centena de monólitos é, na sua forma actual, o resultado de longa evolução funcional e construtiva, processada a partir dos finais do VI milénio, ou dos inícios do milénio seguinte, desenvolvendo-se até começos do III milénio a.C. Ela reflecte as transformações económicas, sociais e ideológicas então ocorridas, à qual também não são estranhas alterações provocadas pelos agentes meteóricos ou por acção antrópica ulterior. O recinto dos Almendres foi erguido em zona de terrenos pouco espessos, assentes em substrato de gnaisses granitóides. A cerca de 250 m encontra-se afloramento de quartzodioritos porfiróides, de grão médio a grosseiro, que pode ter sido utilizado para extracção de alguns dos seus monólitos, e a 1 km, para nascente, desenvolve-se extensa bancada de rochas eruptivas, composta sobretudo por quartzodioritos e granodioritos que, igualmente, deverá ter colmatado a necessidade de grandes blocos para o talhe de outros menires constituintes do monumento. De facto, aqueles elementos foram esculpidos não só em diferentes tipos de quartzodioritos, evidenciando origens distintas, como oferecem formas e dimensões algo díspares. Assim, ali foram utilizados desde pequenos blocos naturais ou muito rudemente afeiçoados, sub-paralelepipédicos, subcilíndricos ou ovóides, a outros maiores, atingindo cerca de três metros de altura, esculpidos com forma cilíndrica, subcilíndrica e, não raro, de aspecto fálico ou estelar. Os dados obtidos através da escavação e da análise deste importante monumento megalítico, assim como do espólio recolhido, permitiram concluir que ele é, essencialmente, constituindo por dois recintos erguidos em épocas distintas, geminados e ambos orientados segundo as direcções equinociais, ou seja nascente-poente. O recinto mais antigo, que atribuímos a fase avançada do Neolítico Antigo e hoje muito alterado, era formado por três círculos concêntricos definidos por pequenos monólitos. O círculo maior media 18,80 m de diâmetro e o menor 11,40 m. Conserva vinte e dois menires in situ, dois tombados, tendo-se identificado restos das estruturas de sustentação de cinco outros. Imediatamente a poente daquela edificação foi construído e a ela adossado, algumas centenas de anos depois, provavelmente já durante o Neolítico Médio, um segundo recinto, formado por duas elipses concêntricas e irregulares, definidas por menires de grandes dimensões. Estes foram afeiçoados em rochas de características diferentes dos pequenos monólitos da construção primitiva, sendo possível que alguns elementos daquela tenham sido então reutilizados. A elipse exterior do novo recinto mede 43,60 m segundo o eixo maior e 32,00 m no eixo menor. Ali contámos vinte e nove menires erguidos in situ, dezassete tombados in loco e onze restos de estruturas de sustentação de monólitos desaparecidos. Mais tarde, durante o Neolítico Final, ambas estruturas sofreram alterações, transformando-se o recinto mais antigo em espécie de átrio que orientaria a entrada no mais recente e maior, sendo capaz de ajudar a solenizar os rituais sócio-religiosos nele praticados, para o que terá contribuído a sua localização em zona de cota inferior.
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É possível que ao longo daquele período se tenham erguido outros menires no interior do recinto maior, período em que se transformaram em estátuas-menires certos monólitos, através da sua aplanação parcial, de modo a criar face depois decorada, através de relevos ou de gravuras (Gomes, 1983; 1994; 1997a; 1997b; 2003). O Cromeleque da Portela de Mogos (Estampa 2B) ergue-se no topo de encosta, pouco inclinada e voltada a nascente, de relevo com 402 m de altura máxima, situado próximo do denominado Alto da Abaneja, a cerca de 12 km para noroeste de Évora. Os dados arqueológicos ali obtidos através de escavação, do estudo das iconografias patentes nos seus menires, da constituição petrográfica destes e do raro espólio exumado, permitiram determinar a existência de monumento inicial, constituído por cerca de quarenta monólitos de forma ovóide, talvez erguidos em diferentes momentos, tendo sofrido alterações devidas a acção antrópica. Assim, recinto possuindo planta com forma de elipse irregular, cujo eixo maior mede 15 m de comprimento, orientado sensivelmente na direcção nascente-poente, e atingindo o eixo menor 12 m, terá sido construído ainda durante o Neolítico Antigo ou nos inícios do Neolítico Médio. Os seus menires, a grande maioria talhados em tonalitos, não oferecem grandes dimensões, predominando as formas ovóides. Naquele último período, ou já durante o Neolítico Final, ter-se-á erguido pequeno alinhamento no seu interior, marcando o eixo menor e sendo formado por cinco menires, um deles de grande volumetria. Julgamos ter sido edificado em uma terceira fase o alinhamento orientado segundo a direcção equinocial e situado a nascente do recinto; actualmente constituído por seis menires, cinco deles dispostos com intervalos regulares, alcançando 30 m de comprimento total. Por fim, durante fase avançada do Neolítico Final, tal como aconteceu em monólitos do Cromeleque dos Almendres, pelo menos seis dos menires do Cromeleque da Portela de Mogos foram parcialmente aplanados, obtendo-se superfícies, voltadas para nascente. Estas serviram de suporte às faces antropomórficas associadas a lúnulas, em relevo ou gravadas, e a outra iconografia. A escavação do Cromeleque da Portela de Mogos proporcionou, no estrato mais antigo, algum espólio. Um machado de pedra polida, com secção sub-rectangular e gume exausto, assim como enxó, ambos de anfibolito, foram recuperados nas estruturas de sustentação, respectivamente, do menir 32, o grande menir central, e do menir 35. Além daqueles artefactos exumaram-se ponta de flecha, fragmentos de lâminas, de sílex, goiva de pedra polida, de anfibolito, tal como raros fragmentos de cerâmica, alguns dos quais decorados através de impressões ou de elementos plásticos, típicos do denominado Neolítico Antigo Evolucionado, mas também testemunhos bem mais tardios, cujas cronologias alcançam a Idade Moderna (Gomes, 1997c). O Cromeleque de Vale Maria do Meio (Estampa 2C), situa-se a cerca de 1,5 km para noroeste do monumento da Portela de Mogos e ocupa vertente muito discreta, voltada a nascente, com 338 m de cota máxima. Conta com trinta e quatro monólitos, tendo-se ainda descoberto restos de duas estruturas de sustentação de menires desaparecidos ou
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deslocados. Pensamos que um recinto mais antigo, com planta de forma circular, terá dado origem a outro com planta oval, de que subsistem catorze monólitos, muitos deles dispostos em intervalos regulares. Ulteriormente foi desmantelamento o sector nascente daquele último e erguido alinhamento formado, pelo menos, por sete menires, orientado nordeste – sudoeste. Também nos finais do Neolítico, tal como sucedeu nos dois cromeleques antes referidos, alguns dos monólitos foram aplanados e transformados em estátuas-menires, com faces antropomórficas e lúnula, aspectos ilustrados pelos menires 11 e 18. O escasso espólio recuperado durante as escavações do Cromeleque de Vale Maria do Meio (restos de talhe de sílex, porção de artefacto de pedra polida e fragmentos de cerâmica muito rolados) não permite conferir datação ao monumento. Todavia, a julgarmos pela sua situação, em local baixo, em termos relativos, e sem grande visibilidade da envolvente, sugere conforme paralelos do Alto Alentejo e Algarve, estrutura recuada, do Neolítico Antigo e/ou Neolítico Médio, quando ainda não existia intenção clara de marcar a paisagem, tornando os recintos sócio-religiosos visíveis a grande distância. Contribui para esta classificação o facto do monumento apresentar inicialmente planta circular, ou seja de forma simples, embora ele tenha sido frequentado e sofrido alterações até ao Neolítico Final, conforme atestam gravuras em diversos monólitos e as estátuas-menires detectadas (Calado e Sarantopoulos, 1996; Calado, 1997; 2004: 60-64). Segundo anteriormente descrevemos, a evolução arquitectónica e cronológica verificada nos recintos megalíticos da Portela de Mogos e Vale Maria do Meio, mas sobretudo dos Almendres, assim como o facto das estátuas-menires evidenciarem clara reutilização de menires neles integrados, permite que as atribuamos a uma fase tardia da vida de tais monumentos, quiçá mesmo terminal, da sua utilização ritual. O aplanamento artificial e in situ, tendo em vista obter faces, depois decoradas com motivos antropomórficos, cujos pedaços cortados, em alguns casos conservando parte da superfície original, exumámos ainda junto de alguns dos menires, a diferente bojardagem e textura dessas superfícies em relação às restantes, o menor grau de pátina apresentado por aquelas e o facto de quase todas as identificadas in situ se encontrarem voltadas para nascente, não só constituem argumentos irrefutáveis de ulterioridade em relação aos menires que reutilizam, como reflectem programa ideológico bem diferente daqueles que originaram as grandes fases construtivas dos três recintos. Os menires reutilizados poderiam ser anicónicos ou mostrarem outro tipo de decoração. Refira-se, a propósito, que dois deles, do Cromeleque da Portela de Mogos (m.1 e m.28), conservam, lateralmente às faces antropomorfizadas, representações de longos báculos, talvez correspondendo a fase anterior à sua transformação em estátuas-menires, embora no seio do mesmo grande episódio cultural, classificado no Neolítico Final. No Cromeleque dos Almendres foram maioritariamente reutilizados menires
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do recinto maior, embora um dos que constituem o recinto primitivo tenha, de igual modo, sido transformado em estátua-menir. No monumento da Portela de Mogos, apenas uma estátua-menir não faz parte da metade poente do recinto elíptico, levando-nos a considerar que a transformação dos menires em estátuas-menires se terá processado depois do alinhamento estar erguido e a metade nascente do recinto em parte desmantelada. Será que esta acção se processou naquele momento, de modo a dar maior visibilidade às estátuas-menires? A resposta por ora não é possível de dar e talvez só possa ser obtida com o estudo aprofundado dos monólitos deslocados, embora no recinto de Vale Maria do Meio ambas estátuas-menires publicadas se encontrem, de igual modo, na zona mais alta, uma delas no centro daquela e primitivamente voltadas para nascente. A pelo menos aparente descorrelação entre as estátuas-menires, em termos iconográficos, de orientação das faces e da sua situação, com a estrutura inicial dos recintos que integram é outro importante contributo para a sua classificação cronológica, e tentativa de interpretação. Todavia, conforme referimos, reconhece-se que elas ocupam, sobretudo as zonas mais altas dos cromeleques, as de maior visibilidade e importância monumental, mas, mesmo assim, deixando-nos a sensação de terem funcionado independentemente da arquitectura daqueles. E embora cinco das estátuas-menires do Cromeleque da Portela de Mogos se encontrem alinhadas formando arco, tal qual os menires que reutilizam, sugerem existência individual no seio do restante monumento. Os menires, transformados em estátuas-menires, serviram de suporte àquelas novas entidades, que terão, certamente, herdado a monumentalidade e a antiga sacralização dos locais que ocupam, e de cada um dos monólitos que reutilizam, aspecto que nos ajudará a tentar determinar a função dos novos monumentos, tão enigmáticos como inesperados. Também na Sardenha muitos menires, com secção circular ou oval, alguns integrando alinhamentos (Pranu Muttèddu), foram aplanados, criando-se face onde se inscreveu, em relevo, iconografia antropomórfica, transformando-os em estátuas-menires (Atzeni, 1979-80: 54). Iconografia As estátuas-menires antropomórficas da Região de Évora, reutilizam menires com volumetria de forma ovóide, alguns rudemente afeiçoados e, muito raramente, blocos naturais sem regularização. A transformação daqueles iniciou-se com a obtenção de superfície plana, através de corte e regularização, por bojardagem e alisamento, sendo depois “decorada” com face oculada, lúnula e outra iconografia, normalmente em relevo (Estampa 3). Aquelas superfícies, voltadas para nascente, mostravam, pelo menos inicialmente, disposição vertical, ocupando toda a altura dos monólitos e oferecendo contorno oval alongado ou sub-rectangular, com os cantos arredondados, sendo ambos lados quase sempre simétricos.
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As dimensões das estátuas-menires identificadas integram três grandes categorias. As mais pequenas atingem 1,50 m de altura e 0,80 m de largura, as médias cerca de 2,10 m de altura e 1,20 m de largura, enquanto as mais altas alcançam 2,80 m de altura e 1,35 m de largura (cf. Quadro I).
Quadro I - Relacionamento das alturas com as larguras das estátuas-menires da Região de Évora (cromeleques dos Almendres – ALM., Portela de Mogos – P. M. e Vale Maria do Meio – V. M. M.).
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Na extremidade distal, perto do bordo, reconhece-se o motivo comum e caracterizador de todas as estátuas-menires antropomórficas, a face, com as representações do nariz e dos olhos, ou face oculada (Estampa 4 e Quadro II). Os olhos são circulares, gravados ou em relevo ligeiro, encontrando-se as pupilas marcadas, através de pequeníssimas covinhas ou de círculos, contendo ponto central. Apenas em um monólito foram figurados através de covinhas. O nariz apresenta, em geral, forma sub-rectangular, mais ou menos larga ou comprida, em forma de oval alongada, e, raramente, em forma de U, a que, em um caso, se ligam as figurações das arcadas supraciliares, ou das sobrancelhas, de configuração arqueada. Também neste atributo tanto se utilizou a gravura como o relevo. A boca quase não surge e quando tal acontece encontra-se reduzida a curto traço horizontal inciso. A falta da representação da boca, em monumentos antropomórficos semelhantes da Europa, tem sido interpretada como tendo havido a intenção de assinalar tratar-se de figurações sobrenaturais, de espíritos ou de personagens falecidas. Porém, para U. Formentini (1948), tal supressão ritual assinalaria precisamente o contrário, pois, deste modo, indicar-se-ia que a alma não tinha saído do corpo através daquela abertura. Imediatamente abaixo da face oculada encontra-se representação lunular, atributo ausente apenas em dois monumentos (ALM 57 e ALM 94). Aquela ocupa posição central, assente sobre o colo das entidades figuradas, contornando a face ou abrangendo largo espaço, de uma extremidade à outra do tronco. A sua forma é, pois, mais ou menos curva e larga, tendo sido, em geral, figurada em relevo (Estampa 5). Além das variações morfológicas e dimensionais, as lúnulas não raro mostram, gravadas ou em relevo, decorações distintas. No interior podem observar-se linhas, formando em um caso grandes ziguezagues ou triângulos, tal como círculos localizados nas extremidades ou ao centro, e espécie de franja, em ziguezague, no bordo inferior, por vezes com elemento central de maiores dimensões. As lúnulas devem reproduzir artefactos de carácter simbólico, possíveis elementos de caracterização ético-social, que tanto podem ter sido construídos em material rígido, como a madeira, a pedra e o osso, ou flexível, talvez entrançados de fibras vegetais, sendo, possivelmente, decorados com contas de pedra. Estas, principalmente as de forma discóide e produzidas em xisto de cor negra, são comuns em contextos funerários da região que os cromeleques integram, a partir do Neolítico Médio, surgindo em grandes quantidades, e com maior variedade formal, durante o Neolítico Final. É interessante verificarmos que representações de colares, por vezes bastantes largos e, talvez, simulando várias voltas de contas, nas estátuas-menires de Valcamónica e Valtellina, exibem idênticas decorações em ziguezague na parte inferior, talvez reproduzindo elementos articulados (Anati, 1968a: 101). As lúnulas podem, ainda, representar artefactos semelhantes aos produzidos em calcário e que fazem parte de espólios funerários do Calcolítico da Estremadura Portuguesa (Gomes, 1994a: 125-127). É interessante verificarmos o facto de alguns exemplares mostrarem, tal como acontece em estátuas-menires da Região de Évora,
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o interior segmentado por grandes motivos triangulares ou ziguezagues, simbologia bem conhecida nas placas de xisto, associada em geral a maciças teorias de triângulos que, quase sempre, cobrem a totalidade das superfícies de tais objectos votivos. Sobre o peito, abaixo das lúnulas, seis estátuas-menires alto-alentejanas mostram seios, figurados através de dois círculos ou de par de círculos concêntricos, simétricos, de pequenas dimensões e sempre gravados, onde círculos ou pequeníssimas covinhas reproduzem os mamilos. Os seios, representados por círculos de pequenas dimensões, surgem nas estátuas-menires da Lunigiana (fase mais antiga), do Sul da França e da Sardenha (Atzeni, 1979-80: 36). Também a estátua-menir da Ermida, em Ponte da Barca, apresenta os seios figurados através de dois círculos concêntricos, contendo covinha central, um deles com gravura mais larga e profunda, provocando a sensação de relevo. Foi conferida ampla cronologia a este monumento, do Calcolítico Final à Idade do Bronze (Baptista, 1985: 27, 38, fig. 11). O atributo que acabámos de descrever permite clara diagnose sexual, aspecto nem sempre evidente, pelo menos para nós, em muitos monumentos congéneres dos que temos vindo a estudar, conforme também afirmava J. Arnal (1987: 12), a propósito das estátuas-menires do Sul da França e que tão bem conhecia. A ausência de simbologia explícita de carácter sexual, nas estátuas-menires, não deve significar que elas forçosamente figurem seres assexuados. Conforme mencionámos, os seios surgem incisos por picotagem e não em falso-relevo, técnica usada em grande parte das faces oculadas e das lúnulas, pelo que podem pertencer a programa iconográfico subsequente ao daquelas figurações. Parece, pois, que em um primeiro momento as estátuas-menires da Região de Évora, representariam entidades assexuadas, masculinas ou femininas, sucedendo-lhes, através da mudança ou da afirmação clara do sexo, as femininas. Fenómeno “transexual” idêntico foi observado primeiramente por Octobon (1931: 412) e confirmado por J. Arnal (1976: 77, 78; 1987: 12), para monumentos do Sul da França, constatando-se que, no Rouergue, pelo menos, 10% daquelas figurações assexuadas ou masculinas foram feminizadas. Algumas destas voltaram, ulteriomente, à sua primeira condição, aspecto que deve reflectir importantes alterações de carácter social e ideológico. As representações dos seios através de círculos, contendo ponto central ou pequeno círculo, figurando os mamilos, podem ser algo mais tardias que aquelas onde os seios foram representados por círculos simples. Quando os seios foram figurados por par de círculos concêntricos, permitem paralelos com as imagens de pendentes em dupla espiral, que encontramos em duas estátuas-menires do Sul de França ou em monumentos afins do Valcamónica, Valtellina e do Petit Chasseur, embora algo mais tardios. Aqueles adereços, tal como os pares de discos concêntricos, contendo ponto central e ligados entre si, têm vindo a ser considerados como artefactos propiciatórios, conotados com a fecundidade em geral, cujos protótipos foram produzidos
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com enrolamentos de cobre/bronze (Arnal e Menager, 1973). Segundo Anati (1968a: 109-115) eles teriam provável origem próximo-oriental e indo-europeia do IV milénio a.C. Também no Egipto dinástico, amuletos semelhantes eram usados, pendendo do pescoço, por mulheres grávidas, embora tais símbolos possam, ainda, encontrar-se ligados ao culto dos antepassados. Em algumas estátuas-menires alto-alentejanas, abaixo dos seios, na superfície mesial, identificam-se as representações de cintos ou de cinturões, podendo ser constituídos por simples linha horizontal, por linha dupla, por linha com círculo ao centro ou, ainda, por conjunto de linhas em ziguezague, figurando faixa larga. Tais elementos completam tanto o aparato simbólico como a estrutura estética daquelas composições, acentuando o seu antropomorfismo. As imagens referidas reproduzem originais, tecidos ou entrançados, manufacturados com fibras animais ou vegetais. Não esqueçamos que durante o Neolítico Final surgem, no Sul de Portugal, as primeiras placas de tear, fabricadas em cerâmica, reflectindo importante surto de desenvolvimento da economia agro-pastoril e a tecelagem da lã e, talvez, de fibras vegetais. As linhas em ziguezague dispostas horizontalmente, demarcando a cintura do monumento 1 da Portela de Mogos e que encontramos nas lúnulas ou abundantemente na decoração das placas de xisto, podem ser interpretadas como símbolos conotados com a água e com a fecundidade, sendo semelhante o signo egípcio mem (Anati, 1981: 71). Os círculos no centro dos cintos podem representar fechos, nós ou conterem valor apotropaico, talvez ligado com o mundo feminino. Observa-se iconografia idêntica em estátuas-menires do Rouergue (Serres, 1997: 50, 51). Em trabalhos anteriores dedicámos largas referências às figurações pré-históricas de cajados ou de báculos, pelo que nos abstemos de repetir tais considerações, embora importe sublinhar o facto de aquelas, quando em contexto funcional primário com as faces oculadas, mostrarem não só menores dimensões que as mais antigas como pertencerem à segunda forma por nós definida (Gomes, 1983: 394-397; 1983a: 281; 1997b: 25-32; 2000: 138-148). Julgamos, ainda, relevante verificarmos que a estátua-menir 65 dos Almendres e a 10 de Vale Maria do Meio mostram, cada uma, dois báculos; repetindo aspecto de que o menir 57 daquele primeiro recinto é exemplo raríssimo, dado exibir treze de tais artefactos. A explicação para tal, parece residir no facto de a repetição de artefactos e, designadamente, de armas, emprestarem maior valor às personagens figuradas, por certo que em proporção com o número de tais símbolos a elas associados. São várias as estelas-menires encontradas no Sul de França, principalmente no Gard, onde se observam báculos, mas em dois exemplares (Montaïon, Gard e Lagorce, Languedoc Oriental) reconhecem-se também dois de tais artefactos, em cada um, num caso a par (um gravado e o segundo em relevo), representados obliquamente, e no outro cruzados, um disposto horizontalmente e o outro na vertical (Gutherz e Jallot, 1987; Jallot, 1987: 40).
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Quadro II - Síntese iconográfica das quinze estátuas-menires encontradas nos cromeleques dos Almendres (ALM.), Portela de Mogos (P.M.) e Vale Maria do Meio (V.M.M.).
As figurações de báculos nas estátuas-menires francesas mostram preferencialmente, tal como nas portuguesas, a extremidade distal voltada para o lado direito do observador, ou seja, como se fossem suportadas, pela extremidade oposta, pela mão direita das entidades representadas em tais monólitos. A extremidade distal repousa, nos monólitos alto-alentejanos, sobre a zona oposta ao coração, assumindo simbolismo que importa aprofundar. A forma de báculo, em cajado ou bengala, é não só mais recorrente na arte rupestre como aquela que mais longo espectro cronológico apresenta, devendo-se tal facto, segundo julgamos, principalmente à utilização dos seus modelos nos contextos de economia preponderantemente pastoril, como seria a das sociedades do Neolítico Médio e Final do Alto Alentejo. Conforme também anteriormente tratámos (Gomes, 2000: 150-152), as covinhas devem auferir diferentes significados, apesar de, na sua origem, sugerirem sobretudo conotação feminina. Pares de covinhas dispostas na vertical podem ilustrar aquela simbologia, com longínquos antecedentes na arte quaternária. Importante característica das estátuas-menires da Região de Évora, reside no facto de não apresentarem decorações no reverso embora, conforme já referimos, dois monumentos da Portela de Mogos ostentem longos báculos em relevo, colocados verticalmente, sobre o seu lado direito. Apesar de ser bem possível que aquele artefacto pertença à gramática iconográfica do menir pré-existente, acreditamos que
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tal símbolo participou na caracterização do novo monumento pois, caso contrário, teria sido apagado. Em relação a outros grupos europeus de estátuas-menires, as alto-alentejanas revelam a ausência de tatuagens faciais, de figuração de cabeleiras ou de capacetes, de membros e das suas extremidades ou, ainda, de armas, como arcos e flechas os tão difundidos punhais e, ocorrendo mais tardiamente, de espadas. Podemos sintetizar este aspecto, expressando a convicção de que as entidades figuradas, nos monumentos que temos vindo a estudar, não contêm atributos guerreiros próprios à representação do poder de elites político-militares. As observações de carácter iconográfico e, sobretudo, as estratigrafias observadas, verticais e horizontais, como as diferenças técnicas, permitem propôr evolução das estátuas-menires da Região de Évora, a partir de menires onde foram figurados somente longos báculos. Em um primeiro momento as estátuas-menires apresentariam, apenas, a face oculada e um ou mais báculos, conforme documentam os monólitos 57, 76 e 94 dos Almendres. Ulteriormente, terão surgido as lúnulas associadas às faces oculadas, em alguns casos os cintos e, mais tarde, os seios. A uma quinta etapa pertencerão adições bem reconhecíveis, como círculos, alguns contendo ponto central e, ainda, muitas das covinhas. Integração sócio-cultural Os artefactos figurados nos monólitos que temos vindo a referir proporcionam tanto contributos de carácter corológico como cronológico, o mesmo acontecendo com a ausência de outros, conhecidos em monumentos congéneres, de diferentes regiões da Península Ibérica ou da Europa Meridional. Por exemplo, a já anteriormente aludida falta de representações de armas e, sobretudo, de armas metálicas que “invadem” o repertório iconográfico de monumentos congéneres, a partir dos inícios do Calcolítico, permite-nos, em princípio, atribuir cronologia anterior àquela. Todavia, tal ausência seria compreensível caso se tratassem de representações femininas. Importa relevar que, a partir das descrições antes efectuadas, ficou demonstrada a constância e a importância da presença caracterizadora da face antropomórfica, tal como a quase permanência da lúnula (cf. Estampa 4 e Quadro II). Parece-nos interessante verificar que no menir 17 do Cromeleque da Portela de Mogos surgem duas faces oculadas, entre outra iconografia anterior (Estampa 6B). Embora se trate de conceptualizações, as faces antropomórficas ou oculadas das estátuas-menires podem, através de alguns paralelos, ajudar-nos a integrar culturalmente os monumentos de que são, afinal, o principal atributo, aquele que de modo decisivo melhor as caracterizam. O tema da face oculada encontra-se muito difundido na Europa, por certo a partir do Sudeste Europeu e da Europa Central, onde se conhecem, durante o IV milénio a. C., em vasos antropomórficos da Cultura de Baden no Danúbio Central, talvez utilizados como urnas e onde também se detectou a presença da roda e do carro (Anati, 1981: 74). Não esqueçamos, no entanto, que foram identificadas faces antropomórficas,
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ou máscaras, desde o Paleolítico Superior, como a do santuário de El Juyo (Santander), rudemente gravada em bloco situado ao centro de pequeno recinto lajeado e atribuída ao Magdalenense Médio (Echegaray e Freeman, 1982). Contudo, para O. G. S. Crawford (1957: 25-27) a difusão na Europa das faces oculadas, acompanharia a neolitização e teria origem oriental; tese fundamentada nas descobertas de numerosas estatuetas femininas, com tais atributos, em Tell Brak, no Leste da Síria, datadas no IV milénio a.C. Conhecemos representações de faces antropomórficas, em quase todas as estações de arte rupestre do Vale do Tejo, encontrando-se normalmente isoladas, mas bem integradas nas formas e dimensões dos suportes. São figurações muito sintéticas, mostrando grandes olhos circulares, em alguns casos, boca igualmente circular ou linear, raramente nariz, mas sendo, na maioria dos casos, limitadas por linha envolvente subcircular ou oval. Apenas em uma, de São Simão, se associou a representação dos seios, tendo ainda a particularidade de ter sido gravada em rocha sub-vertical e não horizontal, como acontece com as restantes daquelas figurações, constituindo composição monumental. Outra face oculada, da mesma estação rupestre, aproveitou tanto o contorno da rocha, como os olhos são duas covinhas naturais, tendo-se somente gravado a boca. Estas imagens têm sido por nós atribuídas aos inícios do período IV, ou Meridional, da evolução crono-estilística que propusemos para a arte tagana, com cronologia tardo-neolítica (Gomes, 1987: 38). Também no abrigo Pinho Monteiro (Arronches), nos contrafortes da Serra de São Mamede, encontrámos face antropomórfica semelhante às acima descritas, mas pintada de cor vermelha. Situa-se no centro do interior do abrigo, isolada das restantes pinturas e em lugar de destaque, parecendo ter presidido às actividades ali desenroladas. A estratigrafia cromática e estilística das pinturas deste abrigo, assim como o espólio recuperado durante a escavação a que ali procedemos, permitem datar a fase onde se integra a imagem descrita no Neolítico Final (Gomes, 1989: 229-235). No Alto Alentejo são há muito conhecidas as pequenas estelas da Esperança (Arronches) e Crato, embora mostrando características bem diferentes dos exemplares que temos vindo a tratar, designadamente mostrando decoração gravada e não em relevo. Em cada uma delas os olhos circulares foram figurados através de pequenas covinhas e o nariz reproduzido por meio de traço, em faces separadas do corpo por linha recta, observando-se, sobre a cabeça, possíveis representações de diademas. Têm vindo a ser atribuídas ao Calcolítico ou aos primeiros tempos da Idade do Bronze, encontrando paralelos em já extensa série descoberta, na Estremadura Castelhana, mas também no Noroeste, onde importa citar o grupo do Cabeço da Mina (Vale da Vilariça, Moncorvo), e o do Norte da Península Ibérica. As estelas do Cabeço da Mina mostram diferentes tipos de faces oculadas, colares e cintos, não se tendo identificado armas, embora tenham vindo a ser classificadas no III milénio a. C. (Jorge e Jorge, 1990: 34, 36). Recentemente estudámos a estela do Casal de Insalde (Paredes de Coura), monólito de granito, ostentando decoração sui generis, constituída por rectângulos
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concêntricos, com paralelos na Bretanha e Irlanda, mas onde se observa face oculada, constituída por olhos circulares e nariz, longo e largo, muito semelhante aos que possuem as estátuas-menires alto-alentejanas. O monumento minhoto pode ser classificado no Neolítico Final (Gomes, 2006) (estampa 6A). Apesar do distanciamento geográfico e, necessariamente cultural, também a estátua-menir da Ermida (Ponte da Barca, Serra Amarela), a que já fizemos breve referência, apresenta afinidades com as do grupo da Região de Évora, merecendo alguma reflexão (Baptista, 1985). Trata-se de monumento que aproveita tosco bloco com forma vagamente antropomórfica, que bem podia ter sido utilizado como menir, sendo idêntico a muitos dos que constituem os recintos megalíticos do Alto Alentejo. Aquele monólito foi aplanado, criando-se face onde se inscreveu a iconografia antropomórfica e, tal como as estátuas-menires da Região de Évora, também ela deve ser olhada de frente. As suas dimensões aproximam-se, igualmente, das medidas médias dos monumentos dos Almendres e Portela de Mogos. E é, ainda, na face, com os olhos representados através de círculos, com pequenas covinhas ao centro, no nariz de forma oval alongada ou na presença discreta da boca, que encontramos outras afinidades. Os seios, utilizando círculos com covinha central, são ainda paralelos que não devemos descurar. A falta de contexto deste monumento constitui importante óbice, tanto em relação à sua cronologia como função. Todavia, as semelhanças com as estátuas-menires alentejanas e a lógica conceptual que elas denunciam, permite conferir-lhe idêntica cronologia. Esteliformes gravados em penedos do Noroeste Peninsular, como na Pedra das Ferraduras de Fentans (Pontevedra), onde se observam três representações com faces antropomórficas, individualizadas do corpo por linhas semicirculares, ou do Vale do Tejo, são ainda, formalmente afins dos monólitos alto-alentejanos (Anati, 1968: 50-52; Gomes, 1987: 38, fig. 31; 1989: 68, 69; 1997: 271, 274; 2004: 96-98, fig. 12). Recordemos que as estelas calcolíticas e dos inícios da Idade do Bronze (estelas diademadas) exibem em geral grandes adereços sobre a cabeça e colares, com as voltas perfeitamente separadas, associando-se, ainda, figurações de armas metálicas (espadas e/ou alabardas), em exemplares do Norte da Península Ibérica (Peña-Tú, Tabuyo del Monte, Collado de Sejos II) ou da Estremadura Castelhana (Hernán Pérez VI, Cáceres) (Almagro-Gorbea, 1993; 1994; Bueno Ramírez, Balbín Behrmann e Barroso Bermejo, 2005: 593, 605, 606, 611). A ausência de tão importantes elementos de caracterização ético-social, que tipificam a grande maioria das estátuas-menires e estelas antropomórficas das Idades do Cobre e do Bronze, nos monumentos alto-alentejanos em apreço, permite considerarmos a sua anterioridade em relação àqueles, como, aliás, já havíamos reconhecido. Também importa evidenciar que em quase todos os monumentos antes mencionados a técnica utilizada na figuração dos motivos foi a gravação e não o relevo ou o falso-relevo. A recorrência desta técnica de representação nos monólitos alto-alentejanos
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é, quanto a nós, outro significativo indicador da sua maior antiguidade. O excepcional desenvolvimento da economia agro-pastoril verificado no Alto Alentejo, durante o Neolítico Final, exemplarmente expressado no “santuário exterior” do Escoural, ficou a dever-se a inovações de carácter técnico, capazes de proporcionarem a exploração agrícola intensiva e em extensão, utilizando o arado, o carro e novas espécies vegetais, a par dos denominados produtos secundários (leite, sangue, lã, estrume), originando acumulação de sobreproduto económico (Gomes, Gomes e Santos, 1994). Este haveria de provocar alterações na estrutura social, permitindo a existência no seu tecido de elementos detentores dos novos conhecimentos técnicos, criando diferentes poderes de decisão, como de controlo dos meios e dos modos de produção, tal como dos excedentes obtidos, aprofundando a segmentação social e fortalecendo as lideranças das sociedades tribo-patriarcais. Tanto a terra como os artefactos ligados à sua exploração, e a própria produção agrícola deixaram, com a crescente acumulação de excedentes, de ter apenas “valor de uso” e passam a auferir “valor de troca”, modificações estruturais que reflectem grandes alterações do comportamento humano e, nomeadamente, na área do poder político e religioso. Naquele contexto, o poder acrescido dos chefes depressa ultrapassa os limites outorgados por quem lhes é próximo, para passarem a reclamar origem divina e cosmológica, integrando genealogias de herdeiros, com direitos e prerrogativas. Podemos, mesmo, deduzir que durante o Neolítico Final do Alto Alentejo se acentuou a transformação de sociedades fundamentalmente igualitárias em sociedades segmentadas, mais ou menos hierarquizadas e constituídas por linhagens, algumas por certo lideradas por elites detentoras do poder político-religioso. Assim terão surgido, pela primeira vez no processo histórico ocorrido no Sul de Portugal, os antepassados divinizados à imagem e semelhança dos mortais, com atributos propiciatórios e funções múltiplas, corporizados nas estátuas-menires, nascidas nos velhos recintos megalíticos, onde melhor herdavam os tão necessários vínculos com o sobrenatural e o seu tempo mítico. Aqueles monumentos desempenhavam papel preponderante, no cerimonial religioso, dada a sua maior aproximação com os antepassados, cuja eternidade era sagrada. Como em todos os sistemas ideológicos complexos estariam, assim, criados os meios para a construção, explicação e manutenção de estruturas coercivas, dos acessos desiguais ao sobreproduto económico e ao controlo dos principais meios de produção (Serrano, 2000: 102, 105). Conclusões Conforme outros autores problematizaram, a identificação/transformação, durante a Pré ou Proto-História, de um bloco natural em figura antropomórfica, não corresponde a uma intervenção artística, mas a uma elaboração conceptual em que o resultado constituía a criação de uma entidade viva.
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As estátuas-menires alentejanas, demonstrando certa continuidade física e conceptual com os menires que reutilizaram, correspondem a fenómeno com localização regional, embora estimulado por possíveis contributos exógenos, sobretudo de ordem técnica e económica, aspecto que só futuros trabalhos melhor definirão. Na síntese figurativa detectada nos monumentos da Região de Évora, destaca-se a grande imagem luniforme, astro da noite e do dia, cujo ciclo está ligado tanto à fecundidade humana como da terra e ao universo feminino. Por outro lado, a presença de reproduções de báculos, com larga tradição local e no megalitismo atlântico (Cassen e L’Helgouach, 1992), assim como das linhas em ziguezague e das covinhas, reforçam o carácter da mensagem que se quis traduzir naqueles monumentos, em termos de estatuto das entidades neles figuradas, mas talvez ainda da sua função ordenadora do tecido social e até psicopompa, capaz de conduzir as almas nos domínios do desconhecido. As estátuas-menires da Região de Évora podem ter constituído o suporte material, ou imagético, de entidades, talvez melhor, de espíritos de antepassados civilizadores e divinizados, com alto estatuto social, que naqueles espaços facilitariam a comunicação com o transcendente, com o mundo dos mortos, onde se acreditaria residirem as forças que presidiam à criação da Natureza, assim proporcionando protecção e bem-estar às comunidades a que tinham pertencido em vida, sendo ainda capazes de confirmarem os direitos e deveres dos seus sucessores. Tais monólitos antropomórficos devem ser entendidos como conceptualizações de entidades poderosas e, em nosso entender, poderiam mesmo substituir os restos mortais daqueles que assim foram representados, tornando-se perenes e mais próximos dos vivos, pelo que os recintos que integram bem podem ter tido o carácter de panteões, em parte substituindo as necrópoles e os seus túmulos monumentais, onde até então se encerravam os testemunhos directos dos antepassados mais ilustres e se conservavam simbolicamente as suas linhagens. O mundo das estátuas-menires, com maior expressão na faixa meridional da Europa, da Ucrânia à Península Ibérica, desenvolveu-se naquela última região a partir de meados do IV milénio a.C. e alcançou o II milénio a.C., quando se reflectiu na construção de estelas com função primariamente funerária (Gomes e Monteiro, 1976-77).
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
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Estampa 1 – Localização dos recintos megalíticos, com estátuas-menires, dos arredores de Évora. A - Cromeleque dos Almendres; B - Cromeleque da Portela de Mogos; C - Cromeleque de Vale Maria do Meio (seg. a C.M.P., nº 448, Évora, S.C.E., 1967).
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Estampa 2 – Cromeleques dos Almendres (A), da Portela de Mogos (B) e Vale Maria do Meio (C). Plantas com localização dos menires decorados (•) (seg. M. V. Gomes).
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Estampa 3 – Cromeleque dos Almendres. Transformação de menir em estátua-menir (m. 76) (seg. M. V. Gomes).
Estampa 4 – Estátuas-menires dos cromeleques de Almendres (ALM), Portela de Mogos (PM) e Vale Maria do Meio (VMM) (seg. M. V. Gomes).
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Estampa 5 – Principal iconografia detectada nas estátuas-menires da Região de Évora (seg. M. V. Gomes).
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Estampa 6 – Faces oculadas. A – Casal de Insalde (Paredes de Coura); B – Menir 17 da Portela de Mogos (seg. M. V. Gomes).
Estampa 7 – Menires com báculos e círculos. Cromeleque da Portela de Mogos (m. 31) e Cromeleque do Xarez (m. 37) (seg. M. V. Gomes).
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Estampa 8 – Lúnulas de calcário. A – Alapraia 2 (Cascais); B – Cabeço da Arruda 2 (Torres Vedras); C – Praia das Maçãs (Sintra); D – Pedra dos Mouros (Sintra); E – Gruta de Cascais (Caiscais); F – Estria (Sintra); G – Pai Mogo (Lourinhã); H – Trigaches 3 (Loures); I – Trigaches 2 (Loures); J, K – Carenque (Amadora) (A-F, H-K, seg. Leisner, 1965, ests 7, 10, 17, 40, 58, 59, 70; G, seg. Gallay, Spindler, Trindade e Ferreira, 1973, fig. 18).
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Identidades y estelas en el calcolítico peninsular. Memorias funerarias en la cuenca del Tajo Bueno Ramirez, P., Barroso Bermejo, R., Balbín Behrmann, R. de1
Resumen El conjunto estatuario peninsular de raíces megalíticas y amplio desarrollo durante el Calcolítico y Bronce, tiene en la cuenca del Tajo un marcado desarrollo. Cuatro grupos con características gráficas reconocibles se analizan a partir de su relación con el megalitismo reciente, argumentando su destacado papel en la configuración de las representaciones heroicas del Bronce Final. El peso adjudicado al impacto colonial en el origen de las estelas de guerrero, queda sensiblemente matizado por la evidencia del largo recorrido de las imágenes humanas asociadas a la muerte desde las primeras construcciones megalíticas, insistiendo en la exhibición del valor de la tradición de los ancestros. Las cuencas interiores del sur de la Península ejercen un notable papel en la configuración de identidades, constituyendo los datos en el Tajo un conjunto muy destacado. A partir de estos datos puede confirmarse el papel protagonista de las tierras que se asocian con el decurso fluvial que alcanza el Ebro, extendiendo sus posibilidades de relación hasta el área pirenaica, que conecta con el Duero en un tránsito sin ninguna dificultad orográfica, que engarza con el Guadiana a través del Gévora por un extremo y de los valles del Noreste cacereño por el otro y, que posee muy fácil acceso a las ricas tierras del Sur. El Tajo aparece, pues, como plataforma de distribución de materias primas e ideas, plenamente consolidada en los períodos metalúrgicos, favorecida por sus capacidades extractivas de cobre y oro. Palabras clave: Imágenes antropomorfas, Neolítico, Calcolítico, Bronce-Hierro, Metalurgia, Cobre, Oro. Abstract The Iberian statues group with Neolithic roots had a marked develop during the Copper and Bronze Age in the Tagus river Valley. Four groups with graphic recognizable characteristics are analyzed from its relation whit the Recent Megalithism, to arguing its out-standing role in the configuration of the heroic representations of the Late Bronze. Human images associated with the death from the beginning of megalithic buildings clearly shown the deeply roots of this kind of iconography, and suggest a reflexion about the traditional weight of the colonial impact in the origin of the warrior stelae. 1 Area de Prehistoria. Universidad de Alcalá de Henares. E-mail: [emailprotected] ; rosa.barroso@uah. es ; [emailprotected].
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história From this information can confirm the main role of the associated lands with the river valley that reaches the Ebro River, extending their possibilities of connection to the Pyrenaica area and the Duero River in a way without any orographical difficulty. It connects with the Guadiana River through the Gévora. Then, the Tagus River appears, like a distribution platform of raw materials and ideas, entirely consolidated in the metallurgical stages, favoured by his sources of copper and gold. Key words: Anthropomorphic images, Neolithic Copper Age, Late Bronze - Iron, Metallurgy, Copper, Gold.
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Introducción El análisis de las grafías megalíticas nos ha permitido fijar el valor de las imágenes antropomorfas en los discursos ideológicos relacionados con el culto a los ancestros. Nuestra hipótesis de que las imágenes armadas de las estelas del Bronce se asentaban en las referencias ancestrales representadas en los megalitos, ha ido ganando argumentos (Bueno, 1987, 1991, 1995; Bueno et al. 2005a) . Podemos contextualizar la simbología desarrollada a lo largo del Bronce y del Hierro en el discurso ideológico de un megalitismo , cuya pervivencia en el III y II milenio cal BC. goza de referencias arqueológicas (Barroso et al. 2007; Bueno et al. 2004a, 2008a). Una fase de estelas y estatuas armadas o no armadas, con cronologías puente entre las más antiguas figuraciones megalíticas y las estelas del Bronce Final, ha venido siendo nuestra línea de investigación (Bueno, 1987, 1991,1995; Bueno et al. 2005a). En esa dirección hemos aportado datos que asocian la evolución de las imágenes antropomorfas al decurso de las arquitecturas megalíticas (Bueno y Gonzalez Cordero, 1995; Bueno et al. 2005a), justificando sus hondas raíces en el culto a los ancestros. La arraigada idea de analizar las estelas del Bronce Final-Hierro como un conjunto de nuevo cuño se explica en la intención de integrarlo como una más de las evidencias coloniales (Almagro Basch, 1966; Bendala, 1977). Mientras que nuestra perspectiva ha sido la de verlo en el desarrollo de la prehistoria reciente de su ámbito territorial, pues muchas de las referencias gráficas tienen correlato indudable en el fondo estatuario de los primeros productores y metalúrgicos. Su contexto ideológico en el megalitismo aporta además interesantes puntos de reflexión acerca de su función y significado, en territorios que aúnan áreas de habitación y áreas funerarias acompañadas por pinturas y grabados al aire libre (Bueno et al. 2004, 2005a). Es esa perspectiva más integral la que propone parámetros de análisis más allá de las tradicionales tipologías y comparaciones de objetos como única vía para el estudio de estas piezas. Estatuas y estelas asociadas al mundo funerario durante el V, IV, III, II y I milenio cal BC., cuyas variantes giran en torno a tamaños, materias primas y modos de trabajo, que se desarrollan en territorios definidos justificando nuestra hipótesis de que se trata de expresiones de carácter identitario (Bueno, 1987, 1995; Bueno et al. 2005a). Ya el ritual megalítico incluye imágenes antropomorfas interpretables en ese sentido (Bueno, 1992; Bueno y Balbín, 1994), insistiendo en especializaciones que tienen en los tipos arquitectónicos y en el énfasis en determinadas tipologías de objetos, argumentos en la misma dirección. Nuestro más reciente compendio nos ahorra prolijas explicaciones. Brevemente resumiremos la situación diciendo que la contemporaneidad de muchas de estas representaciones está demostrada, al igual que su agrupación territorial (Bueno et al. 2005a, 2010a). El continuado trabajo en la cuenca interior del Tajo permite establecer esta zona como caso de estudio para analizar las especializaciones gráficas de estelas y estatuas
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como versiones identitarias. Y ello en el marco del megalitismo regional que, de escaso conocimiento hace unas décadas (Bueno, 2000), ha pasado a constituirse en una de las plataformas más importantes para la discusión de algunos de los problemas básicos de la prehistoria reciente interior (Bueno et al. 2008a). En toda la Península el conjunto de figuraciones armadas en territorios megalíticos está plenamente consolidado a mitad del III milenio cal BC. (Bueno et al. 2005a). Los últimos años y las investigaciones en el área del Tajo Internacional, han proporcionado evidencias de que nuestra hipótesis de conexión entre el megalitismo y las estatuas y estelas armadas, funciona. Además de abrir la puerta a otras versiones dentro del territorio del Tajo que apuntan señaladas interacciones con los caminos ganaderos que alcanzan el Norte de la Península Ibérica (Bueno et al. 2010). Nuestro objetivo es, pues, un estado de la cuestión sobre el panorama de estatuas y estelas del III milenio cal BC. en el Tajo, teniendo en cuenta sus precedentes en la misma región y la evolución de contenidos que conduce a las figuraciones protohistóricas (Estampa 1). Para ello definiremos cuatro conjuntos, todos ellos conectados con el megalitismo, aunque con información desigual. Un primer grupo incluye las piezas armadas o no, trasunto de las clásicas figuras de placas decoradas. Con datos en nuestro ámbito y en Andalucía , su extensión hacia el Norte por rutas tradicionales, ofrece argumentos ideológicos e interacciones documentadas mediante objetos y materias primas entre el Norte y el Suroeste de la Península Ibérica. Relacionar estas imágenes con las referencias identitarias de grupos de ganaderos que acuden a exhibiciones armamentísticas para demostrar su capacidad de control del ganado y de otros bienes de prestigio, es una perspectiva de análisis interesante. Más aún cuando la decoración “clásica” de las placas antropomorfas geométricas, la más extendida en tiempo y en geografía de todo el Suroeste (Bueno, 1992), es la que constituye el principal motivo de la vestimenta de estos personajes. El otro grupo destacado es el relacionado con el conjunto que en su día denominamos Hurdes-Gata y cuya amplitud aconseja definirlo como grupo centro-occidental (Bueno et al. 2005a). Su nexo con el megalitismo reciente es claro. Su ubicación en zonas de actividad y extracción metalúrgica que tendrían en el oro aluvial una de sus expectativas económicas más convincente (Bueno et al. 2004a: 705; Barroso et al. 2003), propone su asociación con linajes relacionados con estas actividades, localizados en la zona interior de la Península, con muy buenos accesos hacia el Norte y Sur del resto de nuestro territorio. La extensión de estas piezas o de sus referencias iconográficas hacia la cuenca del Duero ya fue señalada (Bueno et al. 2005a), y ahora se ratifica. Comenzamos a disponer de datos en el Tajo Internacional y en el extremo del río que conecta con el Guadiana, situándose, pues, en dos plataformas de amplia proyección en los caminos del interior peninsular. Su relación con el grupo norocccidental (Bueno et al. 2005a), y su extensión hacia las sierras andaluzas, consolida un área de interacciones similar a la de los dos grupos antes mencionados.
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Un último conjunto, es el de las estelas alentejanas, que con un ejemplar en nuestra zona de estudio y otro más al Norte, despuntará con más fuerza a tenor de las relaciones que mantienen algunos parámetros gráficos que se analizan en este texto. La pervivencia de este modo de visualizar imágenes de ancestros armados y su conexión con el mundo funerario, ejerce un peso inequívoco en la consolidación de las representaciones heroicas asociadas al mundo del Bronce Final. Su análisis como meras respuestas indígenas a impulsos totalmente foráneos, hurta una realidad más amplia que fija parte de sus contenidos en las referencias ancestrales, constituyendo de hecho esta faceta la de mayor contenido ideológico, pues a las figuras del pasado se le suman los objetos y dádivas relacionados con la capacidad de mostrar prestigio que poseen algunos linajes y caudillos del Bronce Final. Estelas-placa La estrecha relación de piezas mobiliares, ortostatos y estelas se centra en la figuración común de imágenes antropomorfas mediante iconografías muy próximas en las que los dibujos geométricos de las vestimentas que portan son el elemento más visible (Bueno et al. , 2005a, 2007a). La proyección antropomorfa de los ortostatos-estela tiene su mejor correlato en las vestimentas del mismo tipo de las placas decoradas (Bueno,1995; Bueno et al. 2005a: 594), abundando en la hipótesis de que esta fórmula es una de las más extendidas en los sepulcros megalíticos, tanto en la Península Ibérica como en el resto de la fachada atlántica europea (Bueno y Balbín, 2002). Las versiones escultóricas de esta imagen tienen en las ya mencionadas placas su fórmula mobiliar, y en estelas y estatuas de tamaños diversos, su trasunto más visible (Estampa 2). La constatación de que se pintaron y se grabaron en soportes al aire libre situados en destacados elementos orográficos, se suma para proponer que son las imágenes de los ancestros las que presiden los lugares no sólo funerarios, sino de interés económico y simbólico de los constructores de megalitos. En el Tajo, la estela pintada en el abrigo del Buraco, en Santiago de Alcántara (Carrera et al. 2007), repite esquema rectangular acabado en semicírculo, en este caso con unos destacados ojos-sol, dentro de la tradición de las placas decoradas, representada en el conjunto gráfico de los megalitos del Tajo Internacional por los ojos-soles grabados en uno de los ortostatos del dolmen de Trincones I (Bueno et al. 2000). Pinturas de placas de contorno recortado también tienen cabida en la Sierra de San Pedro, un señalado accidente geográfico que caracteriza el territorio de los constructores de megalitos de Santiago de Alcántara, constituyéndose en su referencia más visible (Bueno et al. 2010b). En uno de los afloramientos de granito del área de ocupación neolítica y calcolítica del poblado de Los Barruecos, Cáceres, una forma grabada del mismo estilo (Carrera et al. 2007: 99), ofrece una referencia más para las fórmulas al aire libre de las placas decoradas. La estela de Nuestra Sra. da Esperança (Breuil, 1917), se asociaba a un túmulo megalítico en un entorno, el de Arronches, en el que sabemos de sus abundantes marcadores
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gráficos. Conservada sólo en su tercio superior, reúne grabado y pintura para diseñar un rostro con ojos, nariz y boca, rodeado por varios círculos concéntricos con puntos, que suponemos la parte superior del manto que le cubría, o algún adorno en la cabeza (Bueno et al. 2004b). En esquisto, con sección plana, y un tamaño que en origen podemos suponer de en torno al metro, se trata de una versión escultórica de las piezas tipo Peña Tú, de las que el Norte de la Península Ibérica tiene buenos ejemplos (Bueno et al. 2010). También fragmentada en la base, la estela de Crato repite las características de la anterior, con la diferencia de que no es tan plana y su lateral está trabajado (Bueno et al. 2004b). En él, dibujos geométricos conforman el manto que cubría el cuerpo completo de estas figuras. Este coincide con los documentados en algunas placas escultóricas, como se observa en el trabajo de los laterales de las placas de Couto dos Andreiros y Montemor-o-Novo (Bueno, 1992: figs.9 y 13). Algo más alejadas de nuestro territorio, el mismo recurso gráfico se aplica al diseño de las vestimentas de algunas estatuas-menhir del Sur de Francia y del Noreste peninsular. El caso más recientemente documentado, el de las estelas de Reguers del Seró (Lopez et al. 2009). La cronología C14 del dolmen de Trincones I (Bueno et al. 2007b), dentro del III milenio cal BC ofrece una referencia para los datos que acabamos de exponer, manifestando una fuerte sincronía entre las versiones escultóricas, y las realizadas al aire libre en una fase contemporánea al campaniforme. De hecho, el dolmen de Trincones I tiene campaniforme inciso. Las representaciones de estelas-placas conocidas hasta el momento en el Tajo, no están armadas. Pero no hay que olvidar que en el Norte de la Península, algunas tampoco lo están, validando la sincronía de piezas con armas y sin armas en el abanico de la estatuaria del III milenio cal BC. (Bueno et al. 2010a). La mayor concentración de estelas-placas es la del Norte de la Península. Con un grupo bastante compacto en el centro del Cantábrico relacionado con la cabecera de la cañada leonesa oriental, y otro, en el Oeste, que conecta con la de la Leonesa occidental, éstas aparecen en grabados al aire libre y en versiones estatuarias. La presencia de pintura en Peña Tú y de fórmulas totalmente pictóricas en Fresnedo, asegura sus versiones pictóricas. Su relación con puñales y alabardas de la primera metalurgia encaja con las cronologías de segunda mitad del III milenio cal BC. que hemos valorado para el grupo del Suroeste y confirma la estricta contemporaneidad de las piezas tipo Peña Tú con las descritas en el Tajo (Bueno et al. 2005a). Conectar estas evidencias con modos de vida tradicionales de carácter agropastoril es muy sugerente, aunque no es fácil establecer taxativamente este género de hipótesis por la ausencia casi total de datos paleoeconómicos. Pero algunas materias primas como el azabache de Valencia de Alcántara (Bueno, 1988: 175), proceden del Norte, de manera que la interacción que la presencia de esta materia prima representa, tiene en los hallazgos del grupo Peña Tú argumentos ideológicos de fuerte calado.
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Estelas centro-occidentales Hace casi tres décadas que establecimos la presencia de un grupo de estelas antropomorfas megalíticas en la zona Hurdes-Gata (Bueno, 1987). De entonces acá, hemos podido precisar mejor los contextos de estas piezas, cuyo número se ha incrementado de modo notable (Bueno et al. 2005a), incluyendo alguna referencia armamentística (Estampa 3). De nuevo las placas decoradas fijan elementos gráficos comunes entre objetos muebles y versiones estatuarias. Pero si en el caso anterior se trataba de su faceta geométrica, en el que nos ocupa son las placas escultóricas las que ofrecen las iconografías relacionables con todo un conjunto de estelas asociadas a necrópolis de pequeño tamaño y a sepulturas de falsa cúpula, cuyas referencias cronológicas se sitúan dentro del III milenio cal BC. Las estelas centro-occidentales dibujan, más claramente que otros elementos culturales, la estrecha relación entre las plataformas del Tajo y del Duero, recogiendo iconografías del conjunto de placas escultóricas con expansiones hacia la zona del Duero (Bueno, 1992). No vamos a detallar aquí el largo trasiego cronológico que han sufrido las estelas centro-occidentales. Incluidas em el Catálogo de las estelas del Suroeste por Almagro Basch (1966), fueron recuperadas por Almagro Gorbea (1977), para interpretarlas como versiones femeninas del conjunto de guerreros de las estelas del Bronce Final (Berrocal, 1987; Celestino, 2000; Santos, 2009). Su asociación funeraria tiene refrendo en los pequeños monumentos del área de las Hurdes (Bueno y González, 1995). Se trata de necrópolis asociadas a poblados calcolíticos, en las que también comparecen sepulcros de falsa cúpula (Bueno 1994, Bueno et al. 2004a, 2008a). En la situación actual podemos confirmar su apogeo a lo largo del III milenio cal BC. y su integración en territorios funerarios que continúan en uso a lo largo del II milenio cal BC. La concurrencia de estelas de la serie calcolítica y de la serie del Bronce Final en los mismos lugares, caso de las Hurdes o de Valencia de Alcántara, tiene confirmación en los datos obtenidos en la vecina área portuguesa (Cardoso et al. 2003). Casi una treintena de ejemplares definen un conjunto antropomorfo compuesto por piezas generalmente en esquisto, aunque hay alguna de granito, con tamaños medianos – de 50 cm a 1m –, y alguna pieza mayor como la de Toniñuelo, que tiende a soportes planos, figura de la que se salen algunos molinos como los que constituyen el soporte de las representaciones de Riomalo. Hay también menhires como los de Ciudad Rodrigo I y Salvatierra de Santiago. Su mayoritario contexto sepulcral tiene en el alineamiento de Cabeço da Mina, en el Duero (Sousa, 1996), la evidencia de un monumento complejo del que aún no conocemos detalles suficientes, para proponer otros contextos de mayor capacidad de exhibición pública. Precisamente en esta área están comenzando a tener una consistencia inédita; así el citado conjunto de Cabeço da Mina, la pieza de A-de-Moura (Silva, 2000), en Guarda, la estatua-menhir de Alto da Escrita (Carvalho et al., 1999) o la estela de Barrega (Sampaio, 2007).
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Pocas de estas estelas aparecen armadas. Una alabarda en bajorrelieve se asocia a la estela de Hernán Pérez VI (Bueno, 1987), una hoja de alabarda a la estela de Los Santos, y dos posibles hojas de cuchillo son portadas por las estelas de Agallas y de A-da-Moura, ambas de la zona del Duero (Bueno et al. 2005a: 630). El fuerte núcleo del Norte de Cáceres, con extensiones en el Tajo Internacional y en las llanuras del Duero, coincide con el tramo de la leonesa occidental que une las plataformas del Tajo y del Duero. Y, sobre todo, con un sector de posibilidades auríferas notorias, factor que nos parece del mayor interés para comprender la importante población calcolítica y de la edad del bronce que los datos arqueológicos apuntan (Bueno et al. 2004b, 2008a). La pieza situada más al Sur, la de la Lantejuela, coincide con algunos hallazgos en el Guadiana (Berrocal, 1987), para valorar la expansión hacia Andalucía occidental. Sólo factores económicos importantes sustentarían este despliegue de imágenes antropomorfas ligadas a sepulcros de poca entidad física, que resultan más notables por sus estelas que por la propia visibilidad de los enterramientos. Estatuas y estelas noroccidentales El conjunto que definimos (Bueno et al. 2005a: 629) en el área del Duero, con algunas extensiones hacia el interior y noreste de la Península Ibérica, se caracteriza por piezas de envergadura y de perfil alargado (Estampa 4). Los detalles de su vestimenta muestran auténticos guerreros con corazas, protectores, cascos y, desde luego, armas. Se podría afirmar que son las figuras más explícitamente guerreras de todas las del conjunto peninsular, siendo las espadas y alabardas las armas más representadas, junto con algunos cuchillos. Estos detalles de vestimenta protectora, se asocian a pectorales de mayor o menor desarrollo; datos que en su conjunto, dibujan figuras de gran impacto visual, algunas de las cuales se insertan en territorios megalíticos (Bueno et al. 2005b). Cabezas destacadas, cuello marcado y la disposición de las armas en la zona delantera, permiten proponer su relación con la estatuaria mediterránea. Nos referimos naturalmente al conjunto antiguo de estas piezas, alguna de las cuales tiene referencias en el Sur de Francia (Bueno, 1995). La reciente documentación de dos piezas armadas que entran en estos parámetros asociadas a megalitos del Tajo, es del mayor interés (Bueno et al. e.p.). A ellas hemos de sumar otras dos piezas de la necrópolis de Lagunita (Bueno et al. 2008a). El vado de Alconétar es conocido de antiguo por ser uno de los pasos tradicionales del Tajo. En su entorno se sitúan necrópolis megalíticas, las más conocidas las de Garrovillas y las de Eras del Garrote (Bueno, 1994). Las prospecciones emprendidas por E. Cerrillo en un momento de bajada de aguas del pantano, han aportado más sepulcros y un área de habitación entorno a la cual se dispone otra necrópolis. Sobre uno de los túmulos de ésta, se situó la estela de Alconétar (Bueno et al. e.p.). En esquisto, con la cabeza redondeada y separada del resto del cuerpo por un profun-
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do grabado, destaca de modo notable el conjunto de armas situado en su zona delantera. Puñal, alabarda y cinturón, ajustados entre sí como la espada y la alabarda de la estatua de Valdefuentes de Sangusin, o algunas armas de las panoplias alentejanas de la serie I. La pieza hacía visible el monumento, al igual que en el caso de la estela de Cañamero. Con la cabeza delimitada por estrechamiento, marca hombros y un cuerpo que finaliza con una estructura de coraza que continúa hacia el reverso y que de nuevo recuerda la pieza salmantina ya citada. Delante del cuerpo una alabarda de gran tamaño resulta muy visible (Bueno et al. e.p). Ambas, estelas armadas asociadas nítidamente a contextos funerarios del megalitismo avanzado que certifican nuestra hipótesis de la relación entre estelas armadas y sepulcros megalíticos (Estampa 5). Como sucede en el resto de los conjuntos que venimos señalando, otras piezas no están armadas aún perteneciendo a los mismos contextos. Nos referimos a las estelas de la necrópolis de Era de la Laguna, en Santiago de Alcántara. Lagunita III, una gran cámara con corredor en esquisto disponía de una estela-menhir sobre el túmulo, que creemos se situó tras dar por cerrado el monumento, como sistema de hacerlo más visible. En el interior del sepulcro, otra estela de en torno al metro, mostraba el mismo adorno pectoral de algunas de la serie noroccidental, además de un cinturón, pero no estaba armada (Bueno et al. 2008b). En el momento de dar por concluido el uso del monumento, la estela se situó tapando la entrada del corredor, reiterando la idea de que las piezas antropomorfas son las que protagonizan la memoria de los enterrados en el megalito. Muy cerca, el monumento de Lagunita I incluye una cámara con corredor, reestructurada hasta formar una cámara alargada que se cerró y sobre la cual se situó una estela de gran tamaño. Esta, de perfil triangular, muestra un rostro grabado muy similar al de Longroiva, y una forma rectangular, probablemente indicación de vestimenta (Bueno et al. e.p.). De nuevo, estelas con armas y sin armas, asociadas a contextos funerarios del megalitismo reciente, que ofrecen evidencias del tránsito entre las más viejas representaciones de ancestros con báculos y hachas a las más recientes. Estelas alentejanas Este singular conjunto está bien definido en los trabajos clásicos por sus soportes planos, generalmente asociados a las cistas en las que se localizan estas piezas (Almagro Basch, 1966; Gomes y Monteiro, 1977). Se entiende su posición original como vertical, aunque muchas de ellas ya no dispongan de datos para confirmarla (Gomes, 2006: 51). En los últimos años se han venido dando a conocer algunas piezas más claramente antropomorfas que reiteran asociaciones armamentísticas y técnicas, sugiriendo una cierta variedad entre éstas (Estampa 6). La consideración de su posición vertical que permite comprender los cinturones, bandas y demás elementos de suspensión, junto con la posición de las armas no deja lugar
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a dudas de que la intención de las piezas es totalmente antropomorfa. Esta queda confirmada por los menhires documentados en las necrópolis de Alfarrobeira (Gomes, 1994), Passadeiras (Gomes, 1994: 76) o en Tapada da Moita (Oliveira, 1986) y Corgas (Banha et al. 2010 ). El soporte como cuerpo de la representación es el mismo que transmiten los ortostatos megalíticos, sistemática interesante porque apunta un recurso anclado en la tradición. Como en los casos anteriores, algunos cementerios también presentan estelas del Bronce Final (Gomes y Monteiro, 1997: 309), confirmando el largo recorrido de algunas necrópolis y el valor de determinados territorios funerarios como áreas de agregación sepulcral. De las 25 piezas conocidas, 23 se localizan en el Bajo Alentejo y en el Algarve. Sólo una se ha documentado en el Alto Alentejo, la ya citada de Tapada de Moita y otra más, el fragmento del Torcal, en Córdoba, podría indicar una expansión hacia Andalucía, por el valle del Guadalquivir. Hay que sumar la estatua-menhir de Corgas (Banha et al. 2010), que más al Norte que la de Tapada da Moita apunta presencias hasta hora desconocidas. En lo que nos interesa destacar las piezas con el armamento concentrado en la zona delantera, las que Gomes (2006) denomina grupo C, tienen interesante trasunto en las estelas noroccidentales. Ya desarrollamos este argumento aplicándolo a la estela de Valdefuentes de Sangusín, en Salamanca (Bueno et al. 2005a). La estela de Ataúdes presenta también las armas suspendidas de una banda, la agrupación espada-alabarda y la técnica de bajorrelieve que caracteriza el conjunto algarvio. Las estelas de Alconétar y Cañamero, en el Tajo, insisten en la extensión de estos recursos gráficos para el diseño de imágenes armadas, pero añaden un dato de cronología del mayor interés, al justificar fechas más antiguas que las propuestas por Gomes. Además de asociarlas de modo inequívoco a estructuras funerarias de carácter megalítico. Las armas de Alconétar son muy semejantes a las de Longroiva, proponiendo fechas dentro del III milenio cal BC. para estas representaciones que serían, por tanto, anteriores a la serie alentejana, y un interesante nexo de unión entre las piezas megalíticas y las más recientes. La inmejorable posición de la cuenca interior del Tajo como acceso hacia el Suroeste por el corredor de zonas llanas que alcanza el Algarve, posee evidencias destacadas en el análisis del megalitismo regional. El caso de la decoración de los menhires del dolmen de Navalcán, en Toledo (Bueno et al. 2005a), se erige en buen ejemplo al disponer de referencias simbólicas de clara conexión suroccidental. Si en los dos primeros grupos señalábamos la relación con las placas decoradas, el grupo noroccidental y el de las estelas alentejanas reflejan contenidos propios de la estatuaria mediterránea confirmando el vigor de las vías interiores que, a través del Ebro, conectan con los pasos pirenaicos. De ahí el estilo y armas de la estela de Preixana (Bueno et al. 2005a: fig. 40). Geografías de los ancestros Los tipos que pueden diferenciarse en el marco interior de la cuenca del Tajo pro-
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ponen una variedad de fórmulas estatuarias asociadas a la muerte totalmente inéditas en el resto de la Península, indicando un conjunto de grupos humanos de gran riqueza simbólica y de continuado desarrollo a partir de las primeras referencias neolíticas (Bueno et al. 2005a) (Estampa 7). El nudo de comunicaciones que constituye el área definida entre el río Tajo y las sierras de la Beira por el Norte y S. Mamede por el Sur, se define como un polo en el que resolver algunas de las cuestiones más importantes de la Prehistoria reciente peninsular. Esta perspectiva se consolida con la documentación de evidencias identitarias de sólido recorrido entre el IV y el III milenio cal BC., claramente asociadas al desarrollo de un señalado megalitismo que se constituye en uno de los grupos más importantes de la Península Ibérica. Su sustento económico en las expectativas extractivas y en el asentamiento de modos de vida agropecuarios dispone de datos cada vez más abundantes (Bueno et al. 2008a), que alejan las hipótesis de marginalidad tradicionalmente aplicadas al sector. La facilidad de comunicaciones que esta zona propone debió constituirse en otro de los elementos del despegue social que la estatuaria que analizamos materializa. El establecimiento de probables identidades asociadas a estas diferencias es una versión muy sugerente que encaja con hipótesis del mismo estilo aplicadas a piezas más antiguas. Ya en el conjunto de las placas decoradas es posible documentar decoraciones geométricas afincadas en territorios específicos, así como placas escultóricas que tienen en el Alto Alentejo y la Beira Baja su núcleo mejor definido. Hemos argumentado la presencia de talleres y de una distribución que permitiría que estas piezas muebles alcanzasen el Norte y el Sureste de la Península Ibérica, además del interior y el Sur (Bueno, 1992 y e.p.). Si estos objetos muebles definieron grupos humanos que se sentían identificados por ellos (Bueno, 1992; Hurtado, 2008), las estelas y estatuas posteriores que se agrupan sin dificultad en tipos precisos, se desarrollaron en esa misma línea de expresión de identidades. Explicar la diferencia entre el grupo del Norte de las estelas tipo Peña Tú y el grupo centro-occidental como la materialización de versiones estatuarias de placas decoradas geométricas, el primero y de placas escultóricas, el segundo, nos resulta muy sugerente. Las placas geométricas son las más extendidas de este tipo de piezas (Bueno, 1992) y se identifican tanto en pintura, como en grabado al aire libre, además de en soportes megalíticos de la Península Ibérica y de fuera de ella. Sería, por tanto, un conjunto de más amplio conocimiento y la posición de las piezas peninsulares aboga por integrarlas en recorridos por vías de paso tradicionales, que además de ganado, propiciaron movimientos y circulación de materiales e ideas. Los metales que se les asocian concretan el apogeo de estas versiones en la mitad del III milenio cal B.C (Bueno et al. 2005a, 2010a). Los detalles de brazos y manos, cinturones y algunos recursos gráficos específicos, sitúan a las placas escultóricas como el mejor de los antecedentes para las estelas centro-occidentales. Ello coincide con la posición de este grupo al Norte del Alentejo y al sur de la Beira. Una de las placas con manos del dolmen de Trincones es buen ejemplo de los lazos gráficos que pretendemos valorar. Su cronología de mitad del III milenio cal B.C. (Bueno
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et al. 2007b), insiste en la contemporaneidad con otras versiones que hemos venido argumentando (Bueno et al. 2005a). Las extensiones del grupo centro-occidental hacia Andalucía y su probable conocimiento en Cataluña, se superponen al territorio definido por las placas decoradas. Las estelas alentejanas serían otra versión de piezas planas, prácticamente ortostatos con armas que, como hemos visto en el epígrafe anterior, gozan de más representación de lo que se admite al Norte del Tajo. Desde nuestras primeras propuestas (Bueno, 1987, 1992, 1995), hasta la actualidad (Bueno et al. 2005a), los datos han ido confirmando la presencia de conjuntos con entidad morfológica, técnica y temática, que coinciden con territorios de intereses económicos muy marcados. Los núcleos de mayor potencia de emisión: Sierras del Norte de Cáceres, plataforma del Duero y Algarve, tienen altas potencialidades metalúrgicas, que no se circunscriben exclusivamente al cobre o al estaño, sino al oro (Bueno et al. 2004a; Barroso et al. 2003). Un oro obtenido de placeres aluviales que debió constituir una de las bases del despliegue económico que indica el rico calcolítico de la raya entre España y Portugal (Bueno et al. 2008a y 2008b). Es particularmente llamativo que al interior de la cuenca sólo se localicen piezas más recientes, aunque algunas de ellas se realizaron sobre menhires más antiguos, caso de Las Herencias (Fernández Miranda, 1986). Quizá la singular representación de Castillo de Bayuela se corresponda con la serie antigua, por su alargamiento que concuerda con el del conjunto noroccidental, y con el de algunas piezas alentejanas, pero lo cierto es que la figura humana representada es francamente parca en detalles y no ostenta ningún tipo de armamento. Lo incipiente de la investigación de esta zona del Tajo, permite esperar nuevas localizaciones. Sólo un alto nivel de organización social explica el uso de las imágenes antropomorfas como referencias identitarias. No está de más recordar que los conjuntos de estelas y estatuas europeos se concentran en lugares de alto potencial minero o de explotaciones como sal o silex. La exhibición de armas, su tipología y su cronología insiste en el interés de esta zona interior para analizar cuestiones como la metalurgia más antigua de la región, que tiene en las piezas con contexto arqueológico sólido refrendo para proponer situaciones más complejas que las tradicionalmente admitidas (Barroso et al. 2003). El metal forma parte de los restos materiales de un gran número de asentamientos del Tajo interior que además se ubican en tierras de buenos recursos agropecuarios y registran secuencias de ocupación amplias del Neolítico al Bronce. Piezas como las alabardas de los recientes hallazgos de Cañamero y Alconétar sumadas a la que porta la estela de Hernán Pérez ya aludida, configuran un interesante conjunto de armamento simbólico que unido a los hallazgos materiales del Tajo superior y los de la zona de Lisboa consolidan una uniforme distribución por todo el río. El carácter singular y distintivo dado a estas armas (Delibes et al. 1999: 42) coincide con el papel de las estelas, en las que aparecen en su versión latente, y las sociedades bien organizadas en
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las que insertan. Del mismo modo la asociación de alabardas a armas igual de significativas como los puñales, presentes en hallazgos como el de Pantoja (Toledo), desde nuestro punto de vista un contexto funerario (Bueno et al. 2008a), se repiten en las piezas pétreas, tal el caso de la estela de Alconétar. La misma asociación reiterada en piezas del Duero como Longroiva o Sangusín, o las losas alentejanas vendría a incidir en el papel destacado de sus portadores (Estampa 8). De ahí que nos parezca interesante rescatar la variedad, cronología y asociación sepulcral de las estelas y estatuas calcolíticas del Tajo interior como sistema de reivindicar una Prehistoria Reciente de enorme implementación simbólica que explica los datos del Bronce Final y del Hierro, como la evidente consecuencia de un largo decurso que no por menos conocido, resulta más real. Las estelas del Suroeste La relación de las estelas calcolíticas con las más recientes tiene en algunas necrópolis evidencias de proximidad. Ya hemos citado la concurrencia de piezas antiguas y del Bronce Final en Valencia de Alcántara, las Hurdes o la necrópolis de Santa Vitoria, insistiendo en el valor de agrupaciones funerarias de largo recorrido, como las mejor documentadas del Norte de la PI.(Bueno et al. 2010a). El cambio más notable es la aparición de la figura humana que en figuras francamente esquemáticas se acompaña de armamento más sofisticado que el incluido en las panoplias alentejanas. Pero la base del sistema es la misma: monumentos sepulcrales que destacan unas tumbas sobre otras, insistiendo en el papel dominante de algunos individuos, tal cual manifiestan las estelas de la serie calcolítica. El cómputo total es mayor que el de cada uno de los conjuntos que hemos descrito, pero el territorio que ocupan las estelas del Bronce Final es sensiblemente más amplio. Pese a su variedad, que también existe (Celestino, 2000; Harrison, 2004), lo cierto es que muestran mayor estandarización que los grupos calcolíticos antes definidos, recogiendo características propias a cada uno de ellos y sincretizándolas con la inclusión de objetos englobados en el mundo colonial. En cualquier caso es ese concepto de estandarización como contrapartida de la fragmentación identitaria que expresan las estelas calcolíticas de la región, el que nos parece interesante señalar como trasunto de una organización social con mayor control político que el que expresa la variedad anterior. Las estelas del Suroeste ocupan los territorios alentejanos, llegando por el interior del Tajo hasta Toledo y Ciudad Real. Alcanzan las Beiras, habiéndose documentado recientemente un ejemplar en el Norte de Salamanca (Martin, 2009). Por el Guadiana, se expanden hacia el Sur y por el interior, en una ruta de documentada antigüedad (Bueno et al. 2009), traspasan los Pirineos. Y, en todos los casos, con una notable correspondencia temática y técnica que refleja sistemáticas ampliamente conocidas y exhibidas en los territorios en los que con anterioridad tipos más variados constituían la representación hegemónica (Estampa 9).
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No tenemos datos para fijar las cronologías finales de las estelas calcolíticas del Tajo, pues si bien podemos cifrar sus raíces en el Neolítico Final, y su apogeo en el III milenio, el final de su representación pudo alargarse en zonas donde tuvieran especial representatividad. Su relación con linajes de mineros o de ganaderos parece comparable con las asociaciones de los enterramientos de personajes con propiedades de tierras y ganado, o con emprendedores metalúrgicos del Bronce Final. El uso de algunas figuras humanas francamente relacionadas con las estelas centro-occidentales en las estelas del Bronce Final, liga de modo indefectible ambos conjuntos, insistiendo en el valor de las referencias al pasado que forman parte de las exhibiciones armamentísticas de las piezas recientes. Las estelas diademadas no serían representaciones femeninas, sino el trasunto de las antiguas figuras de las estelas calcolíticas, cuyas características gráficas reiteran, incluida la famosa diadema. El solapamiento de los mapas de distribución de placas decoradas, estelas centro-occidentales y estelas del Suroeste, confirma las referencias ideológicas que defendemos en este texto, y argumenta una secuencia de figuraciones antropomorfas en la cuenca del Tajo que tiene sus más antiguas evidencias en los enterramientos colectivos del neolítico. Imágenes de guerrero y ancestros Es lugar común que las imágenes que nos ocupan representan personajes de cariz guerrero, pero hay algunos elementos para la reflexión en la propia raíz de las grafías de referencia. La relación entre cadáveres y ajuares líticos de útiles punzantes, esencialmente microlitos y puntas de flecha, plantea una cuestión no resuelta entre los investigadores del megalitismo europeo. Una valoración global tiende a reflejar una amplia mayoría de estas asociaciones, sean hombres, mujeres o niños los enterrados. Así el mundo de la caza y de la guerra sería la referencia constante de unos ajuares cuya cronología asegura una economía productora. De ahí que hayamos propuesto interpretar estos depósitos (Bueno, 2000: 62) como elementos muy ideologizados que materializan la imagen del mundo de la muerte que hace guerreros o cazadores a todos los fallecidos incluidos en el sepulcro de los ancestros. Ese tipo de asociaciones entre fallecidos y útiles punzantes se interpretan como ajuares de arqueros o de guerreros en el mundo campaniforme (Fitzpatrick, 2003), pero lo cierto es que son idénticas a las reflejadas en los viejos monumentos. La comparecencia en estos enterramientos campaniformes de metal, dibuja a los enterrados como jóvenes guerreros, cuya imagen en piedra estaría representada por las versiones estatuarias del III milenio cal BC. a las que nos hemos referido. Recogen la asociación básica del cuerpo humano y las armas, ahora metálicas, para expresar la idealización de la muerte que convierte a los personajes más destacados por situaciones económicas concretas, la minería o la ganadería, en guerreros o cazadores como los ancestros que se enterraban en las sepulturas megalíticas, muchas de ellas en funcionamiento o, incluso en construcción (Bueno et al. 2004a, 2008b).
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Las estelas y estatuas armadas “sacan” al fallecido de su contenedor funerario para exhibir su imagen en el territorio de sus congéneres, expresando el valor social de algunos individuos, de la misma manera que sucede en las estelas del Bronce Final. Imágenes coercitivas que evolucionan desde las hachas y báculos de los menhires a las espadas y alabardas del Bronce revelando la guerra y la caza como la materialización del culto a los ancestros de hondas raíces en el imaginario colectivo desde los primeros productores. La evolución ideológica de este decurso gráfico insiste en la exhibición de la tradición, del pasado y de los ancestros como uno de los recursos para el establecimiento de la desigualdad social que muestran las imágenes de guerrero del Bronce Final (Bueno et al. 2005a). El continuum que podemos argumentar es la mejor confirmación del destacado papel simbólico del Suroeste en la ideología del megalitismo peninsular, afianzado perspectivas de protagonismo marcado, si las sumamos a las comprobadas interacciones con la vía interior que conduce al Ebro y, por tanto, al Pirineo, con la vía norteña que permite acceder por la Real leonesa a la zona Norte con datos como las estelas tipo Peña Tú auténticas placas decoradas armadas, o con Andalucía. La fuerza de las imágenes vestidas con ropas “de aparato” definidas con dibujos geométricos y, en los casos en que se conserva el color, en rojo, negro y blanco, es notable en toda Europa. Pero la fijación, desarrollo y evolución de estas versiones estatuarias en la Península Ibérica, y de modo muy destacado en el área occidental del Tajo, aboga por situar la zona de estudio como uno de los principales núcleos económicos y sociales del calcolítico europeo. El solapamiento geográfico de las piezas descritas, sitúa un foco potente en las tierras interiores de las plataformas del Tajo y el Duero, que desde el megalitismo protagoniza una dinámica simbólica de notable pujanza. El proceso de conceptualización/minimización de arquitecturas e imágenes antropomorfas (Bueno et al. 2005a), que se percibe a partir de la segunda mitad del III milenio cal BC., conduce a la reducción de los espacios dedicados a la deposición del cadáver y a la exhibición de estelas cada vez más destacadas señalando el lugar de su último descanso. La documentación de gestos explícitos de cierre de monumentos realizados mediante estelas, en algunos casos armadas (Bueno et al. e.p.), argumenta el protagonismo de estas referencias visibles como señalizadoras de lugares funerarios. Su inserción en necrópolis con sepulcros de diferente entidad, volumetría y ajuares, enmarca estos procesos en los que definen la desigualdad en los registros de la prehistoria del Sur de Europa. Del mismo modo que los antecedentes de arquitecturas e imágenes en el megalitismo más antiguo, justifica valorar las hondas raíces de estos discursos funerarios en la ideología de los más antiguos productores (Bueno et al. 2005a, 2007c). Un territorio desconocido por la falta de recursos suficientes para su investigación, está proporcionando uno de los panoramas más destacados para argumentar el peso de las implementaciones simbólicas en las organizaciones sociales de la metalurgia ibérica. Son esas bases sociales e ideológicas las que mejor explican el auge y la intensificación económica de la protohistoria regional en la que las sistemáticas de exhibición de imágenes antropomorfas asociadas a la idealización de la muerte alcanzan su más notable desarrollo.
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Estampa 1 - Cuenta interior del Tajo señalada en el conjunto de la Península Ibérica.
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Estampa 2 - Estelas-placas en la Península Ibérica, destacando las piezas extremeñas. El mapa indica su ubicación.
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Estampa 3 - Estelas centro-occidentales con su ubicación. Con cuadrados se señalan las necrópolis que presentan además estelas del Bronce Final.
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Estampa 4 - Estelas noroccidentales con su ubicación.
Estampa 5 - Estelas de Alconétar y Cañamero sobre los túmulos donde se localizaron. Fotos R. de Balbín. Calcos de las piezas, según Bueno et al. e.p.
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Estampa 6 - Estelas alentajanas, según Gomes, 2006 y su distribución actual, según Banha et al. 2010.
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Estampa 7 - Distribución de las estelas noroccidentales, centro-occidentales y alentajanas en la Península Ibérica. Obsérvese la concentración en el área del Tajo y su relación con la concentración en la Beira Baja.
Estampa 8 - Armas y posición de las mismas en las piezas de Valdefuentes de Sangusin, Longroiva, Tabuyo y Alconétar.
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Estampa 9 - Estelas del Bronce final en la cuenca del Tajo.
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Iconografía, lugares y relaciones sociales: Reflexiones en torno a las estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce en la Península Ibérica1 Marta Díaz-Guardamino2
Resumen Las estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce reproducen iconos y formatos iconográficos que en ocasiones muestran una amplia distribución geográfica. En este trabajo reflexiono sobre los mecanismos sociales que pueden haber intervenido en la configuración de este panorama. Para ello se revisan propuestas anteriores y se tienen en cuenta dos aspectos complementarios que pueden contribuir a esta temática. Por un lado, considero la distribución geográfica genéricamente complementaria de referentes metálicos (especialmente armas y torques/collares) y sus representaciones en las estelas y estatuas-menhir. Por otro, examino algunos de los lugares en los que se documentan las estelas y estatuas-menhir, su contexto envolvente. Basándome en la consideración conjunta de estos datos, se propone que las estelas y estatuas-menhir fueron mecanismos a través de los que se reprodujeron o reforzaron vínculos sociales a diferentes escalas espacio-temporales y que, a una escala local, tuvieron un papel relevante como medios de reproducción social. Palabras clave: vínculos sociales, reproducción social, estelas y estatuas-menhir, Edad del Bronce, Península Ibérica. Abstract Iberian Bronze Age stelae and statue-menhirs reproduce icons and iconographical formats that sometimes display wide geographical distributions. In this paper I reflect on the social mechanisms that might have played a role in the configuration of this situation. To that end I revise previous interpretations and analyze two complementary aspects that might contribute to the interpretation of this question. On the one hand, I consider the, generally, complementary geographical distribution of metallic referents (specially weapons and necklaces/torcs) and their representations in stelae and statue-menhirs. On the other hand, I examine some of 1 Quiero agradecer a la Dra. Raquel Vilaça que me ofreciera la oportunidad de participar en este coloquio. Este trabajo incluye aspectos y reflexiones que trato en mi tesis doctoral, que he podido realizar gracias a becas predoctorales concedidas por la Fundación Caja Madrid, el Servicio Alemán de Intercambio Académico (DAAD), la Universidad de California y Universidad Complutense de Madrid. Quiero agradecer también la amabilidad de l@s divers@s investigador@s que me han proporcionado información sobre varias estelas y estatuas-menhir descubiertas en años recientes cuando aún estaban inéditas. 2 Departamento de Prehistoria, Universidad Complutense de Madrid, [emailprotected].
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história the places in which stelae and statue-menhirs were documented, their surrounding context. Brought together, these data lead me to suggest that stelae and statue-menhir were mechanisms through which social ties were reproduced or reinforced at varied temporal and spatial scales, and that they played a relevant role as mechanisms of social reproduction at a local scale. Keywords: social ties, social reproduction, stelae and statue-menhirs, Bronze Age, Iberian Peninsula.
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Estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce: aspectos generales La atribución cronológica de las piezas que consideramos en este trabajo es un tema complejo de abordar y debatido que ha sido recientemente revisado en otros trabajos (Díaz-Guardamino, 2010, e.p. 2010), por lo que no vamos a profundizar en él aquí. Únicamente cabe decir que los casos documentados en contextos convencionales (estratigráficos) son contados y que, en ocasiones, la cronología que cabe atribuir a la formación del depósito en el que se encuentra la pieza puede no corresponder a su elaboración y/o uso primario como estela o estatua-menhir. También hay que tener en cuenta las diferentes fases de ejecución que pueden estar implicadas en la configuración actual de algunas de estas piezas, así como su proximidad a otros restos, que pueden ser anteriores, contemporáneos o posteriores a la elaboración de la pieza y/o a su implantación en el lugar. A pesar de las limitaciones y problemas que puede acarrear la forma de datación “tradicional”, basada en la búsqueda de analogías formales entre motivos grabados y referentes materiales, pensamos que sigue siendo un método válido para proponer referencias cronológicas post quem con las que poder trabajar, siempre que se sea consciente de su provisionalidad (Díaz-Guardamino, 2010: 52-53). Teniendo en cuenta estas premisas, la elaboración de muchas de las estelas y estatuas-menhir incluidas en este trabajo puede ser atribuida con bastante seguridad a la Edad del Bronce (ca. 2200-850/825 AC), algunas a los inicios de la Edad del Hierro (ca. 850/825-700 AC), como han propuesto varios autores con anterioridad. Incluyen iconos que disponen de referentes en la Península Ibérica, especialmente armas metálicas, como puñales, alabardas y espadas, o fuera de ella, como escudos de cuero. Hay, sin embargo, un nutrido grupo de piezas que no incluyen armas en su iconografía. Parte de éstas incluyen otros iconos presentes en piezas con armas, como, por ejemplo, los emblemas sub-rectangulares o estolas, por lo que es posible proponer para su elaboración una franja cronológica similar. Entre estos últimos ejemplares hay algunos que presentan collares de varios semicírculos, por lo que se pueden considerar cronologías similares para los ejemplares que incluyen el grabado de este tipo de adornos que, como hipótesis de trabajo, relacionamos con adornos realizados en oro, como las gargantillas de tiras o los torques. La mayoría de las estelas que incorporan tocado incluyen collares, por lo que también es posible atribuirles una cronología genérica de la Edad del Bronce (Barceló, 1989; Sevillano, 1991; Almagro-Gorbea, 1994; Díaz-Guardamino, 2010: 257261), aunque algunos autores se inclinan por situar estas imágenes con tocado a partir de una fase un poco más avanzada del Bronce (Celestino, 2001: 254-260; Santos, 2009). Muchas de estas piezas sin armas han sido atribuidas al Calcolítico, lo que se ha basado esencialmente en la ausencia de representaciones de armas, en su posible carácter femenino, en el concepto de que lo femenino remite al mundo megalítico, en su ocasional proximidad a túmulos o estructuras atribuidas a esta época e, incluso, en paralelos formales con estelas o estatuas-menhir de otras zonas del Mediterráneo Occidental (Jorge, 1986; Bueno, 1990; Bueno y González, 1995; Jorge, 1999b; Bueno et al., 2005). Pero aún
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no se ha documentado ninguna de estas piezas en contextos estratigráficos que aporten referencias cronológicas, por lo que su cronología está abierta al debate, a no ser que se consideren como válidas las reflexiones anteriores, que apuntarían, en todo caso, a una cronología genérica de la Edad del Bronce. En función de lo anterior, disponemos para la Edad del Bronce e inicios de la Edad del Hierro de un amplio y variado panorama iconográfico materializado en estelas y estatuas-menhir3 distribuidas por diversas regiones de la Península Ibérica. Los casos conocidos en la actualidad describen una amplia franja que discurre diagonalmente desde el centro de Galicia hasta el valle del Guadalquivir, aunque también hay concentraciones en el Sur de Portugal y Cantábrico central, y se conocen ejemplares en el Alto Duero (Soria), estribaciones occidentales de los Pirineos y en la cuenca del Ebro. Se encuentran en paisajes muy diversos, pero muchas de estas regiones tienen la particularidad de haber jugado un papel relevante como zonas “bisagra” y de contacto entre regiones diversas en diferentes momentos de la Prehistoria reciente (Martín y Galán, 1998; Vilaça, 1998; Díaz-Guardamino, 2010: 63-64, 72) y/o destacan por la riqueza en recursos minerales diversos, en algunos casos fáciles de explotar por su carácter secundario (Díaz-Guardamino, 2010: 64-66, figs. 19 y 20). A diferencia de las estelas y estatuas-menhir asociadas a la construcción y/o primeros usos de sepulcros del Megalitismo “clásico” (Bueno et al., 2007; Díaz-Guardamino, 2010: 79-116), los ejemplares aquí tratados reproducen un lenguaje gráfico marcadamente icónico, incorporando signos que guardan una estrecha relación formal con sus referentes. Son ejemplares que aluden a personajes a través de diversos elementos emblemáticos y/o de prestigio, como elementos de vestido/protección (cascos, corazas/mantos, “emblemas”, fíbulas, cinturones), adorno (tocados de cabello, collares, pendientes), armas (puñales, alabardas, espadas, escudos, lanzas), herramientas (cinceles, gubias, hachas), u otros elementos, como instrumentos musicales, perros, carros, etc. También puede haber aspectos corporales representados, incluso rasgos faciales, o puede haber una representación esquemática y completa del cuerpo. En estos casos, en ocasiones, son personajes principales que están acompañados de otras figuras secundarias, formando escenas, y hay algunos casos en los que aparecen dos personajes del mismo tamaño que comparten el protagonismo. Se ha señalado que la iconografía de las estelas y estatuas-menhir se va individualizando paulatinamente a partir del Neolítico (Bueno et al. 2005, 2008), aunque pensamos que esta afirmación se puede matizar. Frente a los ejemplares neolíticos, que, con algunas excepciones (Calado, 2004), incorporan una iconografía altamente individualizada, las estelas y estatuas-menhir del Bronce presentan una iconografía bastante normativizada a una escala macro-espacial, ya que hay estilos, formatos e iconos que se extienden por amplias áreas geográficas. Sin embargo, cuando apare3 También consideramos en este análisis algunas composiciones realizadas en soportes permanentes, ya que su iconografía esta estrechamente relacionada con la documentada en varias estelas.
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cen dos o más estelas en el mismo lugar, sus iconografías suelen presentar aspectos distintivos, lo que puede ser interpretado en términos sociales y cronológicos (Díaz-Guardamino, 2006, 2010). Por otro lado, consideramos que no hay datos sólidos que hablen en favor de un continuum entre las estelas y estatuas-menhir de contextos neolíticos y las que atribuimos a la Edad del Bronce a nivel peninsular, ni en términos iconográficos, ni contextuales, siendo el tema antropomorfo en formato más o menos monumental el único aspecto concomitante, de lo que, a nuestro parecer, no se desprende necesariamente la existencia de una misma referencia ideológica de base, como se ha propuesto (Bueno et al., 2005). Respecto a las estelas y estatuas-menhir de estos dos períodos los datos disponibles sugieren que, a nivel global, nos encontramos ante fenómenos análogos de desarrollo independiente, cuya eventual relación a nivel material debería ser abordada en términos de reinterpretación (Díaz-Guardamino, 2010: 10-116, 427-440). Otra característica de las piezas atribuidas a la Edad del Bronce es su “indefinición” contextual. Prácticamente no se conocen ejemplares documentados en contextos estratigráficos prehistóricos que se hayan documentado arqueológicamente. Hay excepciones interesantes, como, por ejemplo, las estelas 1 y 2 de Collado de Sejos (Cantabria) (Bueno et al., 1985; Teira y Ontañón, 2000), las estelas de Cabeço da Mina (Bragança) (Sousa, 1996; Jorge, 1999b), la estela de Alfarrobeira (Faro) (Gomes, 1994) o la de Haza de Trillo (Jaén) (Mergelina, 1943-1944). Otros contextos documentados arqueológicamente revelan usos secundarios de estelas, como el caso de Pocito Chico (Cádiz) (Ruiz y López, 2001: 153-154). A estos casos hay que añadir otros para los que disponemos de referencias orales que asocian su hallazgo a restos funerarios, incluso estructuras, algunas posibles cistas, que indican un posible uso primario de la estela, como en El Cerezal (Cáceres) (Sevillano, 1982) o Cortijo de la Reina (Córdoba) (Murillo et al., 2005: 25-32, fig. 4), o secundario, como ocurre con varias estelas alentejanas que estaban posiblemente reutilizadas como parte de la estructura de varias cistas (Vasconcelos, 1906). Pero los contextos convencionales no agotan las posibilidades de información contextual de las piezas que aquí tratamos y cuya realización se puede atribuir a la Edad del Bronce. Los lugares en los que se encuentran las estelas son su contexto, en el sentido amplio del término (Galán, 1993). A una escala macro y meso-espacial están relacionadas con zonas de paso (Ruiz-Gálvez y Galán, 1991; Díaz-Guardamino, 2010). Además de estar en las cercanías de zonas de paso, están asociadas a recursos muy diversos, como recursos acuíferos, pastos, tierras aptas para el cultivo y/o recursos minerales, mientras muchos casos del Bronce Final e inicios del Hierro se encuentran en las proximidades de poblados (Enríquez, 2006; Díaz-Guardamino, 2010). Pero las estelas y estatuas-menhir fueron ante todo monumentos permanentes en el paisaje y en ocasiones se ha podido comprobar que se eligieron para su implantación lugares o zonas en los que había preexistencias pertenecientes a un pasado remoto o reciente (García Sanjuán et al., 2006; Díaz-Guardamino, 2008, 2010). Fueron imágenes hechas
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para perdurar, por lo que el estudio de estos lugares tiene el potencial de mostrar que las estelas y estatuas-menhir están asociadas a genealogías prolongadas en el tiempo de prácticas y significados muy diversos, situación que queda claramente plasmada en su propia reutilización (Díaz-Guardamino, 2006; García Sanjuán et al., 2007; González García, 2009). Relaciones iconográficas y distribución geográfica Uno de los rasgos más característicos de estas estelas y estatuas-menhir es la iconicidad de sus grabados. Esto es algo que comprobamos en el caso de armas, como los puñales, las alabardas y las espadas, con referentes conocidos en diversas zonas de la Península Ibérica, aunque, de momento, son escasos o desconocidos en las zonas en las que estas armas están representadas. La incorporación de este tipo de ítems en la iconografía de las estelas remite, en principio, a la participación de estas poblaciones en las mismas redes de interrelación. En las estelas y estatuas-menhir hay otros motivos, también de posible carácter emblemático, para los que, de momento, no se conocen referentes materiales. Son motivos de interpretación debatida, aunque su distribución geográfica a grandes rasgos excluyente/complementaria sugiere que nos encontramos ante elementos análogos (Estampa 1). La distribución geográfica de estos motivos define tres áreas que se solapan ligeramente y que cobran especial significado ya que en su seno se repiten algunas convenciones iconográficas. Me refiero, por un lado, a los mantos/escudos/ corazas que incluyen las estelas o estelifomes de morfología rectangular, de proporciones muy similares, que se sitúan en el Cantábrico Central y en el NW, como las estelas de Collado de Sejos 1 y 2 (Cantabria), Tabuyo del Monte (León) o el esteliforme recientemente documentado en Outeiro do Corno (A Coruña). Por otro lado, existen una serie de estelas que incorporan lo que se ha venido a denominar emblema ancoriforme, que se concentran principalmente en el Sur de Portugal, aunque también se conoce un ejemplar en el Alto Alentejo, uno en la Beira Interior (Banha et al., 2009) y otro en Córdoba (Gomes, 2006). Entre estas dos áreas definidas por la distribución de estos emblemas, hay una serie de estelas y estatuas-menhir de iconografía más heterogénea, pero interrelacionada, ya que comparten muchos iconos entre ellas y muchas de ellas incorporan un emblema sub-rectangular o estola. Este hecho adquiere especial relevancia cuando se considera que, en función de las armas que incluyen muchas de estas piezas, la elaboración de estas iconografías pudo haber sido contemporánea en gran parte de su desarrollo. Las estelas o esteliformes del Norte pueden situarse, en función de los puñales y alabardas representados, a partir de ca. 2200 AC, aunque no se pueden descartar cronologías ligeramente anteriores (Díaz-Guardamino, 2010: 172-180). La elaboración de las estelas del Sur de Portugal, en función de las representaciones de espadas y alabardas que incorporan, se puede situar a partir de ca. 2000/1900 AC (Díaz-Guardamino, 2010: 312-315). Finalmente, las armas representadas en algunas estelas y estatuas-menhir que incluyen el
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emblema sub-rectangular permiten proponer que su elaboración tuvo lugar a partir de ca. 2200/2000/1900 AC (Díaz-Guardamino, 2010: 172-180). En el seno de estas tres áreas geográficas definidas a partir de la distribución de estos emblemas se dan afinidades gráficas/estilísticas muy diversas. Otro de los elementos significativos son los collares de varios semicírculos (Estampa 2). Los collares pueden estar asociados al emblema sub-rectangular en piezas del Norte de Portugal, como Boulhosa (Viana do Castelo) o Nave 2 (Viseu) (Cruz y Santos, en este volumen). Los collares también pueden estar asociados a cinturones dobles o decorados, como ocurre en Nave 2 (Viseu) o en la estela 21 de Cabeço da Mina (Bragança), una asociación que remite a las estelas con tocado de estilo “naturalista” que se conocen desde la Beira Alta hasta la cuenca del Guadalquivir (Santos, 2009; Díaz-Guardamino, 2010: 225-291). Como ocurre en el caso de las piezas con armas, la iconografía de las estelas con collares y/o tocado pudo desarrollarse a partir de ca. 2200 AC (Díaz-Guardamino, 2010: 172-180, 257-261), pudiendo alcanzar, en el caso de los tocados, las postrimerías del Bronce Final, como sugiere la estela 2 de Almadén de la Plata (Sevilla) (García Sanjuán et al., 2006). Durante el Bronce Final e inicios del Hierro se desarrolla la paradigmática iconografía de las llamadas estelas “del Suroeste”, aunque hay ejemplares que en función de las armas que incorporan podrían ser atribuidos a finales del Bronce Medio/Bronce Tardío, a partir de ca. 1400 AC (Díaz-Guardamino, e.p. 2010). Las estelas del Suroeste reproducen dos modelos o formatos bastante convencionalizados, uno basado en la panoplia básica de escudo, espada y lanza (B) y que puede incluir otros elementos, algunos relacionados con la interacción precolonial (B+O), otro basado en la figura antropomorfa acompañada de éstos y otros elementos (A). La distribución geográfica de ambos modelos describe dos áreas diferenciadas (Estampa 3). En algunas zonas se solapan, zonas en las que hay estelas que en algún momento son transformadas formato B a formato A, como Torrejón Rubio 4 (Cáceres), o en las que hay estelas que incorporan un modelo “mixto”, como Solana de Cabañas (Cáceres), por lo que podrían se abordadas como zonas de contacto en un momento en el que convivieron ambos formatos. Pero su solapamiento en la zona del Zújar, como también indican los nuevos grabados sobre soportes permanentes documentados en Arroyo Tamujoso (Domínguez y Aldecoa, 2007), requiere introducir la variable temporal para abordar su desarrollo (Estampa 3). En función de los elementos que incluyen en su iconografía, los datos cronológicos disponibles sugieren que el formato básico (B/B+O) inicia su camino a partir de ca. 1400/1300 AC, antes que el formato antropomorfo (A), a partir de ca. 1200 AC, aunque ambos se pueden considerar contemporáneos en gran parte de su desarrollo, entre ca. 1200-950/930 AC, a lo largo de unos 300 años, mientras las estelas del formato A tuvieron continuidad, posiblemente, durante los inicios del Hierro, hasta ca. 800/750 AC (Harrison, 2004: tabla 2.1; Brandherm, 2007: 9-17 y fig. 4; Díaz-Guardamino, e.p. 2010).
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Relaciones iconográficas: propuestas previas y algunas cuestiones La distribución geográfica de ciertos iconos y convenciones iconográficas definen, por tanto, áreas complementarias, que se pueden solapar, y en cuyo seno, en ocasiones, encontramos aspectos estilísticos y/o técnicos comunes. Hay diversos trabajos dedicados al estudio por separado de algunas agrupaciones de estelas y/o estatuas-menhir que han abordado la distribución geográfica de su iconografía y han propuesto hipótesis de trabajo sobre su naturaleza y/o los mecanismos que han podido jugar un papel en su configuración. Destaca el estudio que realiza Barceló con la aplicación de métodos cuantitativos (Barceló, 1988, 1989). Este autor cree posible que los grupos de estelas más homogéneos (estelas con tocado y estelas rectangulares) estén asociados a “culturas particulares” porque, además de la homogeneidad de sus iconografías se encuentran en áreas geográficas definidas con personalidad propia. Respecto a los ejemplares que forman parte del heterogéneo grupo de estatuas-menhir, distribuido especialmente por el NW, sugiere que forman parte de fenómenos de jerarquización social convergentes que quedan plasmados localmente en las estatuas-menhir. En su detallado estudio, Gomes y Monteiro ofrecen una interpretación de la iconografía de las estelas alentejanas y estelas del Suroeste como reflejo de estructuras ideológicas de tipo normativo, no necesariamente relacionadas entre sí (Gomes y Monteiro, 1977). Las estelas del Suroeste son estudiadas con detalle por Celestino, quien las considera parte de un substrato cultural común. Interpreta los diferentes modelos iconográficos en términos cronológicos, como una evolución lineal, del modelo básico al que incluye la figura del guerrero, mientras ve su distribución geográfica como producto del movimiento de la gente relacionada con las estelas hacia el Sur, gentes que buscan nuevas zonas de explotación económica y que llegan al Guadalquivir (Celestino, 2001: 303320). A principios de los noventa Galán aplica el modelo peer polity interaction (Renfrew, 1986), para abordar los mecanismos que han podido intervenir en la variabilidad iconográfica de las estelas del Suroeste, que considera genéricamente contemporánea, y en su distribución geográfica, que interpreta en términos territoriales y políticos (Galán, 1993: 50-52). Aspectos como la interacción social, la emulación, la competitividad entre élites vecinas y las alianzas se convierten en la piedra angular de una hipótesis de trabajo que tiene en cuenta la agencia de las élites en una aproximación que aborda el fenómeno de las estelas desde un punto de vista dinámico e interno. El papel activo de las élites y su recurso a estelas o estatuas-menhir como medio para adquirir o consolidar poder son temas que han ido adquiriendo relevancia en la interpretación de este tipo de restos (Jorge, 1999a; Bueno et al., 2005; Gomes, 2006). En su reciente monografía, R. Harrison sugiere que las estelas del Suroeste son un medio a través del cual las élites locales buscan controlar, manipular y extender una ideología particular más allá del grupo, materializan una ideología instrumentalizada por las jefaturas como estrategia para retener poder. Las estelas materializarían una ideología “guerrera” basada en la masculinidad y en las cualidades guerreras como
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aspectos que confieren autoridad al jefe, que a través de las estelas busca extender su poder más allá de la familia o el clan (Harrison, 2004: 75). Este autor considera plausible la derivación de las estelas con figura humana de las de modelo básico, pero también contempla la pervivencia de este último, lo que resultaría en el desarrollo paralelo de ambos modelos durante un cierto tiempo (Harrison, 2004; Brandherm, 2007; Díaz-Guardamino, e.p. 2010). En una aproximación reciente, Bueno et al. (2005) consideran el papel de individuos que instrumentalizarían lo que denominan ideología “de la tradición” que consideran como la “referencia de base” del conjunto de las estelas y estatuas-menhir prehistóricas. Éstas constituirían un fenómeno de larga duración que parte del Neolítico, por lo que las diferentes versiones que aquí analizamos, que estos autores sitúan en algunos casos a partir de mediados del IV Milenio AC (Bueno et al. 2005: fig. 44), serían versiones regionales desarrolladas a partir de precedentes locales. No se detienen, sin embargo, en los mecanismos sociales en los que estarían implicados estos individuos, mecanismos que podrían dar cuenta del desarrollo espacio-temporal de las concomitancias formales que se detectan, especialmente si tenemos en cuenta que no existen precedentes iconográficos para estos aspectos en la mayoría de estas regiones. El papel de la ideología en la emergencia y/o consolidación de élites sociales es un tema al que se ha hecho referencia en múltiples ocasiones. Destacan dos modelos que conceden un papel relevante a la ideología como medio para obtener poder, aunque difieren entre sí en la importancia que le atribuyen. En el modelo de economía política que Earle aplica a las jefaturas, en las que la posición política y estatus social estarían dominados por las relaciones de parentesco, la principal fuente para la adquisición de poder político es el poder económico, que derivaría del control sobre la producción e intercambio de bienes subsistenciales (staple finance) y de riqueza (wealth finance) (Earle, 1997: 70-75); en el caso de la Edad del Bronce en diversas zonas de Europa, la emergencia de las élites derivaría del control de la producción especializada y la distribución de bienes de prestigio (Earle, 1997: 100-104). Earle considera la ideología como una fuente de poder secundario y, en esta esfera, actuaría la iconografía, como un medio simbólico a través del que las élites dirigentes materializan dicha ideología, haciéndola tangible, como parte de una experiencia común y, por lo tanto, facilitando su manipulación estratégica (Earle, 1990, 1997: 151-158). Otro modelo es el que han desarrollado M. Rowlands y K. Kristiansen en el marco del Marxismo estructural (Kristiansen y Rowlands, 1998), en el que la posición y estatus social están dominados por las relaciones de parentesco, mientras la adquisición e institucionalización de poder y la emergencia de élites residen precisamente en el control del sistema de parentesco a través de las relaciones sociales y la ideología. En este contexto el papel de los objetos de prestigio es fundamentalmente el que se deriva de su uso como regalos o dones a través de los que se articulan relaciones políticas, entre las que destacan las alianzas matrimoniales, e incluso genealógicas. Los dones o regalos están caracterizados por su inalienabilidad, es decir, por ser objetos que representan
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a personas o a partes de personas y que no se pueden desprender de esta vinculación y significado (Rowlands, 1998 [1987]: 229-234). La ideología y la interacción social parecen ser temas ineludibles a la hora de interpretar el papel, la naturaleza y extensión de la iconografía de las estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce, al igual que ocurre con la variada y rica metalurgia que encontramos en la Península Ibérica durante esta época. Es por esta razón, entre otras, por la que el recurso a este tipo de iconografía parece encontrar fácil acomodo en modelos como los anteriores. A una escala local las estelas y estatuas-menhir pueden ser interpretadas como medios a través de los que élites emergentes tratan de institucionalizar los vínculos sociales en los que se basa el poder adquirido a través de las relaciones políticas en las que participan, para así legitimar su posición social a una escala local. Ello explicaría que se hiciera tanto énfasis en elementos y convenciones iconográficos conocidos en amplias regiones en las que posiblemente se desarrollan las redes de interacción social en las que participan. No obstante, un análisis más detenido de la evidencia disponible obliga a matizar esta consideración o, al menos, a mirarla desde otras perspectiva. Cabría preguntarse, por ejemplo, por el papel de las comunidades en las que se recurre a estelas y estatuas-menhir, ya que, en su elaboración, interpretación, preservación, modificación y/o eventual destrucción hubo, necesariamente, otros agentes sociales implicados. El grado de control social, ideológico y/o económico que se atribuye a determinados “individuos” debería ser igualmente documentado en el registro material de otros ámbitos, como los poblados conocidos en las regiones en las que encontramos estelas y estatuas-menhir, ámbito en el que de facto se “producen” las relaciones sociales (Barrett, 1989). En las páginas que siguen analizamos dos aspectos que han sido poco explorados en la investigación, pero que ofrecen matices interesantes que pueden contribuir a esta temática, ya que remiten a la relevancia de los valores compartidos por la comunidad. En este sentido es valiosa la propuesta de Bueno et al. (2005, 2008) quienes relacionan las estelas y estatuas-menhir con una ideología de la tradición, aunque, en nuestra opinión, estas estelas y estatuas-menhir remiten a un sistema de valores relacionado con la importancia de determinados vínculos sociales, contexto en el que la tradición constituiría un recurso más. Iconos y referentes Como comentábamos al principio, uno de los aspectos que caracterizan a muchas de las estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce es que incorporan iconos que remiten a referentes metálicos documentados en diversas regiones de la Península Ibérica. Entre los casos más claros podemos destacar los puñales, las alabardas, las espadas y las fíbulas de codo tipo “Huelva”. Uno de los aspectos más llamativos es que las distribuciones geográficas de iconos y referentes suele ser, por norma, complementaria (p. e. Estampas 4 y 5; Díaz-Guardamino, 2010: figs. 101, 216, 224, 225). Una distribución similar es la que existe entre las representaciones de colla-
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res de varios semicírculos en las estelas y diversos adornos de cuello realizados en oro, como las gargantillas de tiras y los torques (Díaz-Guardamino, 2010: fig. 151). Aunque estos referentes están escasamente o nada representados en las zonas en las que se encuentran sus representaciones, se conocen en regiones vecinas, y hay detalles en los grabados de diversas armas que sugieren una inspiración directa, por lo que no se puede considerar que desconocieran directamente estos ítems, algo que, por el contrario, es posible pensar para los carros representados en las estelas “del Suroeste” (Galán, 1993: 52). La actual escasez o desconocimiento de los elementos metálicos representados en las estelas en las regiones en las que éstas se encuentran es una situación que podría ser interpretada como producto de la invisibilidad de los posibles contextos de amortización, aunque el hecho de que esta situación se repita en diversas regiones en relación con varios iconos y sus referentes requiere, desde mi punto de vista, una explicación alternativa. Esta situación no podría ser explicada como producto de la escasez minerales metálicos en estas regiones, ya que las estelas y estatuas-menhir atribuidas a la Edad del Bronce se sitúan frecuentemente en regiones en las que hay abundancia de recursos minerales accesibles (vide supra). El papel de estas regiones como productoras de excedentes de mineral queda sugerida por los resultados de los análisis de isótopos de plomo realizados recientemente sobre algunas piezas del depósito de Huelva, que indican que la procedencia de los minerales metálicos utilizados para su manufactura pudieron provenir de mineralizaciones de la zona geológica de Ossa Morena-Valle de Alcudia (Sierra Morena), en donde se conoce un grupo significativo de estelas del Suroeste (Montero et al., 2007). Otra hipótesis plausible es la capacidad limitada de los personajes a los que aluden las estelas y estatuas-menhir para monopolizar este tipo de ítems, para que fueran amortizados, por ejemplo, en sus tumbas (Barceló, 1989; García Sanjuán, 2006; Díaz-Guardamino, 2010). Esto incidiría en el carácter corporativo y valor relacional de los personajes/roles sociales a los que aluden las estelas, cuya identidad sería perfilada colectivamente, lo que contrastaría con la visión individualista que impregna la literatura dedicada a élites y líderes sociales, enfoque que ha sido revisado recientemente desde la antropología (Gillespie, 2001; Fowler, 2004: 11-22). Ítems como las armas estarían asociados a roles sociales concretos (Gomes y Monteiro, 1977; Barceló, 1989; Díaz-Guardamino, 2010), no necesariamente a los individuos que los encarnaron en vida. Los objetos serían inalienables por representar, no a individuos, sino a personajes sociales perfilados colectivamente por la comunidad. Es posible que estos objetos no fueran amortizados tras el deceso del individuo que los portó en vida y que tras su muerte se transmitieran a otros individuos que encarnaran este mismo rol social, jugando un papel relevante en la creación y re-creación de genealogías y vínculos sociales (Fowler, 2004: 53 y ss; Jones, 2007), como también debieron jugarlo las estelas y estatuas-menhir.
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Las armas y la orfebrería, remiten a relaciones extralocales pero fueron, como las estelas o estatuas-menhir, un medio permanente a través del cual también se materializaron vínculos sociales de carácter local. La incorporación de este tipo de iconos en las estelas y estatuas-menhir es una forma de institucionalizar su valor, materializando un marco ideológico local en el que se conjugan los vínculos sociales extra-locales y locales como valores fundamentales en la reproducción de las relaciones sociales. Si a la hora de interpretar los vínculos sociales de carácter extralocal podemos hablar de alianzas e intercambios que pudieron llegar a jugar un papel en la articulación de las relaciones de parentesco a través, por ejemplo, de pactos matrimoniales (Galán, 1993: 73-75; Ruiz-Gálvez, 1998: 35-43), ¿de qué tipo de vínculos sociales podemos hablar cuando nos ceñimos al ámbito local?. Estelas, estatuas-menhir y lugares Las estelas y su iconografía remiten a aspectos corporativos de la persona, por lo que podemos asumir la existencia de personajes sociales perfilados por los valores compartidos por la comunidad, valores en los que determinados vínculos sociales parecen ser recursos “capitales”. La ideología puede ser considerada como un conjunto de representaciones (discursos, imágenes, mitos, prácticas) relativas a las relaciones reales en las que vive la gente (Shanks y Tilley, 1987: 75-76). La ideología, como práctica material y forma de poder que es, está ligada a la reproducción social. Los valores, ideas, creencias compartidas, “ocurren” socialmente (Lull et al., 2006: 36), por lo que es preciso considerar el papel de los diversos agentes sociales en su reproducción/estructuración. Para el caso que estamos analizando, entre estos valores se puede situar el parentesco (kinship), como “ideología” en la que se concibe como algo natural el hecho de que las relaciones de parentesco y la genealogía dominen las diferencias de estatus social. De ello se derivaría el valor, conceptualizado como capital, atribuido a la proximidad a un ancestro común. Recientes trabajos y la revisión de casos ya conocidos están dejando ver la riqueza de los lugares en los que se encuentran las estelas y estatuas-menhir. Su entorno es su contexto, en el sentido amplio del término, y su estudio detallado está revelando que las estelas y estatuas-menhir estuvieron relacionadas con prácticas de conmemoración (Díaz-Guardamino, 2006; García Sanjuán et al., 2006; Díaz-Guardamino, 2008; Bueno et al., 2008; García Sanjuán, 2010). La consideración de las estelas y estatuas-menhir como ancestros (Keates, 2000; Bueno et al., 2008; Díaz-Guardamino, 2010: 440-448) abre una nueva vía de interpretación para abordar su papel como medios de reproducción social, ya que son medios que permiten representar visualmente y de forma permanente los vínculos que son considerados necesarios para dar continuidad y estabilidad a las relaciones sociales de una comunidad. Entre los lugares conocidos, algunos destacan por su persistencia en el paisaje. Un hecho relativamente frecuente es que las estelas o estatuas-menhir se encuentren en lugares en los que hay restos pertenecientes a un pasado remoto o reciente. La im-
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plantación de una estela o estatua-menhir en estos lugares es como un eslabón más de una cadena de prácticas que se suceden en el tiempo y que se entrelazan elaborando un Pasado que está en constante reformulación. El hecho de que estos lugares tengan, en ocasiones, un manifiesto carácter ancestral y/o colectivo, obliga, desde nuestro punto de vista, a considerar el papel de las estelas y estatuas-menhir como referentes de carácter colectivo. Hay diversos casos que podrían ilustrar bien este punto y no podemos detenernos aquí en cada uno de ellos, pero mencionamos brevemente cuatro lugares que han sido investigados con más detalle y que ejemplifican algunas de las situaciones que se pueden documentar. Uno de ellos es la Sierra Plana de la Borbolla (Asturias), situada junto a la franja litoral. En su extremo occidental se sitúa una gran peña (Peña Tú) que presenta una concavidad orientada hacia el SE en la que se han documentado varios motivos grabados y pintados (Estampa 6). Entre ellos destaca un “esteliforme” acompañado de un arma, que reproduce una iconografía análoga a la documentada, entre otras, en la estela 2 de Collado de Sejos (Cantabria). En la Sierra Plana se han documentado más de 50 túmulos, distribuidos en grupos de 5 o 6, a lo largo de más de 8 Km. (Pérez y Arias, 1979; Arias y Pérez, 1990; Arias et al., 1999). También se localizaron materiales en superficie en zonas de la sierra yuxtapuestas a los túmulos exponentes de actividades muy variadas. El material documentado sugiere una cronología de finales del Neolítico/Calcolítico Inicial para el uso doméstico y funerario de la Sierra. En este momento se puede situar la estela antropomorfa de Capilluca, procedente del túmulo 17 del Llano de las Campinillas Norte, uno de los más monumentales de su agrupación (Fernández, 1931: 171, fig. 7), así como la elaboración de las pinturas esquemáticas situadas en el panel rematado por el esteliforme de Peña Tú. Durante el Bronce Inicial, posiblemente como fruto de más de una intervención, se realizan el esteliforme de Peña Tú y su arma (Blas, 2003). En la Sierra Plana no se han documentado materiales que puedan ser claramente datados en el Calcolítico Final/Bronce Inicial. Este tipo de materiales sí han sido documentados en contextos funerarios de las cuevas próximas de El Bufón y La Llana (Blas, 1983: 104-107; Ontañón, 2003: 160-161). Por otro lado, en el túmulo 24 de la sierra, cuyo uso inicial ha sido situado por C14 a finales del V Milenio AC, se ha registrado un dispositivo de delimitación en el Sur del túmulo, interpretado como una reforma parcial del monumento, que ha sido datada entre finales del III Milenio e inicios del II AC (Quadro Nº 1). Las excavaciones realizadas en la Sierra a principios del siglo XX no se realizaron con suficiente detalle como para detectar reutilizaciones y hay todavía muchos túmulos que no han sido excavados y que podrían revelar reutilizaciones tardías o incorporar construcciones de nueva planta de cronologías tardías, como podría ser la cámara cistoide del túmulo 6 del Llano de Vidiago (Pérez y Arias, 1979: 699), el más próximo al Peña Tú. En la dehesa boyal de Hernán Pérez (Cáceres) se tiene conocimiento de ocho estelas y seis sepulcros megalíticos (Almagro Basch, 1972; Almagro Gorbea y Hernández, 1979) (Estampa 7). Referencias orales indican que cuatro de las estelas con toca-
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Quadro I - Dataciones de radiocarbono mencionadas en el texto. Calibración realizada con OxCal 4.1 (Bronk, 2009), utilizando la curva de calibración IntCal09 (Reimer et al., 2009).
do aparecieron agrupadas (Hernán Pérez 3-6) con una estela del Suroeste de estilo Básico. Según estas referencias, estaban enhiestas y asociadas unas sepulturas de forma paralelográmica hechas con lajas de esquisto bastante grandes (Almagro Basch, 1972: 91). Aunque esta zona quedó afectada en los años 1970’s por la repoblación de pinos (Almagro Basch, 1972: 93), un incendio que arrasó el sitio durante los años 1980’s permitió la observación de una estructura de forma indeterminada en el lugar (Carta Arqueológica). En el entorno de Hernán Pérez también se han documentado restos de dos poblados calcolíticos con posible continuidad en la Edad del Bronce (González, 1993; Bueno et al., 2004; Carta-Arqueológica, s.f.). Otras tres estelas con tocado más se hallaron dispersas en una área muy amplia en la que se conocen al menos seis dólmenes de tamaño y morfología variada. Dos de estos sepulcros se excavaron en los años 1970’s. Estaban en muy mal estado pero permitieron verificar que al menos uno de ellos (El Matón) era un sepulcro de corredor con posible falsa cúpula, nicho frontal y materiales Calcolíticos (Almagro Gorbea y Hernández, 1979: 57-62). El sector de la dehesa en que se encuentran estelas y sepulcros es muy extensa y la distancia más corta entre ellos se registra entre la estela 1 y el pequeño dolmen de El Chanquero, entre los que hay casi 200 m. Sin embargo, la zona con hallazgos presenta cierta entidad geográfica, el terreno está suavemente ondulado y por él discurren una serie de arroyos en dirección NW-SE, al NE está delimitado por la Sierra del Moro y al SW por el río Arrago, marcando una trayectoria NW-SE por la que se enlaza con una importante vía natural que atraviesa la Sierra de Gata comunicando las cuencas del Alagón, tributario del Tajo, y del Águeda, tributario del Duero. En el “Sitio da Fonte”, en el que se sitúan las cistas 1 y 2 de Herdade do Pomar (Beja), se registra una interesante diacronía (Gomes y Monteiro, 1977). Una de las cistas estaba violada, pero la otra contenía los restos de una mujer (≤ 20 años) acompañada de dos vasos cerámicos, uno de ellos de tipo Odivelas (Gomes y Monteiro, 1977: 168-169). La datación por C14 de estos restos óseos, sin embargo, proporcionó una fecha fiable (Quadro I: ICEN-87) mucho más antigua que la que cabría esperar, ya que nos sitúa, en fechas calibradas, en el primer cuarto del II Milenio AC (Barceló, 1991). Las cistas estaban cubiertas por lajas sin decorar. La estela fragmentada de Ervidel I, de tipo alen-
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tejano, se halló posiblemente, según indican referencias orales, en la necrópolis o en sus cercanías (Estampa 8). Una segunda estela, ésta del “Suroeste”, cuya elaboración cabe situar en el Bronce Final, se halló en superficie junto a la necrópolis. Otro caso de gran interés es la estela de Alfarrobeira, un posible menhir reutilizado, que incorpora un emblema ancoriforme en bajorrelieve con correas incisas. En los años noventa se excavó integralmente y de forma sistemática la necrópolis I de Alfarrobeira, situada en las proximidades de Silves (Algarve) (Beirão, 1973; Gomes, 1994). Las referencias iniciales situaban a la estela tumbada junto a una cista que, tras la excavación, ha sido atribuida a la fase más tardía de dicho núcleo. La excavación reveló la existencia de una fosa junto a esta cista que ha sido interpretada como la fosa de fundación del soporte, que estuvo hincado verticalmente, por lo que se llega a la conclusión de que esta pieza fue una verdadera estela. El desarrollo de este núcleo discurriría durante el Bronce del Suroeste I e inicios del II, según su excavador (Gomes, 1994). Iconografía, lugares y relaciones sociales: una hipótesis de trabajo En este trabajo hemos tratado de abordar las estelas y estatuas-menhir como elementos que institucionalizan vínculos sociales. La relevancia de determinados vínculos sociales como recursos “capitales” en la reproducción social de las comunidades que las produjeron es sugerida por las relaciones materializadas en las estelas, estatuas-menhir, iconografía y lugares de implantación. Su carácter icónico, público y permanente, casi siempre monumental, remiten a una serie de valores que son explícitamente naturalizados y respetados en la mayoría de las ocasiones, aunque están sujetos al desacuerdo, como revelan algunos casos que sí son modificados o destruidos intencionalmente. A nivel local las estelas y estatuas-menhir aluden a la existencia de personajes sociales que son perfilados colectivamente. Se insiste en aspectos corporativos de la persona que son definidos a través de vínculos/relaciones sociales diversos, en los que se basan su identidad y papel en la comunidad. La proximidad a ancestros comunes y, por extensión, las relaciones de parentesco, se perfilan como uno de los recursos capitales en la estructuración de las relaciones sociales. Así lo sugiere el hecho de que en estas sociedades se recurra a medios como las estelas o estatuas-menhir, que representan a personajes sociales como ancestros de formas diversas, no sólo a través de su imagen en piedra, sino, también, a través de su buscada relación con restos pertenecientes a un pasado mítico o reciente, como son otras estelas, estatuas-menhir u otro tipo de restos de carácter mortuorio. En la idea de que la identidad de estos personajes fue perfilada colectivamente incide el hecho de que los ítems representados en las estelas y estatuas-menhir apenas han sido documentados en el registro arqueológico de estas regiones. Según se sugiere en este trabajo, serían ítems inalienables, estarían asociados a roles sociales definidos por la comunidad, por lo que los individuos que los encarnan tuvieron un control sobre los recursos limitado por la comunidad.
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Pero, como indica la iconografía de las estelas y estatuas-menhir, estos personajes sociales también se definen a través de su papel en las relaciones sociales extra-locales. El hecho de que haya comunidades que recurren a emblemas, aspectos técnicos y estilísticos, e incluso convenciones iconográficas que existen en otras zonas, habla en favor de su implicación en redes más o menos amplias de interacción social. El papel encomendado a estos personajes en las relaciones sociales extralocales pudo haber tomado muchas formas. Las distribuciones geográficas que muestran los aspectos iconográficos analizados revelan una serie de áreas interacción que, en función del grado de homogeneidad iconográfica, podríamos interpretar en función del grado de integración social que existió entre las comunidades que las ocuparon. La integración social entre comunidades independientes se fraguaría a través de vínculos sociales que son considerados relevantes en las relaciones sociales de la comunidad a una escala local. La “emulación” gráfica puede ser abordada como recurso relevante para la reproducción social de la comunidad local, ya que, a través de ella, se materializan alianzas o relaciones de parentesco (Galán, 1993; Ruiz-Gálvez, 1998) que pueden contribuir a la continuidad de un grupo o comunidad en situaciones de potencial inestabilidad, como las que posiblemente se generaron con la intensificación de la interacción social a nivel global en la Península Ibérica durante la Edad del Bronce. Hablar de estelas, estatuas-menhir e integración social como lo hacemos aquí es una forma de abordar la interpretación de relaciones formales desde un punto de vista dinámico y fluido teniendo en cuenta el papel activo de las comunidades en las que se elaboraron este tipo de monumentos. Podemos hablar de valores compartidos por una comunidad en los que se privilegian cierto tipo de relaciones sociales, valores que pueden ser análogos a los de otras comunidades, vecinas o no, sin necesidad de hablar de la existencia de “entidades” normativas, culturales o ideológicas, totalizadoras y estáticas. Hasta ahora, diversas propuestas interpretativas han recurrido a la agencia de individuos elitistas para explicar la dinámica espacio-temporal de las estelas, estatuas-menhir y su iconografía. Pero como hemos tratado de mostrar, hay datos que dejan ver el papel de la comunidad como ente colectivo en la configuración de este fenómeno, ya que, como proponemos, através de las estelas y estatuas-menhir, su iconografía y los lugares en los que se implantan, se institucionalizan, por medio de las prácticas sociales que implican, los valores que se consideran capitales para la reproducción de las relaciones sociales de la comunidad. Son las prácticas sociales, ritualizadas o no, las que fraguan los valores de una comunidad.
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Estampa 1 - Distribución geográfica de estelas y estatuas-menhir con emblemas. Se delimitan las áreas con mayor densidad de ejemplares.
Estampa 2 - Distribución geográfica de estelas y estatuas-menhir con collares, cinturón y/o tocado.
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Estampa 3 - Distribución geográfica de estelas del Suroeste discriminando entre formatos iconográficos. Se delimitan las áreas con mayor densidad de ejemplares.
Estampa 4 - Distribución de representaciones de alabardas (Estelas, Estatuas-menhir, Arte rupestre del NW) y de sus posibles referentes metálicos. Localización piezas metálicas según Brandherm, 2003 (Díaz-Guardamino, 2010: fig. 105).
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Estampa 5 - Distribución de espadas atribuidas al Bronce Inicial-Pleno y representaciones asociadas en estelas y estatuas-menhir. Localización piezas metálicas según Brandherm, 2003 (Díaz-Guardamino, 2010: fig. 179).
Estampa 6 - A: Vista del Peña Tú desde el SE, B: Calco del panel de Peña Tú según Hernández Pacheco, Cabré y Vega del Sella (1914, en Blas, 2003: fig. 3), C: Vista del Llano de las Mesas desde el W, el más cercano al Peña tú, en el sector occidental de la Sierra Plana.
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estampa 7 - Estelas y estructuras dolménicas en la Dehesa Boyal de Hernán Pérez (Cáceres). Localización basada en la descripción y plano de Almagro Basch (1972), en la descripción de Almagro Gorbea y Hernández (1979) y en una visita al sitio. Cartografía Base: SigPac (Díaz-Guardamino, 2010: fig. 162).
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Estampa 8 - Calcos esquemáticos de las estelas halladas en la Herdade do Pomar realizados a partir de los publicados por Gomes y Monteiro en 1977 (Díaz-Guardamino, 2010: fig. 229).
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A estela antropomórfica de Monte dos Zebros (Idanha-a-Nova): seu enquadramento nas estelas peninsulares com diademas e “colares”1 João Luís Cardoso2
Resumo Estuda-se uma nova estela antropomórfica, recolhida em 1996 no sítio de Monte dos Zebros, (Idanha-a-Nova), cuja existência foi dada a conhecer dois anos depois, embora apenas se tenha indicado a localização e as condições de ocorrência. Trata-se de um pequeno monólito, incompleto na parte inferior e muito erodido, especialmente na face posterior, em resultado da sua exposição aos agentes meteóricos. A relação do monumento com uma provável mamôa funerária parece sugestiva, já que o mesmo provém da área de dispersão dos elementos pétreos que a integrariam, sem que, contudo, seja possível caracterizar o tipo de túmulo, provavelmente não-megalítico, dado que a topografia do terreno não evidencia actualmente a sua presença. Assim, é provável estar-se em presença de mamôa, da Idade do Bronze, como outras conhecidas na região. Do ponto de vista tipológico, o presente exemplar possui, na estela do Crato, o seu paralelo mais próximo, tanto do ponto de vista da morfologia do suporte, como da iconografia representada, conclusão que decorre do estudo comparativo realizado, devendo ser inserido, tal como aquele, nos momentos iniciais de uma longa série contínua deste tipo de monumentos de cunho feminino, conferido pelos diademas e pelos “colares”, que, remontando ao Bronze Antigo, atinge os finais da Idade do Bronze/I Idade do Ferro. Palavras-chave: estela feminina, Idade do Bronze, Monte dos Zebros, Beira Baixa, Portugal. Abstract In this study we address a new anthropomorphic stele collected in 1996 in the location of Monte dos Zebros (Idanha-a-Nova), published two years later but only for its location and conditions of occurrence. It is a small monolith, incomplete in its inferior zone and quite eroded, especially in its posterior face, as the result of exposure to meteoric agents. The relationship of the monument with a probable funerary tumulus appears suggestive, because it comes from the same area of dispersal of stone elements that would integrate it, but considering the absence of relief of the site, and other evidences, like large stones, the funerary structure would 1 Coube a M. Chambino e a F. Henriques a identificação da estela, devendo-se ao primeiro a caracterização das respectivas condições de jazida. A ambos e à Associação de Estudos do Alto Tejo, a que pertencem, o agradecimento do signatário. 2 Universidade Aberta e Centro de Estudos Arqueológicos do Concelho de Oeiras (Câmara Municipal de Oeiras). [emailprotected].
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história not be of megalithic type, perhaps belonging to the Bronze Age, like others already published of the same region. From the point of view of the typology, the present monument is quite similar to the stele of Crato, concerning the support, the represented iconography, as seen in a comparative study, and should also be inserted, in the early moments of a long continuous series of this type of monuments having a feminine stamp, given by the diadems and by the necklaces that, coming since the Early Bronze Age, reaches the Late Bronze Age/Early Iron Age. Key-words: Female stele, Bronze Age, Monte dos Zebros, Beira Baixa region, Portugal.
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Localização e condições do achado A estela antropomórfica objecto deste estudo foi recolhida em prospecção realizada no dia 23 de Agosto de 1996, no âmbito da cartografia arqueológica do concelho de Idanha-a-Nova, freguesia de Zebreira, no local designado por Monte dos Zebros, o qual possui as seguintes coordenadas UTM, lidas na Carta Militar de Portugal à escala de 1/25 000, Folha 294: PE586085 (Estampa 1). A notícia da descoberta encontra-se publicada no Relatório respeitante àqueles trabalhos de prospecção, correspondendo-lhe o locus 2 do referido topónimo, por se ter atribuído o locus 1 aos vestígios de mamôa, situada nas proximidades, onde foi recolhido algum espólio à superfície (Henriques, Caninas & Cardoso, 1998, p. 10). É provável que o local da descoberta corresponda a uma mamôa, muito arrasada pela lavoura. É o que sugere a existência de abundantes blocos, que, apesar de dispersos pelo solo arável, em virtude dos trabalhos agrícolas, evidenciam maior concentração no local da descoberta, observando-se ali um núcleo de pequenos blocos de granito de grão fino, de quartzo e, mais raramente, de xisto, dispersos sobretudo na direcção do pendor do terreno, para o quadrante de Noroeste, numa extensão de cerca de 50 m (Estampa 2). Como prova da intensidade dessas actividades agrícolas, o monólito evidencia, especialmente na face posterior, mais erodida, em resultado de uma maior exposição aos agentes meteóricos, inúmeros sulcos provocados pela relha do arado, os quais também atingem as outras faces da peça, embora de forma menos acentuada. A ter existido uma mamôa no local da descoberta, aquela possuía pequeno tamanho e, não se vislumbrando nenhum monólito que faça supor a existência de monumento megalítico, é provável que tenha correspondido a um tipo de monumento pós-megalítico, reportável à Idade do Bronze, de que se conhecem exemplos na região, como a mamôa de Amieiro 9 (Cardoso, 2008). O sítio, de pendor suave, propício a culturas cerealíferas, que continuam a realizar-se regularmente, integra cumeada que se inicia a partir de extensa plataforma que se estende na direcção do rio Aravil. O solo, cobrindo substrato xistoso, apresenta-se localmente desprovido de afloramentos, embora um pouco mais para Este (freguesia de Zebreira) estejam identificados afloramentos graníticos, ocorrendo, para Sul (freguesia do Rosmaninhal), afloramentos de xisto e, para Norte e Oeste, depósitos sedimentares areno-conglomeráticos de idade terciária. O local possui ampla visibilidade: para Norte e Noroeste, avista-se o inselberg de Monsanto, Idanha-a-Nova, a grande falha do Ponsul e, mais ao longe, as serras da Gardunha e da Estrela; para Oeste, avista-se a elevação onde se implanta a cidade de Castelo Branco, o Monte de S. Martinho, a serra das Talhadas e a crista das Portas de Ródão; para Sul, divisa-se o Cabeço de Monforte e serranias espanholas. Descrição da estela e da sua iconografia Trata-se de um monólito de granito claro de grão fino, de origem próxima, dado
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que parte dos blocos que juncam o terreno, relacionados com a provável mamôa são também do mesmo tipo petrográfico. Morfologicamente, a parte conservada – que corresponde aproximadamente a cerca do terço superior do volume original – caracteriza-se por uma extremidade superior arredondada, e por lados de perfil levemente convexo. A face anterior, ou frontal, apresenta-se também levemente convexa, enquanto a face posterior mostra-se mais convexa e irregular, e, como já se referiu, com abundantes sulcos em múltiplas direcções, produzidos pela relha do arado, indicando que esteve por muitos anos tombada, e semi-enterrada, com aquela face mais ou menos exposta, embora também se observem alguns sulcos idênticos na face anterior, de ambos os lados, e até no topo. As duas superfícies laterais são igualmente convexas, conferindo à parte conservada uma secção mediana elipsoidal assimétrica. O monólito corresponde, pois, a uma estela, por não exibir contorno recortado (atributo das estátuas-menires), e evidenciar uma face frontal levemente convexa, mais desenvolvida e melhor acabada que as restantes, destinada a receber a iconografia principal (Estampa 3). As dimensões actuais são as seguintes: Comprimento máximo actual (correspondendo à altura, em posição vertical) – 27,5 cm; o monólito original poderia atingir cerca de 0,70 m de comprimento máximo. Largura máxima actual (inferior à do monólito original) – 27,0 cm; Espessura máxima – 17,5 cm. A técnica decorativa recorreu ao picotado, mais ou menos profundo, feito com objecto pontiagudo, seguido, nalguns casos – especialmente na produção de sulcos – de abrasão. Quanto às depressões punctiformes, observam-se dois grupos, segundo o seu tamanho e profundidade, que se distribuem segundo uma lógica de simetria na superfície insculturada. A técnica parece seguir os cânones anteriormente observados, existindo um primeiro momento em que a depressão foi produzida por percussão, seguido de um segundo momento em que se recorreu à abrasão rotativa. Tal conclusão é apoiada pela superfície polida, conservada ainda hoje em algumas daquelas depressões, especialmente nas de maiores dimensões. Do ponto de vista da organização e desenvolvimento dos motivos, tendo presente a respectiva distribuição pela superfície do monólito, podem identificar-se as seguintes grandes unidades, na face anterior ou frontal (Estampa 4): - a representação de diadema ou toucado, na parte superior do monólito, através de finas linhas incisas radiais, que poderiam ter sido obtidas com uma lâmina de sílex, ou, mais provavelmente, metálica, diferenciando-se completamente das outras duas técnicas acima referidas; - a representação esquemática dos olhos, através de dois pontos, com um terceiro ponto, de significado indeterminado, na parte central, correspondente ao nariz; - o nariz, que corresponde a dois traços sub-verticais convergentes, interrompidos por um sulco moderno, largo e pouco profundo, o que impede de saber se tais traços se uniam inferiormente, e como;
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- a boca, correspondendo a um curto segmento horizontal, independente dos traços representando o nariz. A face, assim esquematicamente representada, encontra-se separada do tronco por um traço horizontal, a partir do qual se desenvolvem, inferiormente, três linhas curvas fechadas, descrevendo arcos cada vez mais abertos, correspondentes a “colares”. A presença de alinhamentos de depressões punctiformes, de diversos tamanhos, que, desenvolvendo-se em torno da representação principal, na face frontal, parece que a destacam, merece ser detalhada, uma vez que existe uma ordem no tamanho de tais depressões consoante o local observado. Assim, de ambos os lados do colar, e exterior ao mesmo, observam-se alinhamentos de depressões punctiformes que se prolongariam inferiormente pela parte da peça em falta. Externamente a estes dois alinhamentos, e sem os acompanhar, desenvolvem-se em arco, enquadrando a toda a volta a face esquemática da representação antropomórfica, mais de vinte depressões punctiformes de tamanho análogo às anteriores. Enfim, várias depressões punctiformes, maiores que as anteriores, situam-se, de ambos os lados, formando um alinhamento vertical que se prolongaria inferiormente ao longo das faces laterais do monólito. A face posterior, mais irregular, não se apresenta decorada, como é usual neste tipo de estelas, ainda que existam excepções: é o caso de uma serpente, finamente insculturada na face posterior da estela do Crato (Bueno Ramírez et al., 2004 a), a qual tinha passado despercebida aos diversos autores que anteriormente a publicaram (Estampa 5). Esta representação é conotável com o mundo subterrâneo e, assim, com a crença na vitalidade telúrica e no binómio morte/regeneração (Cardoso et al., 2001/2002). Deste modo, a sua presença neste monólito – tal como em outros de carácter indiscutivelmente funerário, de que é paradigma o notável menir identificado no dólmen de Navalcán, Toledo (Bueno et al., 1999) – é sugestiva da conotação do mesmo com monumento funerário. Sendo certo, no entanto que a continuidade daquela relação se manteve pelos milénios seguintes, a ocorrência desta serpente no monólito do Crato, só por si, não é comprovativa de qualquer época específica a que o mesmo possa ser atribuído. Comparações Nas comparações que se seguem, serão comparados, sucessivamente, os elementos decorativos identificados nesta estela com os identificados em outras, por forma a melhor poder situar o exemplar em estudo no conjunto dos seus homólogos peninsulares. 1 – Suporte – trata-se de um bloco inteiramente afeiçoado, com o topo convexo, exibindo a face anterior um fino trabalho de regularização. No total, o monólito poderia não ultrapassar 0,70 m. Desta forma, integra-se nos pequenos exemplares totalmente afeiçoados e de vulto redondo, como o do Crato (Vasconcelos, 1910). Estes distinguem-se dos exemplares de forma ovóide, os quais, por tal motivo, receberam a designação, algo imprecisa, de “ídolos-guijarro”, adoptada por M. Almagro Gorbea, comuns na vizinha província de Cáceres – a que pertence o pequeno exemplar da Quin-
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ta do Couquinho (Moncorvo) (Vasconcelos, 1910) – por possuírem uma face anterior e uma face posterior bem desenvolvidas, conferindo-lhes formato estelar. O quarto exemplar integrado nesta categoria – presença de duas faces principais e formato estelar – dado a conhecer em território português provém de A-de-Moura (Guarda) e corresponde a bloco intacto, totalmente afeiçoado, com 1,02 m de altura, 0,41 m de largura média e 0,20 m de espessura na parte média (Silva, 2000). Enfim, a estela de N. Srª. da Esperança (Arronches) descoberta acidentalmente por H. Breuil numa ocasião em que se dirigia ao abrigo com pinturas rupestres com aquele nome, e dada a conhecer pelo próprio (Breuil, 1917), distingue-se dos exemplares mencionados por ter sido executada numa placa pouco espessa (Estampa 5). 2 – Olhos – a execução dos olhos através de duas depressões punctiformes, separadas pelo nariz, é prática corrente no conjunto das estelas antropomórficas peninsulares. O presente exemplar, porém, possui, não duas, mas três depressões dispostas quase na horizontal, e a espaços iguais, situando-se a intermédia na zona central da representação do nariz. Esta situação observa-se na estela de Arronches. Neste exemplar, embora os desenhos publicados por H. Breuil (1917) e E. Anati (1968) assinalem apenas os dois olhos, foi identificada mais recentemente uma terceira depressão, encimando o traço vertical correspondente ao nariz (Bueno Ramírez et al., 2005) (Estampa 5). Enfim, podem ainda assinalar-se outros casos em que se observam, na parte atribuível à cabeça destas estelas, a existência de três depressões principais, alinhadas horizontalmente: é o caso de estela de Tabuyo del Monte, León (Almagro Basch, 1972) e de uma das estelas do conjunto de Sejos, Cantábria (Bueno Ramírez et al., 2005). Esta particularidade não pode, pois, ser fruto do acaso, tendo um significado que hoje se afigura de difícil interpretação. 3 – Nariz – a representação do nariz, quando existe, nas estelas antropomórficas peninsulares, corresponde, via de regra, a um sulco vertical simples. No caso presente, tudo indica que não era assim: os dois traços oblíquos convergiriam inferiormente, correspondendo a uma figura em V ou, mais provavelmente, em U fechado. Esta tipologia tem o seu melhor paralelo na estela de A-de-Moura, Guarda, onde o nariz se encontra assinalado por um sulco em U, encimado pelos dois olhos. A outra estela do território português, dada recentemente a conhecer, onde o nariz foi obtido por dois sulcos convergentes, em V aberto, é a do Castro de Barrega, Celorico de Basto (Sampaio, 2007). 4 – Boca – representada por um curto sulco horizontal, sobreposto pelo nariz, tem, igualmente, nas estela de A-de-Moura, e na do castro de Barrega, o seu mais próximo paralelo no território português (Estampa 6). Assinala-se, no entanto, a frequência deste tipo de representação nas estelas peninsulares, ainda que algumas a não possuam: é o caso das estelas da Quinta do Couquinho (Moncorvo) e do Crato a qual, desde a sua primeira reprodução gráfica (Vasconcelos, 1910), até ao decalque cuidado que dela se apresentou em 2004 (Bueno Ramírez et al., 2004 a), ao contrário do verificado com a estela de N. Srª. da Esperança, na qual se assinalou a boca, na última versão conhecida (Bueno Ramírez et al., 2004 a).
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5 – “Colares” – os três arcos com curvaturas crescentemente maiores observados na estela em apreço integram-se nos adereços ou representações que têm sido usualmente interpretados como “colares”. A sua presença é quase constante no conjunto das estelas diademadas peninsulares, encontrando-se presente em exemplares de assinaláveis diferenças morfológicas e iconográficas, desprovidos de diadema e por isso não incluídos no presente trabalho: é o caso da estátua-menir de Boulhosa, possuindo um “colar” de cinco voltas (Vasconcelos, 1910), recentemente redesenhada (Bueno Ramírez et al., 2005); de algumas das estelas do Cabeço da Mina (Vila Flor), infelizmente ainda não publicadas como mereciam; e do exemplar do Alto da Escrita (Viseu), ostentando “colar” com cinco voltas e um cinturão (Carvalho et al., 1999). Igualmente de cinco voltas, é o colar da estela do Castro de Barrega, Celorico de Basto (Sampaio, 2007). É certo que, em oposição, existem exemplares estilisticamente mais próximos da estela em apreço que não ostentam “colares”, embora se possam adivinhar os diademas: os casos mais evidentes, provêm todos da parte setentrional do território peninsular: ao célebre painel rupestre gravado e pintado de Peña Tú (Astúrias), desenhado por Juan Cabré (Cabré, 1917) e recentemente reinterpretado (Bueno Ramírez et al., 2005), somam-se as estelas de Tabuyo del Monte (León), a inscultura estelar de Garabandal (Cantábria), e o conjunto de estelas de Sejos (Cantábria), que evidenciam estreitas afinidades entre si, constituindo um grupo muito homogéneo. Note-se que o número de voltas identificados nos aludidos colares, por simples contagem do número de sulcos curvilíneos existentes pode ser ilusório. Na verdade, ao contrário do verificado na estela em estudo, são frequentes os preenchimentos internos entre cada uma delas, sugerindo tratar-se, em particular nestes casos, de peitorais ou estolas de tecidos bordados: é o caso de um dos exemplares mais próximos morfológica e geograficamente do agora estudado, a estela do Crato: na última versão publicada (Bueno Ramírez et al., 2005), o “colar”, apresenta-se também preenchido internamente com zigue-zagues, tal como se observa na estela, mais elaborada, da Granja de Toniñuelo (Badajoz) (Bueno Ramírez & Balbín Behrmann, 1997). 6 – Toucados ou diademas – a presença de diademas assume nestas estelas um papel de tão evidente importância, que foram designadas por “estelas diademadas”, realidade particularmente nítida nas produções consideradas mais modernas, reportadas ao Bronze Final/I Idade do Ferro. A variabilidade formal deste suposto adereço é muito grande, desde uma simples linha (caso da estela da Quinta do Couquinho, Moncorvo), passando por reticulado, semelhante a rede (caso da estela do Crato), sugerindo uma espécie de coifa, até representações mais complexas, como as linhas curvas alternantes com faixas preenchidas por alinhamentos de depressões punctiformes (estela de N. Sª. da Esperança, Arronches). Na estela de A-de-Moura (Guarda), o toucado encontra-se representado por finas linhas radiais, com evidente paralelo no presente exemplar, e em outros do território vizinho, podendo reproduzir toucado de crinas soltas. A dicotomia entre as representações de estelas de personagens armados e as que não possuem armas, coincide com a presença ou ausência deste atributo, moti-
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vo por que foram frequentemente reportadas a personagens femininas. É o caso das estelas antropomorfas de La Lantejuela (Sevilha) (Oliva Alonso, 1983) e de Capilla I e Belalcazar I (Badajoz) (Enríques Navascués & Celestino Pérez, 1982, 1984), as quais, confirmando aquela atribuição, exibem a representação dos seios através de depressões punctiformes. Note-se, de passagem, que a representação de seios nas estelas diademadas peninsulares mais antigas é excepcional, aparte o exemplar de Salvatierra de Santiago (in Sevillano S. José, 1991). Ainda dentro daquelas últimas produções de estelas diademadas, é de referir a estela muito conhecida de Torrejón del Rubio II (Cáceres) (Almagro Basch, 1966), cuja cronologia dentro do Bronze Final se encontra comprovada pela presença de uma fíbula de cotovelo e de um pente de um dos seus lados. O toucado ou diadema tende a substituir o “colar” nalgumas delas, situação que foi explicada por apenas o primeiro manter validade como indicador social (Celestino Pérez, 1990). Enfim, numa destas estelas (El Viso III) representam-se dois personagens armados e confrontados entre si, claramente enquadráveis nos exemplares das estelas com armas ou guerreiros armados, ditas “extremeñas”, separados por um personagem feminino diademado, não armado. Esta estela estabelece, assim, a ponte que faltava entre as estelas diademadas e estelas de guerreiros (in Celestino Pérez, 1990, grupo B da sua sistematização das estelas diademadas). Nas estelas consideradas mais antigas, o toucado ou diadema é discreto. É neste grupo que se integra o exemplar em estudo. Com efeito, tal adereço é apenas sugerido pelas finas incisões radiais que contornam a cabeça da estela, enquadrada pelas depressões punctiformes que inferiormente se prolongam por outras. As finas incisões radiais, observadas no topo da estela em estudo, com paralelo próximo na já citada estela de A-de-Moura, têm equivalente nas representações filiformes radiais na parte superior do ídolo rupestre de Peña Tú, pintadas a vermelho, aparentando simbolizar, igualmente, uma coifa constituída por crinas soltas, sobre a cabeça. Nalguns casos, o toucado, que envolve superiormente a cabeça, encontra-se prolongado pelo “colar”, ou estola, que a delimita inferiormente, sem solução de continuidade, como se observa na estela de Agallas (Salamanca) onde, não obstante, houve espaço para a representação de finas linhas incisas radiais, sobrepostas à cabeça (Sevillano, 1991), equivalentes das que se observam na estela do Monte dos Zebros e em muitas outras. Noutros casos, observa-se nítida dicotomia entre o toucado e o “colar”, como na estela de Hernán Pérez VI (Almagro Basch, 1972). Os alinhamentos de depressões punctiformes observados na estela de Monte dos Zebros em torno da face e, mais abaixo, enquadrando o “colar”, reforçam o efeito decorativo do referido diadema, toucado ou coifa. A já citada estela de Granja de Toniñuelo, a par da de Arrocerezo (Cáceres) (Bueno Ramírez & González Cordero, 1995) e da de Robledillo de Gata (Salamanca) (Sevillano, 1974, 1991) corporizam a integração dessa temática no diadema, a par com a decoração radiada, nele predominante. É curioso notar que, mesmo nas estelas mais tardias, do Bronze Final/I Idade do Ferro, se continua a observar a manutenção de tais características, como no exemplar de Capilla I (Badajoz).
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Sexo, cronologia A presença de “colares” tem sido critério utilizado por diversos autores para atribuir as estelas onde ocorrem a representações femininas (Almagro Gorbea, 1993a, 1993b). Este princípio tem antecedentes extra-peninsulares: com efeito, ao estudar os diversos grupos presentes no Midi francês, Jean Arnal considerou a existência clara de representações femininas – todas as que possuíam colares, também acompanhados da representação de seios – por oposição às masculinas – todas as que possuíam armas, considerando-os adereços mutuamente exclusivos. Considerou ainda certos casos híbridos, envolvendo a deliberada alteração de atributos, e a adição de outros, nos mesmos exemplares, suportando a ideia de reformulação, com a transformação de estelas masculinas em femininas e vice-versa (Arnal, 1976). No que se refere às estelas peninsulares, a presença de armas em estelas diademadas ou afins, afigura-se como um elemento importante na atribuição do sexo, sem esquecer a possibilidade de reconversão, à semelhança do observado em França. Nenhuma das estelas diademadas encontradas em Portugal possui armas, as quais, no entanto, foram precocemente valorizadas no país vizinho, a partir da associação pictórica do ídolo de Peña Tú a uma adaga longa, obtida por gravação, idêntica à encontrada na cista epicampaniforme da Quinta da Água Branca (Vila Nova de Cerveira) (Cardoso, 2002). Note-se que a representação daquela arma possui, na versão publicada por J. Cabré (1916), cinco pontos a vermelho, junto da empunhadura, que poderão corresponder a rebites, remetendo-a assim para um modelo de características argáricas, em vez de arma de afinidades campaniformes, munida de lingueta simples de encabamento, como é admitido por diversos autores (Anati, 1968); e esta representação é tanto mais insuspeita quanto é certo, por um lado, ser Juan Cabré um arqueólogo que, à época em que realizou o decalque deste painel, já possuía larga experiência acumulada na realização deste tipo de trabalhos, e por outro, a convicção que a figura em apreço representaria uma sepultura, depois de ter sido atribuída a punhal, o que torna ainda mais insuspeita a real existência daquelas pontuações. Merecem ser transcritas as suas palavras, pela importância que detêm para a interpretação desta representação e, por conseguinte, da respectiva cronologia: “La figura grabada, que en un principio creimos dada su forma indicaba un puñal, creo mas bien debe ser una sepultura, indicadora de un enterramientoen cuya memoria se hicieron dichas pictografias, simbolizando la imágen de la derecha la divindad generatriz a la que dirijeron sus invocaciones en el sepelio y confiaron el cadaver los deudos del enterrado, el signo-puñal el sepulcro, la escena humana la danza fúnebre (…). El origen de nuestro error se basaba en la forma estilizada de la sepultura, y mas aún por los cinco puntos que aparecen en el tercio superior, los cuales nos movieron a creer, que significaban los clavos de remache de la empuñadura com la hoja del supuesto puñal. Dichos puntos no deben relacionar-se com el gráfico y pueden pertenecer a las séries inmediatas de puntuaciones” (Cabré, 1916, p. 26).
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A ideia inicial é que estava certa, visto actualmente não se colocar a questão de a representação em causa corresponder a uma sepultura antropomórfica. Que essa arma possui rebites, é a opinião claramente expressa por H. Breuil, que, tendo observado o painel in loco, apresenta as seguintes conclusões sobre a questão em apreço: “L´une figure évidemment un grand poignard triangulaire d´environ 0 m. 65, à manche court, du type classique du début de l´âge du bronze ou de la fin de celui du cuivre, avec cinq rivets peints en arc de cercle sur la garde” (Breuil, 1933, p. 41). Deste modo, é estranho que os rebites, tão nítidos no desenho de J. Cabré, arqueólogo já com larga experiência acumulada na reprodução de pinturas e gravuras rupestres peninsulares, aquando da execução deste decalque, e confirmados por Henri Breuil, eminente especialista de arte rupestre, já não figurem na versão publicada por P. Bueno Ramírez e colaboradores em 2005, a menos que entretanto tenham desaparecido por causas naturais. Admitindo a efectiva presença de rebites na empunhadura daquela arma, também devidamente valorizados por outros autores (Sevillano, 1982), a representação do ídolo de Peña Tú seria reportável ao Bronze Antigo, situável nos inícios do II milénio a.C. É a tal época que a estela leonesa de Tabuyo del Monte deve também ser atribuída, por ostentar, de ambos os lados, respectivamente, uma alabarda de tipo Carrapatas, de folha triangular, e um punhal de tipologia aparentemente próxima do representado no painel pintado de Peña Tú, de cabo curto (embora sem representação de rebites, o que se compreende por se tratar de uma inscultura) os quais, por seu turno, têm paralelo numa das estelas cantábricas de Sejos. Na estela de Hernán Pérez VI (Cáceres), publicada por M. Almagro Basch em 1972, foi identificada recentemente a inscultura de uma alabarda fixada ao cinturão da personagem representada, do mesmo tipo da anterior (Bueno Ramírez et al., 2005). E uma outra foi registada na estela de Agallas (Salamanca) (Sevillano, 1991). Esta estela tem a particularidade de a alabarda, em tudo semelhante às anteriores, ter sido gravada após a peça ter sofrido uma fractura, na face frontal. Dado que a estela em causa possui, de acordo com a figura ulteriormente dela publicada por P. Bueno Ramírez et al. (2005), uma representação na zona inferior desta face conotável com o órgão genital feminino, que tudo indica ser da época da feitura do monumento, pode admitir-se situação idêntica à referida por J. Arnal para algumas estelas do Midi francês, a da transformação de um personagem feminino em personagem masculino. Com efeito, é interessante notar que a alabarda foi gravada exactamente na superfície fracturada da estela, correspondente à área em que se desenvolveria o “colar”, enquanto atributo feminino, pelo que a ablação daquela parte da estela pode ter sido intencional. Em reforço da dicotomia entre estelas femininas e estelas masculinas, não deixa de ser significativo observar que as representações de Peña Tú, Sejos e Tabuyo del Monte, todas com armas, não possuem colares e que as escassas estelas onde se observam armas e colares admitem a hipótese de aquelas terem sido adicionadas em momento ulterior: além da estela de Agallas, é o caso da estela de Hernán Pérez
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VI, que, na primeira representação publicada (Almagro Basch, 1972) não apresenta nenhuma arma, ao contrário da versão publicada recentemente (Bueno Ramírez et al., 2005), onde se representa uma alabarda do tipo Carrapatas em posição vertical, fixada ao cinturão do personagem. Mas o traço filiforme do cabo desta desta arma, bem evidenciado no desenho mais antigo (conclusão confirmada pela análise da respectiva foto, cf. Almagro Basch, 1972, Lám. VI), afigura-se muito diferente da restante gravação da estela, sendo, pelo contrário, semelhante ao da alabarda da estela de Agallas; assim, é provável que, também neste caso, a arma tenha sido adicionada à representação pré-existente. O sexo feminino, na estela de Agallas, está representado por duas linhas verticais levemente convexas, que se unem em ambas as extremidades, assemelhando-se muito à representação presente na estela de A-de-Moura, já atrás referida. É interessante notar que a dita representação ocorre em uma placa de xisto da anta do Couto de Vale Magro (Crato) (Isidoro, 1971), a qual possui também braços e dedos filiformes, observados de ambos os lados da referida representação, exactamente como na estela de Agallas (Estampa 6). Este modo de representar o sexo feminino acompanharia a forma mais usual, através de um triângulo invertido, que se observa em algumas placas de arenito do grupo alto-alentejano, como a que foi recentemente publicada da Anta da Horta (Crato) (Oliveira, 2006), com prolongamento pela província de Cáceres, através da placa encontrada no dólmen de Vega del Guadancil, associada a uma placa de xisto com representação de “colar” (Leisner & Leisner, 1959, Tf. 55, nºs 1 e 2). A referida semelhança formal sugere a possibilidade de as placas decoradas terem estado na origem das estelas do grupo em apreço, como defenderam em diversos trabalhos P. Bueno e colaboradores, no seguimento de observações muito anteriores no mesmo sentido (Vasconcelos, 1910), entretanto também apresentadas por diversos autores, no âmbito da discussão de monumentos de outras áreas geográficas (Arnal, 1976). Vale a pena recordar as observações a tal propósito, de um dos mais notáveis pioneiros dos estudos arqueológicos em Portugal: “existe parentesco dos monumentos da Boulhosa, do Couquinho e do Crato com a placa de lousa de Alcobaça, que provém de uma região chalcolithica, e posso incluir na mesma parentella uma placa de lousa de Idanha-a-Nova, achada num dólmen” (Vasconcelos, 1910, p. 38). Referia-se o autor à existência, nas placas de xisto e nas estelas em apreço, de “colares”, os quais, sendo um dos traços mais marcantes das primeiras, ocorrem também em algumas placas. Um dos exemplos mais expressivos é o da placa mencionada por J. Leite de Vasconcelos, oriunda da gruta do Cabeço da Ministra (Alcobaça) (Gonçalves, 1978), apesar de provir de região onde não se conhece nenhuma estela (Estampa 6). Tal como o observado em algumas estelas, o “colar” patente no anverso desta placa é definido por duas linhas preenchidas interiormente por faixas oblíquas, sugerindo uma estola, sugestão que é reforçada pela representação do reverso, onde se observa outro “colar”, representado por duas faixas arqueadas preenchidas interiormente.
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O Alto Alentejo Oriental corresponde à região que, estendendo-se em território português pelo sul da Beira Interior (região do Tejo internacional), possui maior concentração de placas de xisto e de arenito com representações antropomórficas semelhantes a algumas das estelas mais elaboradas, com cabeça, braços e mãos, possuindo algumas delas, decorações que se assemelham a “colares”, os quais, tal como na placa de Alcobaça estão presentes em ambas as faces das mesmas. Esta realidade parece ser explícita quanto à representação de uma personagem vestida, vista de frente (a face que possui braços e mãos) e de costas: é o caso do exemplar recolhido na anta da Horta (Alter do Chão) (Oliveira, 2006), e do publicado por J. L. de Vasconcelos, proveniente de uma anta de Idanha-a-Nova (Ferreira, 1973), cujas afinidades entre si são evidentes, extensivas a alguns exemplares da província de Cáceres, como os recolhidos no dólmen de Lanchas 1 (Valência de Alcântara) (Bueno Ramírez, 1992) e no já mencionado dólmen de Vega del Guadancil. Os ditos “colares”, além de estolas ou adereços de indumentária, que cobririam os ombros e o peito dos personagens representados, poderiam não ser mais do que a bordadura, em U ou em V, de mantos ornados com padrões geométricos. Com efeito, a relação entre os padrões geométricos das placas de xisto e peças de vestuário onde os mesmos estivessem presentes, foi assinalada por diversos autores, no seguimento da proposta de P. Bueno Ramírez, sobre a filiação das estelas antropomórficas nas placas alentejanas do grupo de Crato-Nisa-Castelo de Vide (Bueno Ramírez, 1991). Deve notar-se, contudo, que a distribuição geográfica deste tipo de placas não corresponde à das estelas em apreço, já que, para Ocidente, se prolonga até ao Alto Ribatejo, como prova o fragmento recolhido na anta do Penedo Gordo (Gavião) (Cunha & Cardoso, 2002/2003), sendo residual na província de Cáceres, e inexistente na de Salamanca, áreas de onde provêm a maioria das estelas diademadas. Se a hipótese de algumas das placas antropomórficas do grupo alto-alentejano oriental e da Beira Baixa poderem ostentar a reprodução de mantos tem cabimento, algumas das representações estelares reúnem também indícios naquele sentido, especialmente as do grupo setentrional, como as de Peña Tú, Garabandal, Tabuyo del Monte e Sejos, cuja iconografia de bandas horizontais preenchidas por zigue-zagues ou triângulos, é comum às placas. Porém, tendo presente a completa ausência de placas de xisto na região correspondente à das estelas em apreço, pode concluir-se que tal semelhança só pode resultar de mera convergência formal. Em conclusão, parecendo aliciante a hipótese de relação entre certas placas alentejanas calcolíticas e as estelas em apreço, a efectiva demonstração desta hipótese carecia da verificação prévia duas condições: a idêntica distribuição geográfica das placas antropomórficas e das estelas – o que só muito parcialmente se verifica; e, mais importante, a efectiva continuidade – para não dizer contemporaneidade – entre os dois grupos de manifestações simbólicas. A segunda condição remete directamente para o faseamento da produção das estelas, com base nas suas características iconográficas e nos escassos contextos co-
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nhecidos, questão que foi abordada por diversos autores. Tendo presentes as propostas sucessivamente apresentadas, especialmente as mais recentes, da autoria de M. Almagro-Gorbea (1993 a; 1993 b), verifica-se que este autor faz corresponder as produções mais antigas às menos elaboradas e com menores pormenores anatómicos. Esta primeira etapa estaria representada, em Portugal, pelas estelas de Crato e de Quinta do Couquinho (Moncorvo) (Vasconcelos, 1910; Anati, 1968), a que se juntaria o exemplar agora estudado, o qual possui no exemplar do Crato o seu paralelo mais directo, como já se referiu. É possível que a este primeiro grupo pertença também a estela de Arronches, que, por se encontrar muito incompleta, não permite conclusão segura. A inserção deste grupo nos primórdios da Idade do Bronze encontra-se apoiada na presença de armas características, como as alabardas de folha triangular do tipo Carrapatas e punhais de rebites, como é o caso dos rebites pintados a vermelho no exemplar de Peña Tú. À etapa seguinte, atribuível pelo Autor ao Bronze Pleno, corresponderiam exemplares crescentemente elaborados, possuindo braços e mãos, além de “colares”. A este grupo pertence a estela do Castro de Barrega, Celorico de Basto (Sampaio, 2007), possuindo braços desenvolvidos e mãos, com a representação dos dedos. Importante elemento para estabelecer a cronologia deste grupo é a presença de uma alabarda de tipo Carrapatas numa das estelas nele integráveis (Agallas), num momento posterior à produção da peça. Admitindo a sua atribuição ao Bronze Pleno, a hipótese de este grupo ter sido inspirado nas placas alentejanas com idêntica iconografia, encontra um sério obstáculo, por não ser possível explicar um lapso temporal superior a 500 anos existente entre os dois gupos, já que as placas de xisto e de arenito dificilmente poderiam ser ulteriores a 2500 anos a.C. Assim, as palavras precursoras a este propósito de E. Frankowski, ao declarar: “Supongo que todas estas piedras, y especialmente las três de Portugal [Crato, Quinta do Couquinho e Moncorvo], no son ni ídolos, ni tampoco unas representaciones de la diosa protectora de los muertos, sino que guardan cierto parentesco ideológico con las placas de pizarra, encontradas en los dólmenes (…)” (Frankowski, 1920, p. 136), significam apenas, no quadro dos nossos conhecimentos actuais, um parentesco formal, não sustentável do ponto de vista arqueológico e explicável por ambos os grupos se relacionarem com o mundo funerário e as suas divindades (conotação ideológica a que se referia o Autor citado). A representação de cinturões surgiria, segundo M. Almagro Gorbea, nos exemplares do grupo imediatamente seguinte, que marcariam o início do Bronze Final. E, com efeito, embora a presença de cinturões seja conhecida em estelas-menires de épocas anteriores, atribuíveis ao Neolítico Final, as presentes nestes monumentos diferenciam-se daquelas, onde são comuns as decorações punctiformes, provavelmente representando aplicações de tachas de bronze – adereços só conhecidos, e até frequentes, no Bronze Final – sendo semelhantes ao patente em monumentos inquestionavelmente do Bronze Final, como a estela do Monte de São Martinho 1,
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Castelo Branco (Almagro Basch, 1966). Acresce que algumas das estelas diademadas cuja atribuição ao Bronze Final também não levanta dúvidas, como é o caso dos exemplares de La Lantejuela (Sevilha) e de Torrejón del Rubio II (Cáceres), também possuem cinturões decorados interiormente pela mesma técnica. Assim, a presença de cinturões com as características referidas, parece ser critério válido para incluir no Bronze Final as estelas que os ostentem. Assim, a pretensa cronologia calcolítica atribuída por alguns autores às estelas deste grupo, não possui, no quadro dos nossos conhecimentos actuais, fundamento sólido, até porque se trata, via de regra, de exemplares desprovidos de contexto. Por tal motivo, a estela de Granja de Toniñuelo (Badajoz), com cinturão deste tipo, seria da Idade do Bronze, e não do Calcolítico, com base na sua hipotética relação com a sepultura de falsa cúpula ali existente, conforme é defendido por P. Bueno Ramírez & Balbín Behrmann (1997, 2003). Também carece de fundamento a afirmação, reiteradamente apresentada por aqueles autores, segundo a qual as estelas antropomórficas do território português de Crato e Esperança se relacionam com sepulturas megalíticas, invocando os testemunhos dos que primeiramente as publicaram (Bueno Ramírez & Cordero, 1995; Bueno Ramírez et al., 2004 a, 2005; ver, por todas, as passagens contidas respectivamente a pp. 671 e 594 das duas últimas publicações). Ao contrário, como claramente afirmam os autores que primeiramente estudaram aqueles e outros exemplares (Vasconcelos, 1910; Breuil, 1917), os respectivos contextos arqueológicos não foram reconhecidos, não havendo nada que os possa associar a quaisquer construções tumulares megalíticas, situação aliás extensiva aos achados mais recentemente efectuados em território português. Exceptua-se a estela agora estudada, embora este aspecto não deva, pelas dúvidas expostas no início deste trabalho, ser excessivamente valorizado. A realidade descrita parece ser comum ao país vizinho, especialmente à zona de maior concentração destas peças, na província de Cáceres e na de Salamanca (o que motivou a designação de grupo de Hurdes-Gata, registado na literatura). Como refere M. C. Sevillano (1991), apenas uma minoria das estelas conhecidas, poderiam, com alguma probabilidade, encontrar-se associadas a pequenas cistas, de época indeterminada, já que o registo mais fiável que se conservou foi a descoberta, em cista situada próximo da estela de El Cerezal I, de “una urna o puchero” (op.cit., p. 100), o que, no entanto, é suficiente para comprovar a relação daquela estela com uso funerário. No respeitante ao conjunto de Hernán Pérez, são de reter as seguintes observações: as estelas I, II e VII, encontravam-se isoladas no terreno, enquanto as estelas III, IV, V e VI, jaziam, segundo os testemunhos orais recolhidos, agrupadas em espaço restrito, onde se encontrava também uma estela de “tipo extremeño”, na maioria fincadas ainda no solo, junto a sepulturas rectangulares de lages de xisto bastante grandes (Almagro Basch, 1972, p. 91). Pode, pois, concluir-se, que as estelas assinalavam uma necrópole de cistas, que incluiria uma estela de “tipo extremeño” (Almagro Gorbea, 1977, p. 199), o que levou o autor a admitir, com razão, a existência de “paren-
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tesco funcional” entre os dois tipos de monólitos decorados. Tal realidade não sofreu alteração de fundo, desde o trabalho de M. C. Sevillano de 1991, até o presente, no que às estelas antropomórficas diademadas diz respeito, admitindo-se a sua efectiva conotação funerária com necrópoles de cistas da Idade do Bronze, de incineração e/ou de inumação, mas nunca com monumentos megalíticos. Deste modo, sendo certo que as últimas produções desta sequência se inscrevem no Bronze Final/I Idade do Ferro, conclui-se que a proposta de faseamento de M. Almagro-Gorbea de 1993 mantém plena actualidade, até pela lógica interna a ela associada: teríamos, assim, uma filogenia contínua para as estelas femininas diademadas que se iniciaria nos finais do Calcolítico/Bronze Antigo, passando pelo Bronze Pleno, e atingindo, mais de mil anos depois, o seu último estádio, no Bronze Final/I Idade do Ferro, coexistindo com as estelas ditas “extremeñas” ou afins. Distribuição geográfica, incidências sócio-económicas A distribuição geográfica das estelas diademadas tem sido conotada com recursos mineiros. Com efeito, a província de Cáceres, onde se concentram as ocorrências de estelas diademadas (Barceló, 1988, Fig. 11), com prolongamento pela de Salamanca – correspondente grosso modo ao designado grupo Hurdes-Gata, ou, conforme preferiram depois P. Bueno-Ramírez et al. (2005), ao Grupo Centro-Ocidental – é uma área rica em jazidas de ouro e estanho aluvionares (Sevillano, 1982), a que se junta o cobre (Barroso et al., 2003, in Bueno Ramírez et al., 2004 b) (Estampa 7). A referida riqueza mineira explica a presença, na mesma região, de produções metálicas do final do Calcolítico e dos primeiros estádios da Idade do Bronze, inventariadas por R. Barroso Bermejo e colaboradores (2002/2003). E, já anteriormente, M. Almagro-Gorbea (1977, p. 200) tinha relacionado a proximidade de algumas estelas diademadas da província de Cáceres (Robledillo de Gata, Hernán Pérez) a jazidas auríferas, assinalando também naquela região jazidas de cobre e prata, concluindo ser possível a sua relação com sociedades mineiras cuja hieraquização se encontrava comprovada pela existência das próprias estelas: “Así estas estelas corresponderían a jeracas de grupos sociales, evidentemente mineros, cuya sacralización explicaria su relación original com el tipo de ídolo com el cual parecen estar relacionados originariamente estas representaciones” ( Almagro-Gorbea, 1977, p. 201). Esta afirmação afigura-se também aplicável à região setentrional da península Ibérica, onde ocorre um outro grupo de estelas antropomórficas, de assinalável coerência iconográfica (Tabuyo del Monte, Collado de Sejos, Peña Tú, Garabandal), conotável, pela tipologia, com as produções consideradas mais recuadas da série das estelas do grupo Hurdes-Gata. Nestes termos, o exemplar da Quinta do Couquinho (Moncorvo), igualmente de tipologia recuada no contexto evolutivo que se descreveu, ocupa posição geográfica intermédia entre os dois grupos, enquanto a estela de A-de-Moura se integra, do ponto de vista geográfico, no grupo de Hurdes-Gata, conclusão
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sublinhada pelas assinaláveis analogias com alguns daqueles exemplares. A situação geográfica dos achados portugueses de Crato e Arronches, e também do agora dado a conhecer, corresponde, por seu turno, à periferia ocidental do referido grupo, constituindo, sob o ponto de vista estritamente formal, os exemplares mais antigos da série, pela simplicidade iconográfica evidenciada e, deste modo, os mais próximos do grupo setentrional (Tabuyo del Monte, Peña Tú, Garabandal), embora estando muito afastados geograficamente destes últimos (Estampa 8). Tal realidade só pode explicar-se admitindo a existência de corredores de circulação transregional de orientação Norte-Sul, aliás assinalados graficamente de forma muito clara na Extremadura espanhola (Barroso Bermejo et al., 2002/2003), com expressão também no território português, situado mais a ocidente. Não se percebe, consequentemente, face à localização geográfica dos exemplares de Crato e de Arronches, que os mesmos tenham sido incluídos no Grupo Setentrional por P. Bueno Ramírez et al. (2005). Deste modo, admitindo a maior antiguidade dos exemplares alentejanos portugueses de Crato e de Arronches (embora neste com as reservas acima expostas), incluindo o agora estudado, face ao núcleo principal de estelas diademadas, situado a mais de 100 km a NE e onde, em contrapartida, são escassas as peças de características similares, fica por explicar a razão de, no actual território português, não se ter desenvolvido uma filogenia como a observada nas províncias de Cáceres e Salamanca, exceptuando o exemplar isolado do Castro de Barrega, Celorico de Basto, o qual, por possuir uma iconografia mais completa, no quadro das estelas femininas, é reportável ao Bronze Pleno. É provável que a escassez deste tipo de estelas no nosso território se deva à também menor disponibilidade de recursos mineiros, do que resultaria uma menor presença humana, durante um lapso temporal reportável a todo o II milénio a.C. Com efeito, embora as conclusões do estudo de J. A. Barceló (1988), com base em métodos de análise estatística, tenham indicado que as estelas antropomorfas constituem, globalmente, um conjunto espácio-temporal homogéneo, a realidade parece sugerir uma segregação das produções mais antigas fora daquele núcleo principal, entre o final do Calcolítico e o Bronze Antigo. Da presente análise, ficaram excluídas as estelas com representação facial em baixo-relevo, que se integram em um grupo diferente e provavelmente mais antigo, de época calcolítica, representado pelo exemplar português de Moncorvo (Vasconcelos, 1910) e pelo exemplar granadino de Asquerosa (Paris, 1903, p. 85). As evidentes semelhanças entre ambos, ainda que situados em regiões muito afastadas entre si, sublinham a já referida existência das vias de circulação transregionais, de ainda mais ampla expressão, pois é possível relacionar os dois exemplares peninsulares citados com as numerosas estelas do Midi francês (estelas de Orgon e de Trets, entre outras), como muito bem já havia sido sublinhado no pioneiro trabalho de síntese de Octobon (Octobon, 1931, p. 467, 468), corporizando, assim, o cunho mediterrâneo de tais produções (Arnal, 1976).
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Agradecimentos À Doutora Raquel Vilaça, pelo convite endereçado para participar neste reunião internacional e pela bibliografia que providenciou. Ao Doutor M. Almagro-Gorbea, pelo envio de bibliografia que não foi possível obter em Portugal. Nota: Já depois de este contributo ter sido entregue para publicação, o autor teve conhecimento de dois estudos de autoria de M. J. Correia Santos, entretanto publicados nas revistas Herakleion, 2 (2009) e Madrider Mitteilungen, 51 (2010), abordando, entre outras temáticas relacionadas com as estelas diademadas, a questão da sua cronologia. Deixando para outra oportunidade a discussão dos argumentos expostos nestes dois artigos, deseja-se desde já declarar que, face àqueles, considera-se que se mantêm válidas tanto a cronologia proposta para a estela de Monte dos Zebros, como as considerações apresentadas sobre a periodização de tais monumentos. Quanto à estela de A-de-Moura, tratada especialmente no segundo artigo, corresponde a representação feminina como já se indicava no presente trabalho, embora se discorde da autora no que se refere à cronologia do Bronze Final, por ela defendida.
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estampa 1 - Localização da estela do Monte dos Zebros: em cima, na Península Ibérica; ao centro (estrela*), na região do Tejo internacional, com o respectivo enquadramento arqueológico (círculos: antas e mamôas; quadrados: vestígios de povoamento disperso; triângulos: recintos megalíticos, menires e rochas com covinhas, seg. Cardoso, 2008, modificado); em baixo: na Carta Militar de Portugal à escala de 1/25 000, Folha 258, com o enquadramento arqueológico imediatamente envolvente: 94: mamôa; 95: materiais romanos em dois núcleos de achados; 96: estela de Monte dos Zebros (seg. Henriques, Caninas & Cardoso, 1998).
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Estampa 2 - Campo agrícola de declive muito suave, com vasta visibilidade, onde se encontrou a estela, com abundantes blocos dispersos numa extensão aproximada de 50 m, configurando uma mamôa não megalítica, compatível com monumento da Idade do Bronze (fotos de M. Chambino).
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Estampa 3 - A estela de Monte dos Zebros. Vista frontal e pormenor da técnica de execução (fotos de J. L. Cardoso).
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Estampa 4 - A estela de Monte dos Zebros. Em cima: desenho da parte conservada; em baixo: representação da iconografia existente (desenhos de B. Ferreira).
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Estampa 5 - Pequenas estelas do território português comparáveis à de Monte dos Zebros, representadas por diversos autores. Estela do Crato, incompleta inferiormente: 1, seg. J. L. de Vasconcelos (1910); 2, seg. P. Bueno Ramírez et al. (2005); 3, seg. E. Anati (1968). Estela da Quinta do Couquinho (Moncorvo): 4, seg. E. Anati (1968); 5, seg. J. L. de Vasconcelos (1910). Estela de N. Srª. da Esperança (Arronches): 6, seg. H. Breuil (1917); 7, seg. E. Anati (1968); 8, seg. P. Bueno Ramírez et al. (2005). Note-se a variabilidade dos pormenores representados pelos diversos autores.
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Estampa 6 - Diversas representações com interesse comparativo com a estela de Monte dos Zebros: 1, Estela de A-de-Moura, Guarda (Silva, 2000), com explicitação do sexo feminino (atribuição nossa); 2, placa de xisto com representação de “colares” em ambas as faces, da gruta do Cabeço da Ministra, Alcobaça (Gonçalves, 1977); 3 e 4, duas representações da estela de Agallas, Salamanca: 3, seg. M. C. Sevillano S. José (1991), provida de uma alabarda, gravada ulteriormente ao lascamento frontal da estela; 4, seg. P. Bueno Ramírez et al. (2005), com explicitação do sexo feminino (atribuição nossa); 5, placa de xisto da anta de Vale Magro, Crato, com indicação do sexo feminino (atribuição nossa), seg. A. Isidoro (1971).
Estampa 7 - Possibilidades extractivas de cobre e de ouro (aluvial) na bacia do Médio Tejo, assinalando-se com estrela* a localização da estela de Monte dos Zebros, seg. Barroso et al. (2003).
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Estampa 8 - Localização aproximada na Península Ibérica das estelas antropomorfas. A de Monte dos Zebros assinala-se com estrela* . Seg. J. A. Barceló (1988).
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As estátuas-menires da serra da Nave (Moimenta da Beira, Viseu) no contexto da ocupação pré-histórica do Alto Paiva e da Beira Alta Domingos J. Cruz1, André Tomás Santos2
Resumo Publicam-se duas estátuas-menires identificadas na Chã das Lameiras (serra da Nave). Analisa-se o contexto paleoambiental e arqueológico. A ocupação da serra da Nave remontará aos finais do V milénio a. C., destacando-se nesta fase os numerosos monumentos megalíticos, por vezes reutilizados em períodos mais tardios. As estátuas-menires datarão dos finais do III milénio a. C. Esta proto-estatuária constituirá uma das formas de negociação do Poder entre as comunidades locais e regionais. Palavras-chave: Alto Paiva, Pré-história Recente, Paleoambiente, Estatuária, Terceiro milénio a. C. Résumé3 Nous publions deux statues-menhirs trouvées à Chã das Lameiras (plateau de Nave, région de Beira Alta au Portugal). Leur contexte paléo-environnemental et archéologique régional est analysé. L’occupation de la région débuterait à la fin du Vème millénaire av. J.-C. quand les premiers dolmens sont construits. Quelques uns ont été réutilisés au Chalcolithique et à l’Âge du Bronze. Ces statues-menhirs dateraient de la fin du IIIème millénaire av. J.-C. Elles pourraient, comme d’autres éléments, être d’importants supports de négociation du Pouvoir entre les communautés locaux et régionaux. Mots-clés: Haute Paiva, région de la Haute Beira, Portugal. Chalcolithique / Âge du Bronze, Paléo-environnement, Statues-menhirs, IIIème millénaire av. J.-C.
1 Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Departamento de História, Arqueologia e Artes. Centro de Estudos Pré-históricos da Beira Alta. 2 Centro de Estudos Pré-históricos da Beira Alta. 3 Agradecemos a Thierry Aubry a revisão deste resumo.
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Introdução Entre 1998 e 2002 decorreu na região do Alto Paiva um projecto de investigação sobre a ocupação antiga do território. O projecto integrou trabalhos de prospecção, de inventário e de escavação arqueológica, em jazidas tumulares e habitacionais. Neste contexto foram estudados vários sepulcros com tumulus, datáveis do Neolítico Final à Idade do Bronze, e dois povoados, um dos finais da Idade do Bronze, outro dos inícios da Idade do Ferro. A ocupação do período medieval baseou-se em trabalhos de prospecção arqueológica4. O referido programa de investigação visava também o conhecimento da evolução ambiental e ecológica da região a partir do estudo de macro-restos vegetais (madeira, sementes e frutos) e partículas finas (pólenes), existentes nos solos soterrados com a construção de monumentos tumulares, depósitos sedimentares e solos antropogénicos, bem como avaliar o impacto da presença humana na paisagem e inferir aspectos de ordem económica e social que permitissem compreender as sociedades que, ao longo de milénios, se instalaram na região. Os resultados de alguns destes trabalhos, normalmente circunscritos às amostragens de cada estação, temporalmente delimitadas, foram entretanto divulgados. Os trabalhos de prospecção de arqueológica permitiram a inventariação de cerca de três centenas de jazidas (Cruz, 2001; Valinho, 2003; Canha, 2002; Vieira, 2004, 2005-2006; Loureiro, 2003). Neste cômputo incluem-se as duas estátuas-menires que agora se divulgam mais extensamente. Caracterização geográfica da região A sub-região do Alto Paiva situa-se no norte da Beira Alta. Identifica-se com a área de influência da bacia superior do rio Paiva — afluente da margem esquerda do Douro —, e os planaltos que se desenvolvem em torno da designada “serra da Nave”, expressão que, de facto, se identifica com os “níveis culminantes” do conjunto de superfícies de aplanação que caracterizam a região. A serra do Montemuro constitui o limite mais ocidental desta área planáltica; o rio Távora, o limite oriental. Administrativamente integra sobretudo os concelhos de Vila Nova de Paiva e de Moimenta da Beira, mais restritamente, Castro Daire e Tarouca, e muito parcialmente, a leste, as áreas confinantes de Tabuaço e Sernancelhe, bem como, a sul, entre o Paiva e o Vouga, a área serrana dos concelhos de Sátão e Viseu (Estampa 1). O relevo da região é o resultado de múltiplos processos de erosão; destaca-se a 4 O projecto, intitulado “O Alto Paiva: sociedade e estratégias de ocupação do território desde a Pré-história Recente à Alta Idade Média”, foi subvencionado pelo Instituto Português de Arqueologia, no âmbito do Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos. A equipa de investigação, coordenada por D. J. Cruz, integrou jovens investigadores, antigos alunos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra: Alexandre Jorge Canha, Alexandre Valinho, Marina Afonso Vieira e Sílvia Loureiro. Neste contexto foram concretizadas sete dissertações académicas, de doutoramento e de mestrado, e publicados múltiplos trabalhos, alguns dos quais se referenciam ao longo deste texto.
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designada “superfície fundamental”, pelo bom estado de conservação e extensão, que no Alto Paiva se enquadra entre os 750 m e os 900 m de altitude. A serra da Nave compreende um grupo de relevos que se levantam um pouco acima dos 1000 m de altitude: Leomil (1008 m), Laje Branca (1012 m), Nave (1016 m), etc. É provável a existência de um terceiro nível de aplanação — a “superfície inferior” ou “superfície de Pendilhe”. Este conjunto de episódios, sobretudo o nível intermédio de aplanação —”superfície fundamental” —, marca o comportamento do relevo da região. Os planaltos, extensos, são interrompidos por circunscritos relevos mais elevados, como os já mencionados, e outros, entre a Nave e a serra do Montemuro (Ferreira, 1978). Geologicamente a região é dominada pelos granitos, de idade hercínica, e as litologias xistentas, ante-ordovícicas, conhecidas na literatura geológica portuguesa sob a designação de “complexo xisto-grauváquico ante-ordivícico e séries metamórficas derivadas”. Os filões de quartzo são bastante expressivos, por vezes assumindo a forma de cristas, muito evidentes na paisagem por força dos processos de erosão diferencial. São escassas as litologias mais recentes, o que se justificará pela morfologia dos vales da região, normalmente profundos e pouco entalhados; conhecem-se, de qualquer modo, alguns depósitos de terraço, de idade plistocénica, e depósitos aluvionares, restritos e pouco espessos, já do Holocénico (Schermerhorn, 1956, 1980; Ferreira e Sousa, 1994). A área considerada faz parte, principalmente, da bacia hidrográfica do Douro. Os relevos que constituem os maciços do Caramulo e da Gralheira, associados ao Montemuro, constituem importante barreira natural. Os valores de precipitação anual variam entre 2500 mm e 3000 mm nos cimos aplanados da serra do Montemuro, 1600 e 1400 mm, no vale do Paiva e sector sudeste do referido maciço (Castro Daire, Vila Nova de Paiva e Sátão). Climaticamente a região insere-se na área de influência das massas de ar do Atlântico, com um clima “marítimo de transição”, alternando, nas altas montanhas e depressões topográficas mais acentuadas, com um clima de feição continental: os verões são moderados a quentes (estes sobretudo nas vertentes do Douro e altas montanhas) a muito quentes, no vale do Douro; os invernos são generalizadamente frios e muito frios, e frescos nas margens do Douro (Daveau, 1977; Ribeiro, Lautensach e Daveau, 1988) (Estampa 1). O revestimento vegetal da região é contrastante, em função da altitude e o regime pluviométrico, opondo as vertentes e o fundo dos vales, mais arborizados e verdejantes, ao planalto; neste contexto, é também importante o substrato (granitos/ xistos e grauvaques), a que se liga a potencialidade dos solos; o contraste é também claro entre as encostas viradas ao Paiva, pelo menos até à povoação da Ermida, e as que se relacionam com o Douro. O Alto Paiva integra actualmente a zona fito-ecológica SA.MA (Subatlântica/ Mediterrâneo-Atlântica), que se caracteriza pela presença da Betula celberica (vidoeiro), Castanea sativa (castanheiro), Pinus pinaster (pinheiro bravo), Pinus pinea (pinheiro manso), Quercus pyrenaica (carvalho negral), Quercus robur (carvalho alvarinho),
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Quercus suber (sobreiro) e Taxus bacata (teixo)5. Seguindo a classificação por andares bioclimáticos (vegetação potencial), a região faz parte da província Cantabro-Atlântica, subprovíncia Galaico-Asturiana, sector Galaico-português, subsector Miniense, com carvalhais mesotemperados e termotemperados do Rusco-aculeati-Quercetum roboris quercetosum suberis, que inclui igualmente formações de urze, giesta e tojo (Costa et al, 1998: 13). Mais restritamente integra o superdistrito Beiraduriense, com as associações de carvalhais de carvalho negral (Holco-Quercetum pyrenaicae), giestais (Lavandulo sampaioanae-Cytisetum multiflori e Cytiso striati-Genistetum polygaliphyllae), urzais-tojais (Ulci minoris-Ericetum umbellatae), prados de lima (Anthemido-Cynosuretum cistati) e juncais (Peudedano Juncetum acutifori) (idem, ibidem: 14). Uma parte significativa do território está ocupada com matas e incultos, estes até há pouco utilizados extensivamente como baldios, principalmente para a criação de gado miúdo (ovelhas e cabras) (Medeiros, 1976, 1982). A transumância dos gados das vizinhanças da serra da Estrela, seguindo trajectos há muito definidos em direcção ao Montemuro, era prática corrente até há pouco (Ribeiro, 1948; Dias, 1951, 1965). A recorrência de incêndios tem constituído o principal factor de devastação do coberto arbóreo. A rearborização baseia-se em monoespecíficas, sobretudo o pinheiro marítimo (Pinus pinaster), mais recentemente também o eucalipto (Eucaliptus sp.) A paisagem antiga O reconhecimento do quadro paleombiental da região do Alto Paiva é possível com base nos dados polínicos das seguintes estações arqueológicas: Orquinha dos Juncais (Queiriga) (López Sáez e Cruz, 2002), Orca das Castonairas (Fráguas) (López Sáez e Cruz, 2002-2003), monumentos 1 e 2 de Lameira Travessa (Pendilhe) (Castro et al, 1999; López Sáez et al, 2001a), Canedotes (Vila Cova-à-Coelheira/ Touro) (López Sáez et al, 2000, 2001b), Castro de Vila Cova-à-Coelheira (Vila Cova-à-Coelheira) (López Sáez et al, 2002-2003) e depósito sedimentar da Chã das Lameiras (Peravelha, Moimenta da Beira) (Cruz, 2001). De algumas destas estações, e outras, dispõe-se igualmente de dados relativos à identificação de carvões vegetais (Figueiral, 2001). Os vários estudos paleobotânicos realizados na região permitem-nos caracterizar a evolução da cobertura vegetal da região durante o período Holocénico: paisagem aberta, com prados extensos (Gramineae), clima seco e frio durante o Boreal (9000-8000 BP) e fase inicial do período Atântico (8000-6500 BP), evoluindo para o bosque de carvalhos, por vezes assumindo o aspecto de uma paisagem florestal densa, com prados mais reduzidos, em ambiência de clima húmido e quente; no Sub-Boreal (5000-2700 BP), com um clima seco e frio, assiste-se a fases de desflorestação e de recuperação do carvalhal; a intervenção humana é agora mais incisiva, nomeadamente através da utilização do fogo; a vegetação arbustiva instala-se; o período paleoclimático Sub-Atlântico (2700-), observável nomeada5 “Carta Ecológica, Fito-edafo-climática”, Comissão Nacional do Ambiente, Lisboa, 1984.
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mente no perfil polínico da Chã das Lameiras, evidencia importante intervenção humana; caracterizar-se-á genericamente pela regressão significativa do carvalhal — resultante da actividade humana —, e avanço dos matos de cistáceas e ericáceas; ocorrem incêndios, de nível local e regional; verificam-se indicadores de esgotamento e erosão dos solos. A Chã das Lameiras Os relevos mais elevados da série de superfícies de aplanação que caracterizam o Alto Paiva — “níveis culminantes” — delimitam uma ampla depressão — a Chã das Lameiras. Trata-se de um típico vale de montanha, amplo e de fundo chato (Ribeiro, 1951). Situam-se aqui as nascentes do rio Varosa (ribeiro da Nave e subsidiários). Em alguns sectores os sedimentos acumulados terão cerca de 3 m de possança. A drenagem é actualmente muito limitada. Os terrenos são alagadiços, apesar da exploração mais intensiva dos recursos hídricos e drenagem de algumas áreas com vista ao aproveitamento agrícola. A formação do depósito sedimentar estará associado a processos erosivos, de carácter periglaciar, dos finais do Tardiglaciar, depois, com alterações climáticas do período Holocénico, a que se deve ligar também o elevado índice de alterabilidade das rochas graníticas de base (arenização). Na periferia da Chã das Lameiras, nos relevos circundantes que a definem, como também sobre os depósitos que preenchem a depressão, foram construídos vários monumentos com tumulus, cuja cronologia se situará em torno de 5000 BP (4000/ 37003650 cal. AC). Destacam-se, pela volumetria, os monumentos designados Orca Grande, Orca de Seixas, Fonte do Rato, Orca da Carqueja, Quinta dos Caetanos, etc. (Cruz, 2001). O sítio foi frequentado em épocas posteriores; perto localizam-se dois amuralhados (Penedo da Pena; Castelo de Ariz), de cronologia indefinida, mas de idade pré-histórica, podendo remontar ao período Calcolítico; serão também deste período e da Idade do Bronze algumas sepulturas com tumuli baixos e muito baixos e cista central, de planta poligonal e rectangular (Cartaixos, Labiada das Touças; Bebedouro 1 e 2; Torrão 3; etc.); o dólmen de Seixas, escavado por V. Leisner e datável dos inícios do IV milénio cal. AC, revelou, aliás uma reutilização importante com vasos campaniformes e ponta de lança de tipo Palmela; sítios de carácter habitacional, sobranceiros à depressão, ou áreas imediatas, datarão de diferentes momentos do Calcolítico e da Idade do Bronze (Chã das Lameiras; Cova do Sol; Penedo do Cão; etc.); foram também identificadas estações da Idade do Ferro e do período medieval, umas mais imediatas, outras mais distantes (Valinho, 2003; Vieira, 2004, 2005-2006). Acrescem outros achados, avulsos, o que apontará para a frequentação desde a Pré-história da área de influência da Chã das Lameiras, como também, mais generalizadamente, de toda a região do Alto Paiva. De facto, a ocorrência de vestígios arqueológicos, de todas as épocas, é aqui recorrente (Cruz, 2001) (Estampas 2, 3 e 4). As duas estátuas-menires da Chã das Lameiras foram localizadas no rebordo deste vale de montanha, cujo eixo maior se orienta segundo a direcção SE.-NO. Considerando as “terras baixas”, delimitadas pelos relevos circundantes, esta depressão, receptora de
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múltiplas pequenas linhas de água, comportará cerca de 25 km2. Os solos são espessos, a propriedade é pouco dividida, o que favorece a prática de uma agricultura mecanizada (cereais, como o milho e o centeio; batata de semente; feno para o gado), como também a criação de gado bovino, para além da tradicional criação de gado ovino e caprino, neste caso nas terras adjacentes aos lameiros (Medeiros, 1982, 1985; Roux, 1998). Cada uma das estátuas ocupa os “limites” desta ampla depressão, distando uma da outra cerca de 2,5 km. Uma, fincada no terreno (margem direita do ribeiro da Nave), encontrar-se-á in situ. A outra (margem esquerda do mesmo curso de água) foi identificada deslocada, mas relativamente próxima do local inicial de implantação (imediações da pequena povoação da Nave, antes designada Quinta dos Caetanos). Localização geográfica Administrativamente ambas as estátuas pertencem ao concelho de Moimenta da Beira, distrito de Viseu. A estátua Nave 1 situa-se em território da freguesia de Peravelha, enquanto que a estátua Nave 2 pertence já à freguesia de Alvite. Coordenadas geográficas: Nave 16 Coordenadas geográficas: latitude — 40° 56’ 23” N.; longitude — 01° 27’ 31” E. (Lisboa). Altitude — 955 m. Cartografia: “Carta Militar de Portugal, na escala de 1/25.000”, fl. 148 (Moimenta da Beira), 2.ª ed., 1984. Nave 2 Coordenadas geográficas: latitude — 40° 56’ 23” N.; longitude — 01° 27’ 31” E. (Lisboa). Altitude — 950 m. Cartografia: “Carta Militar de Portugal, na escala de 1/25.000”, fl. 148 (Moimenta da Beira), 2.ª ed., 1984. (As coordenadas deste monumento dizem respeito ao local onde foi localizada, que não é o original). Ambos os monumentos foram inicialmente descritos (Cruz, 2001) sob a designação, respectivamente, de: “Estátua-menir Nave 1” (p. 390, n.° 208, mapa 6, est. 62) e “Estátua-menir Nave 2” (p. 390-391, n.° 209, mapas 6-7, fig. 54, est. 63-65). Metodologia7 O desenho de ambas as peças resulta do registo das suas secções e de decalques efectuados durante a noite com o auxílio de iluminação artificial. Esta estratégia permite o controlo do ângulo de iluminação que proporciona a legibilidade adequada 6 A estátua 1 foi identificada por uma equipa de técnicos da firma Arqueohoje, Ldª, que então realizava trabalhos de escavação e valorização da Orca de Seixas (Moimenta da Beira). Os referidos trabalhos integraram o projecto de investigação sobre o Alto Paiva, coordenado por um dos autores (D. J. Cruz). Aguarda-se a publicação do correspondente relatório. 7 Nos trabalhos de levantamento da estátua 1 contámos com a colaboração de João Nuno Marques. No caso da estátua 2 fomos coadjuvados por João Perpétuo e Artur Serra. A finalização dos desenhos de cada uma das peças, em gabinete, deve-se a José Luís Madeira, técnico superior do Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. A todos devemos o nosso agradecimento.
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ao que se quer registar. Desta forma, a luz deverá incidir de forma rasante e perpendicular relativamente ao desenvolvimento dos sulcos a levantar. O decalque foi feito sobre plástico de cristal de espessura adequada colocado directamente sobre cada uma das faces historiadas. Sobre ele, recorrendo-se a um código de cores, foi registado o que considerámos pertinente para a compreensão das peças. O negro foi utilizado para tudo o que é de origem antrópica de cronologia pré-histórica e o azul nas gravações históricas (situação apenas observada na estátua 2); os limites das faces foram definidos com uma caneta vermelha de ponta M; canetas da mesma cor de ponta F serviram para documentar as estruturas naturais das peças (relevos, fissuras, etc.). Paralelamente desenharam-se também as secções das peças. Estas definiram-se a partir de um eixo paralelo às orientações dos seus lados maiores e foram desenhadas à escala de 1: 20. Os desenhos publicados resultam da mistura de ambos os documentos e da visualização de fotografias. A sua apresentação em pontilhado prende-se com o facto de — como se demonstrará seguidamente — a volumetria das peças, em particular da estátua 2, ser sumamente relevante. A fotografia foi efectuada sobre suporte digital e película a preto e branco, cor e diapositivo. As estátuas-menires da serra da Nave Nave 1 (Estampas 5 e 7) Bloco de granito, irregular, genericamente paralelepipédico, com os cantos superiores arredondados; anverso e lados alisados; reverso grosseiro, sem tratamento particular, denotando, ao invés, o aproveitamento das irregularidades da pedra. A peça encontra-se fincada no terreno, provavelmente fracturada ao nível da base, com a face principal orientada para E.NE. Dimensões: altura (acima do terreno) — 1,36 m; largura — entre 0,56 m e 0,42 m (medida no anverso); espessura — 0,31-0,24 m (base) e 0,10 m (topo). A superfície insculturada é definida por um sulco horizontal, junto à base, aplicado nas faces e lados, embora seja menos nítido no reverso; sob este sulco definem-se pequenos lascamentos, de contorno ovalado e circular, de técnica distinta da utilizada nas restantes insculturas; tratar-se-á de estalamentos resultantes de processos de erosão; admite-se que a estátua estivesse enterrada quase até ao sulco delimitador, situação que poderá justificar estas fracturas com pátina distinta, sendo neste caso de cronologia posterior ao levantamento da escultura. A face principal do monumento é dominada por uma figura trapezoidal, alongada, com os lados maiores côncavos; a base é levemente convexa; a parte superior é igualmente côncava, com os vértices acentuados. Esta figura central é encimada por um rectângulo, possível representação do pescoço, sobre o qual assenta a cabeça. Seis sulcos, contornando a totalidade da peça, têm origem nos lados maiores e nos vértices superiores da figura trapezoidal; no reverso, estes sulcos associam-se a outros dois — gravados imediatamente acima do traço horizontal que delimita a área
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historiada —, que se observam apenas nesta parte da escultura. Os sulcos do reverso apresentam-se sequencialmente encurvados no sentido da cabeça, por vezes aproveitando as irregularidades da superfície da pedra, sugerindo aplicações do vestuário (“folhos”/ “pregas”, “correias”, algo “repuxadas” para cima). Por fim, referenciamos um sulco no lado esquerdo do anverso — que não existe no lado direito — e que se liga à primeira “prega” do reverso. A estátua-menir 1 da Nave não mostra armas, mas este sulco, em certo sentido, lembra a representação da “bandoleira” de algumas estátuas com iconografia similar, mas armadas. Cabeça subtrapezoidal, delimitada por dois sulcos que partem dos vértices superiores da figuração rectangular, parecendo terminar no reverso junto do último sulco da sequência antes referida. Representação dos olhos, através de duas cavidades, pouco fundas, algo erodidas. O nariz é insinuado com a superfície alteada da parte central da face (relevo natural incorporado na escultura). Técnicas: escultura (desbaste, por vezes sumário, do bloco e incorporação dos relevos naturais na figuração humana); da gravação, por picotagem seguida de abrasão, resultaram os sulcos largos dos elementos que identificam o personagem (“insígnia”; “aplicações do vestuário”, “olhos”); a representação do indivíduo passa pela obtenção de uma forma (escultura), mas também pela representação dos atributos identitários (gravação). Nave 2 (Estampas 6 e 8) Bloco de granito, paralelepipédico, muito regular; anverso e reverso finamente alisados; arestas marcadas, angulosas; reverso irregular, sem trabalho de afeiçoamento. Dimensões: altura — 2,33 m (base partida); largura: anverso — 0,53 m/ 0,49 m; lados — 0,38 m/ 0,24 m (lado direito); 0,36 m/ 0,23 m (lado esquerdo): reverso — 0,49 m/ 0,55 m; espessura: 0,38 m/ 0,24 m (lado direito); 0,36 m/ 0,23 m (lado esquerdo). O bloco apresenta na parte inferior um veio de quartzo, muito regular, rectilíneo, criando uma leve saliência por efeito da erosão diferencial (eventualmente, também, do trabalho de alisamento das superfícies da pedra); esta ocorrência natural terá servido para delimitar a área insculturada (1,70 m de extensão acima do veio), como também, talvez, o limite para a sua fixação no terreno; a base está fragmentada, pelo que admitimos que, originalmente o bloco pudesse atingir cerca de 2 m de altura. A peça, quando localizada, servia de pilar que, com outros, delimitavam propriedade rústica8. Originalmente situar-se-ia nas proximidades da antiga Quinta dos 8 O monólito encontrava-se enterrado pela parte da cabeça. Observavam-se então os sulcos que definem a parte inferior da “insígnia” do anverso e a banda larga, obtida por rebaixamento, que corresponde ao cinturão. Não se identificaram quaisquer gravuras no reverso, a não ser algumas pontuações do cinturão. Estas observações iniciais foram feitas sem qualquer limpeza da superfície da pedra. Posteriormente, após a deslocação do monólito, não foi possível, por vicissitudes várias, limpar e observar mais atentamente esta parte da peça (reverso). Assim, ressalvamos a possibilidade desta estátua poder possuir qualquer outra gravura nesta parte do monumento, que só será possível analisar quando, resol-
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Caetanos (actual povoação da Nave), na margem direita do ribeiro da Nave. A sua localização no terreno — periferia das “terras baixas” — é similar à da estátua 1, em posição de dominância sobre os lameiros imediatos. Tal como naquela, também aqui podemos considerar que se trata de área de acesso natural à Chã das Lameiras. A antropomorfização do bloco foi conseguida com a aplicação de atributos da figura humana e indumentária, segundo as técnicas da escultura, gravação, baixo e alto relevo. Personagem vestido, com “manto”/”toga” ou outra vestimenta, em que se destaca uma figura trapezoidal que percorre a face principal do bloco; esta representação foi conseguida, na parte superior, por rebaixamento lateral da superfície da pedra, e, na parte inferior, com sulcos bem marcados mas pouco fundos; esta figuração apresenta-se, assim, parcialmente em relevo. A meio, em sentido transversal, define-se um cinturão, neste caso por rebaixamento circunscrito da superfície da pedra, onde foram aplicados vinte e quatro pequenos orifícios, percorrendo o anverso e os lados, com alguns destes elementos ainda no reverso, mas apenas junto ao ponto de inflexão do lado direito; o cinturão está cingido ao corpo; a figura trapezoidal surge, assim, mais estreita na parte superior, sugerindo um “manto”, ou “traje”, com a referida insígnia que, apertado com o cinturão, cai solto abaixo da cintura. A peça de vestuário com que a figura é representada é lateralmente decorada: triângulos, no anverso, e linhas quebradas, paralelas, no lado direito, lembrando o motivo em “espinha de peixe”; de facto, um sulco longitudinal une as diferentes linhas quebradas pelo ângulo de inflexão; igual efeito é conseguido com a aresta formada pela face principal e este lado da peça. Observou-se na parte inferior desta figura central, sensivelmente a meio, uma covinha; sobre esta, igualmente uma “cruz”, obtida com técnica distinta da generalidade das gravações, pelo que terá sido executada em período histórico, em contexto de cristianização do monumento e eventual reutilização como marco territorial. Na parte superior do anverso define-se a cabeça. Face subtriangular na qual foram gravados os olhos (incluindo o saco lacrimal), o nariz e a boca. O limite superior desta é definido por uma linha horizontal, encimada por outra semicircular; observam-se ao nível da face, de cada um dos lados, dois adereços semiesféricos, interpretáveis como elementos de fixação dos “colares” que se dispõem abaixo da face; em ambos os lados da cabeça dispõem-se vários sulcos e dois adereços do cabelo, de contorno semicircular; no alto da cabeça, imediatamente acima da testa, vêem-se dois sulcos largos que se associam a covinha, eventual “jóia”/”alfinete de fixação”, etc.; a forma desta parte da estátua, como também o conjunto de adornos/ elementos de fixação, sugerem um “toucado” bastante elaborado. Sobre o peito, logo abaixo da face, dispõem-se quatro semicírculos, representando possíveis colares; estes sobrepõem-se à figura trapezoidal, sendo presos lateralmente, ao nível da face, com adereço circular. vidas questões de propriedade, for removida do sítio em que se encontra e colocada em posição vertical.
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Tecnicamente, esta peça revela maior grau de complexidade que a anteriormente descrita. A escultura é visível no trabalho do bloco, mas sobretudo ao nível da cabeça e adornos que a ornamentam; o cinturão combina o rebaixamento da superfície com a gravação de covinhas por picotagem; esta última técnica foi utilizada também para a decoração lateral; por sua vez, o sulco definidor da cabeça e toucado, os atributos faciais, os adereços do cabelo e os colares foram picotados e posteriormente polidos; os adornos para prender os colares apresentam-se em alto-relevo9; por sua vez, a figura trapezoidal combina o alto-relevo com a gravura modelada10. As estátuas-menires da Nave revelam similitudes, mas também algumas diferenças, que assinalamos. Ambas são feitas em blocos de granito, mas de textura e qualidade diferenciadas. A estátua 1 foi elaborada num bloco de granito de grão médio a fino. As superfícies expostas são mais irregulares, sobretudo o reverso, onde são visíveis os negativos de vários lascamentos e fracturas; a alteração superficial do granito é evidente. O bloco é de qualidade inferior para a execução de uma boa escultura, pelo menos na perspectiva actual. A estátua 2 foi trabalhada em bloco de granito, mas de grão fino — por vezes com cristais de quartzo muito visíveis —, cujas superfícies se apresentam bem conservadas. A pedra de granito utilizada é de qualidade superior. Tecnicamente a estátua 2 revela um trabalho mais apurado, ao nível do afeiçoamento do bloco, regularização das superfícies, trabalho de pormenores, destacando-se a cabeça e o tronco. O suporte é profundamente alterado para se representarem, em relevo, os diferentes adereços. A estátua 1, ao invés, revela um trabalho de escultura mais ligeiro, ocorrendo mais francamente a integração dos relevos, fracturas e outras irregularidades da pedra na figura que se pretende representar. Os “folhos”/ “pregas” da face posterior, por exemplo, são “repuxados”, surgindo em relevo por efeito do acompanhamento das irregularidades e fracturas da pedra. A cabeça resume-se a forma genericamente subtrapezoidal com a representação sumária dos olhos (cavidades naturais, eventualmente acentuadas), insinuação do nariz (pequeno relevo natural), sem representação da boca. Iconograficamente ambas representam figuras vestidas, cuja vestimenta (“manto”/”toga”) foi adornada, ora com aplicações de vestuário (“pregas”/”folhos”, na estátua 1), decoração do próprio tecido ou igualmente aplicações, de carácter geométrico (estátua 2), sobre a qual se apunha (ou integrava) figura trapezoidal (“insígnia”), gravada na estátua 1, em relevo e parcialmente gravada na estátua 2. As diferenças 9 Como refere Claude Barrière, os termos técnicos utilizados para descrever as manifestações escultóricas mais recente não se devem aplicar às de cronologia pré-histórica. Para este autor, alto-relevo em arte pré-histórica corresponde a um motivo cuja espessura ultrapassa a metade do volume do modelo representado (Barrière, 1993, 275), situação que julgamos encontrar aqui. 10 “Gravure modelée: lorsque le contour de la figure cernée para la gravure est plus ou moins arrondi.” (Barrière, 1993, 275, itálico no original).
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mais notórias registam-se ao nível da cabeça: muito simples, sem que se destaque excessivamente do bloco, na estátua 1; com toucado, adereços do cabelo, objectos de fixação de possíveis colares, etc., na estátua 2, destacando-se, sem dúvida, a expressividade da própria figura, com a representação mais naturalista desta parte do corpo, situação que também se pode ver na “insígnia” peitoral que, abaixo do cinturão é mais larga que na parte superior, por efeito decerto da pressão exercida pelo cinturão sobre o traje. As diferenças não quererão dizer distanciamento no tempo, ou, pelo menos, excessivo distanciamento. Consideramo-las genericamente contemporâneas, atribuíveis ao Bronze Antigo/ Médio, recorrendo-se para este efeito às estátuas-menires com iconografia similar em que é possível observar armas, cuja cronologia é conhecida. De facto, as diferenças poderão justificar-se se atendermos à diferente qualidade dos suportes, perícia do artífice, panóplia ampla de atributos na representação da figura humana, que também poderá passar por questões de género (masculino/ feminino). As estátuas da Nave no contexto pré-histórico peninsular As estátuas da Nave permitem estabelecer uma ampla rede de relações ao nível da Península Ibérica, quer sejam técnicas, iconográficas ou contextuais. Uma aproximação neste sentido foi já ensaiada quando da publicação da estátua-menir de Ataúdes (Figueira de Castelo Rodrigo, Guarda) (Vilaça et al, 2001) —uma escultura com arma(s) —, pelo que nos escusamos de o repetir excessivamente aqui. Mas de facto perpassam por um conjunto numeroso de peças atributos comuns. Destaca-se a figura trapezoidal, normalmente interpretada como “insígnia” de autoridade (Almeida e Jorge, 1979, 18; Jorge e Jorge, 1993: 41; Almagro Gorbea, 1993: 126; López Plaza et al, 1996: 289; Cruz, 2001: 176; Vilaça et al, 2001: 76), que se colocava sobre o vestuário (ou o integrava). Como se acentua naquele trabalho, a maior parte das estátuas-menires conhecidas com este atributo revelam-no na face principal da estátua (anverso): Longroiva, Meda, Guarda (Almagro, 1966; Rodrigues, 1983; Jorge, 1995), Ataúdes, Figueira de Castelo Rodrigo, Guarda (Vilaça et al, 2001), Boulhosa, Monção, Paredes de Coura (Vasconcelos, 1910: 32), Preixana, Lérida, Astúrias (Duran i Sempere, 1970; Maluquer de Motes, 1971), etc. Nas estátuas-menires de Chaves (Jorge e Almeida, 1980: 10) e de S. João de Ver, Vila da Feira, Aveiro (Jorge e Jorge, 1993: 41), com uma cronologia mais tardia, sobretudo a última, foi aplicado no reverso. Em outras, como Faiões, Chaves (Almeida e Jorge, 1979) e Bouça, Mirandela (Sanches e Jorge, 1987) é difícil a sua atribuição ao anverso ou ao reverso. Este atributo associa-se por vezes a armas — alabardas, punhais, espadas, outras armas (ou objectos encabados) —, que permitem a definição de uma cronologia adentro da Idade do Bronze, sobretudo Bronze Antigo e Médio. Na estátua de Valdefuentes de Sangusín, Salamanca (Santonja Gómez e Santonja Alonso, 1978), a “insígnia” está ausente sendo “substituída” por um punhal e uma alabarda, cuja tipologia permitirá considerar uma cronologia do Bronze Médio.
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Tecnicamente a “insígnia” é gravada ou apresenta-se em relevo (ou parcialmente em relevo, como acontece em Nave 2). Destaca-se, neste sentido a estátua-menir da Boulhosa, aproximando-se neste aspecto de Nave 2, mas o tratamento sumário da cabeça e da face desta estátua aproximam-na mais de Nave 1. Em Longroiva e Preixana este motivo identifica-se com o próprio personagem. Trata-se de gravações em blocos menos trabalhados, embora a intenção fosse, como nas estátuas mais elaboradas, a representação tridimensional. Em Preixana, a correia que segura a espada, iniciando-se no vértice direito da figura trapezoidal, percorre toda a peça (lados e reverso), similarmente às estátuas mais antropomorfizadas (Ataúdes). Em algumas destas estátuas partem desta figura central uma série de sulcos, interpretados como os “folhos” ou “pregas” do “manto”/ “toga” do personagem, por vezes também interpretados como “correias” aplicadas sobre o vestuário ou a representação da “armadura” do personagem, sobretudo nas estátuas que apresentam armas. Não é este o caso das estátuas de Nave 1 e 2, mas ambas mostram o “manto” decorado: com os referidos “folhos”, percorrendo os lados e o reverso (Nave 1); tecido decorado com motivos geométricos (ou com aplicações), no anverso e lados (Nave 2). Tal atributo está presente em estátuas como Valdefuentes de Sangusín, Salamanca, Tremedal de Tormes, Salamanca (López Plaza et al, 1996), Los Santos, Salamanca (Bueno Ramirez, 1991), mas é absolutamente ausente em outra estatuária do Norte de Portugal. Indo para além do Norte peninsular e centro ocidental da península Ibérica, referenciamos a designada Estela de Millarón, Valência de Alcântara (Bueno Ramírez, 1991), que mostra os referidos “folhos” (pelo menos no lado esquerdo), que partem de uma figura central rectangular cuja parte inferior é adornada com “franjas”, cuja simbologia não será muito diferente da atribuída à figura trapezoidal/ armas que são apostas no anverso das estátuas antes referidas. A estátua de Agallas, Salamanca (Sevillano San José, 1991) poderá também aqui ser considerada se uma série de sulcos de contorno ovalado, envolvendo a cabeça e parte superior do tronco, forem considerados como os “folhos” de um manto e não tanto “colares”, como por vezes também se admite. A temática das linhas quebradas, eventualmente associáveis ao motivo “espinha de peixe”, é comum na cultura material do Calcolítico e da Idade do Bronze, para além da arte megalítica, de cronologia bastante anterior (pelo menos na perspectiva do megalitismo clássico). Ainda assim, referenciamos a estátua feminina da Ermida, Ponte da Barca, Viana do Castelo (Baptista, 1982, 1985) cuja parte superior do corpo é decorada em dupla espinha de peixe, segmentada a meio por linha incisa muito marcada. Outros elementos, como o cinturão, são recorrentes na estatuária de diferentes épocas e regiões da península Ibérica. Nem sempre estão presentes (Ataúdes, Agallas, Los Santos, Preixana, Millarón, etc.), como também, por vezes, o que se interpreta como “cinturão” poderá representar apenas a delimitação da área esculturada e visível quando da fixação da escultura no terreno, como acontece com a estátua Nave 1, Ermida, etc., ou apenas a marcação gráfica da cintura sem que haja recurso àquele adereço.
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Os cinturões mais elaborados, como o da Nave 2 (banda larga, em negativo, com a representação de “aplicações” (metálicas?), ou os que são delimitados por dois sulcos, definindo uma banda larga com série de perfurações circulares, são comuns na estatuária da Extremadura espanhola, sobretudo em exemplares das províncias de Salamanca e Cáceres, integrando o “grupo Hurdes-Gata” definido por Primitiva Bueno Ramirez (1987). De facto, neste conjunto de peças da Meseta ocidental encontramo-los quer sob a forma mais simples (Cerezal II, Cáceres), quer como cinturão largo (Hernán Perez II, Cáceres; Granja de Toniñuelo, Badajoz) (Bueno Ramirez, 1987, 1991; Bueno Ramirez e Balbín Behrmann, 1995). Na Beira Alta observa-se na estátua-menir de A-de-Moura, Guarda (Silva, 2000), neste caso um cinturão largo, bem definido, sem qualquer ornamentação, afim daquele grupo escultórico, mas igualmente na estátua do Alto da Escrita, Tabuaço, Viseu (Carvalho et al, 1999) — cinturão largo com perfurações. Os exemplares de Trás-os-Montes, a este e outros títulos, poderão igualmente ser aqui invocados — Vale da Vilariça (Sousa e Rebanda, 1993; Sousa, 1996) e Quinta de Vila Maior, Moncorvo (Custódio e Campos, 2002, 161-162). Os “toucados”, “colares”, adereços de fixação destes e adornos do cabelo, são igualmente bastante comuns na estatuária da Extremadura espanhola (Cerezal II, Cáceres; Hernán Pérez, Cáceres; Granja de Toniñuelo, Badajoz; Riomalo de Abajo, Cáceres; Robledilo de Gata, Cáceres), mas também em estátuas identificadas mais a norte, como Ciudad Rodrigo I e II, Salamanca. Os “colares” são, de qualquer modo, comuns a outra estatuária da Península Ibérica, e de diferentes épocas. Relativamente aos toucados será de lembrar, por outro lado, a existência de possíveis representações deste tipo de adereço no âmbito da arte esquemática pintada, devendo-se relevar o exemplo de Penas Róias, Mogadouro, Bragança (Almeida e Mourinho, 1981). Os múltiplos descritores que possam ser considerados neste tipo de peças conduzem-nos à evidência da conciliação na estatuária peninsular do Calcolítico e da Idade do Bronze — tal como nos exemplares da serra da Nave —, de elementos de origem muito diversa, traduzindo-se a Península Ibérica num espaço geográfico onde circulam amplamente pessoas, produtos e ideias. Se, por um lado, é possível observar particularidades de carácter regional, é também evidente a apropriação por estas comunidades de elementos transregionais, numa alargada tessitura de contactos, directos ou indirectos. Discussão Na maior parte dos casos, os discursos relativos à interpretação em Pré-história (quando os há) oscilam entre dois pólos aparentemente opostos: um, em que se pretende explicar tudo por via da economia; e outro por via do que, e à falta de melhor palavra, podemos designar como simbólico. A primeira das vias foi e é essencialmente percorrida pelos investigadores processualistas; na segunda podemos encontrar os pré-historiadores pós-processualistas. Estes, na sua generalidade, mesmo quando advogam a necessidade de uma visão
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ontológica dos problemas falham nessa abordagem. Digamos que privilegiando uma parte de um Mundo se abstraem do resto. Tentaremos aqui não cair no mesmo erro ao tentar expor a importância destas estátuas no contexto em que apareceram. Como foi referido atrás, estas peças localizavam-se nos rebordos de um vale de montanha que se caracterizava essencialmente por duas coisas ao tempo em que foram insculturadas as pedras que aqui nos trazem: tratava-se de uma área despida, bem irrigada numa região fortemente arborizada e, consequentemente, apta para pastagens; encontrava-se rodeada de montículos claramente não naturais e cuja origem se perdia na noite dos tempos uma vez que a construção, utilização e encerramento dos mesmos se tinha dado há pelo menos um milénio e meio atrás. Em curtas palavras era isto que encontravam na Chã das Lameiras os elementos das comunidades que percorriam a serra da Nave há cerca de 4000 anos. Mas que comunidades eram estas? Tratar-se-iam de agricultores e pastores, como atestado pelas colunas polínicas de várias estações das imediações. Por outro lado, seriam comunidades em cujo seio a diferenciação social estaria bem presente. Daí — também — a importância dos sítios cercados por estruturas positivas por vezes de grandes dimensões. Aqui as identidades dos elementos que compunham as sociedades seriam criadas, negociadas ou reforçadas por intermédio de encenações, deposições, consumos, de percursos e outras acções menos detectáveis no commumente designado registo arqueológico. Por este caminho nos levam os trabalhos desenvolvidos em Castelo Velho (Jorge, 2005), Castanheiro do Vento (Cardoso, 2007; Vale, no prelo), Fraga da Pena (Valera, 1997) ou Crasto de Palheiros (Sanches, 2008). Provavelmente os sítios regionais do Castelo de Ariz ou Penedo da Pena deverão corresponder a locais deste tipo. Locais onde, e resumindo, se negociava o Poder. Mas este Poder, para se manter, não se pode apoiar somente nas acções desenvolvidas nestes sítios especiais. Tem que se dar a ver, é obrigado a presentificar-se, tem que revelar-se quotidianamente. Ora, que melhor sítio para tal ocorrer que nos pontos de acesso à melhor das áreas de pastagem da região? Para além desta importância económica, a Chã das Lameiras estava, como referimos, rodeada por monumentos megalíticos cuja construção remonta ao primeiro terço do IV milénio a. C. A reentrada na Orca de Seixas numa altura genericamente coeva da execução das estátuas atesta (como noutros casos similares, desde logo) a importância da reapropriação social de sítios cuja natureza é difusa e, como tal, propícia à manipulação no contexto de encenações de poder. Este processo de reapropriação parece dar-se desde o Neolítico, como se depreende dos estudos de C. Tilley em Inglaterra (1994, 76-110), e no caso de Portugal, nos numerosos monumentos megalíticos reutilizados em momentos mais tardios (por vezes muito tardios), destacando-se, neste aspecto, a região da Beira Alta e a sub-região do Alto Paiva (Leisner, 1998; Cruz, 2001). Trata-se de algo que se prolongará por todo o Bronze, sendo verificável em necrópoles (v. g. Fonte da Malga — Kalb e Höck, 1979), sítios de habitat (Valera, 2008), estações de arte rupestre (Santos, 2009, 123) e mesmo ao nível dos depósitos metálicos (Vilaça, 2007).
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Nada evidencia com clareza a apropriação de um espaço economicamente importante — a Chã das Lameiras — por parte de uma elite. Contudo, os recursos aqui existentes levaram a que fosse uma zona bastante frequentada e até provavelmente habitada. A existência de gente (audiência), a par de antigos monumentos (cenário), tornava o sítio um importante “palco” para a expressão do poder por parte de uma elite (o que não implica a apropriação da terra). Mas poderemos falar de manifestações de poder a peças que não ostentam armas ou outros motivos tradicionalmente mais conectados com aquele valor? Poderemos falar de tal quando até as faces destas representações variam entre o plenamente esquemático (estátua-menir 1) e o anónimo (estátua-menir 2)? Se relativamente à segunda peça ainda podemos admitir a existência de jóias, na primeira nada disso encontramos. Contudo, há que valorizar a insígnia presente nesta última e, sobretudo, relevar o vestuário. Na verdade, ainda hoje a indumentária de cada um tem um forte carácter identitário. Provavelmente, em tempos pré-históricos esse lado identitário seria ainda mais forte. Na verdade, já um de nós chamou a atenção para o facto da importância dos pesos de tear no terceiro milénio — que se verifica nas decorações e nos contextos deposicionais em que ocorrem — poder prender-se com a importância da roupa na identidade de cada um (Santos, 2008, 134). Ambiente. Pastagens. Gado. Poder. Estatuária. Monumentos Megalíticos. Economia. Simbolismo. Terceiro milénio. Vestuário. Não se tratam de palavras-chave dispostas ao acaso. São referências que se imiscuem umas nas outras tal como num parágrafo de Joyce entre “sardinhas no mostruário” e um “queijo poderoso” cabem anúncios, reflexões sobre canibalismo, o Yom Kippur ou a paz e a guerra (Joyce, 2009, 131).
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Estampa 1 — Localização da região do Alto Paiva. Relevo da fachada atlântica da Península Ibérica. Andares hipsométricos fundamentais de Portugal: I — abaixo de 400 m; 2 — de 400 a 900 m; 3 — acima de 900 m. (seg. O. Ribeiro, 1986, mapa I).
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Estampa 2 — Chã das Lameiras. Localização das estações pré-históricas: 110, 154-158, 160169 — tumuli; 201-202 — habitats; 206-207 — amuralhados; 208-209 — estátuas-menires. “Carta Militar de Portugal na escala de 1: 25.000”, fl. 148 (Moimenta da Beira), 3.ª ed., 1997.
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Estampa 3— Chã das Lameiras. Localização das estações pré-históricas: 110, 160-169 — tumuli; 208 — estátua-menir 1; 201 — povoado de ar livre. “Carta Militar de Portugal na escala de 1: 25.000”, fl. 148 (Moimenta da Beira), 3.ª ed., 1997.
Estampa 4 — Perspectiva “wire-frame”, segundo a direcção aprox. SO.-NE. Localizam-se as estações pré-históricas desta área da serra da Nave. Aplicação do programa informático Surfer, versão 6.
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Estampa 5 — Estátua-menir Nave 1.
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Estampa 6 — Estátua-menir Nave 2.
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Estampa 7 — Estátua-menir Nave 1.
Estampa 8 — Estátua-menir Nave 2.
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As estelas antropomórficas de Picote – Miranda do Douro (Trás-os-Montes) Maria de Jesus Sanches1
Resumo Este texto tem como propósito estudar um conjunto de figuras proto-escultóricas de carácter antropomórfico de granito, i.e., estelas, identificadas em prospecção arqueológica, nos locais de Salgueiros e Puio, em Picote- Miranda do Douro (Trás-os-Montes, Portugal). A estação de Salgueiros sugere ser um sítio arquitectonicamente complexo, provavelmente um recinto. Os sítios de Salgueiros e de Puio, devido à sua proximidade, podem ser interpretados, no contexto da Pré-história regional (4º e 3º mil. AC), como fazendo parte da mesma paisagem simbólica, situada estrategicamente numa área que domina topograficamente uma curva apertada do rio Douro. Foram estas características que nos levaram a analisar neste texto o recinto de estelas de Cabeço da Mina (Vila Flor), que domina também um alargado vale—o vale da Vilariça. De igual modo, esta paisagem (o alargado vale da Vilariça) aparece marcada não somente pelo recinto em si, mas também pelas (duas) estelas que se implantavam na entrada Sul do mesmo vale. Em ambas as áreas — Picote, no vale do Douro, e Vale da Vilariça/Foz do rio Sabor— a análise formal e iconográfica das estelas sugere que podemos estar perante narrativas comunitárias de carácter genealógico, ou outro, que admitirão porventura leituras múltiplas. À escala do sítio, cremos que dariam corpo a discursos que fariam de cada um destes sítios “um lugar” de significado relativamente autónomo, singular. Porém, no contexto das práticas sociais que ali se desenrolariam, estes “lugares”/recintos teceriam, ou evocariam necessariamente narrativas relativas às relações comunitárias de carácter identitário que vigorariam entre os grupos que na Pré-história habitavam esta região. Palavras-chave: Estela antropomórfica, arquitectura/recinto, Pré-história, género, identidade. Abstract The purpose of this paper is the study of a group of granite made anthropomorphic proto sculptural forms, identified at the archaeological sites of Salgueiros and Puio, during an archaeological survey at Picote, Miranda do Douro (Trás-os-Montes, Portugal). The archaeological site of Salgueiros evokes an architectonically complex structure, probably a precinct type. Due to their close proximity the archaeological sites of Salgueiros and Puio may be interpreted (in the regional pre-historic context, 4º and 3º mil. AC) as being part of the same simbolic 1 Professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (DCTP).e-mail: mjsanches77@gmail. com. Investigadora Principal do Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto (CEAUCP(http://www.uc.pt/uid/cea)
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história landscape, a strategically situated area that topographically dominates a narrow curve of the Douro river. It was these characteristics that drove us to analise the stelae precinct of Cabeço da Mina (Vila Flor), which also dominates an enlarged valley, the valley of Vilariça. Likewise, this landscape (the broad Vilariça valley) appears marked not just by the precinct itself, but also by two standing stelae located at the southern entrance of the same valley. In both areas — Picote, Douro valley, and Vilariça valley/base level of Sabor river — the formal and iconographic analisis of the stelae suggests that we may be facing communal narratives with a genealogical character, or some other that may allow multiple readings. Given the scale of the area, we belive they would embody discourses that would make each of these precincts “a place” of a relatively singular meaning. However, given the context of the possible social practices that may have occured there, these “places”/precincts would have (or would necessarily evoke) narratives relating to the identitary character of communal relations that would vigorate among the groups that habitated this region during Pre-History. Keywords: anthropomorphic stele, architecture/precinct, Prehistory, gender, identity.
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As estelas de Puio e de Salgueiros: condições da descoberta e localização Este texto tem como propósito estudar e divulgar um conjunto de figuras proto-escultóricas de carácter antropomórfico de granito que identificámos no Verão de 2001 em Picote, no decurso de uma prospecção realizada nas imediações da Fraga do Puio com o objectivo de contextualizar esta estação rupestre2. Todas as peças se encontravam em muros de divisória de propriedade da freguesia de Picote, concelho de Miranda do Douro, distrito de Bragança ( Estampa 8). A estela do Puio encaixava-se grosseiramente no muro da “curtinha” do Puio, isto é, do lado direito do caminho que atravessa longitudinalmente o esporão com o mesmo topónimo, o mesmo pelo qual é conhecido na aldeia de Picote (Estampa 8). Este esporão coincide com a estação arqueológica de Castelar na denominação de J.R. dos Santos Júnior (1975). O caminho inicia-se no topo sul da aldeia de Picote e dirige-se à Fraga do Puio (Estampas 1 e 5). Esta é uma formação imponente de rochas graníticas que caem a pique sobre as encostas do rio Douro, frente a uma curva apertada deste rio, na fronteira com Espanha. Numa das rochas foi gravado um arqueiro, a cujo estudo aludimos acima (Sanches e Pinto, 2002), e o conjunto foi formalmente transformado em 2001 pelo Parque Natural do Douro Internacional (PDNI) num miradouro. São as seguintes as coordenadas geográficas do local da recolha da peça: Lat. 41º 23’ 55”,07 N; Long. 6º 22’ 09” W (M- 347706; P-493654); altitude absoluta- 637 m ( CMP, nº 95, IGE, 1996)3. As estelas de Salgueiros encontravam-se encravadas num troço de muro rústico que preenchia o espaço situado entre as ombreiras de pedra da primitiva entrada duma propriedade privada toda murada e situada no local cujo topónimo é “Salgueiros”4 (Estampas 1, 7 e 8). Situa-se este local a cerca de 1Km para Sudeste de Picote, embora o acesso seja mais fácil pela aldeia de Barrocal do Douro5. Também se lhe acede pelo estradão de terra batida que sai do topo sudeste de Picote e conduz ao local cujo topónimo é “Castelo”, uma fraga granítica de grande porte sobranceira ao rio Douro. Na verdade esta propriedade murada implanta-se numa pequeníssima área aplanada onde confluiriam originalmente dois pequenos ribeiros (temporários) que descem de Barrocal do Douro, a Este, precipitando-se mais abaixo no rio Douro, no local denominado de Remanso, frente à encosta que sustenta o esporão do Puio. Em 2 Essa prospecção foi realizada juntamente com alunos da cadeira de Trabalhos Práticos de Arqueologia da FLUP, em 2001, quando fui convidada pela Associação FRAUGA de Picote a estudar uma gravura rupestre na Fraga do Puio. As 3 estelas de Salgueiros foram objecto de um primeiro estudo num trabalho de Seminário realizado pela aluna da FLUP, Maria Antónia Soares (2002-3). 3 Dado que a CMP de 1950 mostra a topografia do terreno ainda não alterada pela construção da barragem do Picote (que ocorreu entre 1954-58 e foi inaugurada em 1960) e correlativas linhas de alta tensão que atravessam o Puio, utilizámos esta edição como cartografia de base na imagem 3D da Est. 2. 4 As estelas foram recolhidas com autorização dos proprietários do terreno murado (que é um pequeno pomar), Sr. Manuel Alves, Sr. Francisco Alves e D. Ana Alves. Encontram-se actualmente à guarda da Associação FRAUGA. 5 Lugar da freguesia de Picote, sendo uma aldeia criada ex novo por motivo da construção da barragem de Picote.
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tempos de que não há memória, o muro sul desta propriedade e daquela que lhe é contígua, foi construído de modo a desviar um dos ribeiros indicados acima, de modo que aqueles se juntam agora mais abaixo, no exterior dos campos murados. Refira-se desde já que este estudo incide somente em duas das 3 peças6, as estelas 1 e 3 pois devido a problemas de transporte das pedras a estela 2 acabou por não ser recolhida7. Publicamos, no entanto, uma fotografia tirada no local e esperamos publicar brevemente a descrição desta peça (Estampa 8). São as seguintes as suas coordenadas geográficas: Lat. 41º 23’ 35”,5 N; Long. 6º 21’ 27”,4 W (M- 348500; P-492945); altitude absoluta- 565 m ( CMP, nº 95, IGE, 1996). A estela do Puio: descrição e contexto de recolha 1. Descrição (Estampa 3, 4 e 5) A estela do Puio é uma laje/bloco subtriangular alongado, de granito, delimitado por extensas diaclases planares paralelas que definem as duas faces principais (o anverso e o reverso). Uma das faces laterais—a face direita do anverso8— é também natural, sendo bem visível a diaclase endurecida pela precipitação e meteorização química de cristais; a oposta foi objecto de afeiçoamento e polimento. O granito é de grão médio-fino, ligeiramente alterado, não friável e a textura é equigranular, quase sacaróide, o que permitiu um polimento extremamente fino. Na extremidade distal, mas em época recente, segundo cremos, foram realizadas duas extracções do que resultou um topo triangular, ou anguloso, de fractu6 No Relatório do IPA, em 2002, bem como na publicação do Arqueiro do Puio (Sanches e Pinto, 2002) ou mesmo no Relatório de Seminário de Maria Antónia Soares (Soares, 2002-3) foram consideradas 6 estelas em Picote. Duas do Puio e 4 de Salgueiros. Porém, uma análise mais atenta da 4ª estela de Salgueiros mostrou que esta não tinha sido nem talhada nem polida, embora a sua forma se assemelhe a muitas estelas pré-históricas recolhidas em contextos arqueológicos fidedignos. Na falta deste contexto optámos por a excluir do presente estudo (em termos de descrição de pormenor) aguardando uma escavação no local que nos possa então valoriza-la devidamente ou exclui-la em definitivo do conjunto. No caso do Puio, a laje que considerámos estela (2ª estela do Puio) apresenta “desenhos” de forma losângica, detectados também na estela 1 de Salgueiros, mas que se revelaram ser decorrentes da estrutura de formação (compressão tectónica) do granito. 7 Esta estela nunca fez parte do grupo das que a Associação FRAUGA trouxe para o Porto para serem estudadas. Depois de várias diligências, em 2002, mas também já em Janeiro de 2010, acabámos por perceber que a estela 2 nunca terá sido trazida do local. Reconstituindo os factos, damos conta do seguinte. Após identificadas e fotografadas, as estelas foram deixadas no local à espera da autorização do proprietário para as remover e o muro foi refeito por nós. Porém, segundo nos informaram, um dos proprietários reconstruiu novamente o muro por achar (acertadamente) que nós não o tínhamos sabido fazer de modo a torna-lo seguro. Assim, quando os responsáveis da Associação FRAUGA, que conseguiram a autorização após a nossa partida, mas que não são arqueólogos, se deslocaram ao local com um tractor para transportar as pedras, não recolheram a estela 2 por esta pedra não se encontrar junto das outras duas. Provavelmente teria sido integrada no muro. Naturalmente, iremos procurar de novo a estela no local, realizando em simultâneo um reconhecimento mais pormenorizado daquela área. 8 Quando falamos do lado direito estamos a falar do lado direito do observador, não do da peça.
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ras vivas. Porém, do lado direito a extracção foi mínima e os polimentos do reverso permitem perceber que ao topo do anverso só devem ter sido extraídos uns 2 cm na sua parte central. Assim, a parte distal deveria ter sido arredondada e não triangular (porque lascada), tal como se nos apresenta na actualidade. Sofreu lascagens de maior extensão na extremidade proximal, sendo que aquela do lado direito deve ter sido bastante ampla. Os negativos destas lascagens apresentam-se igualmente muito angulosos, rugosos ao tacto e levam-nos a crer que a extremidade proximal da estela poderia ter uma forma muito diferente daquela que agora exibe. É provável que a base tenha sido alargada mas na realidade nada na peça nos sugere a primitiva forma nem o modo de assentamento. Os danos indicados acima, somados a uma intensa manipulação da peça, aconselham cautela na reconstituição formal e iconográfica da estela quando “inteira”, isto é, quando o bloco se identificou, pelos desenhos, com alguma entidade de carácter antropomórfico. Admitimos, naturalmente, que tal bloco tenha sido considerado “completo”, uno, noutras manipulações e/ou formas que foi ganhando, tal como exporemos mais abaixo. Tem actualmente as seguintes dimensões: altura máxima - 78,1 cm; largura máxima - 42,4 cm; a espessura, medida na secção, varia entre 5,8 e 8,7 cm. Trata-se portanto de uma laje bastante estreita, fácil de mover/manipular por duas pessoas, embora uma pessoa também o possa fazer. As diferentes acções de configuração/uso a que a peça esteve sujeita, porque não afectam simultaneamente as mesmas superfícies, não podem ser descritas como uma sequência discreta e garantida, aconselhando antes prudência. Mesmo assim, por facilidade de exposição, parece-nos mais claro e útil fazer a descrição de acordo com uma sequência genérica de tratamentos tal como os entendemos, e que comentaremos em pormenor. Iniciam-se, tanto quanto a falta de contexto específico permite depreender, com a escolha da laje cuja intenção primeira terá sido a de criar uma figura antropomorfa. Esta ter-se-ia identificado com o bloco de granito pelas razões que de seguida explicamos. A laje foi sujeita desde logo a um trabalho de pico fino e de ponta dura (talvez de quartzito), seguido de um alisamento grosseiro ou de regularização das arestas do trabalho do pico (com areia?) numa extensa banda que se define longitudinalmente no lado direito do reverso (2). Um picotado um pouco mais fino e regular do que o anterior, seguido de polimento, agora mais visível, manteve-se também numa largada área do topo no anverso, acima do “olho” esquerdo (Estampa 5). (Este tipo de picotado não foi distinguido no desenho da Estampa 3 por motivos que se prendem, num desenho a preto e branco, com o desvio da atenção e a perda da visão de conjunto.) É possível que este primeiro tratamento tenha sido realizado em todas as faces (ou melhor, nas 3 faces pois exclui-se a face lateral esquerda do anverso, já descrita acima). Porém, trata-se de uma mera suposição pois neste caso particular esta hipó-
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tese nem sequer pode ser sustentada por uma lógica “técnica” já que a laje nos induz a pensar que terá sofrido tratamentos distintos nas suas diferentes partes sem que possamos compreender nem as razões, nem o alcance de tais diferenças. Ao picotado/polimento (grosseiro) indicado atrás (2) ter-se-á seguido por certo a gravura dos olhos e da(s) sobrancelha(s), realizadas por picotado fino (3). Originalmente o traço dos olhos e das sobrancelhas pode ter sido mais largo do que aquele que agora se exibe pois esta superfície foi sujeita posteriormente a um polimento/abrasão extremamente fino que rebaixou substancialmente a superfície original em toda a área abrangida pelo olho direito, sobrancelha e superfície acima desta. Este polimento intenso, ou abrasão intensiva (1), terá sido realizado (talvez somente na parte final) com o auxílio de uma substância mineral muito fina (argila, areia moída) eventualmente completada com polimento a couro, o que conferiu àquela área um aspecto tão liso e lustroso como aquele que é conseguido modernamente em máquinas de polir superfícies em rocha. Também o traço largo, horizontal, da parte inferior do anverso, do círculo que se situa abaixo deste, bem como da covinha da parte inferior do reverso, parecem ter sido realizados pela mesma técnica de picotagem do olho e sobrancelha. Estes sulcos apresentam o interior polido. No anverso, a covinha pode ter sido realizada em qualquer momento posterior ao picotado e regularização daquela área. Já referimos anteriormente o polido muito fino/abrasão que se sobrepôs ao olho e área em torno deste (Estampa 3-1). Esta acção abrasiva foi realizada na maioria das superfícies do anverso e reverso bem como na face lateral esquerda e no local da aresta lateral direita do anverso. Nalgumas áreas foi extremamente intensa e repetida. É o caso do rebordo lateral direito do anverso onde houve a clara intenção, num primeiro momento, de eliminar a aresta longitudinal; seguiu-se-lhe outro momento abrasivo que se expande pelo anverso e que criou mesmo uma espécie de “linha de festo” paralela à antiga aresta. Esta abrasão, como dissemos atrás, rebaixou também substancialmente a superfície que inclui o olho direito e sobrancelha, desenhando aí “depressões” que simulam uma área lacrimal, definindo ainda uma depressão triangular acima da sobrancelha direita. Também destacou uma área central, entre as sobrancelhas, que se mantém sobreelevada. Na parte inferior do anverso este polimento abrasivo rebaixou grandemente a superfície pois suavizou os rebordos dos traços gravados (sulco horizontal e círculo) e rebaixou, na sua parte média, a área lateral esquerda que, por esse motivo, exibe uma alargada superfície deprimida. No reverso este polimento fino, abrasivo, é também bem claro mas parece ter sido menos insistente que no anverso. Enquanto nesta face a superfície ficou absolutamente plana, sem qualquer rugosidade, no reverso, conquanto não haja atrito ao toque, conservaram-se alguns dos desníveis que terão pertencido ao bloco original. Esta estela parece ter sido coberta, parcial ou totalmente, de uma camada de pasta consistente de cor castanho avermelhada (4). Esta pasta, que parece um reboco, ganha uma cor castanho amarelada na parte central onde uma mancha alargada
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se sobrepõe à superfície finamente polida (sem irregularidades). Aqui aderiu de tal modo que adquire o aspecto de pintura. Conserva-se também, agora com uma espessura de 1 ou 2 milímetros, mas em manchas quase residuais, nos interstícios das superfícies polidas em várias áreas do anverso e também no reverso. Nesta última face também se sobrepõe à superfície picotada que fora objecto duma regularização e polimento mais grosseiro (2), isto é, do lado direito do reverso (Estampa 4). Parece-nos ser uma pasta fabricada para o efeito, mas cuja composição, natureza e mesmo modo de aplicação só análises específicas poderão revelar9. A observação à lupa sugere somente a presença de óxidos de ferro misturados eventualmente com argila de grão extremamente fino. Porém, a sua preservação leva-nos a pensar que tal se deverá à existência de algum tipo de aglutinante orgânico tal como tem vindo a ser detectado nos rebocos (e mesmo pintura) de alguns monumentos megalíticos do NW peninsular (Carrera, 2006). Merece referência ainda uma pasta de cor cinzento esbranquiçada, semelhante a cinza e que, à simples lupa, parece integrar pequenos fios ou “pêlos”. Espalha-se pela parte central do reverso, mas somente sobre as áreas muito polidas. Aí sobrepõe-se, nalgumas zonas, à pasta castanho avermelhada, referida atrás. No desenho do reverso (Estampa 4-5) esta pasta só foi marcada nas áreas onde se apresenta com uma certa densidade pois na verdade uma fina película parece espalhar-se por toda a superfície polida do reverso. Se inicialmente pensáramos tratar-se de um sedimento que aderira à peça em contexto pós deposicional, uma análise mais fina à sua distribuição leva-nos a questionar tal interpretação. Com efeito, esta pasta cinzenta só se encontra nas partes do reverso que foram sujeitas a abrasão e nunca naquelas picotadas e em cujos interstícios a sua fixação e conservação seria mais facilitada. Naturalmente, esta pasta necessita de ser sujeita também a análise para conhecermos a sua composição, natureza e modo de aplicação. Refira-se ainda que esta pasta cinzenta se sobrepõe àquela de cor castanho avermelhada. Cremos que foi devido às condições do contexto pós posicional que surgem esboroamentos que afectam sobretudo o rebordo esquerdo do anverso e áreas adjacentes onde a abertura de planos de fissuração e subsequente desintegração da rocha segue as linhas da diaclase natural. Foi esta desintegração que afectou toda a área envolvente do olho esquerdo, donde resultou, cremos, a sua quase total destruição. Na realidade, os líquenes esverdeados, precisamente na área que acabámos de descrever, mostram que esta zona da peça parece ter estado parcialmente desenter9 Privilegiaremos análises não destrutivas, combinando eventualmente as técnicas SEM (Microscopia Electrónica de varrimento) com EDX pois é provável que tais análises se possam realizar no CEMUP (Centro de Estudo de materiais da Universidade do Porto). As análises de espectrometria de absorção infravermelha, que intentaremos também, foram utilizadas com sucesso particularmente na análise dos hipotéticos aglutinantes orgânicos do reboco da mamoa de Mota Grande e Portela do Pau 2 (Carrera, Suriol e Silva, 2006).
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rada e sujeita a destruições. Porém, tal desintegração também pode ter-se iniciado no decurso do polimento fino daquela área. A fragilidade da rocha junto da diaclase terá suportado mal a conformação e da peça destruindo parcialmente a simetria do desenho facial. 2. Contexto Esta estela parece ter sido colocada há muito pouco tempo no muro pois, ao contrário das restantes pedras deste, que se apresentam cobertas de líquenes e musgo, encontrava-se (surpreendentemente) limpa, à excepção da restrita área esverdeada referida atrás. Assim, a hipótese mais provável é a de que tenha estado quase completamente enterrada. Na realidade, estamos numa área sujeita a remoções constantes resultantes de trabalhos agrícolas. Estas movimentações de terras deslocarão não somente o que se encontra eventualmente in situ, como os sedimentos e materiais já antes revolvidos tanto pela escavação de J R do Santos Júnior e pela implantação dos postes de alta tensão, como ainda pela abertura de uma fossa séptica no local (Estampa 5). O contexto arqueológico da estela será, a nosso ver, aquele onde foi recolhida, isto é, a estação arqueológica do Puio. Esta estação tem vestígios que aludem a uma ocupação de longa diacronia que se estenderá do Calcolítico à época contemporânea já que a própria aldeia de Picote se estende também para a parte N do esporão do Puio. Assim, se atendermos somente ao esporão delimitado pelas duas ribeiras, merecem destaque as ocupações datáveis do Neolítico/Calcolítico, da Idade do Ferro (com início pelo menos no séc. 7º/6º A.C.) e do período romano (Pinto, 2005). Na sua encosta leste, no decurso de arroteamentos, foi encontrado um minúsculo recipiente cerâmico (de fabrico manual, forma subcilíndrica e fundo plano-convexo), juntamente com um outro, maior, que “se desfez em cacos” e por isso não foi recolhido10 (Estampa 5). Acresce ainda a memória de que aproximadamente neste local estaria um “sepulcro” de um guerreiro ou cavaleiro, pois junto das pedras foi vista uma arma metálica (espada ou punhal) que se desfez. Esta última informação não pôde ser precisada pois não nos foi relatada pelo seu descobridor, entretanto falecido. Quer se trate de uma deposição e/ou de um contexto funerário, ou mesmo de uma área de uma estação arqueológica cuja especificidade só poderá vir a ser corroborada por escavações, temos um argumento para a ocupação pré-histórica deste local já que vasinhos minúsculos daquele tipo são frequentes em contextos, sobretudo “habitacionais” do 4º e 3º mil. A.C11. Na realida10 Informação oral do proprietário, Sr. António Branco Fernandes, a quem agradecemos a informação e a possibilidade de fotografar e desenhar o recipiente. Neste momento encontra-se à guarda da FRAUGA. Este pequeno recipiente mede, na abertura, 4,1 cm e tem de altura 2,9 cm ; a espessura média das paredes é de 0,4 cm. É de fabrico manual, de cor castanho acinzentado e tem superfícies mal alisadas quer no interior quer no exterior. 11 Recipientes de pequenas dimensões, lisos ou decorados, ocorrem por ex. em povoados do Neolítico final/Calcolítico, como seja o de Mairos-Chaves (Jorge, 1986), no abrigo do Buraco da Pala – Mirandela, Crasto de Palheiros (Murça) (Sanches, 2008).
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de podemos estar perante uma alargada estação pré-histórica que se estenderia por toda a parte superior do esporão e suas encostas leste e sul se, complementarmente, considerarmos os resultados do estudo da grande quantidade de materiais arqueológicos recolhidos tanto na nossa prospecção de 2001 como na escavação de J-R. dos Santos Júnior12, realizado por Dulcineia Pinto (2005). As cerâmicas da pasta C e F, de fabrico manual e pertencentes a formas dominantemente globulares (fechadas) e em meia calote, representam cerca de 30% da amostra estudada. São consideradas pré-históricas pois ocorrem sistematicamente em contextos transmontanos datados pelo C14 do 3º mil. AC; porém, também estão bem representadas na ocupação do Calcolítico e da Idade do Ferro do Crasto de Palheiros (Murça) (igualmente datadas pelo C14) (VVaa, 2008). Deste modo, embora a estação do Puio (ou Castelar, como a denominou Santos Júnior) tenha uma efectiva ocupação da Idade do Ferro (cujo início, datado por objectos metálicos, aponta o séc. 7º/6º AC) (Pinto, 2005), é provável que desde tempos anteriores, provavelmente desde o Calcolítico (finais do 4º/3º mil. AC), tenha existido ali uma estação arqueológica que exigirá uma adequada caracterização. Em alternativa, e tal como Dulcineia Pinto também avança, tais cerâmicas podem mostrar somente a pervivência, na Idade do Ferro, de modos de fabrico muito alicerçados na tradição pré-histórica regional , como acontece no Crasto de Palheiros (Pinto, 2005; VVaa, 2008). Do mesmo modo, é provável que o contorno do recinto que Dulcineia Pinto propõe como limite exterior da estação da Idade do Ferro (Estampa 5), tenha tido origem em época mais antiga. Por certo, muros, anteparos, taludes e/ou outras barreiras terão existido ao longo do topo da linha do esporão que, na realidade, não poderia manter aquela topografia nem reter os sedimentos na ausência de barreiras físicas. A diversidade do espólio recolhido, somado à recolha de 3 berrões em granito, indicia sem margem para dúvidas uma estação da Idade do Ferro com características sui generis, mas de incontestável interesse para o conhecimento da especificidade da Idade do Ferro nesta região transmontana13. A continuidade da ocupação do Puio no período romano e medieval merece, naturalmente, igual caracterização14. O painel gravado da Fraga do Puio deve também ser comentado. Quer pela sua localização — no topo sul do esporão, frente à curva apertada do rio —, como pela disposição interna dos motivos gravados (que compõem uma “cena de arremesso com arco em tensão”), o painel reforça a importância do local tanto para a comunidade 12 Trata-se dos materiais (cerâmicos e metálicos) da escavação do local onde fora recolhido o grande berrão de Picote, realizada em 1952/53 e guardados no Instituto Mendes Corrêa ( Faculdade de Ciências da Univ. do Porto). Na prospecção de 2001 foram recolhidas e estudadas (por Dulcineia Pinto) cerca de 8 dezenas de fragmentos cerâmicos, quantidade que permite suportar, com razoável credibilidade, uma interpretação relativa à cronologia do sítio. 13 Deve destacar-se no contexto da caracterização da Idade do Ferro em Trás-os-Montes e Alto Douro, a grande quantidade de painéis com arte rupestre dos vales do Douro, Côa (Baptista, 1999) e Sabor. 14 O rigoroso texto de Dulcineia Pinto (2005) dá conta da especificidade dos materiais (de várias épocas) desta estação, bem como do contexto de recolha das esculturas dos berrões.
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que criou o painel como para as que se sucederam neste local. É certo que a tipologia dos motivos (descritos e comentados noutra publicação: Sanches e Pinto, 2002), dada a sua peculiar formalização, admite uma ligação possível, mas não absolutamente evidente, a contextos rupestres do Neolítico e Calcolítico regional. Na realidade, certos pormenores, como sejam o do “desenho” do penacho (/chapéu/capacete) do arqueiro contrasta com a ausência de outros pormenores na indumentária. Se o desenho de penachos é característico da arte/pintura esquemática peninsular (que aqui tem um dos exemplos no vizinho abrigo de Penas Róias, Mogadouro), constatamos que as representações de certos pormenores do traje, ou anatómicos, aparecem nas rochas datáveis da Idade do Ferro do vale do Douro (Vale da Casa) e do Côa (Baptista, 1999). Destacamos na rocha nº 10 de Vale da Casa o desenho de dois antropomorfos que “têm na cabeça (circular) estranhos chapéus ou capacetes, que se assemelham a turbantes: uma forma subcircular que envolve toda a cabeça, encimada por um semi-círculo.“ (Baptista, 1982:79), similares, de certo modo ao penacho/capacete do arqueiro do Puio. Porém, um “turbante” similar ao da Rocha 10 encima também uma figura antropomórfica do abrigo de Penas Roias pelo que, de momento, este formalismo não pode ser devidamente avaliado do ponto de vista cronológico. Ainda na mesma rocha 10 do Vale da Casa encontra-se um antropomorfo com um arco, embora formalmente bastante distinto daquele do arqueiro do Puio. Na realidade a estação do Puio, se vista no seu conjunto, é de difícil caracterização tanto pela diversidade de indícios materiais de ocupações humanas, como pela originalidade dos diferentes vestígios onde se destaca também a recolha, em todos os casos fortuita, de 3 esculturas zoomórficas em granito, conhecidas por “berrões” (dois fragmentados e fragmento de um terceiro) (Santos Júnior, 1975; Redentor e Pereira, 2007), datáveis da Idade do Ferro. Neste texto tentámos aproximações interpretativas sobretudo à Pré-história e à Idade do Ferro neste local pois será adentro desta (ainda) longa diacronia do sítio do Puio que nos parece mais acertado procurar compreender a estela que é objecto do nosso estudo. As estelas de Salgueiros Originalmente considerámos 4 peças que apelidámos de estelas 1,2,3 e 4. A “estela” nº 4 é uma pequena e fina laje de granito, de contorno sub-rectangular mas com uma das extremidades convexa, e de faces polidas, incluindo as laterais. Tem 30 por 20 cm de eixos e a espessura varia entre 2,5 e 5 cm. Uma análise mais fina, ajudada pelo Professor Manuel Abrunhosa15, veio mostrar que essa peça não tem vestígios de qualquer tratamento, sendo as superfícies polidas, bem como o seu topo, arredondado, será de origem natural. É este o motivo pelo qual a excluímos do presente estudo mas continuamos a admitir que, embora de configuração natural, possa ter feito 15 Geólogo. Faculdade de ciências da Universidade do Porto
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parte do conjunto de estelas deste local, assim se venha a conhecer o tipo de estação arqueológica em apreço. Na realidade, a estação/recinto do Cabeço da Mina, no Vale da Vilariça, de que falaremos adiante, exibe várias peças similares a esta bem como outras que, se não pudessem ser associadas, como conjunto, a um contexto, nunca poderíamos apelidar de estelas. O mesmo acontece com as 3 lajes/estelas recolhidas in situ na câmara da Mamoa da Alagoa- Murça (Sanches, Nunes e Silva, 2004), que são formalmente similares a esta e que denotam exíguos tratamentos intencionais. Deste modo esta peça será guardada até que as escavações no local de Salgueiros venham fornecer documentos que a incluam ou excluam do conjunto. 1. Estela nº 1 (Estampa 6) É um pesado bloco de granito de grão médio, de duas micas, ligeiramente alterado, não friável e que terá proveniência local. Apresenta uma configuração claramente antropomórfica pois que o bloco se identifica claramente com uma forma proto-escultórica, formalizada de acordo com “modelos” conhecidos em contextos da Pré-história, particularmente relacionados com pequenas figuras “idoliformes” provenientes de monumentos megalíticos ou tumuli. Destaque-se, porém, que tal configuração, onde foi procurada simultaneamente a volumetria e a simetria, decorre tanto da forma natural do bloco original (que já ostenta superfícies polidas) como dos talhes e picotagens conducentes à sua transformação numa forma escultórica simétrica. Tem as seguintes dimensões: altura máxima - 74 cm; largura máxima - 41 cm; espessura máxima - 23 cm. É assim uma peça bastante pesada, difícil de manusear por uma só pessoa, mas que tem uma base alargada de assentamento e uma equilibrada distribuição de peso de modo que, uma vez colocada em pé e escorada na base, facilmente se manteria naquela posição. Apresenta superfícies de diaclases subplanares, bem como finas capas de deposição de óxidos de ferro sobre aquelas superfícies, deposições que também existem no seio da rocha. Esta deposição de óxidos, que afecta particularmente a metade inferior do anverso, fez-se maioritariamente antes da transformação do bloco em estela e confere-lhe uma coloração castanho avermelhada. É provável que este aspecto de “pedra pintada” tivesse também influenciado a escolha na medida em que incide na depressão longitudinal a áreas adjacentes . Também pertence ao bloco original a grande reentrância lateral do lado direito do anverso, “entalhe” que em certos modelos de estelas pré-históricas é uma característica formal. No lado oposto, agora sim, foram feitos picotados com algum vigor quer no sentido de rebaixar aquela superfície, quer no de criar ali um entalhe simétrico ao do lado direito. Como resultado temos um rebaixamento grosseiro e um entalhe lateral irregular e bastante rugoso. As restantes extracções, à excepção da daquela da extremidade distal e que
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destinaria a configurar a cabeça, foram feitas com o objectivo de, através da subtracção de material, conferir à peça um aspecto antropomórfico, onde a simetria volumétrica é claramente intentada em todas as faces. Esta estela se vista à luz rasante exibe, particularmente no seu anverso, uma rede de desenhos losângicos que inicialmente pensamos serem gravuras muito finas. Aliás, o primeiro desenho por decalque desta peça, realizado por Antónia Soares (Soares, 2002-3), dá conta dessa espécie de desenho, que parecia definir-se como um manto. Porém, aquando do registo da peça por varrimento laser, feito com o objectivo de melhor entender a volumetria da estela, bem como destes desenhos, verificou-se que aqueles decorrem da estrutura da própria matéria-prima, ou seja, da meteorização estruturada pela rede de fissuras pré-existentes16. 2.Estela nº 3 (Estampa 7) Estela de granito cuja forma geral é sub-rectangular mas com o topo triangular e a base plana (recta). As secções — longitudinal e transversal— são sub-rectangulares. Tem as seguintes medidas: altura-44 cm; largura actual (máxima) - 26,5 cm (caso não estivesse fracturada deveria medir aproximadamente 28 cm); espessura máxima, na base - 7,5 cm; no topo - 4 cm. Esta peça denuncia alterações profundas na sua superfície que cremos serem decorrentes do contexto (ou contextos) pós deposicional, o que torna bastante difícil discernir e descrever os tratamentos— talhe, picotagem, alisamento— conducentes à sua configuração como estela e onde bloco se identifica com uma formalização facial. Quer a forma geral da peça — com topo triangular, em ogiva, e ressaltos laterais (de que só resta um)—, quer o “desenho” em baixo relevo que sugere, no anverso, uma face ou tatuagem facial—, remetem para um modelo representativo recorrente nalgumas estelas, pequenos ídolos, placas de xisto ou mesmo cerâmicas, de cronologia Neolítica e Calcolítica ( da Península Ibérica e do arco do Mediterrâneo central e ocidental), e a que a bibliografia arqueológica dá o nome genérico, de “cariz mediterrânico”. Porém, regionalmente já se conhecem outras figuras formalmente similares a esta, em granito também, provenientes dos vizinhos concelhos de Moncorvo — a estela de Moncorvo (Vasconcelos, 1910; Sousa, 1996) — e a de Freixo de Espada à Cinta — estela do Monte de Santa Luzia (Santos, 1984; Sousa, 1996). Nesta de Salgueiros e naquelas (particularmente na de Santa Luzia), são marcadas em baixo relevo as arcadas supraciliares/órbitas por desenhos (depressões) arqueadas que se desenham de ambos os lados do nariz, alteado. Porém, no nosso caso, uma depressão alongada, sob o nariz, parece enquadrar novas depressões escavadas, difíceis de entender já que esta parte da peça foi particularmente sujeita a escama16 Foi Paulo Lima que, na tentativa de encontrar uma explicação para os “desenhos”, colocou a hipótese de se tratar da estrutura de formação do granito, hipótese que o registo por varrimento laser permitiu confirmar já que com estas imagens se tornou exequível a medição, rigorosa e repetida, dos ângulos de tais geometrias (Ver texto de Paulo Lima e Hugo Pires neste volume).
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ções (no lado esquerdo) e à erosão. Parecem-nos claros os seguintes gestos técnicos: marcação, por picotagem, da depressão das arcadas supraciliares /órbitas (pois as marcas do pico são claras no lado direito do anverso), seguido da criação da depressão, também por picotagem, e da sua regularização por alisamento; conformação, por talhe e alisamento, do topo, em ogiva e do ressalto lateral (próximo da base); alisamento de todas as arestas e superfícies conservadas na peça. É provável que as duas arcadas que se delineiam em sequência do lado esquerdo já pertencessem ao bloco original, onde terão sugerido, naturalmente, a criação da arcada do lado direito. Como dissemos atrás, esta peça terá sido muito alterada/destruída em contexto pós deposicional. Além das fracturas do lado esquerdo e que também se estendem pelo reverso da peça (que implicaram uma assinalável amputação de massa), encontram-se vestígios de descamação, por erosão ou eventualmente pela passagem de arados, na parte inferior esquerda do anverso. Aliás, as marcas da passagem do arado desenham mesmo dois alongados riscos de perfil em V (visíveis na foto da Estampa 7 mas não marcados no desenho), que se estendem longitudinalmente pela metade inferior do anverso e alguns outros são também visíveis no reverso. A fixação insistente de líquenes (que ainda se observam na peça), aliada à erosão diferencial e à meteorização, criou rugosidades na maioria das superfícies, mesmo naquelas lascadas (descamadas) em época mais antiga. Estas superfícies, embora não agressivas ao tacto, mostram rugosidades e grandes grãos de feldspato. Esta peça possuía o seu maior peso na base (extremidade proximal), base essa que seria perfeitamente plana e de contorno rectangular. O eixo de simetria foi criado pela conformação do topo. Deste modo a estela segurar-se-ia na posição erecta logo que assente no solo. Tal facto não impediria, cremos, outras modalidades de fixação. As estelas de Picote no conjunto das representações escultóricas de carácter antropomórfico de Trás-os-Montes. 1. Possibilidades interpretativas: abordagem geral As estelas antropomórficas como representações, incorporações (corporizações simbólicas) de personagens ou de entidades que evocam formalmente figuras de traça humana, têm sido sujeitas a abordagens de diversos âmbitos nos estudos de arqueologia. Particularmente desde os anos de 1960, na Itália, França, ou nos países da Península Ibérica (para só falar dos estudos do arco mediterrânico ocidental) (Arnal, 1976; Almagro, M. 1966; Jorge, V. e Jorge, S., 1993), as abordagens interpretativas a esta “materialidade” tem-se enquadrado em modelos ou tendências interpretativas que são comuns ao estudo arqueológico de outras materialidades. Não sendo objectivo deste texto a exposição analítica pormenorizada de tais abordagens, o enquadramento teórico enriqueceu, ao longo das últimas 3 décadas, a compreensão destas figuras no conjunto e em articulação com outros vestígios do
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Passado, merecendo destaque as interpretações que relacionam as estelas (estátuas-menir e/ou outras pedras fincadas) com paisagens humanizadas, ou territórios (no sentido antropológico do termo)17 (Galan Domingo, 1993; Bueno e Balbin, 2000). Quando tais peças ocorrem em escavações, as interpretações contextuais têm vindo a enriquecer de forma clara o(s) sentido(s) e o(s) papel (éis) que estas peças terão tido, particularmente no âmbito das arquitecturas (duráveis, perecíveis, ou outras) da Pré-história (Bueno, 1995; Cardoso, 2007). É de sublinhar desde logo que embora estas figuras, que evocam a figura humana— ou, a nosso ver, mais acertadamente, as condições/estatuto de pessoas, grupos ou entidades—, sejam distinguidas frequentemente em masculinas ou femininas, em atenção a certos aspectos, nem sempre muitos explícitos patentes na figuração, embora o porte de armas (ou a forma fálica) tenha sido dos argumentos mais solicitados para a sua associação ao género. Outros ensaios interpretativos, mais cautelosos (Jorge, 1999) não as associam a qualquer um destes dois géneros, mas é de sublinhar que, sendo o género uma construção cultural, isto é, que se realiza no decurso da formação /criação de identidade através de práticas sociais e de atitudes (Sorensen, 2006) que envolvem, naturalmente, outros aspectos da vida, da organização social e dos comportamentos, este tema continuará, cremos, a ser discutido no âmbito mais alargado que a Antropologia nos proporciona. Por certo terão de ser considerados os modos através dos quais o género, a etnia (a pertença), etc., se podem ter assumido, alternativa, ou cumulativamente, como permeáveis, divisíveis/segmentáveis, em função dos contextos em análise (Fowler, 2004). Na realidade, os géneros, as identidades e os estatutos, ensina-nos a Antropologia das sociedades tradicionais, podem variar não somente ao longo da vida em função de circunstâncias variadas (dádivas, trocas, casamentos, escalão etário, ritos de passagem, etc.), como após a morte (manipulação de cadáveres, partição de cadáveres ou pertences daqueles, etc.) (Fowler, 2004). Quer dizer, a identificação depende do enquadramento genealógico de cada sociedade e do modo como se define ou vai definindo, o “indivíduo” ao longo da sua vida e mesmo após a morte. A identidade, ou que Fowler denomina de “personhood” (/ser pessoa), é um processo de múltiplas facetas onde a divisão ou segmentação, a partição ou, pelo contrário, a acumulação de identidades múltiplas, ocorre em muitas sociedades tradicionais/indígenas. Acresce ainda o facto de em muitos casos o processo de identificação se referir não a indivíduos (tal como os concebemos na nossa sociedade ocidental, moderna e pós-moderna), mas a clãs, grupos etários, etc. (Fowler, 2004), sendo estes também considerados “indivíduos”. Deste modo, no âmbito da Arqueologia contextualista, um entendimento com17 O território constitui-se para uma sociedade como o seu lugar de pertença ancestral e organiza-se materialmente em função da estruturação social e das normas colectivas, e é protegido de agressões/ ameaças exteriores (ameaças de diversa índole). O território torna presente e perene a presença dos antepassados, legitimando-se assim como território dos vivos. Dos pressupostos anteriores decorre que é cumulativamente um lugar de “representações” sociais (Bourgeot,1991).
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plementar das formas escultóricas antropomorfas terá obrigatoriamente de atender não somente às formalizações/iconografias das peças, mas ao leque de práticas sociais envolvidas susceptíveis de serem identificadas no registo arqueológico18. As estelas de Salgueiros, ou mesmo do Puio, embora formalmente diferentes entre si, sugerem um agrupamento intencional de “personagens” que corporizarão entidades, estatutos, papéis sociais, etc., criados pela dinâmica social e referencial do grupo. A sua variedade formal/iconográfica tem, mesmo assim, claros paralelos regionais (em monumentos megalíticos, recintos, ou achados simples). Mesmo como conjunto de figuras formalmente bastante diferentes entre si, associadas num só local de práticas sociais, as estelas de Picote não tem obrigatoriamente de ser entendidas como uma singularidade para a qual não se possam encontrar interpretações metodologicamente aceitáveis. Assim, tal como na estação do Cabeço da Mina (Vila Flor) —que analisamos aqui como um dos modos de criar possibilidades interpretativas alternativas à escala regional—, em Salgueiros e mesmo no Puio, também as estelas poderão corporizar entidades individuais ou colectivas que se metamorfosearão/transformarão em função dos parâmetros genealógicos/ideológicos dos grupos pré-históricos em causa. Será portanto no contexto da Pré-história regional, i.e., a uma escala baixa de análise que privilegie os sítios e as relações espaciais entre eles, que estas transformações/associações poderão ser entendidas. Naturalmente, estamos em crer que as escavações virão a revelar, pelo menos em Salgueiros, algum tipo de arquitectura que, tal como no recinto do Cabeço da Mina, dominaria um vale, no caso de Picote sobre a curva apertada do rio Douro que na outra margem ( margem espanhola) se delineia em falésia abrupta. A estela do Puio, no esporão em frente a este vale, poder-se-ia articular relacionalmente com Salgueiros (Est.I) havendo agora que desenvolver a investigação, necessariamente com escavações arqueológicas, no sentido de comprovar esta hipótese. 2. Contributo da estação do Cabeço da Mina para o entendimento das estações de Salgueiros/Puio Da estação do Cabeço da Mina (Assares) em Vila Flor provém a maior quantidade de estelas conhecidas até ao presente na Europa Ocidental. Ultrapassam as 6 dezenas19 mas resultam de recolhas feitas em momentos e circunstâncias diferentes: 18 Damos o exemplo, já largamente citado na bibliografia arqueológica, da reutilização de estelas em contextos pré-históricos (megalíticos) da Bretanha, ou da sua manipulação em arquitecturas complexas, como é o caso do Recinto do Castanheiro do Vento, Foz Côa (Cardoso, 2007). 19 Orlando Sousa (1996, p. 86) refere que aquelas “não decoradas” serão mais de 3 dezenas; a estas somam-se as 21 estelas (nº 1 a 21) com “decoração” que constam no trabalho atrás citado. Em data posterior foram recolhidas no decurso de trabalhos agrícolas, pelo menos mais 12 estelas (algumas são fragmentos de estelas): aquelas nº 23, 24, 25, 26, 27, 29 e 33 (com atributos gravados) e nº 22, 28, 30, 34 e 35 (somente de faces alisadas). (Ver quadro 1, neste texto). Assim, este texto assume que deste sítio se conhecem pelo menos 63 estelas. Entre a entrega deste texto para publicação e a revisão de provas, visitámos novamente o sítio do Cabeço da Mina (Junho de 2010), e aí recolhemos mais uma metade su-
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a) recolhas pontuais, desde o final da década de 1980, à medida que o arroteamento do campo, no topo norte do Vale da Vilariça, se ia fazendo mais em extensão e em profundidade; b) de sondagens realizadas pelo SRAZN em 1985, 1986 e 199120, embora, lamentavelmente, estas nunca tenham sido objecto de uma publicação de pormenor21. Assim, não se conhecem exactamente quais as estelas, ou fragmentos daquelas, que integrariam o alinhamento pétreo contínuo e semiderrubado que aí figura22. Desse alinhamento fazem ainda parte lajes de tamanho médio e pequeno em granito e xisto (matérias-primas dominantes), bem como blocos de quartzo. Estes vestígios fazem supor a existência de espaços murados/divididos de outros, isto é, eventualmente de alguma arquitectura em xisto e quartzo23 — e/ou materiais que se desintegrariam e/ou deformariam, como elementos vegetais ou argila— de que não podemos imaginar a planta. S. Oliveira Jorge (1999) refere que talvez este alinhamento seja uma fracção do arco de pedras que, segundo os proprietários, circundaria a pequena e suave elevação, necessitando por essa razão de confirmação arqueológica, o que até à data ainda não foi feito. Dado que as estelas, maioritariamente em granito, mas algumas também em xisto azulado ( Estelas 2 e 8), foram recolhidas ao longo de uma área em que o terreno se sobreeleva (naturalmente) um pouco da periferia (é uma pendente extremamente suave), ficamos somente com a ideia de que este espaço poderia conter arquitecturas (um recinto de planta desconhecida) onde se integrariam as estelas conhecidas até ao presente. Algumas destas poderiam fazer parte dos alinhamentos/muretes, mas outras poderiam ocupar outros espaços criados por aqueles, como acontece, por ex., com as estelas e/ou lajes de xisto azulado que no Recinto do Castanheiro do Vento (V. N. Foz Côa) reconfiguram espaços formalmente muito diversificados (Cardoso, 2007). Desconhecemos também se tais arquitecturas, que poderiam desenhar-se somente ao nível do solo, configurariam um “edifício” construído de uma só vez— o que conferiria às estelas uma mesma cronologia— ou se, pelo contrário, tal arquitectura sofreu acrescentos, alterações, transformações ao longo do tempo do seu uso. São muitas as hipóteses em aberto. Porém, devem ser realçados os seguintes aspectos: a) as estelas integram-se numa arquitectura pétrea (de tipo recinto) que se desenvolve espacialmente numa encosta muito suave; b) tal arquitectura situa-se em posição topográfica e morfologicamente dominante sobre o vale aberto da ribeira da perior de uma pequena estela com o atributo 2 (ver Estampa 2), que se encontra provisoriamente à nossa guarda no Laboratório de Conservação e Restauro da Faculdade de Letras da Unievrsidade do Porto. 20 Serviço Regional de Arqueologia da Zona Norte (Sousa, 1996). 21 Orlando Sousa (1996) publica uma planta e um corte dessa sondagem, da qual faz comentários muito breves. 22 Na realidade, na Est. LXXXI da publicação de O. Sousa (1996), que é uma foto da escavação, vê-se uma laje em granito que se assemelha à estela nº 10 ou à nº 5. Por outro lado, na pág. 82, O. Sousa leva-nos a crer que as estelas 5 e 10 (de granito) e 8, de xisto, também estariam inseridas no alinhamento. 23 O granito é uma matéria-prima alógena e no solo, quando esta se identifica pertence sempre a uma estela.
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Vilariça, uma área intensamente ocupada na Pré-história24; c) se excluirmos as pedras do alinhamento, as estelas são o único “artefacto” desta arquitectura pois nem nas escavações nem nas prospecções foi exumado qualquer outro; d) cerca de 56% das estelas conhecidas até ao presente25 seriam somente afeiçoadas e 44% exibem atributos gravados; e) o antropomorfismo, como já S. Jorge (1999) fizera notar, decorre da forma/ tratamento das superfícies e/ou dos reduzidos (e repetidos) atributos gravados; contudo, surge agora um novo caso (estela nº 25, fragmentada) em que o topo superior sofreu um estrangulamento que parece anunciar formalmente a cabeça. Aliás, numa das estelas conhecidas em xisto azulado (nº 8), dois entalhes laterais também podem indicar uma divisão formal do corpo (/cabeça?), embora esta estela não tenha contorno antropomórfico. Devemos chamar a atenção para o facto de existirem algumas pedras fincadas e/ou tombadas no Cabeço da Mina (em divisórias de propriedade), por vezes com alguns motivos gravados que formal e iconograficamente se afastam deste grupo, digamos, mais uniforme, o que sugere um aumento de complexidade do sítio e nos mostra que afinal este só se conhece de modo extremamente parcelar. Tendo presentes os condicionalismos já expostos, teceremos aqui alguns comentários interpretativos. Sem contrariar a tipologia proposta por S. Jorge, referente a 21 peças (1999), acrescentaremos alguns comentários que decorrem da presente análise formal/tipológica a 28 estelas “decoradas”. Assim, o nosso quadro 1 dá conta dos atributos considerados (Ver também a Estampa 2). O atributo 1 —1/MF— refere-se à forma/configuração simples e nele se incluem, como dissemos, 56% das peças (35 estelas). Os atributos A2, 3, 4, 5 e 6 são diferentes modos de formalização facial, que ocorrem em 46% das peças (13), embora em 3 delas toda a iconografia se reduza à representação dos olhos (duas covinhas). A separação entre a cabeça e o resto do corpo, através duma linha contínua, foi incluída neste grupo de representações faciais em A3 e A5 (3 casos). Pela posição e associação repetida a motivos claramente frontais, somos levados a supor que os colares (A7 e A8), bem como o motivo A15, marcarão o anverso. Os cintos/faixas (A9, A10 e A11), ocupam posições grandemente aleatórias no corpo da peça, sendo em 10 casos (36%) o único elemento iconográfico que as caracteriza (Estelas 5, 9, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 23). É de fazer notar ainda que mesmo o atributo A13 tanto pode cruzar no reverso 24 Nos rebordos do vale da Vilariça regista-se um assinalável número de estações pré-históricas da mesma época das estelas (povoados e sítios com arte rupestre, além de mamoas), sendo importante referir também o aparecimento de estelas isoladas no extremo sul desse mesmo vale (estelas de Vila Maior e de Couquinho que, entre outros atributos, possuem “olhos” e “colares”). A primeira destas, descoberta por Nelson Rebanda, encontra-se exposta no Museu de Moncorvo (Sousa, 1996); a segunda, publicada por L. Vasconcelos (1910), encontra-se no MNA. Tal povoamento intenso, no Calcolítico, tem vindo a ser confirmado também no baixo vale do Sabor (onde a ribeira da Vilariça desagua), através da identificação de extensos povoados que se desenvolvem em plataformas ao longo das encostas graníticas. 25 Ver atrás, nota 18. Assumimos aí que o total conhecido, à data de redacção deste artigo, perfaz 63 peças.
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(Estelas 1 e 26), como no anverso, pois é o que acontece na estela 10 onde se cruza sob uma face claramente representada e demarcada do resto do corpo. Vários atributos são singulares pois só aparecem uma vez: A4, 6 (faciais), 8, 12 e 16 (indumentária) o que contribui, conjuntamente com as observações anteriores, para podermos interpretar a maioria dos atributos como elementos cuja autonomia bastaria para personificar/dar identidade a cada peça. Se usados em combinação, como acontece também nas estelas 1, 10 e 21, criar-se-iam por certo personificações compósitas quer do ponto de vista gráfico quer semântico. Na realidade, apesar das semelhanças, patentes na distribuição dum leque reduzido de atributos pelo universo das estelas (decoradas), a singularidade/autonomia formal parece ser a característica mais marcante deste conjunto. Se 3 estelas se revelam complexas por associarem 4 motivos iconográficos (Estelas 1, 10, 21), ou por associarem 3 motivos (Estela 27), verificamos, em simultâneo, que estas 4 peças compósitas se distinguem claramente entre si sobretudo porque não partilham exactamente os mesmos atributos embora as estelas 1 e 21 ostentem o mesmo tipo de cinto (A10). Assim, a configuração e associação dos motivos nas estelas nº 1, 10 e 21 permitem que as interpretemos como entidades/personificações com um acentuado grau de independência formal entre si. As restantes estelas parecem ser “partições” ou divisões destas: a) as que têm 2 motivos — 4, 26 e 29—, partilham-nos com as estelas 1, 10 e 21; num caso— estela 24—, a partilha faz-se com a estela 27 (que tem 3 motivos); b) as que tem somente um motivo, e que são a maioria (19 estelas), este está também presente numa ou em duas das estelas complexas atrás consideradas (1, 10, 21 e 27). Exclui-se assim a Estela 25 pois, como dissemos atrás, quer a configuração, quer o motivo (A16) não tem paralelo no conjunto das estelas do Cabeço da Mina. Apesar o Cabeço da Mina ser uma estação muito peculiar —uma arquitectura talvez de tipo recinto—, se atendermos à iconografia/conformação do numeroso conjunto de estelas, aquela parece desenhar-se como um Lugar do Passado com acentuado carácter narrativo. Ali, “personificações de seres” extremamente compostos, mas formalmente (e semanticamente?) independentes entre si (estelas 1, 10 e 21), desdobram-se/ dividem-se em seres sucessivamente mais simples de modo que qualquer ser/entidade/ estela deve ser entendida de modo relacional com o conjunto do recinto e, possivelmente ainda, com as duas estelas que se implantam na entrada sul do Vale da Vilariça e detêm também alguns motivos característicos destas: as estelas de Vila Maior e Couquinho (com similar formalização facial, colares e/ou cintos). Assim, a estação do Cabeço da Mina, situada na parte Norte do vale, tal como já fizéramos notar noutra publicação (Sanches, 1997: I-225-226) remeterá semanticamente para a parte sul do mesmo vale aberto, englobando uma paisagem que fará sentido estudar em articulação mútua. Por outro lado, quer os atributos se refiram a identificações genealógicas e sociais de grupos ou clãs, a estatutos peculiares no interior destes (de género, idade, genealogia, etc.), ou materializem até relações sociais entre grupos e/ou entre “divindades”, admitem individualizações pois cada atributo parece deter um valor específico,
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totalizante, quer dizer, de certo modo, um valor autónomo. Tal facto seria visível nas estelas em que aparece figurado somente um dos atributos (cinto, colar, olhos/face) e que representam afinal a maioria das peças. Porém, cremos que esta arquitectura que pelas suas características formais e locacionais deve ter tido elevado peso regional, não deverá ser entendida somente como uma narrativa comunitária/identitária fechada, à escala do sítio em si, isto é que articule os discursos somente para dentro, para o recinto em si. Deverá, cumulativamente, voltar-se, também de modo relacional, para a rede de lugares exteriores, evocando a vida social das comunidades que nesta época ocupam o território circundante. Como dissemos atrás, este aparece como intensamente povoado na 2ª metade do 4º milénio e no 3º milénio AC, e será em relação com estes sítios regionais —que assumimos como lugares de práticas sociais rotineiras, cíclicas ou mesmo excepcionais, i.e., lugares onde a memória e a identidade se mantêm e recriam—, que uma interpretação mais abrangente destas figuras terá de ser procurada. De acordo com esta linha de abordagem que procura inter-relacionar os diferentes lugares da vida comunitária, e se atendermos por ora somente às peças/estelas que se conhecem no território periférico do Cabeço da Mina, não podemos deixar de nomear aquelas estelas (e seus sítios) que se relacionam formalmente, embora em diferentes graus, com as daquela estação arqueológica. Em primeiro lugar temos as estelas de Vila Maior (Sousa, 1996) e de Couquinho— já referidas atrás e que se situariam no horizonte visual do cabeço da Mina —, bem como a de Moncorvo e a do sítio de Santa Luzia (Freixo de Espada à Cinta). Em segundo, a estela do recinto do Castelo Velho de Freixo de Numão - V.N. Foz Côa (Jorge, 2002; Cardoso, 2007), as do “Bastião” B e D do Recinto de Castanheiro do Vento V.N. Foz Côa (Cardoso, 2007), e as de Salgueiros- Picote, que são objecto deste estudo. Algumas considerações finais Em primeiro lugar é de repetir que somente um programa bem articulado de escavações nos sítios de Salgueiros e Puio–Picote, poderá vir a substanciar as hipóteses interpretativas que aqui fomos expondo. Estas podem resumir-se do seguinte modo: a) O sítio de Salgueiros parece materializar uma estação com estelas, talvez de tipo recinto, complexa. Na realidade, cremos que estas estelas seríam em maior número, assim tivéssemos podido desmontar todo o muro onde as que são objecto deste estudo se recolheram. b) A uma escala baixa de análise, o sítio do Puio, devido à sua proximidade geográfica com Salgueiros, poderá articular-se formalmente e semanticamente com aquele sítio, delineando assim uma paisagem socialmente significativa para os grupos regionais do final do 4º/3º milénio AC e que coincidiria/marcaria o território sobranceiro à curva apertada do rio Douro, bem como o planalto adjacente às falésias da margem esquerda (já em território actualmente espanhol)( Estampa 1). c) A uma escala mais alargada de análise, cremos que este sítio de Picote (Sal-
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gueiros/Puio) se relacionaria discursivamente com toda a rede de lugares regionais, não somente com aqueles que utilizam estelas/lajes nas suas formalizações arquitectónicas (que nomeámos atrás), como com outros sítios (povoados, lugares com arte rupestre, tumuli). d) Seria talvez devido a esta rede de relações, cujos contornos são ainda difíceis de precisar, que tanto a formalização das estelas de Salgueiros/Picote, como a sua associação a uma paisagem “arqueológica” (por ora composta por dois sítios- Salgueiros e Puio) se apresenta tão peculiar (isto é, não se encontram ali duas estelas iguais, nem na forma, nem no tamanho, nem na iconografia). e) Este tipo de formas escultóricas tem raízes formais/cronológicas nas arquitecturas de tipo megalítico (ou de tipo tumulus), como tem vindo a ser referido por vários autores. Nesse sentido, é de destacar aqui, pela proximidade, a Mamoa 3 de Pena Mosqueira-Mogadouro (Estampa 2) que incluía, no local da deposição do cadáver (infantil), um grande seixo antropomórfico coberto de ocre que, tal como a estela 1 de Salgueiros, terá sido escolhido em função da forma antropomórfica que evoca (Sanches, 1986). f) A estela do Puio, embora iconograficamente muito diferente daquelas que até à data se conhecem, sobretudo pelo naturalismo da representação dos olhos, não deixa de apresentar pormenores que tem sentido valorizar no contexto do comportamento das sociedades pré-históricas: a cobertura com pasta castanho avermelhada e cinzenta, que é uma pratica conhecida noutros contextos (particularmente megalíticos) e deve ser valorizada localmente na medida em que a vizinha Mamoa 3 de Pena Mosqueira (Mogadouro) incluía, precisamente na área do enterramento, 3 peças cobertas de ocre e/ou pintura26 (Sanches, 1986); o tratamento do suporte pode ter-se realizado em momentos diferentes, isto é, a peça pode ter sido sujeita a transformações físicas de acordo com o(s) contextos/práticas de significação em que teria entrado.
Agradecimentos Agradece-se a Hugo Pires a disponibilização, para publicação, do levantamento por varrimento da Estela 1 de Salgueiros e a Paulo Lima a ajuda no entendimento da morfologia da mesma estela. Estamos também gratos ao Prof. Manuel Abrunhosa (geólogo da Faculdade de Ciências da UP) que nos ajudou a entender e caracterizar as estelas em análise. Um obrigado muito particular a Rafael Morais que connosco criou os desenhos definitivos que aqui se publicam e organizou também as estampas.
26 A composição desta pasta, no grande seixo antropomórfico, e da pintura, nas outras duas placas, nunca foi objecto de análise específica.
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Estampa 1 - 1: Imagem 3D da topografia da área de Picote onde se recolheram as estelas de Puio (A - esporão/estação arqueológica com longa ocupação de Puio) e local de Salgueiros (B) ( Baseada na CMP, 1:25 000, folha 95, 1950). 2: Extracto da CMP de Picote, 1:25 000, folha 95 (1996), tendo localizados as duas estações indicadas na figura anterior.
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Estampa 2: Em cima - Península Ibérica e ampliação, no segundo mapa, do NW peninsular. Neste localizam-se estelas de Picote e outras estelas, citadas no texto, recolhidas noutros contextos arqueológicos pré-históricos de Trás-os-Montes e Alto Douro. 1- Picote (Miranda do Douro); 2Cabeço da Mina (Vila Flor); 3- Mamoa 3 de Pena Mosqueira (Mogadouro); 4- Estelas da Foz do Sabor/Ribeira da Vilariça (Moncorvo, Vila Maior-Moncorvo, Quinta do Couquinho-Vila Flor ); 5- Sítio arqueológico de Santa Luzia (Freixo de Espada à Cinta); 6-Cemitério dos Mouros (Mirandela); 7- Dólmenes de Alagoa, Castelo 1 e Alto das Madorras 4 (Murça) e dólmen K (Alijó); 8- Dólmen de Madorras 1 (Sabrosa); 9- Castanheiro do Vento e Castelo Velho (V. N. Foz Côa); 10- Estela de Longroiva (Meda); 11- Alto da Escrita (Tabuaço). Em baixo: quadro dos atributos das estelas da estação do Cabeço da Mina (Assares), Vila Flor.
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Estampa 3 - Estela do Puio: anverso e secção longitudinal.1- Superfície polida (sendo maioritariamente polido fino); 2- superfície tratada com picotado fino seguido de polimento grosseiro (sem rugosidades); 3- gravura feita por picotado; 4- Vestígios de pasta castanho avermelhada (reboco?) realizada sobre o fino polido ou sobre o picotado (reverso) 5- Pasta acinzentada (só reverso) sobreposta à superfície finamente polida ou à pasta castanho avermelhada; (cont. na Estampa seguinte).
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Estampa 4 - Estela do Puio: reverso e secção transversal. 6- Talhe realizado por impacto violento e fissuração decorrente do mesmo (fracturas frescas e rugosas); 7- esboroamento e esfoliação, pelas fissuras da diaclase (particularmente nos rebordos da peça). Covinhas da parte média do anverso e outras depressões e picotados (que figuram a branco) decorrem de acções intencionais (de destruição?) e foram feitas recentemente (não tem patine).
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Estampa 5 - Levantamento topográfico da área do Puio. A- local das escavações de J.R. dos Santos Júnior (1952-53); B- (Recinto) Contorno proposto por Dulcineia Pinto (2005) para a demarcação física (por taludes e/ou muralhas) da estação da Idade do Ferro; C- Local onde se recolheu a estela do Puio (no muro de propriedade); D- Fraga do Puio (painel com gravura de arqueiro). Em Baixo: estela do Puio no momento da sua descoberta; parte central do painel da Fraga do Puio com o arqueiro.
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Estampa 6 - Estela 1 de Salgueiros: anverso, reverso, perfis longitudinais e secção transversal (imagens realizadas por Hugo Pires e baseadas no seu registo por varrimento com luz estruturada 3D). Marcam-se os contornos das extracções para conformação da peça bem como as picotagens pontuais (P) feitas com o mesmo objectivo.
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Estampa 7 - Local de Salgueiros. A seta indica a entrada da propriedade onde se recolheram as 3 peças. Em baixo: desenho do anverso e fotos da estela 3 de Salgueiros (as fotos desta estela são da autoria de Antónia Soares).
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Estampa 8 - Desmontagem do muro que tapava a entrada, em Salgueiros. Do lado direito, na vertical e encostada à ombreira da entrada, encontra-se a estela 2. Em baixo: estela 1 do Puio quando ainda no muro.
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Novos métodos de registo digital de arte rupestre: digitalização tridimensional e fotografia multiespectral Hugo Pires1, Paulo Lima2, L. Bravo Pereira3
Resumo A aplicação de tecnologias digitais não-intrusivas no registo da “arte rupestre” e noutras formas de arte, tais como a pintura, escultura, proto-escultura ou mosaicos/tessalae, tem vindo a ser utilizada pelos autores em diversos projectos, nos quais se pretende a criação de modelos virtuais digitais que possam fornecer aos investigadores um novo suporte, passível de ser inspeccionado detalhadamente, bem como desenvolver um novo método de registo para memória futura. São aqui apresentados dois casos de estudo: a Estela n.º 1 de Salgueiros, proveniente de Picote em Miranda do Douro e as pinturas rupestres do abrigo 3 do Regato das Bouças, na Serra de Passos em Mirandela. No caso da Estela n.º 1 de Salgueiros, foi efectuado o levantamento por digitalização tridimensional, tendo por objectivo aferir a existência de grafismos gravados e vestígios de afeiçoamento. No que diz respeito ao abrigo 3 do Regato das Bouças, apresentam-se os resultados preliminares de um projecto de desenvolvimento de um novo método de registo para a pintura rupestre, onde se procura colmatar os limites espectrais da visão humana, conjugando técnicas de fotografia multiespectral com a digitalização tridimensional por luz estruturada. Procuramos, aqui, obter um modelo tridimensional foto-texturizado que permita durante a interpretação, aceder à relação espacial entre os grafismos, à sua relação com a morfologia e à distribuição pelo suporte. Palavras-chave: arte rupestre, registo não intrusivo, modelos virtuais digitais, fotografia multiespectral. Abstract The use of non-intrusive digital technologies in Rock Art documentation, as in other forms of art like paintings, sculpture, proto-sculpture or mosaics, has been applied by the authors in several projects, aiming the creation of digital virtual models that can provide to the researchers a new support for interpretation that allows detailed inspection as well as to develop a new registration method for future memory. Two case-studies are presented: the n. º1 Salgueiros stele, from Picote in Miranda do Douro, 1 Superfície – Geomática, Lda., Porto, Portugal, [emailprotected]. 2 Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto, Portugal, [emailprotected]. 3 Centro de Investigação em Ciências e Tecnologias - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal, [emailprotected].
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história and the cave paintings in the shelter 3 at Regato das Bouças from Serra de Passos in Mirandela. In the first case a three-dimensional scanning was done aiming to assess the existence of engraved drawings and traces of molding. In what concerns the shelter 3, the preliminary results from an on-going project using the combination of multispectral photography and structured light three-dimensional scanning are presented, aiming to improve the spectral limits of human vision. As in the engravings case, the creation of a three-dimensional model is aimed in order to facilitate the drawings interpretation allowing simultaneously understanding the spatial relation between the drawings and the rock morphology, but also his distribution throughout the support. Keywords: rock art, non-intrusive recording, digital virtual model, multispectral photography.
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Âmbito e considerações iniciais A acção dos agentes erosivos naturais e antrópicos sobre os suportes da “arte rupestre” condicionam, frequentemente, a sua visualização. O método de registo convencional, que assenta no decalque manual das pinturas e gravuras em película acrílica, está dependente do limite espectral e da acuidade visual humana e sujeito à subjectividade do operador. Além disso, apresenta uma deficiente adaptação à morfologia do suporte, reduzindo o registo gráfico a uma projecção plana bidimensional que distorce, quer a relação espacial interna dos grafismos, quer a sua relação e distribuição, ocultando, ainda, possíveis associações dos grafismos com particularidades geomorfológicas das rochas (Estampa 1). Por último, a fragilidade e dimensão do registo, resultante da aplicação deste método, dificulta, quer a sua manipulação pelo investigador, quer o seu armazenamento e conservação, factores estes que condicionam fortemente o seu acesso. Neste artigo, são apresentados dois exemplos de aplicação desta metodologia em gravura e pintura rupestres. O novo método de registo que propomos consiste na utilização de duas tecnologias digitais não-intrusivas: a fotografia multiespectral, recorrendo à combinação do espectro visível da luz com as bandas de infravermelhos (NIR) e de ultravioleta (UV), e, finalmente, a digitalização tridimensional. A aplicação destas tecnologias digitais no registo da “arte rupestre” elimina o contacto físico entre o suporte de registo e os grafismos, colmatando, simultaneamente, algumas das limitações espectrais e de acuidade visual humana, suprimindo-se a subjectividade da percepção do operador. A fusão destas duas tecnologias permite, ainda, disponibilizar um modelo digital tridimensional foto-texturizado de fácil manipulação pelos investigadores, concedendo-lhes acesso, não só à rigorosa relação espacial entre os grafismos, bem como à relação destes com a morfologia e distribuição pelo suporte (Estampa 2). Tecnologia de digitalização tridimensional A digitalização tridimensional é uma tecnologia recente que permite a criação de modelos tridimensionais. Estes baseiam-se na medição sistemática de coordenadas cartesianas de pontos sobre uma determinada superfície. A medição de pontos é efectuada em grandes quantidades e num curto espaço de tempo, possibilitando a captura de modelos de superfície compostos por vários milhões de pontos em poucos segundos [BR02]. A conjugação da rapidez de captura de dados com níveis de precisão da ordem das dezenas de micra e a resolução submilimétrica, permite produzir modelos tridimensionais que registam a forma da matéria com um detalhe equiparável à nossa acuidade visual. Existe, actualmente, um variado leque de equipamentos de digitalização tridimensional que permite registar, desde grandes áreas de superfície terrestre de dimensões quilométricas a pequenos objectos de dimensões inferiores ao centímetro,
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apresentando uma relação inversamente proporcional entre a dimensão da superfície a medir e a resolução da respectiva digitalização. A estampa n.º 3 procura elucidar, sucintamente, a relação entre alguns dos equipamentos disponíveis, a sua precisão e as dimensões das áreas a digitalizar. No levantamento realizado na Estela n.º 1 de Salgueiros, foi utilizado um equipamento de digitalização tridimensional por triangulação óptica. A opção por este equipamento teve por base, não só a dimensão da peça em estudo, como também o nível de detalhe pretendido para posterior análise. O sistema utilizado é composto por um vídeo-projector com resolução de 1280x800 píxeis, uma vídeo-câmara digital também com 1280x800 píxeis de resolução e uma câmara fotográfica digital de 10 megapíxel de resolução. A emissão de luz do vídeo-projector, assim como os sinais capturados pelas duas câmaras digitais são controlados por uma aplicação informática desenvolvida particularmente para este fim. O sistema de digitalização tridimensional utiliza a projecção de luz estruturada e apresenta uma precisão de 0,1 mm e resolução espacial de 0,3 mm, consistindo o processo de captura de dados na projecção de feixes de luz sobre a superfície a medir e na recolha de imagens da sua reflexão através de sensores fotográficos digitais. Analisando a deformação provocada pela forma da superfície nos padrões de luz projectados, o sistema calcula uma malha com cerca de 700 000 pontos por cada operação de digitalização (convencionalmente designada por nuvem de pontos) (Estampa 4). Fotografia multiespectral Numa fotografia de luz visível comum, as câmaras fotográficas captam a informação distribuída por três bandas do espectro electromagnético, face às quais os nossos olhos são sensíveis: vermelho, verde e azul (ou abreviadamente “RGB”, do inglês Red, Green, Blue). Sempre que se capta fotograficamente a informação, separando-a em mais bandas do que estas três mencionadas, podemos falar de fotografia multiespectral. Neste tipo de imagem, as bandas podem distribuir-se dentro do espectro de luz visível, mas também incluir outras bandas no espectro de radiação não-visível: frequentemente, incluem-se, neste tipo de imagem, a radiação infravermelha, a ultravioleta ou os raios-X. Para se seleccionar as bandas do espectro pretendidas, o método que utilizamos recorre ao uso de fontes emissoras de radiação de largo espectro (do ultravioleta ao infravermelho, passando pela luz visível) com recurso a flashes electrónicos de lâmpadas de Xénon (Vivitar 285 e 283), modificados com a remoção do filtro protector anti-UV. A selecção das bandas pretendidas realiza-se, posteriormente, através de filtros “band-pass”, colocados na frente da objectiva da câmara. Os filtros têm como objectivo a selecção da banda pretendida, eliminando o restante espectro electromagnético, ao qual o sensor digital da câmara seria sensível. Usamos, desta maneira, um filtro Baader “Vénus” para registo na banda ultravioleta (aprox. dos 350 aos 400 nm
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de comprimento de onda), filtros anti-Infravermelho, anti-Ultravioleta Baader IR/UV block + Schneider Kreuznag 489 para as bandas RGB do espectro visível (aprox. dos 400 aos 700 nm) e, finalmente, um filtro Schneider Kreuznag B+W 093 para bandas no Infravermelho próximo (aprox. dos 700 nm até aos 1000 nm) (Estampa 5). Para o registo das imagens, recorremos a uma câmara digital fotográfica do tipo DSLR, mas modificada e que não apresenta filtro interno anti-IR/UV (Fuji S3 Pro de 6 megapíxeis, filtro anti-IR/anti-aliasing removido). A objectiva usada com esta câmara é também especial, porque é concebida especificamente para um registo multiespectral. Escolhemos uma objectiva Coastal Optics UV-VIS-IR, de 60 mm de distância focal, com um desenho óptico especial que se apresenta apocromática, dos 350 aos 1100 nm de comprimento de onda da radiação electromagnética, não necessitando, desta forma, de correcção de foco nas diferentes bandas do registo (Estampa 6). Casos de estudo Estela n.º 1 de Salgueiros A Estela n.º 1 de Salgueiros integra-se num conjunto estudado pela professora Maria de Jesus Sanches e que se encontra publicado neste mesmo volume. Foi criado um modelo tridimensional integral da sua superfície, construído a partir de dez modelos parciais obtidos por outros tantos varrimentos de diversos pontos de vistas. A montagem do modelo resulta, assim, do alinhamento e do ajustamento geométrico das várias nuvens de pontos a que fizemos referência no ponto 2. O modelo final, depois de eliminada a redundância nas zonas de sobreposição entre nuvens, é composto por 1,5 milhões de pontos. Com base nestes pontos, criou-se um modelo de triângulos, recorrendo ao algoritmo ICP (Iterative Closest Point) que procede à união, por segmentos de recta de cada ponto, com os seus vizinhos mais próximos, originando um modelo contínuo de superfície com cerca de 3 milhões de triângulos (Estampa 7). Outra possibilidade dos sistemas de digitalização tridimensional, explorada neste caso, foi a texturização fotográfica. Este processo consiste na captura de imagens fotográficas em simultâneo com a medição de nuvens de pontos. Desta forma, para além das coordenadas (x,y,z), é atribuído um valor RGB a cada ponto medido, permitindo a criação de um modelo com textura fotográfica realista. De entre as potenciais utilizações deste tipo de modelos no registo de “arte rupestre”, destacamos a edição de ortofotografias digitais (imagens que não apresentam distorções geométricas, podendo ser utilizadas como elemento de representação planimétrica), o cálculo de curvas de nível ou qualquer outro tipo de seccionamento desejado, a inspecção virtual dos modelos, fazendo uso de luz rasante simulada (mimetizando as técnicas de análise de gravura rupestre usadas convencionalmente em arqueologia) e de funções de interacção visual, tais como a rotação e o zoom. Reproduz-se aqui o modelo tridimensional para exemplificar o novo tipo de suporte produzido pela conjugação destas duas tecnologias e mostrar as potencialidades que
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estes modelos digitais reúnem como ferramenta no estudo da “arte rupestre”. O modelo tridimensional obtido por digitalização da estela nº 1 de Salgueiros mostrou ser uma ferramenta que se adequa à análise dos grafismos e estrutura dos suportes da “arte Pré-Histórica”. A inspecção detalhada realizada ao modelo e às características estruturais e morfológicas da sua superfície tornou possível compreender que os “desenhos” losângicos “esculpidos” na sua superfície, que numa primeira fase se pensou terem origem antrópica, não resultaram da acção humana mas sim da metereorização estruturada pela rede de fissuras, reflexo das condições em que se deu a formação do granito (Granito de duas micas Sintectónico, SIN-F 3). Verificou-se que os “desenhos” seguiam um padrão geométrico em que o ângulo de 82,7º definido pela intercepção das fissuras se repetia da macro à microestrutura. A regularidade evidenciada pelos “desenhos” afastou a possibilidade de resultarem da acção humana. Abrigo 3 do Regato das Bouças A fotografia multiespectral parece também ela adequar-se, particularmente, à análise e registo de pintura rupestre. As imagens obtidas por este método ao registarem para além dos limites espectrais da visão humana, permitem redescobrir iconografias ou parcelas delas, que não sendo já visíveis ao olho humano, continuam a sê-lo noutros comprimentos de onda. Com efeito, é isso que parecem provar as imagens multiespectrais obtidas por este método, no Abrigo 3 do Regato das Bouças, Mirandela. Nos dois detalhes que apresentamos, é possível verificar que o registo tradicional não foi capaz de fixar alguns pormenores dos elementos gráficos que surgem de forma muito clara nas imagens multiespectrais, especialmente na componente UV das mesmas. Nestas imagens, é possível definir contornos exteriores e interiores que escaparam à visão humana, mas que se tornaram visíveis através deste método. As imagens apresentadas foram captadas na banda do espectro ultravioleta e processadas em aplicação informática de edição fotográfica, de forma a realçar os elementos pintados (Estampa 8). Trabalho futuro O novo método, que pretende constituir-se como uma nova ferramenta para o registo e estudo da “arte rupestre”, não se limita à captura e utilização em separado das imagens multiespectrais e dos modelos tridimensionais. A fusão destes dois tipos de dados numa única interface, ou seja, num modelo tridimensional com textura fotográfica multiespectral, poderá converter-se numa ferramenta que disponibilizará aos investigadores um novo tipo de acesso aos registos de “arte rupestre”. Este novo instrumento permite proceder a minuciosas inspecções de detalhe, observar o que já não é visível e, em simultâneo, proceder a rigorosas avaliações das relações espaciais entre os grafismos ou deles com as estruturas onde se inserem, assim como com as particularidades morfológicas e geológicas dos suportes. A colmatação de algumas lacunas nos grafismos poderá, ainda, dar um valioso
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contributo para verificar a presença ou não de “artefactos gráficos”, partilhados com outras estruturas, bem como detectar novas singularidades, originárias de novos motivos ou de associações de motivos. O processo de fusão de tecnologias, aplicada à “arte rupestre”, encontra-se em fase de desenvolvimento, tendo como objecto de estudo o Abrigo 3 do Regato das Bouças, em Mirandela.
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Estampa 1 - Detalhe de motivos de pintura associados a particularidades morfológicas da rocha no abrigo 7 do Regato das Bouças.
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Estampa 2 - Estela n.º 1 de Picote e Entrada do abrigo 3 do Regato das Bouças.
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Estampa 3 - Quadro comparativo entre os diversos equipamentos de digitalização tridimensional disponíveis.
Estampa 4 - Operação de calibração do sistema de digitalização tridimensional.
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Estampa 5 - Montagem do equipamento para captura de fotografia multiespectral.
Estampa 6 - Fotografias nas bandas espectrais: visível ultravioleta e infravermelho de detalhe do tecto do abrigo do Regato das Bouças.
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Estampa 7 - Modelo simplificado de nuvem de pontos, modelo triangulado e de malha de superfície.
Estampa 8 - Comparação entre fotografia multiespectral e decalque tradicional.
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Memoriais de pedra, símbolos de Identidade. Duas novas peças escultóricas de Cervos (Montalegre, Vila Real). Lara Bacelar Alves1 e Mário Reis2
Resumo Sobre o planalto que se estende a ocidente da cumeada da serra de Leiranco, no extremo Norte de Portugal, erguem-se dois monólitos ostentando decoração gravada, separados por uma distância de cerca de dois quilómetros. A Cruz de Cepos serve ainda hoje de marco divisório dos termos das aldeias de Arcos e Cervos, enquanto a estela de Tojais se encontra inserida num muro de propriedade. Embora conhecidas localmente, e a primeira tenha merecido algum destaque num inventário descritivo de sítios arqueológicos de Montalegre dos inícios do século XX, nenhuma destas ocorrências havia sido objecto de uma caracterização rigorosa. A Cruz de Cepos é uma estátua-menir de forma antropomórfica e com quatro faces decoradas, exibindo numa delas o singular motivo sub-rectangular alongado que ocorre noutros exemplares conhecidos na zona Norte e Centro da Península Ibérica. Por seu lado, o monólito de Tojais revelou uma composição gráfica integrável no universo estilístico das ‘estelas de guerreiro’ do Bronze Final, o que constitui uma descoberta algo inusitada dado o seu grande afastamento, para norte, da zona fulcral de distribuição destes monumentos. A relevância destes achados justificou a elaboração do estudo monográfico de cada uma das peças, complementado com uma investigação sobre os contextos arqueológicos a elas associáveis. Palavras-chave: Norte de Portugal, Idade do Bronze, Estela, Estátua-menir, Contextos arqueológicos. Abstract This paper deals with two Prehistoric sculptures exhibiting engraved decoration recently identified on the plateau that extends to the west of the higher ridges of serra de Leiranco (Northern Portugal) and located nearly two kms away from each other. Cruz de Cepos is the place-name attributed by the locals to one of these pieces, which still performs the role of boundary marker between the territory of two small villages on the plateau, Arcos and Cervos. Conversely, the stela of Tojais was concealed in a field boundary’s dry-stone wall. Although they were both locally known, and despite the fact that the former was referred to in some detail in an archaeological inventory of Montalegre published in the beginning of the 20th century, none of them had yet been the object of a rigorous study. In fact, Cruz de Cepos is an anthropomorphic shaped statue-menir, displaying an elongated rectangular carved motif which occurs in similar 1 Bolseira de Pós-doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). Investigadora integrada no Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto (CEAUCP). larabacelar@ gmail.com. 2 Parque Arqueológico do Vale do Côa (PAVC). [emailprotected].
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história sculptures from central and northern Iberia. More surprisingly, the monolith from Tojais revealed a carved composition typical of the Late Bronze Age ‘warrior stelae’, meaning that it is, for the moment, the northernmost exemplar of this group, which main distribution area extends from south-western to central parts of Iberia. This paper presents the results of recent research on both sites, drawing upon the archaeological contexts associated with the sculptures. Keywords: Northern Portugal, Bronze Age, Stela, Statue-menir, Archaeological contexts.
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Introdução: as peças e o seu contexto 1. O historial da descoberta As duas peças decoradas que se trazem à estampa são conhecidas pelas comunidades locais, particularmente das aldeias de Arcos e Cervos, mas o seu historial científico era, até à data, muito reduzido. A estátua-menir da Cruz de Cepos encontra-se a meio caminho entre aquelas duas povoações, perto da estrada que as une e, mantendo-se em pé e sendo bem visível, serve desde tempos imemoriais de marco divisório entre os termos das duas aldeias. A estela dos Tojais é menos conhecida por ter sido, há muitos anos, colocada num muro de propriedade com a face gravada voltada para o interior do mesmo e, portanto, oculta dos olhares mas ainda assim mantendo-se a memória, na família do proprietário, da existência desta “pedra com desenhos” (Estampa 1)3. Foi com base nesse conhecimento e nessa memória que um de nós (MR) teve acesso às duas peças, em finais de 1999, no âmbito do trabalho de relocalização e inventário dos sítios arqueológicos transmontanos levado a cabo pela Extensão de Macedo de Cavaleiros, na altura integrada no Instituto Português de Arqueologia4. Da primeira destacou-se a presença de gravuras numa das faces e o facto de servir como marco de termo entre as aldeias, mas não foi na altura reconhecida como sendo uma peça pré-histórica. Maior importância foi atribuída à pedra dos Tojais mas, naquela ocasião, e por ter sido possível apenas entrever parte de dois traços semicirculares paralelos no sector superior da zona decorada, colocou-se a hipótese de se tratar de um esteio de anta gravado com uma figura espiralada. Sobre estas peças existia apenas uma referência bibliográfica de relevo5 num artigo dos primórdios do século XX, da autoria de Fernando Barreiros (1920), que encerra uma primeira inventariação, notavelmente extensa, dos sítios arqueológicos do concelho de Montalegre. Sobre a Cruz de Cepos, Barreiros (1920: 70-71) indica que se situava “num campo chamado do Padrão”, onde ainda hoje se encontra, fincada no solo e bem visível desde uma extensa área em seu redor. Nela refere a existência de três covinhas abertas numa das faces e apresenta um esboço da composição gravada na face voltada a sudeste, embora não adiante qualquer interpretação ou cronologia para este monumento (ibidem). A pedra dos Tojais não é directamente mencionada 3 As duas peças situam-se, administrativamente, na freguesia de Cervos, concelho de Montalegre, distrito de Vila Real. As coordenadas dos locais onde foram identificadas, obtidas por GPS, são as seguintes: Cruz de Cepos: Lat. 41º44’59.6’’N; Long. 007º40’27.7’’W (Coordenadas geográficas, datum WGS 84); ou, em alternativa, M= 238159; P= 531264 (coordenadas rectangulares métricas Hayford-Gauss, datum de Lisboa); Alt. 884m. Estela de Tojais: Lat. 41º46’03.1’’N; Long. 007º39’16.8’’W (Coordenadas geográficas, datum WGS 84); ou, em alternativa, M= 239786; P= 533233 (coordenadas rectangulares métricas Hayford-Gauss, datum de Lisboa); Alt. 920m. 4 Foram ambas incluídas na base de dados nacional de sítios arqueológicos — Endovélico — tendo sido atribuídos o CNS (Código Nacional de Sítio) 13972 à Cruz de Cepos e 13975 à peça de Tojais. 5 As escassas referências posteriores limitam-se a reiterar a informação contida na primeira.
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nesse mesmo artigo mas é possível que o seja indirectamente quando o autor se refere à anta dos Tojais6 (Barreiros, 1920: 70), descrevendo a morfologia de um esteio in situ, que ainda lá se encontra, e de um outro que diz estar tombado a seu lado, entretanto desaparecido. Como veremos adiante, é lícito colocar a hipótese de que este último esteio corresponda à estela dos Tojais. Em 2008, aquando da preparação de um trabalho de síntese sobre as manifestações de arte rupestre de Trás-os-Montes Ocidental, procedemos a um reconhecimento destas duas peças e pudemos então, mediante uma avaliação criteriosa das suas características, reconhecer-lhes pleno valor. A Cruz de Cepos é, efectivamente, uma estátua-menir de forma antropomórfica, faceada em quatro lados e com decoração gravada em pelo menos três faces: para além das duas que haviam sido já testemunhadas por Barreiros, numa terceira entrevia-se, apesar da espessa cobertura liquénica, o que se assemelhava fortemente ao enigmático motivo sub-rectangular alongado, presente em diversas estátuas-menires do Norte e Centro peninsulares. Isto permitiu desde logo incluir esta peça no acervo de esculturas pré-históricas, definido inicialmente por Susana O. Jorge como Grupo 2 (Jorge, 1991: 367-368), ou por Primitiva Bueno e colaboradores como Grupo do Noroeste Peninsular (Bueno Ramirez et al., 2005: 629). Em Tojais, fomos desta feita mais longe na remoção das pedras do muro que ocultavam a superfície gravada da laje, e mesmo não tendo acesso à sua totalidade, foi possível desvelar por inteiro o motivo anteriormente observado, constatando-se que se tratava afinal da representação de um escudo com chanfraduras em “V”, integrável no universo estilístico das chamadas “estelas de guerreiro” do Bronze Final do Centro e Sul peninsular. Assim, estas peças foram incluídas na síntese atrás referida (Alves & Reis, 2009: 78-81), após uma análise preliminar e sem que na altura estivesse ainda adquirido um pleno conhecimento do repertório figurativo presente em cada uma. 2. Trabalhos realizados e metodologia. Em virtude da relevância científica destes achados, procedeu-se à elaboração de um projecto de investigação conducente ao levantamento morfológico e registo gráfico das gravuras presentes em ambas as peças, direccionando a pesquisa também aos potenciais contextos arqueológicos associados mediante uma prospecção selectiva da área envolvente. Munidos das necessárias autorizações do IGESPAR, I.P. e dos proprietários dos terrenos onde se encontram a Cruz de Cepos e a estela de Tojais, respectivamente, do Sr. José Avelino Vaz de Sousa e do Sr. Artur Pires Lucas que, com entusiasmo, consentiram a realização dos trabalhos, mesmo tendo implicado, em Tojais, o desmonte de parte do muro de pedra seca. O trabalho de campo decorreu entre os dias 7 e 12 de Agosto de 2009, tendo-se cumprido o programa de trabalhos proposto7. 6 Aquela anta e outro possível monumento vizinho são inventariados no Endovélico com os CNS 13973 e 13974. 7 A equipa de investigação foi constituída pelos autores, com a colaboração pontual de Jorge Vilhena, a quem agradecemos.
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Na Cruz de Cepos, procedeu-se à remoção parcial da flora liquénica que recobria quase toda a superfície das suas quatro faces, por meios não abrasivos, visto que impediam uma adequada visualização da decoração gravada. É de notar, aliás, que só após a limpeza foi descoberto o motivo insculpido na face que se julgava isenta de decoração8. Concluída esta operação, realizou-se o decalque integral das gravuras rupestres e dos acidentes da superfície rochosa que ilustram a sua textura e microtopografia, à escala 1:1, sobre polivinilo transparente. Obtiveram-se ainda uma secção longitudinal segundo o eixo maior da peça e secções transversais a cada 20 cms, registadas à escala 1:10. Para o registo fotográfico foi preferida a luz solar rasante em detrimento da luz artificial, por se considerar mais adequada às características litológicas do suporte, dada a profusão de grãos de quartzo luminescentes em toda a superfície da peça. O tratamento digital dos registos em gabinete foi realizado pelos signatários e o desenho final das peças por Marisa Nata. Uma das questões mais prementes e que foi colocada com anterioridade à intervenção no terreno, prendia-se com a possibilidade desta estátua-menir se encontrar ainda na sua posição original ou se, em época desconhecida, teria sido transladada e colocada na sua actual localização. Visto que se encontra fincada no solo, impunha-se procurar, nas imediações, eventuais contextos arqueológicos, parcial ou integralmente coevos deste monumento, assim como aferir, por meio de uma sondagem de diagnóstico, da existência de indícios que apontassem (ou não) para a sua inserção in situ. Neste sentido, foi prospectada a superfície do terreno na área envolvente e aberta uma pequena sondagem na base da estátua, encostada a uma das faces9. Tal como para a Cruz de Cepos, foi inicialmente proposto abrir uma sondagem de diagnóstico junto à estela de Tojais embora, tendo em sua conta a sua colocação num muro de propriedade, a possibilidade de se encontrar in situ se afigurasse remota. Porém, visto que se tratava de uma pedra de dimensão bastante superior às demais e por o muro fazer um cunhal em 90º aproveitando precisamente aquela laje, ainda se considerou a hipótese. No entanto, antes do início dos trabalhos, o actual proprietário do terreno informou-nos que o seu pai, há cerca de 70 anos atrás, retirara a pedra do local onde se encontrava para a inserir no muro. A memória da existência daquelas gravuras manteve-se até hoje, mas os restantes elementos que resultaram da fracturação do que seria uma laje de maiores dimensões desapareceram, permanecendo a estela irremediavelmente mutilada. Assim, os trabalhos resumiram-se ao desmantelamento do muro de um e outro lado da pedra, à escavação da parte inferior de forma a libertá-la por completo e ao registo da sua morfologia e iconografia.
8 Foram apenas removidos os líquenes foliáceos com recurso a água e espátulas de madeira. Não se insistiu na limpeza dos líquenes crustáceos que, de forma visível, crescem dentro da estrutura do suporte e moldam a própria superfície, o que se observa ao longo de grande parte da peça. 9 Terminados os trabalhos de registo de planos e perfis, foi colocada uma extensão de ‘rede-sombra’ no fundo e contra os cortes e a sondagem entulhada com a terra procedente da escavação.
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3 . Contexto geográfico: o planalto e a serra Situada no limite noroeste de Trás-os-Montes, a área visada neste estudo encosta-se às faldas orientais do sistema montanhoso Galaico-duriense cujo relevo se desenvolve ao sabor do suave modelado granítico das amplas extensões planálticas, retalhos da superfície fundamental entre os 850 e os 950 m, apenas entrecortadas por cumes elevados, de origem tectónica, com altitudes sempre superiores aos 1100 m, e por vales profundamente entalhados (Pereira, 2006: 8). Trata-se de uma zona que se encerra no arcaizante ambiente das montanhas do Alto Portugal, marcada de forma indelével pela extraordinariamente forte energia do relevo (Ribeiro et al., 1995: 137) à qual se alia uma perfeita adaptação humana no que respeita à economia e ao povoamento (Ribeiro, 1987: 109). A zona planáltica adjacente à serra de Leiranco situa-se, então, entre a orla oriental do maciço formado pelas serras do Gerês-Barroso e a depressão Verín-Chaves, onde se encaixa a planície fluvial do Tâmega, bem conhecida pelo seu potencial agrícola e por constituir uma via natural de passagem. De facto, a serra de Leiranco encontra-se próximo do cruzamento entre duas vias naturais de trânsito que atravessam a região central do Norte de Portugal: uma, no sentido N-S, definida pela grande depressão tectónica Verín-Régua que conduz ao vale do Douro e outra, no sentido E-O, entre o vale do Cávado e a veiga de Chaves. Este eixo foi materializado, em época romana, pela via XVII do Itinerário de Antonino que ligava Braga a Astorga atravessando, de forma mais ou menos linear, os planaltos do Barroso, antes de alcançar Chaves (e.g. Rodríguez Colmenero et al., 2004). Se avistada desde a veiga, a serra de Leiranco, que atinge os 1156 m de altitude, ergue-se no horizonte como uma verdadeira muralha granítica (Estampa 2). A vertente oriental desce abruptamente mais de 600 m até ao vale do rio Terva e possui um perfil reminiscente das escarpas de falha que ali se desenvolvem no sentido NNE-SSW (Pereira, 2006: 9; Ribeiro et al., 1995: Fig. 50). Desde poente, o Leiranco é a última culminação a atingir uma altimetria superior aos 1000 m antes de se descer para a veiga. Porém, o relevo que se desenvolve a cotas superiores aos 850 m sobe suavemente formando chãs alargadas até alcançar aquele maciço sendo apenas interrompidas pelo vale do rio Beça. A estátua-menir da Cruz de Cepos e a estela de Tojais encontram-se nessa extensão planáltica que constitui a extremidade ocidental do maciço de Chaves (Teixeira et al., 1974; Ramos, 2003). É importante realçar que estas peças se encontram muito próximo de um ponto de convergência de três formações litológicas distintas, ponto esse situado precisamente nas encostas fronteiras à Cruz de Cepos. Nesta zona, o maciço de Chaves, uma importante mancha de granitos de grão médio a grosseiro de duas micas, encosta-se a uma faixa metassedimentar que integra duas unidades diferenciadas (Teixeira et al., 1974; Ramos, 2003). A Noroeste de Arcos ocorre uma mancha de xistos muito metamorfizados que corresponde a uma unidade constituída por metassedimentos quartzo-pelíticos e quartzo-feldspáticos com algumas intrusões quartzíticas e graníticas, atravessado por ocasionais filões aplito-pegmatíticos e de quartzo (Ramos, 2003: 136 e
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Fig. 4.7). Para ocidente e sul daquela aldeia estende-se uma faixa de micaxistos andaluzíticos, onde se encaixam numerosos filões aplito-pegmatíticos que foram sujeitos a intensa actividade mineira10 (Ramos, 2003: 136 e Fig. 4.7; Teixeira et al., 1974; Pereira 2006). Na verdade, os aplito-pegmatitos desta segunda unidade constituíram uma das principais fontes de extracção de estanho do Norte de Portugal, em virtude dos teores elevados de cassiterite neles contidos (Pereira, 2006: 88; Teixeira et al., 1974: 29). Na encosta sudeste da serra de Leiranco é de destacar o conjunto mineiro do vale do Terva, com importantes vestígios de exploração de estanho e ouro em época romana, nomeadamente no Poço das Freitas (Martins, 2009; Martins & Morais, 2009). 4. O contexto arqueológico local Os férteis terrenos da planície fluvial do Tâmega, na veiga de Chaves, a mais baixa da linha de depressões Verín-Régua, favoreceram, desde tempos remotos, a fixação do povoamento, sendo a coesão social das comunidades locais manifestada pela criação de ‘culturalidades’ e formas de socialização próprias. Mas é, em simultâneo, uma via natural de trânsito encravada entre relevos montanhosos e, por isso, também um receptáculo de elementos materiais e ideológicos supra-regionais. Arqueologicamente atesta-se a abertura das comunidades pré-históricas a protótipos artefactuais de origem meridional desde os inícios do IIIº milénio BC em povoados como a Pastoria ou o Castelo de Aguiar (Jorge, 1990: 206). A riqueza mineira da região deverá, já nos alvores da história, ter estimulado uma forte interacção entre comunidades locais e forâneas (e.g. Martins, 2009; Martins & Morais, 2009). E é sobre essa dicotomia e equilíbrio entre o ambiente culturalmente mais dinâmico da veiga e o ambiente arcaizante das montanhas, por um lado, e a necessidade permanente de regularização entre as formas de sociabilização entre comunidades locais e alógenas, por outro, que se deverá futuramente perspectivar os contextos sociais e ideológicos subjacentes à presença das duas peças escultóricas que se trazem agora à estampa. A nossa área de estudo encontra-se, como notámos, precisamente na linha de transição entre as serranias e as veigas de Boticas, a mais próxima, e de Chaves. É de lamentar que a investigação arqueológica tenha sido aqui praticamente inexistente. Dos sítios arqueológicos situados na envolvente imediata à serra de Leiranco que foram referenciados no último século e coligidos nas bases patrimoniais, nenhum mereceu ainda qualquer intervenção científica, o que condiciona sobremaneira qualquer tentativa de contextualização destas peças. Neste conjunto, é de salientar, no planalto, a presença da anta de Tojais, embora referências toponímicas antigas indiciem a localização de outros monumentos desta natureza nas imediações (Barreiros, 1920). A noroeste da aldeia de Cervos, em local desconhecido, há notícia de um achado ocasional de um machado de bronze (Cardozo, 1960). No Castro dos Cortiços, sobran10 Foi significativa a exploração mineira nesta zona durante o século XX, a avaliar pelos resultados da actividade do antigo Couto Mineiro do Bessa (e.g. Pereira, 2006).
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ceiro ao vale do Beça, os materiais arqueológicos observados à superfície do terreno indiciam a presença de uma ocupação da Pré-história Recente ou Proto-histórica11. Mais próximo da Cruz de Cepos, no Alto do Facho12, foi recolhido, no âmbito deste trabalho, algum material de superfície que inclui cerâmica de fabrico manual e um fragmento de dormente de mó manual. A sudeste da área de estudo, na encosta ocidental da serra, foram inventariados três possíveis sítios de habitat, dois dos quais amuralhados, um com ocupações da Idade do Ferro e Romana, os outros de cronologia indeterminada. Na vertente oposta, sobre o vale do Terva, para além de rochas com gravuras rupestres, estão referenciados numerosos sítios com ocupações Pré- e Proto-históricas e de época romana, incluindo explorações e povoados mineiros (e.g. Martins, 2009; Martins & Morais, 2009; Alves & Reis, 2009). A importância da exploração romana das fontes de minerais metálicos desta região é atestada pela associação directa entre estas e o traçado da referida da via XVII do Itinerário de Antonino (Martins & Morais, 2009: 315-316). Esta via bifurca-se a ocidente da serra de Leiranco numa área onde são conhecidas inúmeras jazidas de estanho (Teixeira et al., 1974) sendo que um dos troços atravessa o planalto na zona de Tojais onde inicia a sua descida em direcção ao vale do Terva e à veiga de Chaves (Martins & Morais, 2009). A estátua-menir da Cruz de Cepos 1. O locus A estátua-menir encontra-se no campo do Padrão, entre as aldeias de Arcos e Cervos. O microtopónimo ‘Padrão’, por alguns já hoje esquecido, alude provavelmente à presença deste monumento, ele próprio também designado por ‘Marco do Padrão’13. A estátua ergue-se numa zona aplanada, bem irrigada, no eixo central do planalto, sobre lameiros actualmente ocupados por campos agrícolas e, dependendo do faseamento dos pousios, pode ser vislumbrada em campo aberto, tal como a encontrámos em Agosto de 2008, ou emersa num denso milheiral que a oculta por completo dos olhares, situação com que nos deparamos em 2009. Curiosamente, situa-se também a quase meia distância entre o início da subida para os cumes da serra de Leiranco (cerca de 1500 metros para nascente) que se desenvolvem sensivelmente na direcção norte-sul e o vale do rio Beça (cerca de dois quilómetros para oeste), sendo este o primeiro curso de água com alguma importância nesta zona e que corre de norte para sul, antes de se juntar ao Tâmega. Assim, entre a serra e o vale do Beça, espraia-se um relevo suavemente ondulado, encontrando-se a estátua aproximadamente ao centro deste corredor, numa das zonas mais deprimidas topograficamente. Para nascente, a vista é dominada e fortemente condicionada pelos relevos escalonados que conduzem às cumeadas superiores da serra mas de11 Cf. informação contida na ficha de inventário do Endovélico referente ao Castro de Cortiços (CNS 5384). 12 Inventariado no Endovélico com o CNS 13967, era aqui apenas referida uma possível ocupação de cariz e cronologia indeterminadas. 13 Se bem que pudesse referir-se igualmente aos marcos miliários conhecidos associados à via romana.
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tém um domínio visual mais amplo para noroeste. Desde o local de implantação da estátua, por entre a elevação do Alto do Seixo e pequenos outeiros rochosos, a vista alcança os sinuosos contrafortes do Barroso e o alto da serra do Larouco (Estampa 3). Desta forma, associam-se intimamente, numa área de cerca de 12 km2, chãs aplanadas e bem irrigadas, favoráveis ao povoamento sedentário em grandes aldeias e à prática de agricultura, e as cumeadas da serra, profícuas em recursos cinegéticos. Nos lameiros que se estendem pelo eixo central do planalto, os campos de cultivo de centeio, batata e milho dão lugar a pastagens para gado bovino quando em pousio e remetem para cotas mais elevadas os extensos relvados naturais que se mantêm durante quase todo o ano (Ribeiro 1987). Pontua o arvoredo típico da Terra Fria — castanheiros, carvalhos, plátanos, choupos — que pincelam a paisagem de tons rijos de cinzento e castanho (Ribeiro 1987: 150). Parece que todos os recantos foram tocados pelo Homem, trilhados, cultivados. Só o fraguedo e os fios de água que escorrem pelos suaves declives parecem guardar o carácter etéreo desta paisagem onde a Cruz de Cepos assoma como uma âncora da longevidade do tempo. 2. A estátua-menir: morfologia e iconografia Encontra-se exposta a totalidade da escultura destinada a ser visível que atinge uma altura de 1,60 m. Abaixo da cota actual do terreno, o monólito adquire uma secção ovalada e afunila paulatinamente até à base, mantendo um talhe cuidado. A parte enterrada mede 1,00 m de comprimento, o que corresponde a pouco mais de um terço da sua altura total. A modelação subtrapezoidal das faces maiores confere à peça um carácter antropomórfico como se o personagem representado se encontrasse envolto numa túnica longa que lhe recobrisse o tronco e membros inferiores (Estampa 4). O anverso e o reverso apresentam superfícies tendencialmente aplanadas e verticais enquanto as faces laterais são mais irregulares e estreitam progressivamente da base para o topo. Como mostram os cortes transversais (Estampa 5) apresenta, ao nível da base, secção plano-convexa que se desenvolve para o topo adquirindo contorno sub-rectangular. O geometrismo estrutural da forma paralelepipédica impõe a estruturação da peça segundo quatro perspectivas distintas, quatro planos paralelos criados pelo tratamento individual de cada uma das superfícies. Insere-se num esquema primevo de estatuária caracterizada pela representação anorgânica da figura humana que impõe imagens com elevado grau de abstraccionismo, conceptuais e tendentes à tipificação (Beccati 1965: 31-33). Neste caso, a aspereza do talhe geométrico anguloso é atenuado pela sucessão de elementos gráficos, símbolos que aderem ao ‘corpo’ pétreo e que são visualizados ao ritmo da luz e do movimento do observador. O monólito granítico14 foi afeiçoado na íntegra e exibe detalhes anatómicos 14 Uma observação preliminar indica que se trata de granito local, de grão médio com duas micas, em cuja composição abundam o quartzo, feldspatos potássicos e albite (Teixeira et al., 1974: 20).
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dignos de nota. Arranca do solo numa espécie de plinto, tem os ombros bem marcados e o pescoço foi cuidadosamente talhado no anverso de forma a ser obtida uma superfície côncava. O topo, boleado, corresponderá ao arranque da cabeça que não parece ter merecido um tratamento formal muito evidente. A face lateral direita (A) exibe um alinhamento de três covinhas mais profundas e três outras mais ténues, para além de dois segmentos de linha muito degradados que poderão constituir vestígios de sulcos. No anverso da peça (face B), disposto de forma central e dominante, surge um motivo sub-rectangular com os lados ligeiramente estrangulados na zona mesial e um seccionamento interno na extremidade superior (Estampa 5). Esta é uma figura recorrente noutros exemplares desta região e constitui um elemento identificador de um subgrupo particular de estátuas-menir peninsulares. Nesta peça, ele ocupa cerca de 2/3 do espaço operatório e assume um carácter dominante e estrutural ao nível da composição escultórica. Aliás, concordamos com a ideia avançada por R. Vilaça e colaboradores de que se deverá considerar a superfície onde este motivo está representado como o anverso ou face principal na maioria peças conhecidas, incluindo Faiões (e.g. Vilaça et al., 2001: 76), por oposição às propostas inicialmente expressas (e.g. Jorge, 1991: 368; Jorge & Jorge, 1983: 47; Jorge & Jorge, 1990). Acresce referir que na estátua-menir de São João de Ver esta questão merece algumas dúvidas contudo não se deverá descartar a hipótese de que este exemplar possa ter sido reutilizado e a organização plástica e escultórica alteradas subsequentemente à sua concepção original15, o que não é inédito no contexto do Noroeste peninsular16. À semelhança dos restantes casos conhecidos, o motivo sub-rectangular arranca do pescoço que foi aqui intencionalmente talhado de modo a definir uma ligeira curvatura. É frequente relacionar aquela figura com um elemento de vestuário, quiçá cerimonial, uma peça, talvez em tecido ou couro, destinada a ser colocada sobre o peito e atada à volta do pescoço com fitas ou correias e vem sendo interpretado como 15 Atentando ao que nos é permitido apreciar através do registo fotográfico publicado (Jorge & Jorge, 1983: 48) há alguns aspectos que permitem sugerir que originalmente esta peça poderá ter sido concebida com o motivo sub-rectangular gravado no anverso. A estátua apresenta perfil de configuração plano-convexa, mais pronunciada na zona da cabeça, sendo que a curvatura se desenvolve no sentido da superfície onde se encontra a figura sub-rectangular enquanto que a face oposta é plana e vertical, tal como sucede no reverso do exemplar de Tremedal de Tormes (Salamanca) e na própria Cruz de Cepos. Na face que exibe a insígnia, a saliência subcircular sobre o pescoço poderia corresponder, caso se tratasse do anverso da peça, ao contorno inferior do rosto. Esta seria uma explicação alternativa à proposta pelos autores que deram à estampa esta peça e que interpretam este ressalto como figuração do para-nuca do capacete ou cabelo associado à figura humana representada na face oposta (Jorge & Jorge, 1983: 46). É evidente que se trata de uma mera hipótese de trabalho que só poderá ser convenientemente avaliada após uma análise in loco daquele exemplar. 16 A estátua-menir de Muiños de San Pedro (Ourense) é dos exemplos mais conhecidos de reutilização de uma peça desta natureza. No lado oposto àquele que exibe o motivo sub-rectangular foi figurado, em época romana, um rosto humano sobre a zona da cabeça e gravada, na superfície correspondente ao corpo, uma epígrafe funerária cuja onomástica indicia uma filiação indígena (González García, 2009: 133-140).
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‘insígnia’ de poder ou elemento de protecção corporal (e.g. Jorge, 1991; Vilaça, et al. 2001: 76). Adopta formas relativamente estandardizadas mas é evidente alguma variabilidade no que respeita às dimensões em que é representada. Nas estátuas-menir da Bouça (Sanches & Jorge, 1987) e de Ataúdes (Vilaça, et al. 2001: 76) figura ao nível do peito, enquanto que na de Longroiva (Almagro Basch, 1966: 108-109) e na de Cruz de Cepos ocupa cerca de 2/3 do espaço operatório disponível. Ainda no anverso da peça observam-se quatro covinhas que parecem ter sido adicionadas em fase posterior à gravação do motivo central, o que é mais claro no caso daquela que se sobrepõe directamente ao sulco do lado direito. A limpeza cuidada da superfície da estátua-menir foi, de facto, fundamental para a boa visualização das gravuras e permitiu desvelar um motivo insculpido na face lateral esquerda (face C). Trata-se de uma espada, com 50 cms de comprimento, 8 cms de largura no topo e 6 cms no desenvolvimento folha. Encontra-se disposta na vertical, ligeiramente inclinada para a esquerda. Este é o único motivo que não foi aberto a picotado mas figurado em ‘falso relevo’ obtido por rebaixamento da superfície adjacente através de um desbaste arrastado. Parece estar representada apenas a parte correspondente à folha, que apresenta contorno subtrapezoidal na parte superior e se desenvolve com bordos rectos até afunilar próximo da ponta, estando a empunhadura ausente ou degradada. É de relevar que a espada figurada na estátua-menir de Chaves (Jorge & Almeida, 1980) apresenta uma morfologia muito semelhante à da Cruz de Cepos, sobretudo no que respeita à configuração da parte superior da folha17. Embora seja difícil classificar as armas gravadas sobre estes suportes dado o esquematismo das representações e a ausência de detalhes definidores de uma tipologia específica, não deixa de ser curioso assinalar que as suas dimensões se aproximam, por exemplo, das da espada de Pinhal de Melos (Fornos de Algodres) atribuível ao Bronze Antigo Pleno (AA. VV., 1995: 31), com 56 cm de comprimento, medindo a parte correspondente à folha cerca de 50 cm e 9 cm de largura, o que apenas permite sugerir que poderá estar aqui representada graficamente em tamanho real. Paralelamente, deve notar-se que as dimensões da estátua-menir são compatíveis com a estatura humana. O reverso (face D) apresenta uma composição geométrica complexa. Ao centro e ocupando a parte correspondente ao corpo da estátua desenvolve-se um motivo em X com o topo e base unidos por linhas constituindo duas formas triangulares espelhadas que são atravessadas longitudinalmente por uma linha medial com desenvolvimento para a parte superior onde termina lançando dois sulcos de cada lado, o que confere à figura um aspecto vagamente antropomórfico. Não cremos que se tratem de correias ou elementos de suspensão por não terem prolongamento para as faces laterais. O sulco gravado, com perfil em U, é ligeiramente mais largo e encontra-se melhor conservado do que o das gravuras do anverso, estas também mais expostas à erosão. Embora esta 17 Esta semelhança foi corroborada por observação directa da peça que se encontra em exposição no Museu da Região Flaviense, em Chaves.
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composição não encontre paralelos estreitos noutras peças conhecidas, os conjuntos de linhas cruzadas não são estranhos ao repertório iconográfico das estátuas-menir da região, tomando a de Chaves como exemplo. Porém, é importante assinalar que combinações de dois triângulos espelhados unidos por um vértice, ocorrem em pelo menos duas estátuas-menir provenientes do santuário do Cabeço da Mina (Vila Flor) que exibem unicamente decoração geométrica (e.g. Jorge, 1999a: 139). Apesar das semelhanças formais serem menos claras, esta composição também recorda um motivo presente na face lateral esquerda da estela da Caparrosa (Tondela) constituído por uma sequência de figuras triangulares que formam toscos losangos (Gomes, 1993). No que respeita à distribuição geográfica do subgrupo de estelas a que a Cruz de Cepos pertence, cumpre apenas mencionar que estas peças tendem a ocorrer na metade Norte da Península, com maior concentração no rebordo ocidental da Meseta e Norte de Portugal. Entre elas, as peças que exibem em simultâneo os três elementos que melhor caracterizam este subgrupo, ou seja, uma forma antropomórfica evidente, motivo sub-rectangular e armas, compreendem menos de metade do acervo conhecido e não configuram um subgrupo geograficamente circunscrito. Pelo contrário, ocorrem no mesmo âmbito regional das demais. A diversidade de soluções reconhecida nas formas escultóricas destas peças, assim como a ausência/presença e distribuição de certos elementos gráficos no espaço operatório parece indiciar alguma liberdade por parte das comunidades locais para seleccionarem, no momento da criação destas peças, determinados componentes morfológicos adentro de um modelo geral. É evidente a utilização de ‘protótipos’ escultóricos e figurativos e a existência de alguma regularidade na posição em que são colocados os elementos gráficos mas a morfologia final das peças parece ter sido largamente deixada à mercê da criatividade dos seus escultores. Contudo, também parece ser claro que estas manifestações prefiguram uma adesão das comunidades locais a formas de expressão simbólica que criam laços de identidade cultural e/ou cultual de amplitude supra-regional, materializada na personificação, em pedra, de uma figura tutelar, herói deificado ou de uma entidade mítica que assume características humanas. Pela sua presença física em locais visíveis na paisagem, em sítios de passagem e de uso quotidiano, constituíram verdadeiros memoriais que prevalecem até aos nossos dias. Embora vendo alteradas as suas funcionalidades primevas, a Cruz de Cepos é também hoje ‘memória petrificada’ de um tempo antigo estando nela retido o valor simbólico da delimitação do termo das aldeias trasmontanas. 3. A prospecção e a escavação arqueológica A primeira prospecção da área envolvente à estátua revelou-se infrutífera. Em pleno Verão, os terrenos encontravam-se cultivados ou cobertos por uma exuberante vegetação que condicionava a visibilidade ao nível do solo. No entanto, o primeiro indício da existência de uma ocupação pré-histórica no local surgiu nos preparativos para a implantação da sondagem de diagnóstico. Em redor da estátua-menir, encon-
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travam-se pequenos blocos de granito, provavelmente ali colocados no decurso dos trabalhos agrícolas. Um destes jazia imediatamente em frente à face correspondente ao anverso, apresentava uma forma regular, ovalada, secção semi-circular e exibia uma nítida marca de arado na superfície visível. O bloco foi removido após registo no levantamento planimétrico da área de intervenção, e só nessa ocasião se verificou que se tratava de um fragmento de dormente de uma mó de vaivém que, embora descontextualizado, não terá sido trazido de longe (Estampa 6). Não se trata seguramente de um depósito intencional relacionado com a utilização original da estátua-menir pois assentava sobre uma camada de revolvimento recente cuja extensão se definiu aquando da abertura da sondagem. A sondagem de diagnóstico foi implantada do lado Norte da estátua, encostada à face lateral direita ou face A18. A escavação revelou quatro unidades estratigráficas sequenciais (Estampa 6): U.E. 01 – camada superficial, pouco espessa, constituída por terra pulverulenta de cor cinzenta, com abundantes raízes, de textura grosseira e homogénea; U.E. 02 – camada de terra humosa com características idênticas à anterior, embora com menos raízes, que configura uma bolsa intrusiva encostada à estátua-menir. U.E. 03 – unidade negativa correspondente à abertura da vala que se dispõe ao longo da base da U.E. 02; U.E. 04 – camada de terra mais compacta do que as anteriores, de textura grosseira, homogénea, com algumas raízes, apresentando cor castanha-acinzentada escura e exíguos elementos pétreos (granito e quartzo) próprios dos terrenos aluvionares; U.E. 05 – camada de terra de textura fina, compacta, pouco húmida, sem raízes, de cor castanha clara com alternância de manchas amareladas e castanhas escuras. U.E. 06 - o plano final da escavação terminou no topo desta camada. No seu plano inicial apresenta uma terra de textura fina e muito homogénea, pouco compacta e de cor bege19. Sob o nível de sedimentação recente (U.E. 01), revela-se uma pequena vala que encosta ao monólito e que poderá corresponder a uma tentativa recente de desenterrar a estátua ou sondar a sua profundidade. O carácter recente das quatro unidades superiores é acentuado pelos materiais que forneceram: pequenos fragmentos de vidro (U.E. 04), um pequeno fragmento de cerâmica cinzenta a torno (U.E. 02) e, em todas estas, abundantes resíduos de plástico. Todavia, continham também dois fragmentos de cerâmica manual (U.E. 02) e uma esquírola de quartzo (U.E. 04). A U.E. 05 é claramente a mais relevante e aquela que lança algumas pistas sobre 18 Inicialmente abriu-se uma sondagem de 70x50 cm que foi ampliada para 120x50 cm quando se constatou que a base da estátua se encontrava profundamente enterrada. 19 Perante a inesperada profundidade que a sondagem atingiu e as condicionantes impostas pela calendarização dos trabalhos, foi decidido protelar a escavação desta U.E. para uma futura campanha de trabalhos no local, razão pela qual não conhecemos as características específicas desta camada, nem a que cota se encontra o solo geológico.
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as condições de implantação da estátua-menir. Isenta de vestígios modernos, é integralmente seccionada pela estátua, cuja base parece entrar ligeiramente no topo da U.E. 06. Outro aspecto que a diferencia das anteriores é a sua heterogeneidade, evidenciada pela presença de manchas de distinta coloração. Por outro lado, embala uma quantidade mais apreciável de material arqueológico, o qual aparece ao longo de toda a sua espessura, mas com uma nítida concentração no fundo. Foram exumadas três esquírolas de talhe, uma lasca de quartzo leitoso e uma outra de quartzo hialino e oito fragmentos de cerâmica manual. Aparecem com frequência pequenos carvões que foram recolhidos. De acordo com as informações obtidas nesta fase, afigura-se-nos muito plausível que a U.E. 05 corresponda à vala de implantação da estátua-menir, embora a exiguidade da sondagem não tenha permitido definir o seu contorno periférico, nem se haja detectado qualquer vestígio de uma estrutura pétrea de contenção. A coincidência da implantação actual com a presença de contexto arqueológico pré-histórico, ainda que não claramente definido, deve ser assinalada, ampliando a probabilidade de que a actual implantação da estátua-menir seja a original. O carácter fragmentário do material arqueológico exumado parece apontar para uma deposição secundária, ou seja, a sua presença na vala de implantação da estátua deverá resultar do preenchimento desta com a terra das camadas cortadas pela sua abertura. Na verdade, não nos parece provável que este material se relacione com deposições intencionais no interior da vala de implantação, nem com vestígios de actividades directamente associadas à presença da estátua-menir ou fundação deste locus específico. Será mais plausível que resultem do revolvimento de estratos arqueológicos pré-existentes no local, indiciando a existência de ocupação humana na área envolvente num período da Pré-história Recente que, de momento, não é possível determinar com rigor. Nos finais de Dezembro de 2009, foram obtidas informações adicionais numa nova visita ao local. Em pleno Inverno, lavrados os campos, o terreno envolvente à estátua-menir encontrava-se praticamente livre de vegetação e o solo gelado. Isto permitiu-nos proceder a uma prospecção superficial mais eficiente. Constatou-se, de imediato, a abundância de vestígios materiais à superfície, disseminando-se por uma ampla área em redor. Os fragmentos cerâmicos, de reduzidas dimensões, apresentam um padrão similar ao encontrado em escavação e dividem-se em dois tipos: cerâmicas de fabrico manual, destacando-se um único fragmento decorado com linhas incisas e paralelas e cerâmicas negras montadas a torno20. Surgiram ainda dois moventes de mó manual, em granito e uma massa informe de cobre ou bronze, com 3,6 cm de comprimento, 2 cm de largura e 0,5 cm de espessura. Conquanto os resultados dos trabalhos não demonstrem inequivocamente a contemporaneidade entre os achados de superfície, os materiais exumados na sondagem 20 Estas últimas, que também já tinham sido encontradas nas camadas superficiais da sondagem, deverão ser de fabrico regional, similares às cerâmicas de Vilar de Nantes, em Chaves, e são menos abundantes que as cerâmicas pré-históricas, não parecendo indicar uma ocupação coeva no terreno, mas sendo provavelmente resultantes da actividade agrícola ao longo dos tempos.
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e a fundação da estátua-menir, é indubitável a coincidência da localização desta com a presença um sítio arqueológico. Dentro deste grupo específico de estátuas-menir, a maioria dos exemplares conhecidos foram identificados fora da sua localização original que se mantém largamente desconhecida, embora haja uma ou outra alusão a possíveis contextos arqueológicos correlacionáveis. Por exemplo, Leite de Vasconcelos (1910: 32) refere que a estátua da serra da Boulhosa, apareceu “num local em que ha dolmens” e a estátua-menir da Bouça, embora deslocada, poderá originalmente provir das proximidades de um povoado fortificado sobre o rio Rabaçal (Sanches e Jorge, 1987: 78). Neste sentido, a Cruz de Cepos reveste-se, por ora, de um carácter excepcional. A estela de Tojais 1. A implantação espacial Tojais é o microtopónimo atribuído a uma área do planalto no sopé da serra de Leiranco, a cerca de um quilómetro a Nordeste da aldeia de Arcos, hoje ocupada por terrenos agrícolas. Insere-se numa zona com a designação geral de Pindo21 que corresponde aos relevos adjacentes à orla nordeste do planalto, sobre a íngreme encosta voltada a Leste, sobre o vale do Terva e com domínio visual privilegiado sobre a ampla veiga de Chaves. A localização da estela de Tojais oferece alguns pontos de interesse, destacando-se a associação espacial a dois contextos arqueológicos muito precisos embora cronologicamente distintos (Estampa 7). A estela foi identificada a menos de uma centena de metros de distância de um ponto importante e visualmente impressivo de um dos troços da via romana, onde ela abandona o planalto e inicia a abrupta descida para o vale do Terva. Naturalmente, não é possível asseverar que a via romana segue um traçado de origem anterior, uma via de passagem milenar, embora essa hipótese não seja improvável. A cerca de meia centena de metros para Sul do muro que continha a estela situa-se a anta de Tojais. Este monumento, visivelmente degradado pela contínua actividade agrícola, terá resistido à plena destruição por servir de divisória entre duas propriedades. É, aliás, conhecido como ‘o marco’. Da câmara megalítica subsiste um único esteio fincado, em torno do qual jazem blocos de granito de calibre inferior, alguns claramente fragmentados. O respectivo tumulus foi quase obliterado pelo arado, adivinhando-se o seu perímetro pela suave elevação do terreno. Aliás, Fernando Barreiros (1920) descreve o monumento e refere-se às suas dimensões, afirmando que tinha 1,20 metros de altura e 24 metros de diâmetro. Indica ainda que o esteio que encontrou in situ media 1,90 m de altura, 0,72 m de largura e cerca de 0,30 m de espessura. O que é interessante é que Barreiros menciona igualmente a presença de um segundo esteio, tombado junto ao primeiro e fracturado numa das extremidades, com 1,60 m de altura e 0,20 m de espessura. Infelizmente não refere a sua posição exacta face ao esteio fincado, não 21 Este topónimo encontra-se assinalado na Carta Militar de Portugal, escala 1/25 000, folha nº 33 — Sarraquinhos (Montalegre).
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sendo assim possível determinar se jazia sobre a zona da câmara ou sobre o tumulus do monumento. Essa pedra desapareceu. O actual proprietário do terreno, embora já não tenha memória da existência desta segunda laje, é muito claro quando nos diz que a estela colocada no muro foi retirada pelo seu pai «de cima do ‘marco’», ou seja, da anta. Curiosamente, a espessura da estela e do segundo esteio (0,20 m) coincidem em absoluto. Porém, a altura do segundo esteio referida por Barreiros não equivale à altura actual da estela mas é evidente, pelas arestas vivas que ostenta, que esta peça foi fracturada provavelmente aquando da sua colocação no muro. Conjugando estes dados, é lícito colocar a hipótese de que a estela de Tojais corresponda àquele segundo esteio. Aquando da visita de Fernando Barreiros, caso a estela se encontrasse com a face insculpida voltada para baixo, o que aliás explicaria o excelente estado de conservação das gravuras, dificilmente se distinguiria de um simples ortostato. Apesar de determos alguns argumentos favoráveis à existência de uma associação directa entre esta estela do Bronze Final e o monumento megalítico, nenhum deles é passível de ser inequivocamente validado e muitas questões permanecerão em aberto: a estela terá sido concebida ex novo ou teria o escultor reaproveitado um esteio da câmara megalítica como suporte? Teria sido colocada junto ou sobre o monumento? Sobre o corredor, a câmara ou o tumulus? 2. As características do suporte e o repertório figurativo O suporte eleito foi uma poderosa laje de granito de grão médio de duas micas (Teixeira 1974: 20) que se revela macroscopicamente muito similar ao da Cruz de Cepos embora a face decorada da estela de Tojais exiba uma tonalidade amarelada resultante de processos de alteração superficial. O excelente estado de conservação da superfície gravada deve-se seguramente ao facto de não ter estado exposta aos elementos e de ter permanecido, nas últimas décadas, voltada para um tramo interior do aparelho do muro de propriedade. Porém, como a estela foi fracturada e os restantes blocos dispersos, dificilmente se poderá reconstituir quer a morfologia da peça original, quer a composição gráfica nela patente. O fragmento que ora se traz à estampa possui 0,74 m de largura máxima, 0,70 m de comprimento e 0,20 m de espessura. A face lavrada mereceu uma regularização cuidada e polimento integral, o que manifesta um elevado apuro técnico também patente na gravação. Os sulcos das gravuras foram abertos através de fino picotado, apresentam secção em U aberto, com largura e profundidade muito regulares (2-3 mm) e encontram-se integralmente polidos. Toda a composição terá sido gravada num só momento. Deve ainda registar-se que todas as figuras foram delineadas segundo o seu contorno externo, estando ausente a técnica de picotagem integral do interior dos motivos tal como sucede noutros casos conhecidos. Conforme se referiu anteriormente, aquando da visita ao local no Verão de 2008 foi apenas possível visualizar a representação de um escudo formado por uma covinha central e três círculos concêntricos, em que os dois externos apresentam chanfraduras em
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V. Em 2009, ao remover a estela verificou-se que não só preservava parte do seu rebordo original com arestas boleadas, mas que exibia mais três motivos gravados: ao escudo que se impõe como figura dominante e estruturante da composição, associa-se uma lança, um zoomorfo e, embora a figura esteja truncada, o que se reconhece como a gravura de uma espada22 (Estampa 8). Esta mede 24 cm e parece tratar-se de uma espada de folha larga que estreita a partir de metade do seu comprimento, de empunhadura rectangular, com um ponto externo na sua base, talvez figurando uma guarda. A lança pertence a um tipo comum, com cabo curto e folha larga, ovalada, em forma de folha de loureiro, similar às presentes nas estelas de Baraçal ou Pedro Abad (e.g. Celestino Peréz, 2001: 327, 433). O quadrúpede é representado também na sua forma clássica, esquemática, sem detalhes anatómicos que permitam identificar a espécie mas poderá figurar um canídeo, tendo em conta a interpretação de outros exemplos conhecidos, como o que acompanha um escudo de tipologia similar na estela de Ervidel II (Gomes & Monteiro, 1977). Não nos alongaremos na análise comparativa e classificação tipológica desta peça pois desconhecemos se estariam presentes outros motivos gravados, mas há três ideias que cumpre realçar. Em primeiro lugar, os escudos com chanfraduras em V e covinha central, interpretados como escudos figurados do anverso dada a ausência da pega, surgem preferencialmente em áreas periféricas às grandes concentrações, tais como Luna, Ervidel II e os exemplares franceses (Celestino Pérez, 2001). A estela de Tojais parece confirmar esta ideia. Em segundo lugar, a espada pertence a um tipo mais comum em duas áreas de maior concentração de estelas desta natureza – a serra da Gata/Beira Interior portuguesa e o Médio vale do Tejo – mas que não parecem encontrar correspondência em nenhum exemplar, de bronze, conhecido na Península (ibidem). Também a estela de Robleda, descoberta recentemente na zona de Salamanca (Martín Benito, 2009), ostenta uma espada de morfologia similar àquela figurada na estela de Tojais. Por fim, considerando as tipologias da espada e da lança e a sua associação a um escudo com chanfraduras em V, verificamos que os melhores paralelos são também aqueles mais próximos geograficamente: as estelas de Baraçal, San Martin de Trevejo e mesmo Robleda. As duas últimas apresentam o espelho como elemento adicional, enquanto Tojais exibe a figura de um quadrúpede. De igual modo, o seu ordenamento compositivo não obedece à estrutura modelar daqueles exemplares em que o escudo ocupa o centro do espaço operatório do suporte, encimado pela lança, com a espada em baixo. Na ausência de dados que permitam determinar a orientação original da estela de Tojais e considerando as hipóteses que permitiriam que a peça fosse fincada no solo, obteríamos sempre uma organização algo atípica em que ou a lâmina da espada ou a lança ficariam apontadas para cima23. 22 Ainda que esta se nos afigure como a hipótese mais plausível, o estado fragmentado do motivo não permite que se afaste por completo outras possibilidades. 23 As estelas de Veja de San Miguel, Capilla, Badajoz figuram entre os exemplares em que a espada é representada com a lâmina voltada para o topo, enquanto nas estelas de La Solanilla, El Viso, Córdoba, são figuradas lanças apontadas para cima (e.g. Celestino Peréz, 2001).
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É certo que não podemos retirar grandes ilações sobre a morfologia original desta estela. Apresenta, sem dúvida a panóplia de elementos que se associam às estelas de guerreiro, cuja interpretação adentro de um domínio simbólico associado a práticas funerárias é hoje pouco contestada, embora seja parco o conhecimento acerca dos contextos arqueológicos a que estariam originalmente associados. Uma das propostas interpretativas com maior aceitação nos últimos anos pressupõe a associação destas estelas a sítios cerimoniais situados junto a zonas naturais de passagem. E. Galán (1993) refere que 9% das estelas se situam nas proximidades de vias usadas desde época romana. Por seu lado, Rúiz-Gálvez enfatiza a semelhança entre a localização preferencial das estelas e as dos depósitos votivos de artefactos metálicos do Bronze Final, mas sobretudo o facto de se encontrarem em locais periféricos ou marginais na paisagem (1998). A implantação da estela de Tojais associa, sem dúvida, estes dois contextos: situa-se nas proximidades de uma via natural de passagem materializada pela estrada romana e próximo do rebordo do planalto entre a descida para as terras altas e a subida para o alto da serra de Leiranco, ou seja, numa zona ‘naturalmente’ liminar. Contudo, o aspecto mais relevante a assinalar é a sua possível associação espacial a um monumento megalítico, não sendo de excluir por enquanto a hipótese de se poder vir futuramente a detectar, no seu entorno, vestígios arqueológicos coevos da estela de Tojais, porventura de cariz funerário24. As peças escultóricas de Cervos e o seu contexto peninsular: o local e o forâneo, ancestralidade e inovação Gotthold Lessing, crítico de arte e filósofo alemão do século XVIII, sugeriu que a essência da escultura residia no facto de se constituir um corpo estático no espaço, uma massa inerte envolvida pelo espaço e nele colocada, razão pela qual concebia a escultura como uma ‘arte do espaço’ relegando o factor ‘tempo’ para segundo plano, dado que ela não capta a duração de acções mas cristaliza um só momento (cf. Carter, 2005: 643). No caso das peças que trazemos à estampa, estamos perante duas formas escultóricas distintas – uma estela e uma estátua-menir – que fazem uso do espaço físico e nele se integram de forma diferenciada. As estelas são geralmente conotadas com elementos de evocação de um lugar, enquanto as estátuas-menir podem ser elas próprias criadoras de um locus. Detendo-nos na implantação particular das duas peças, a estela de Tojais poder-se-ia imiscuir visualmente, à distância, com os relevos ondulados e os afloramentos soerguidos que pontuam nas imediações, enquanto a Cruz de Cepos, erigida no centro do planalto, constitui um verdadeiro marco na paisagem. De facto, perspectivando a evolução da escultura monumental da Pré-história Recente, as estátuas-menir, pela sua concepção morfológica, pelas suas dimensões e 24 Recorde-se que a estela de Ervidel II foi identificada na área da necrópole da Herdade do Pomar, onde as cistas escavadas ofereceram datações um pouco mais antigas não se invalidando a hipótese de existirem ali contextos atribuíveis ao Bronze Final (Gomes & Monteiro, 1976-77).
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pela forma como são erigidas no terreno, parecem herdar do megalitismo o carácter comemorativo e monumental dos menires. Este aspecto foi já relevado por António Martinho Baptista que oferece uma definição de estátua-menir assente precisamente no facto de se destinar a ser fincada no solo como um menir e ter como suporte um monólito afeiçoado de forma antropomórfica ou antropomorfizada, figurando um só personagem, cujos atributos são geralmente assinalados através de gravuras (Baptista, 1985: 20). Por seu lado, J. N. Bonneville (citado por González García 2009: 128) defende que o termo ‘estela’ deve ser aplicado a peças cuja largura seja inferior a um terço da face anterior, isentas e que se destinem a serem vistas de frente. Mas, como esculturas que são, estas peças adquirem a particularidade de serem simultaneamente ‘arte visual’ e ‘arte táctil’ (Carter, 2005: 642). Não só o acto escultórico lhes confere tridimensionalidade e frequentemente uma textura superficial distinta da da matéria-prima original, como a aposição de símbolos gravados ou talhados em baixo relevo reiteram esta premissa. A estela de Tojais e a Cruz de Cepos têm em comum a presença de representações gráficas de armas metálicas e, embora de forma distinta, evocam a figura humana, um personagem, real ou imaginário mas são monumentos que, paradoxal e simultaneamente, corporizariam memórias colectivas e constituir-se-iam como palcos de interacção social (e.g. Díaz-Guardamino Uribe, 2006; 2008). Um aspecto que importa realçar prende-se com o facto de que não sendo inédita, no contexto peninsular, a ocorrência de duas peças escultóricas de tipologia distinta numa área espacialmente restrita, a exemplo das estelas I e II de Ervidel (Gomes & Monteiro, 1977) atesta-se, pela primeira vez, a associação de uma estátua-menir desta natureza e uma ‘estela de guerreiro’. Como vimos, a Cruz de Cepos encontra-se no centro da zona fulcral de distribuição deste tipo de estátuas-menir, enquanto a estela de Tojais se destaca pelo seu afastamento em relação às áreas de maior concentração de registos similares. Trata-se efectivamente do exemplar mais setentrional identificado até à data25. Este facto conduz-nos inevitavelmente a uma questão que recuperamos de um trabalho anterior (Alves & Reis, 2009: 84): a esta convergência no espaço, corresponderá uma idêntica convergência no tempo? A atribuição cronológica da estela de Tojais ao Bronze Final é dificilmente contestável, porém, as opiniões dividem-se quanto à datação das estátuas-menir armadas e/ou que ostentam o enigmático motivo sub-rectangular. Como se sabe, a proposta inicial para a cronologia do conjunto das 25 Excluindo a estela de Tojais, o exemplar mais setentrional desta grande zona de distribuição será uma das estelas, agora publicadas, da Pedra da Atalaia, em Celorico da Beira (Vilaça et al., neste volume), deslocando o limite desde a região do Sabugal, para os limites setentrionais do maciço montanhoso da serra da Estrela, no Alto Mondego. A estela da Pedra da Atalaia alarga para norte a área distributiva destas estelas em escassas dezenas de quilómetros. Desta forma, embora o vazio que separa a estela de Tojais de uma das principais áreas de concentração se tenha atenuado, ainda assim a distância, em linha recta, que a separa da estela da Pedra da Atalaia é de aproximadamente 130 quilómetros.
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estátuas-menir do Norte de Portugal, designadamente S. João de Ver, Chaves, Faiões, Bouça, pressupõe a sua integração no Bronze Final ou mesmo na Idade do Ferro (e.g. Almeida & Jorge, 1979: 21; Jorge, 1991: 368; Jorge & Jorge, 1993: 41; Jorge, 1999b: 120). António Martinho Baptista (1985: 38) atribui uma cronologia dos finais do Calcolítico ou Bronze Antigo ao exemplar da Ermida, fundamentada na sua vinculação ao movimento das estátuas-menir europeias e na presença de elementos decorativos, designadamente círculos concêntricos, com claras afinidades com o grupo I da arte rupestre do Noroeste. O mesmo autor sugere que a estátua-menir de Faiões deveria ser integrável em pleno IIº milénio a.C. (Baptista, 1985: 33). Neste contexto, é curioso verificar que esta peça exibe igualmente duas combinações de círculos concêntricos com covinha central em cada um dos remates do arranque dos braços. Mais recentemente, no âmbito do estudo da estátua-menir de Ataúdes, Raquel Vilaça e colaboradores sugeriram uma datação de finais do 1º-2º quartel do IIº milénio a.C. para estas manifestações (Vilaça, et al. 2001: 79). Outras propostas, assentes numa perspectiva diacrónica longa da escultura Pré-histórica, apontam para uma origem das estátuas-menir no IIIº milénio cal. BC interpretando-as como elementos que acompanham o desenvolvimento da mais antiga metalurgia (Bueno, et al., no prelo). Neste âmbito cronológico são inseridas estátuas-menir com a figuração de armas metálicas e o motivo sub-rectangular de Tremedal de Tormes, Soalar e Ataúdes (ibidem). Perante o conjunto de dados disponíveis actualmente, admitimos também a possibilidade de atribuição da Cruz de Cepos e das peças estilisticamente análogas ao Bronze Antigo/ transição para o Bronze Médio. Neste sentido, devem ser reiterados dois argumentos: o da representação, na estela de Longroiva, do motivo sub-rectangular associado a uma alabarda de tipo Carrapatas e da presença de uma espada de rebites na estátua-menir de Ataúdes (Vilaça, et al. 2001: 79). Aceitando esta hipótese, as peças escultóricas de Cervos seriam subsequentes no tempo, embora, como vimos, partilhem elementos ideográficos de forte conotação simbólica: a representação de armas metálicas (de bronze?) e a evocação de um personagem individual. Partilham o mesmo ambiente físico e algo que nele é distintivo. Referimo-nos à abundância de recursos minerais metálicos, especificadamente estanho e ouro, nas zonas limítrofes do planalto. Aliás, esta dupla ocorrência de Cervos consolida a ideia que vem sendo sugerida por diversos autores, quer para as estátuas-menir armadas, quer para as estelas de guerreiro, da proximidade da sua localização com fontes de minerais metálicos (e.g. Comendador Rey, et al. neste volume; Vilaça, et al. 2001; Bueno, et al. no prelo). Face aos resultados preliminares obtidos na intervenção realizada na Cruz de Cepos, uma investigação futura direccionada para uma avaliação mais abrangente dos contextos arqueológicos identificados no local poderá trazer contributos adicionais para o debate sobre o balizamento cronológico destas peças. Mas é indubitável que a Cruz de Cepos, erguida no centro do planalto, se vincula a concepções simbólicas e estilísticas próprias do contexto regional. Pelo contrário, a estela de Tojais sur-
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ge como um elemento tipológica e conceptualmente alógeno associado a um monumento megalítico que é, sem dúvida, a materialização, ou a face visível, de uma ancestralidade autóctone. É certo que há uma evidente relação de proximidade entre a estela e a anta de Tojais que se assume como visual e simbolicamente muito significativa, contudo não se pode assegurar que a estela resulte do reaproveitamento de um esteio da câmara do monumento ou mesmo se terá estado fincada sobre a mamoa. As motivações ideológicas para esta associação podem ser diversas e mais ou menos complexas, mas esta conjugação entre inovação e ancestralidade é certamente algo a ter em conta na hora de compreender como e pela qual razão surge no Noroeste peninsular uma peça como a estela de Tojais. Se a origem da estela ou, mais provavelmente, a origem da ideia da sua concepção remete para regiões longínquas, a sua localização impõe-se como fortemente local. Também é verdade que esta estela ocupa uma zona ‘naturalmente’ liminar no rebordo do planalto, entre este a subida para o alto da Serra de Leiranco, um local visualmente impressivo, muito próximo de uma via romana e de um eixo natural de passagem que, em última análise, liga esta às regiões remotas onde se enraízam as suas origens. A estela de Tojais é a face visível de uma realidade arqueológica que urge investigar na sequência dos contactos precoces existentes entre desta zona e regiões meridionais entre finais do 3º milénio a.c. e inícios do 2º mil. a.c. e da manutenção da abertura destas comunidades a protótipos artefactuais de origem meridional ao longo de uma das principais vias de comunicação naturais entre o Centro-Sul e o Noroeste peninsular (e.g. Jorge, 1991). É sobretudo interessante verificar que, por vezes, o estudo de manifestações artísticas permitem, aprioristicamente, considerar problemáticas que de outra forma seriam difíceis de aflorar perante a exiguidade de informações arqueográficas. No caso das duas peças aqui estudadas, o escudo, por um lado, e a insígnia sub-rectangular, por outro, conformam símbolos de identidade ostensivamente esculpidos em memoriais que personificam, em pedra, figuras tutelares, míticas ou mitificadas, memoriais esses erigidos por comunidades que viveram e partilharam um mesmo espaço, independentemente do tempo que decorreu entre a criação de um e outro.
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estampa 1 – Localização da Cruz de Cepos e da estela de Tojais (extracto da Carta Militar de Portugal, escala 1/25 000, folhas n.º 33 e 46).
Estampa 2 – Serra do Leiranco. Vista de sudeste sobre a encosta voltada ao vale do Terva e veiga de Chaves.
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Estampa 3 – Cruz de Cepos: três perspectivas. Vista de oeste, desde o Alto do Seixo sobre o centro do planalto, com as cumeadas da serra de Leiranco em pano de fundo (em cima). A implantação da estátua-menir no terreno, avistando-se ao longe os contrafortes do Barroso e serra do Larouco (em baixo, à esquerda). Aspecto das faces lateral esquerda (C) e do reverso (D) antes da limpeza da superfície (em baixo, à direita).
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estampa 4 – Cruz de Cepos. As quatro faces da estátua-menir (em cima). Desenho esquemático do anverso da peça com indicação das secções transversais e longitudinais obtidas (em baixo).
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estampa 5 – Cruz de Cepos (desenho elaborado a partir do levantamento gráfico à escala 1:1).
Estampa 6 – Sondagem de diagnóstico na Cruz de Cepos (à esquerda). Fragmento de movente de mó de vaivém que jazia junto à base da estátua (em cima à direita). Sequência estratigráfica detectada no perfil sul, figurando a extensão enterrada da estátua-menir (em baixo à direita).
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estampa 7 – Localização da estela no muro de propriedade e da anta de Tojais (em cima). Aspecto da estela após a remoção de uma secção do muro (em baixo, à esquerda). Perspectiva da superfície decorada (note-se que o rebordo conservado da peça se encontra assente no solo (em baixo, à direita).
Estampa 8 – A estela de Tojais (desenho realizado a partir do registo gráfico à escala 1:1).
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
A estatua menhir do Tameirón no contexto dos resultados do proxecto de intervención arqueolóxica no Monte Urdiñeira e o seu contorno (A Gudiña- Riós, Ourense) Beatriz Comendador Rey, Víctor Rodríguez Muñiz1, Alejandro Manteiga Brea2
Resume Neste traballo presentamos a estatua menhir atopada casualmente en agosto de 1992 por un veciño do lugar de Santa María do Tameirón (A Gudiña, Ourense) e dada a coñecer po Rivas e Rodríguez en 2002. A revisión deste achado foi incluída entre os obxectivos do proxecto de Intervención Arqueolóxica no Monte Urdiñeira e o seu contorno (A Gudiña-Riós, Ourense) iniciado no 2009, no contexto da análise dos patróns de asentamento poboacional e a a constitución como área de tránsito desta zona, que combina a presenza de dous eixos fundamentais nas comunicacións do territorio (oeste- leste coa Meseta, e norte- sur con Portugal), cunha excepcional riqueza patrimonial froito da súa remanencia no tempo. Presentamos o levantamento nocturno con luz artificial dos gravados da estatua menhir así como os resultados preliminares da prospección do contorno do lugar onde foi localizada, que permiten relacionala con outras manifestacións arqueolóxicas contiguas: dous túmulos e dous afloramentos de xisto con motivos gravados, no contexto xeral dunha chaira, potencialmente favorable para a localización de novos achados. No contexto máis xeral da área prospectada no contorno do Monte Urdiñeira, presentamos a relación con diversos xacementos dende a prehistoria recente ata o mundo romano, prestando atención á relación con vías de paso e con recursos minerais. Finalmente propomos unha lectura do achado da estatua menhir partindo do actual estado de coñecementos acadados no proxecto, que esperamos poda ser ampliado e mellorado en futuras intervencións. Palabras chave: Estatua menhir, Idade do Bronce, Circulación. Abstract The present study aims to introduce the statue-menhir, found in august 1992 by a local resident of Santa María do Tameirón (A Gudiña, Ourense) and first published in 2002 by Rivas and Rodríguez. 1 Facultad de Historia. Universidad de Vigo. Campus das Lagoas s/n. 32004. Ourense. beacomendador@ uvigo.es [emailprotected]. Blog do proxecto http://urdinheira.blogspot.com. 2 Department of Archaeology, Connolly Building, University College, Cork, Ireland. alex.manteiga@ gmail.com.
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história The revision of this find was included among the objectives of the Archaeological Intervention project in the Monte Urdiñeira environment (A Gudiña-Riós, Ourense). The project was initiated in 2009, in the context of analysis of settlement patterns and the establishment of the surroundings of Monte Urdiñeira as a transit zone (Ríos - A Gudiña). This geographical location combines the presence of the two main axis of communication in the territory (west- east with the Meseta, and north- south with Portugal), an area with an exceptionally rich heritage due to its survival through time. We present the tracing techniques carried out at night with artificial light on the statue-menhir engravings, as well as preliminary results of the survey in the place of discovery. This may allow us to relate the statue-menhir with adjoining archaeological features, such as two tumular mounds and two outcrops with carved motifs, on a plain, a location which is potentially favourable for the discovery of new findings. In the broader framework, we study the contextual relationship of the surveyed Monte Urdiñeira with several sites, ranging from the recent prehistory to the Roman world, giving special emphasis on the relationship with overland routes and ore resources. Finally, we propose an interpretation of the statue-menhir find within the scope of current investigations. We hope these results may provide further insight for future research interventions. Keywords: Statue-menhir, Bronze Age, Circulation.
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As circunstancias do achado A estatua menhir foi atopada casualmente en agosto de 1992 por un veciño do lugar do Tameirón, cando estaba a levar a cabo labores agrícolas nun terreo da súa propiedade denominada O Cichón. A estatua estaba tombada cando o tractor topou con ela, aínda que ao ser retirada presentaba a marca da parte soterrada. Alí permaneceu un tempo ata que técnicos de patrimonio da Xunta de Galicia procederon á súa catalogación e, máis tarde, operarios do concello da Gudiña trasladárona para a súa custodia a un almacén municipal3. Na actualidade atópase fincada nun xardín do antigo Toural na Gudiña, preto do albergue de peregrinos. No Catálogo de Bens Arqueolóxicos Protexidos do Concello de A Gudiña (2000: 85) a ficha indica que no lugar non apareceron materiais asociados e o lugar do Cichón ten adxudicado un grado de protección patrimonial III (non integral)4. Coñecéramos a estatua a través da publicación de Rivas e Rodríguez (2002: 75-77). Posteriormente a súa referencia foi recollida e presentada ao Congreso Transfronteirizo de Arqueología celebrado en Montalegre en 2008 (Comendador e Méndez, 2009), e incluída na revisión das estatuas menhir feita por González García (2009). Finalmente, no marco do proxecto Intervención Arqueolóxica no Monte Urdiñeira e o seu contorno5, o lugar do achado foi obxecto dunha prospección co obxectivo da localización de posibles indicios arqueolóxicos. A revisión do contorno do Tameirón ofreceu interesantes resultados. Foron localizados dous túmulos no contorno visual próximo. Un deles é denominado Cabeza do Cichón e presenta en xeral un bo estado de conservación. Non así o outro, do que só quedan restos da coiraza. Nos afloramentos próximos de xisto, no dominio visual dos túmulos e do lugar do achado da estatua, foron localizados distintos gravados a base de cazoletas e marcas de pouca entidade. A prospección proporcionou materiais cerámicos no entorno das terras de cultivo de diversa adscrición. O proxecto presentado incluía o levantamento do calco da estatua menhir empregando luz artificial co obxectivo de documentar posibles elementos nas zonas máis deterioradas da pedra6. 3 No proceso de identificación da estatua menhir e da súa recuperación, foi fundamental a actuación de J. Rodríguez Cruz , quen recentemente publicou unha reseña (Cruz, 2009). 4 Catálogo A. 21-GA32034. Plano 1:5.000: 266-72. No momento de escribir estas liñas e baixo iniciativa privada, Industria estaba a estudar a viabilidade para a apertura dunha canteira de granito no lugar, onde xa houbera intentos previos (La Región, 11-12-2009). 5 A intervención arqueolóxica está incluída dentro do proxecto Organización territorial da provincia de Ourense na Idade Media (ss. XII-XV). Grupo de Investigación da Vicerreitoría do Campus de Ourense. Universidade de Vigo. (REF 2009-INOU-04) Concedido pola Vicerreitoría do Campus de Ourense e co financiamento da Deputación de Ourense. A intervención foi autorizada pola Dirección Xeral do Patrimonio de Galicia da Consellería de Cultura e Turismo da Xunta de Galicia e dirixida por Beatriz Comendador Rey (Profesora Asociada T3-P6 da área de Prehistoria da UVIGO). 6 Este traballo foi realizado coa colaboración de José Luis Méndez Fernández, restaurador do Museo Arqueolóxico Provincial de Ourense, a quen agradecemos a elaboración da diagnose do estado de conservación da peza aportada neste texto.
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Localización e descrición do contexto xeográfico rexional A área obxecto de actuación na intervención arqueolóxica sitúase no sueste da provincia de Ourense, inscribíndose nas primeiras alturas das serras orientais que separan a depresión de Monterrei (ao oeste) das terras zamoranas de Sanabria (ao leste). A Urdiñeira atópase na zona meridional do concello de A Gudiña e parcialmente no norte do concello de Riós, que forman, xunto co concello da Mezquita, a chamada Terra das Frieiras, integrada na comarca de Verín7 (Estampa 1). Dende o punto de vista do relevo, a morfoloxía está constituída por serras, chairas a distintas altitudes e vales. O relevo chairo é resultado da tectónica (bloques fracturados e elevados), unha intensa acción erosiva e a posterior incisión fluvial, sobre xistos, cuarzo e granito. Característica é a presenza de fallas onde hai numerosos abeiros e palas ou buracas. Entre estas está a chamada Cova das Choias ou Casa das Grallas, na cima do Monte Urdiñeira (tamén chamado Serra da Urdiñeira) que é un estribo montañoso da parte sur do Invernadeiro, ao que se vencella polo norte por medio dos montes do Sanguñedo. A súa altura máxima sitúase no Pico da Urdiñeira, con 1.146 m.s.n.m., estando as alturas medias entre os 700 e 1150 m.s.n.m nunha área xenérica aproximada dunhas 50 Ha. A zona está inscrita entre dous grandes complexos litolóxicos: o granítico e o metamórfico. A área da Urdiñeira inscríbese no dominio de xistos de Galicia-Trás-os-Montes, mentres que a zona do Tameirón está no do complexo granítico. Sobre estes grupos desenvólvese unha cobertura edafolóxica caracterizada por un predominio de solos de tipo ranker. Con respecto á rede de drenaxe, caracterízase por pertencer a bacía do río Douro, estruturada en torno a dous colectores principais: cara a occidente, o río Mente, e cara o oriente o río da Ribeira. O río Mente, xa na parte final do seu recorrido, fai de fronteira con Portugal, onde conflúe co Ribeira ou Pentes no río Rabaçal. Son cursos fluviais de escaso caudal e moi encaixados, que sucan formas alombadas e depresións. Dende o punto de vista climático, pode incluírse no que Pérez Alberti (1982: 94) define como oceánico de montaña, caracterizado por temperaturas baixas e precipitacións altas, cunha oscilación térmica superior aos 12º, así como bastantes días de precipitacións en forma de neve e xeadas durante os meses invernais. A proximidade da Meseta dálle a estas terras unha certa orixinalidade, cunha marcada diferenza entre os meses estivais e invernais. As características climáticas condicionan en boa medida a aparición de formacións vexetais con presenza de plantas claramente mediterráneas: esteva ou xara, érbedo e romeu xunto con especies oceánicas como os soutos de castañeiras ou carballos. Nas partes máis altas predominan as urces e 7 Con respecto á situación do entorno de traballo, está inscrito dentro da seguintes follas da cartografía: Folla-265 Laza, 1:25.000, Folla 265-IV (Campobecerros); Folla-266 A Gudiña, 1:25.000, Folla 266-III (A Gudiña); Folla-303 Verín, 1:25.000, Folla 303-II (Riós); Folla-304 Hermisende, 1:25.000, Folla 304-I (Chaguazoso)
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carqueixas e nos vales os érbedos, carballos e castiñeiras, aínda que no últimos anos houbo repoboación forestal con piñeiro. A principal actividade económica é a agropecuaria, especialmente ovicaprina, existindo un limitado espazo cultivado nas cortiñas en torno ás aldeas, e moi destacable o espazo forestal. En canto á dinámica demográfica, trátase dunha área regresiva que dende 1900 vén perdendo habitantes dun xeito lento pero constante, resultando nun forte envellecemento da poboación8. Só se mantiveron as parroquias situadas cerca das vías de comunicación máis importantes que se cruzan nesta zona, en sentido norte-sur en relación coa dirección dos vales fluviais, e en sentido leste-oeste en relación coa vía natural pola que discorre o Camiño de Castela ou Verea, un dos camiños secundarios a Compostela (Ferreira, 1988: 181; Vaz, 2006: 46; Rivas e Rodríguez, 2002: 85). Arrieiros e segadores recorreron estes antigos camiños, como evidencian os amilladoiros e os vellos mesóns que, xa no século XVII, mostraban unha certa notoriedade comercial no concello. Actualmente pasan pola zona a Autovía das Rías Baixas A-52, a nacional N-525 OurenseBenavente, a C-535 A Gudiña- Viana do Bolo e a vía férrea dende o século XIX. Estes eixos actuaron como motor para o desenvolvemento de certa infraestrutura terciaria baseada en pequenos comercios, empresas de hostalería e outros establecementos de servizos centralizados en A Gudiña. Resultados preliminares da prospección do conxunto arqueolóxico de O Cichón (Santa María do Tameirón, A Gudiña). Santa María do Tameirón está enclavado nunha plataforma achaiada ben delimitada ao oeste polo río da Ribeira que discorre en dirección norte-sur, e ao sur polo río Diabredo (ou río do Tameirón ou río Pereiro), que discorre en dirección leste-oeste (Mapa Topográfico Nacional de España, 1: 25.000, Folla 266-III (A Gudiña). No río da Ribeira conflúen o Ribeiriña e o Diabredo para conformar o Rabazal ou Rabaçal, ao que xa en terras portuguesas verte as augas tamén o Mente. A maior altitude no contorno é a Cabeza de Penabicos (1.185 s.n.m.), aínda que a maior parte da zona achaiada está por riba dos 900 m.s.n.m. A estatua menhir foi atopada na paraxe de Cabeza do Cichón, que está ubicada entre A Chaira do Borraxo (ao nordeste), As Searas (ao noroeste), Franxó (ao norte), e o Camiño do Roupeiro (ao sur) en torno dos 1.060 m de altitude, a escasos dous quilómetros km ao noroeste do núcleo habitado de Santa María do Tameirón (A Gudiña) (Estampa 2). Trátase dunha franxa de terra paralela ao camiño (a finca do Cichón) que actualmente constitúe un souto. 8 Na Gudiña pasou de 2.697 habitantes no 1900 a 1.568 en 2008, mentres en Riós, de 4.664 habitantes no 1900 a 2097 en 2004. Datos INE, IGE.
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A estatua non se atopaba fincada no momento do achado, aínda que si soterrada, e xa apareceu fracturada. Non se coñece o lugar exacto que ocuparía na finca, aínda que si o sitio aproximado, por máis que non podemos confirmar que aparecera in situ. Revisadas as coordenadas con G.P.S. e a fotografía aérea, podemos corrixir os minutos que figuran na ficha do concello de A Gudiña (Táboa 1).
Táboa 1
A revisión das terras remexidas na finca non ofreceu restos de cerámica ou material doutra entidade, aínda que apuntamos a presenza de abondosos anacos de pedra granítica de bo tamaño (Estampa 3). Ao suroeste da finca do Cichón hai dúas pequenas elevacións formadas por materiais graníticos coñecidas como Os Tocos do Camiño de Medias, e O Toco do Roupeiro, por medio das que vai un camiño nunha zona de portela (Portela do Cichón). Dende o punto de vista litolóxico a zona do Tameirón está inserida no dominio das rochas graníticas hercínicas, con presenza de granito de dúas micas e granodioritas (IGME, 1982). É interesante destacar que o camiño que discorre entre a finca do Cichón (ao noroeste) e Os Tocos (ao sueste) constitúe o límite e zona de contacto entre unha área de rochas graníticas e a zona de xistos e paraneises. Trátase dun granito de dúas micas de boa calidade, que foi canteira en tempos recentes9. A prospección dos afloramentos graníticos na zona dos Tocos non ofreceu resultados en canto á presenza de gravados, aínda que si hai diversas pías naturais e abondoso cascallo solto. Os escasos gravados apareceron só na área dos afloramentos de xisto. Fronte á Portela do Cichón, cara ao nordeste, o lugar do achado semella un pequeno anfiteatro onde a estatua estaría localizada na parte máis baixa, mentres que algo máis elevadas por tras dela, e recortadas no horizonte, son visibles na paisaxe catro estruturas que pasamos a describir (Estampa 3). Túmulo 1. Cabeza de Cichón (Estampa 4). 9 Aínda non temos resultados sobre a posibilidade de que a estatua sexa feita con este granito local.
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O Túmulo 1 ou Cabeza do Cichón10, está emprazado nunha pequena plataforma elevada ao leste da finca onde apareceu a estatua menhir. Trátase dun túmulo de dimensións medias, que mede no seu eixo norte-sur uns 19.50 m., e no leste-oeste, uns 18.60 m. A altura no lado oeste é de 1,80 m., sendo menor cara o leste onde non supera o 1.50 m. Está construído sobre un afloramento de xisto, que asoma no sector sur, e posiblemente foi aproveitado para darlle unha maior monumentalidade, fenómeno este que temos observado noutros túmulos galegos. Os indicios visibles de coiraza indican nembargante, que o xisto non foi empregado na posible coiraza, xa que afloran pedras de bo tamaño que combinan granito e seixo fundamentalmente. O túmulo presenta unha pequena depresión central de violación, na que non se observan esteos, aínda que tiradas na superficie, especialmente ao nordeste, hai varias laxes de bo tamaño (de 1,50 x 1 m. aproximadamente) e unha gran acumulación de pedras. O seu estado de conservación é bo, aínda que na metade oeste está atravesado lonxitudinalmente por unha gabia, na que afloran as pedras soltas da coiraza. Afloramento 1 (Estampa 5). Trátase dun afloramento natural de xisto ao leste do túmulo de Cabeza do Cichón, de aparencia conspicua na liña do horizonte, xa que destaca un conxunto de bloques de bo tamaño. Ao norte do afloramento hai dous bloques soltos en posición horizontal, que denominaremos bloque 1 e bloque 2. O bloque 1, mede 85 cm. no seu eixo leste-oeste e 95 cm no seu eixo norte-sur. Presenta catro cazoletas ou coviñas gravadas sobre o xisto, das que dúas están soltas e outras dúas unidas por un suco. O motivo de dúas coviñas unidas ten un desenvolvemento de 30 x 10 cm, e o gravado presenta unha profundidade de entre 4 e 5 cm. As outras dúas coviñas miden 5 x 4 x 2 cm e 8 x 7 x 3 cm. Presenta tamén un posible motivo semicircular. O xisto presenta unha superficie irregular dada a súa conformación foliácea, na que os gravados están feitos na dirección perpendicular ao pregamento, a contraveta. O bloque 2, mede 45 cm no seu eixo leste-oeste e 120 no seu eixo norte-sur, separándose do chan uns 35 cm. Na superficie horizontal presenta unha cazoleta de 30 x 12 cm e 8 cm de profundidade, así como un suco duns 10 cm de longo e 3 cm de profundidade. Por último nunha parte máis sobresaínte da superficie presenta uns trazos gravados mal conservados e posiblemente modernos. Na revisión do afloramento, entre os bloques, había abondosa vexetación de monte baixo, especialmente queiruga polo que é posible que unha nova inspección máis detida permita atopar novos motivos. Túmulo 2 do Cichón (Estampa 4). 10 O túmulo está inédito, pero coñeciamos referencias de José Manuel Lorenzo Rodríguez a través de José Rodríguez Cruz sobre a súa existencia.
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Ao leste do afloramento 1 e ao oeste do afloramento 2, atópase un resalte no terreo con abondosas pedras de granito e seixo. Pola súa configuración e pola presenza de pedras de pequeno e mediano tamaño que poderían formar parte dunha coiraza, especialmente na parte oeste, consideramos que son os restos dun túmulo arrasado. No seu eixo norte-sur a dispersión de pedras e a acumulación de terras ten unhas dimensións duns 8,5 m e de 7,20 no leste-oeste, estando mellor preservado cara ao suroeste, onde acada unha altura duns 50 cm, fronte aos 30 cm do seu lado nordeste. Presenta un profundo suco central que atravesa a estrutura na parte central con orientación sueste-nordeste. Actualmente está lixeiramente cuberto de carqueixa e monte baixo. Salvo as pedras que formarían parte dunha posible coiraza, no foron apreciados outros materiais arqueolóxicos en superficie. Afloramento 2 (Estampa 6). Ao este do túmulo 2, se atópase un afloramento conspicuo na liña do horizonte, con aspecto de túmulo. Sobresae un bloque de xisto de grandes dimensións duns 3, 5 m no seu eixo norte-sur, e 2,3 m no seu eixo leste-oeste. Na súa parte norte presenta unha cazoleta de 17 x 10 cm e 6 cm de profundidade. No seu extremo suroeste presenta outra posible cazoleta de 6 x 6 cm e 2,5 cm de profundidade. No seu lateral leste aparece unha importante acumulación de pedras en superficie que poderían ter formado parte dalgunha estrutura de cronoloxía e uso descoñecidos. No contorno do conxunto do Cichón, a revisión das leiras aradas circundantes ofreceu dúas dispersións de materiais. Na primeira, seguindo o camiño ao noroeste da finca do Cichón, aparece o conxunto máis importante. Moitas cerámicas son modernas ou están feitas a torno, pero tamén aparecen outras de conformación manual e factura antiga, aínda pendentes de estudo, xunto cunha pequena placa de pizarra perforada. A segunda, atópase ao oeste da elevación dos Tocos do Camiño de Medias, seguindo o denominado camiño do Toxal, é consiste nun grupo de cerámicas feitas a torno de adscrición indeterminada. Poderían ter relación con aportes para o cultivo, ou tamén cos indicios de poboamento a escaso medio quilómetro ao suroeste do lugar do Cichón, no lugar coñecido como As Muradellas, Tameirón Vello ou Tameironciños (Rivas e Rodríguez, 2002: 61) catalogado como asentamento romano de chaira (Varela e López, 1991-1992; Rivas e Rodríguez, 2002: 61) que forneceu material cerámico e fragmentos de elementos construtivos, removidos por labores agrícolas. A estatua menhir Trátase dunha escultura de vulto redondo feita en pedra granítica, de ton rosáceo11, de sección e configuración xeral antropomorfa que presenta o inicio dos brazos e insinúa a cintura. O remate da parte superior mostra unha rotura e polo tanto des11 Datos do alto e peso tomados por J. Rodríguez Cruz.
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coñécese a forma que puidera ter este anaco que falta, pois ata o de agora non apareceu. Cando se atopou medía de alto 2’35 m., aínda que actualmente ao estar fincada só está á vista unha porción menor. Mide 63 cm. de ancho e 26 cm. de grosor. O seu peso aproximado é de uns 250 quilos. Fixemos un levantamento con luz artificial co obxectivo de rexistrar con detalle posibles elementos gravados nas zonas máis deterioradas da pedra. A estatua está actualmente fincada con boa parte da súa base soterrada, polo que evidentemente o traballo só se fixo na parte que actualmente está á vista12. O reverso, a parte máis coidada, presenta un debuxo subrectangular en relevo ao xeito de “estola” alongada. É interesante sinalar que esta forma non está configurada mediante un suco gravado, senón mediante a creación dun suave altorrelevo a través dun rebaixe de grosor e conservación variable. No sector superior dereito está moi perdido, aínda que se aprecia ben o límite interno. Á dereita deste motivo, aparece un rebaixe incompleto de forma triangular do que non está clara a súa feitura antiga, xa que todo o lateral dereito está afectado por perda de material na superficie (Estampa 7). No anverso presenta diversas faltas e marcas modernas, posiblemente resultado do seu traslado. Na parte central obsérvase un conxunto de sucos soltos que poderían configurar unha figura subrectangular aberta por riba. Aprécianse tamén outros sucos soltos na parte máis alta e un na más baixa. Nos laterais, a parte superior semella ter cotos ou saíntes de forma redondeada. O lateral esquerdo presenta tres tramos de suco cerca da actual base e unha falta circular podería ser considerada unha cazoleta. Pola súa parte, o lateral dereito presenta diversas gretas na base. Malia estar incompleto e presentar perdas de materia en diversas partes (afectando nalgún punto a zonas decoradas), o material está relativamente ben conservado: amosa unha boa cohesión, sen a disgregación propia da forte meteorización química, habitual nas interaccións temperatura / humidade / acidez do chan do país, pese a ter estado enterrado moito tempo e, posteriormente, á intemperie. Si aparece un desgaste acusado das superficies e decoracións, propio do período de enterramento, e parcialmente pola actual exposición aos axentes ambientais; tamén se aprecian algunhas fendas, e áreas de granito recentemente expostas, por perda de placas de materia. Polas súas características pode ser integrada no grupo de estatuas menhir, sendo o seu referente máis próximo a de Faiões (Chaves) no val do Támega, xa que ambas se diferencian das outras pola ausencia de aspecto fálico. Podemos atopar a presenza do motivo xeométrico no reverso tanto na de Faiões, como nas de Chaves, Bouça, San 12 Para o desenvolvemento do traballo inicialmente revisouse a superficie da estatua empregando dous focos de gran potencia, movendo a iluminación ás posicións máis axeitadas. Posteriormente realizouse a marcaxe con xiz dos límites dos sucos e elementos relevantes para despois indicar os aspectos rexistrados sobre un plástico de polietileno sobreposto, empregando distintas cores para distinguilos.
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João de Ver e Muiño de San Pedro (Gonzalez García, 2009), así como na dada a coñecer neste volume de Cruz de Cepos (Montalegre) (Vid. Alves e Reis). Sen embargo, a revisión confirmou a ausencia de representación de armas. Outro aspecto interesante é que non mostra indicios aparentes de reutilización, como sería o caso da de Muíño de San Pedro reconvertida en epígrafe funerario en época romana (Vid. González). Deixaremos os aspectos relativos á súa interpretación e cronoloxía para as consideracións finais do traballo. O entorno arqueolóxico da estatua menhir do Tameirón A zona transfronteiriza do sur da provincia de Ourense e Trás-os-Montes foi obxecto de atención por múltiples investigadores que realizaron traballos sobre a arqueoloxía provincial, a etnografía e a Idade Media, continuando o labor desenvolvido dende principios do s. XX pola Comisión Provincial de Monumentos de Ourense. Os últimos traballos realizados na zona indican o alto potencial arqueolóxico aínda por descubrir dunha rexión con características peculiares, tamén na Idade do Ferro (González Ruibal, 2009). Aínda no estado preliminar no que se encontran os estudos da intervención na área da estatua menhir do Tameirón, incluídos como unha actuación puntual no marco da prospección da Serra da Urdiñeira e o seu contorno, neste apartado imos procurar unha visión o máis completa posible do seu contexto arqueolóxico, e tamén, dun xeito más global, do territorio no que se atopa. Para este punto empregaremos resultados da recente prospección, e tamén, dun xeito extensivo, empregaremos información sobre xacementos e puntos xa referidos en catalogacións arqueolóxicas previas, recollidos tanto na documentación dos plans de ordenación dos concellos de A Gudiña e Riós, como no Inventario de Xacementos Arqueolóxicos da Xunta de Galicia, e noutros traballos publicados, sendo moi de destacar como síntese o de Rivas e Rodríguez (2002). 1. O fenómeno tumular e a arte rupestre No relativo ao achado de túmulos, na zona inmediata ao paraxe do Cichón, aparte dos xa citados, non hai referencias previas, aínda que as características orográficas (unha chaira) son propicias para o emprazamento de necrópoles, das que podería ser indicativa a conservación de topónimos en áreas próximas, como o de As Antas, cara ao este do lugar13 que serán obxecto de futuras intervencións (Estampa 2). Nun contexto máis amplo, hai que citar a Mámoa de Val da Lagoa (Santiago de Carracedo, A Gudiña), as referencias a dúas ou tres mámoas destruídas no Alto do 13 Recollido tanto na cartografía 1:25.000 como nos traballos do Proxecto Toponimia de Galicia (PTG), realizado en Riós e A Gudiña por Vicente Feijoo Ares. Este proxecto, de grande utilidade para a intervención arqueolóxica, foi posto en marcha en Maio do ano 2000 dende a Consellería de Presidencia, en colaboración coa S.A. para o desenvolvemento comarcal de Galicia e co apoio da Consellería de Educación e Ordenación Universitaria.
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Espiño (San Mamede de Pentes, A Gudiña) ou a Medorra da Gudiña, que foi obxecto dunha intervención en 1996 con motivo das obras de construción da Autovía das Rías Baixas14. Tiña unha coiraza de pizarra, seixo e granito e tiña un anel perimetral (Rivas e Rodríguez, 2002: 53). Por último, na prospección foi atopado un novo túmulo no sector norte da Serra da Urdiñeira, na Chaira das Pozas (Estampa 8). Tanto o túmulo de Val da Lagoa como o de Chaira das Pozas son estruturas pequenas nas que destaca unha coiraza de seixo branco. A posibilidade de documentar a contigüidade física entre a estatua menhir, e os afloramentos con gravados e túmulos aconsella a revisión dos casos de relacións similares no norte da Península Ibérica, como os de Collado de Sejos 1 y 2 (Polaciones, Cantabria), o da estatua menhir de Soalar (Elizondo, Navarra), situada nunha área de actividade ao ar libre onde hai varias estruturas megalíticas, e outros revisados recentemente por Díaz-Guardamino (2008), que suxire a existencia de complexas cadeas de prácticas que estruturan eses lugares. Máis coñecidas son as referencias sobre arte rupestre, de tema recorrente a base de cazoletas e ferraduras. Podemos mencionar os petróglifos de Leiras da Preseira en San Pedro da Gudiña onde hai gravadas máis de cen cazoletas (Barandela e Lorenzo, 2004: 71-72). Pola súa banda, o do Tameirón presenta ferraduriformes, semellantes á desaparecida Pedra da Vidueira (O Navallo, Riós)15 (Romero, 1926; Taboada, 1955: 336), e garda relación tanto a nivel estilístico como folclórico coa Pala dos Touciños, Penedo do Mouro ou Penedo de Santiago (O Canizo, A Gudiña) ou A Ferradura (Pereiro, A Gudiña) (Rivas e Rodríguez, 2002: 57, 71) (Estampa 8). Ferro Couselo (1952) xa se decantara pola súa cronoloxía histórica a partir do seu traballo con documentos dos mosteiros de Oseira e Celanova (s. XVI-XVII) nos que a ferradura é utilizada como demarcación de propiedades, e outros documentos de época máis tardía (século XVIII) onde se especifica tamén a súa feitura. Recentemente Barandela e Lorenzo (2007) veñen de facer unha revisión sobre os petróglifos con ferraduras e a tradición oral sobre Santiago Matamouros nas terras da Mezquita, sinalando a cronoloxía histórica dos gravados, aínda que tamén a súa posible convivencia con outros de cronoloxía prehistórica. Poderíamos asumir perfectamente para o sur da provincia de Ourense as propostas da recente síntese realizada por Alves e Reis (2009) para a rexión de Tras-os-Montes, que pon de manifesto o interese dunha rexión habitualmente reducida á súa caracterización como unha area de confluencia entre a denominada Arte Atlántica e a Arte Esquemática, pero necesitada dun estudo máis detallado sobre a súa inmensa diversidade temática e as súas descontinuidades espazo temporais. Aínda que non somos capaces de aventurar unha cronoloxía para os motivos sinxelos gravados no Cichón, a contigüidade cos túmulos detectados e coherencia es14 Intervención dirixida por A. Parga (CJ102A-95/76-D). 15 Confirmamos a súa destrución nos traballos de prospección. Segundo os veciños do Navallo, a pedra foi empregada na construción da igrexa.
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trutural nos seus criterios de emprazamento, permite propor como hipótese a cronoloxía prehistórica de al menos, algúns destes motivos. 2. A Idade do Bronce O entorno arqueolóxico da estatua menhir do Tameirón ofrece importantes indicios de ocupación ao longo da Idade do Bronce, o que ten especial interese para a súa contextualización. O máis próximo é o lugar de Meiro Longo, a uns seis quilómetros ao noroeste do lugar do Cichón (Estampa 8), onde se empraza o xacemento da Corga da Mela (Pentes, A Gudiña)16, coñecido na bibliografía por ter aportado algúns dos escasos moldes de fundición da prehistoria recente galega. Dun xeito casual foron atopados un molde de fundición bivalvo de machados planos semellante ao tipo Barcelos (aínda que co gume menos pronunciado), e dous fragmentos de moldes sen parella, para fundición dun cicel un deles, e indeterminado o outro (Taboada,1973). Están realizados nunha pedra semellante á esteatita, con indicios claros de uso. Actualmente están depositados no Museo Arqueolóxico Provincial de Ourense. Aínda que non está claro si se trata dun acubillo nun entorno illado ou un contexto máis amplo, nos últimos anos, por mor dos traballos agrícolas, a Corga de Mela, ten aportado outros materiais de interese (Rivas e Rodríguez, 2002: 70)17. Na revisión superficial do terreo efectuada no transcurso da prospección atopáronse algúns fragmentos de cerámica lisa de conformación manual e adscrición prehistórica, así como un posible fragmento de muíño plano. A tipoloxía dos moldes apunta ás orixes da metalurxia de bronce, cunha posible datación de mediados do segundo milenio A.C (Comendador e Bettencourt, 2009). Unha cronoloxía semellante é a proposta pola equipa de escavación para o xacemento trasmontano de Fraga dos Corvos (Vilar do Monte, Macedo de Cavaleiros), a uns sesenta quilómetros ao sur do xacemento de Corga de Mela, seguindo o curso norte-sur do Rabaçal e acadando a bacía de Mirandela, accesible a través do curso do Túa. Este xacemento forneceu nos últimos anos a documentación máis completa e antiga sobre a primeira produción de bronce binario do noroeste e posiblemente, de toda a Península Ibérica (Senna-Martínez et al., 2006). Na campaña do 2008 atoparon un fragmento de 16 Na prospección foron tomadas correctamente as súas coordenadas. Atopamos erros na localización cartográfica do xacemento na documentación que consta na D.X.P. que figuran tanto na ficha de inventario como na delimitación para o Plan de Ordenación Municipal de A Gudiña, aínda que a descrición do lugar así como os datos do propietario coinciden. 17 O dono da finca onde apareceran hai anos os moldes, Germán Barxa de Erosa, conserva unha colección dos materiais que vén atopando durante estes anos no mesmo terreo, entre os que figura unha pedra irregular con perforación bitroncocónica oblícua (2,5 x 2 cm), un fragmento de base dun muiño navicular e unha man de muiño. Tamén atopou unha cuncha de caracol mariño, que semella unha intrusión contemporánea, xa que foi identificada como Babylonia japonica, unha espécie endémica dos mares de Xapón, que vive a uns 20 metros de profundidade. Agradecemos a Eduardo González e Victor Bejega do grupo de Arqueomalacología de León os seus comentarios ao respecto.
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molde para a fundición de machados “idéntico” ao de Corga de Mela18, que os autores encadran nun momento antigo da Primeira Idade do Bronce pola presenza de cerámica campaniforme xunto con formas e decoracións típicas do “Mundo Cogeces” en practicamente todas as cabanas escavadas (Senna-Martínez et al., 2009: 73). Neste mesmo marco cronolóxico do Bronce Medio segundo a cronoloxía tradicional, insírese a datación publicada recentemente19 para o enterramento en Cista da Forxa ou das Fraguas (Vilariño das Touzas, Riós), a escasos quilómetros ao oeste do Tameirón (Estampa 8). A datación foi obtida dos restos carbonizados dun dos catros vasos troncocónicos aparecidos na intervención de urxencia realizada en 1995 a seguir do seu achado casual (dirixida por F. Méndez) e que foron analizados e interpretados como restos de cervexa (Prieto et al., 2009a: 95). A esta información debe engadirse a que vén de ser publicada sobre o xacemento de Fraga do Zorro (Abedes, Verín), necrópole de fosas cunha datación que o sitúa no Bronce Inicial galego de contextos campaniformes (Prieto et al, 2009b). Ademais da inhumación en cista ou en fosa na rexión, temos que mencionar a presenza de grutas e abrigos ocupados como lugares de enterramento e de depósitos durante a Idade do Bronce, aspectos funerarios tratados por Bettencourt (2009), quen refire varios xacementos con restos óseos e materiais diversos. Destacariamos pola súa proximidade A Lorga de Dine (Vinhais, Bragança) doutro lado da raia, onde habería indicios de enterramentos dende cando menos o Calcolítico rexional ata a Idade do Bronce e o Fragâo da Pitorca (Chaves). Foron realizados enterramentos nun período amplo (asociados a un posible poboado) e apareceu unha espiral de ouro e un machado de perfil trapecial e gume destacado (Comendador, 1997: 124, nº 57b) cunha morfoloxía pouco habitual con respecto dos machados planos de cobre, polo que a falta de analítica, podería ser tida en conta a posibilidade de que se trate un machado de bronce. O emprego para usos diversos de covas ou abrigos podería ser corroborado para a zona do Tameirón a partir dos datos dunha escavación antiga na chamada Fraga do Pombal (Barxa)20, refuxio natural de considerables dimensións (Estampa 8). Segundo informa López Cuevillas (1956), en 1952 Laureano Prieto, mestre e intelectual da Gudiña, fixera unhas catas que permitiran detectar tres niveis arqueolóxicos de pouca potencia separados por outros estériles, considerando o primeiro da Idade Media pola presenza de cerámica a torno, o segundo dos inicios da romanización, e o terceiro neolítico polo achado de cerámicas “asimilables ás dos dolmens”21. Segun18 Machados similares aos do depósito de Agro Velho (Montalegre, Vila Real) (Teixeira e Fernandes, 1963-64). 19 Ua-21691: 3370±45 BP, 1746-1523 2σ cal BC (Prieto et al., 200a: 95). 20 No Inventario de Xacementos Arqueolóxicos da D.X.P. figuran como dúas covas: a de Pentes (Ref. 3) e a Fraga do Pombal (Ref. 4). Consideramos que pode tratarse da mesma, xa que A chamada Fraga do Pombal está en Barxa, pero tamén preto de Pentes. 21 “A 58 cm, en una oquedad de la roca, se encontraron una piedra bastante grande y dos pequeños fragmentos de vasos, uno rojo y otro pardo amarillento, los dos gruesos y toscos” (López Cuevillas, 1956: 298).
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do os veciños máis vellos, atoparan alí restos de moas e dentes, máis dúas pequenas pezas de bronce macizo, semellando ser arracadas, entregadas a Laureano Prieto, e hoxe en paradoiro descoñecido (Varela e López, 1991-1992)22. Na serra da Urdiñeira, na Cova das Choias ou Casa das Grallas (Estampa 8), tamén hai referencias á localización dun punzón de óso duns 5 cm. de longo con fiestra redonda na punta, e de feitío pouco acabado (Romero, 1926). Infelizmente son achados antigos, que deberán ser obxecto de revisión e novos estudos. A un momento posterior, dos finais da Idade do Bronce, pertencería o conxunto do Abrigo 2 do xacemento de Fraga dos Corvos, xa referido, onde nun posible contexto funerario, apareceu un pequeno brazalete en bronce, unha fíbula de dobre resorte e un pendente ou pendeloque decorado, feito que é interpretado como unha relación co mundo orientalizante (Senna-Martínez, et al., 2006: 5; Figueiredo et al., 2007; Figueiredo et al., 2009). O achado do abrigo 2 da Fraga das Corvos podería ter unha relación cronolóxica co do denominado Tesouro da Urdiñeira, atopado casualmente por volta do ano 1921 cerca do lugar de Parada da Serra (A Gudiña, Ourense) (Macías, 1921; Romero, 1926; López Cuevillas, 1958) a escasos dez quilómetros en liña recta ao oeste do Tameirón (Estampa 8). O conxunto está integrado por dous brazaletes de ouro e un disco ou “botón” de bronce (Comendador e Méndez, 2009; Comendador, 2009). Distintos autores apuntaron a súa hipótese cronolóxica e cultural baseada nas semellanzas con outras pezas de diferentes contextos da Prehistoria Europea, especialmente da Idade do Bronce, pero os aspectos formais e a tecnoloxía de elaboración mediante o emprego do baleirado á cera perdida e o emprego dun torno de eixo vertical, permitiron poñelos en relación coa ourivería Villena/Estremoz que aparece na fachada atlántica europea no Bronce Final (Armbruster, 1999: 242; 2000). Poderían ser ítems persoais no caso de tratarse dun hipotético enxoval funerario, opción pola que se decantan Rivas e Rodríguez, (2002: 69) e tamén Suárez (1990: 141), tendo en conta a complementariedade das pezas. Outra posibilidade é consideralas un acubillo ritual nun punto sinalado da paisaxe. Perea (2005: 61-62) indica unha serie de achados de ouro ao longo da fachada atlántica durante a Idade de Bronce e a transición para a Idade do Ferro, que pertencen a un código semántico que semella regularizado: depósitos contendo espirais ou cadeas de espirais de ouro, depósitos con ourivería tipo Villena (Perea, 2005: Lám. 3) ou tipo Sagrajas/Berzocana. Tendo en conta estes aspectos, poden ser postos en relación con outros achados do noroeste peninsular, interpretados como depósitos do Bronce Final e que presentan unha serie de características comúns (Comendador 2009, Táboa 1, Figura 3). De feito, os da Urdiñeira non son os únicos brazaletes da rexión inseribles neste ámbito. Tamén están os de Ourense, Toén, Alto da Pedisqueira (Chaves) e, máis 22 López Cuevillas (1956: 298) fala dun “pedazo de mandíbula de un óvido con dos molares” na segunda capa, pero non hai novas de posibles arracadas.
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lonxe, os de Melide e Monte da Saia (Braga). En todo caso son ítems moi elaborados, que requiren unha manufactura especializada e que poderían ser de produción local ou, máis probablemente, importados dun contexto cultural foráneo. Tal feito podería revelar importante información sobre as alianzas políticas locais e/ou rexionais, así coma da circulación de persoas e tamén de tecnoloxía e de valores rituais e sociais. A presenza dunha cultura material dedicada á creación de identidades e á construción do poder dende mediados do segundo milenio ata os inicios do primeiro, é un contexto coherente para o achado da estatua menhir do Tameirón, xa que o Bronce Final é a datación que se ven dando aos exemplares de Ermida, Faiões, Bouza y Chaves, ou a inicios de la Idade do Ferro, no caso das de Chaves e San João de Ver, pola tipoloxía dos obxectos representados (Jorge, 1991: 367-368, Bettencourt, 2005: 171, González García, 2009). 3. A Idade do Ferro e a romanización Na estampa 8 recollemos algúns dos xacementos fortificados da Idade do Ferro no entorno do Cichón, aínda que o estado actual da investigación non permite polo de agora unha mellor caracterización. Rivas e Rodríguez (2002: 53-65) consideran que semellan ter sido influídos pola explotación dos minerais, e que aparecen moi romanizados. O poboamento castrexo na comarca das Frieiras foi tratado recentemente por Pungín (2009)23, identificando un total de catorce xacementos, e ofrecendo unha interesante análise dos seus patróns de asentamento. En xeral están emprazados en altitudes absolutas medias ou baixas, en relación coa rede de drenaxe, coas terras cultivables e con potenciais rutas de tránsito, aínda que se poden diferenciar grupos distintos. Contrario a este patrón xeral de asentamento estaría o castro de Pedroso (Trasestrada, Riós), asentado nun outeiro cónico que resalta no relevo circundante. Na recente intervención se detectaron polo menos tres liñas de muralla e dous posibles accesos. Non foron atopados materiais en superficie. Outro xacemento revisado foi o chamado Castelo do Navallo (Riós) (Romero, 1926, Rivas e Rodríguez, 2002: 63), con características que poderían facer pensar nunha fortaleza de época histórica máis que nun asentamento da Idade do Ferro. González-Ruibal (2006-2007: 286) ten sinalado para os castros da segunda Idade do Ferro da zona de Trás-os-Montes que o seu patrón de asentamento e moi discordante con respecto da zona galaica propiamente dita e que o poboamento semella estruturarse en relación aos recursos gandeiros, facendo fincapé na considerable concentración de “verracos”. A área estudada podería ser englobada nesta perspectiva, tamén en canto a aparición desta estatuaria (Taboada, 1955: 349). Os asentamentos fortificados non serían o único modelo de asentamento coñecido, xa que no lugar de Valdamio (Riós) foi escavado un asentamentos aberto da Ida23 O estudo deixa fóra parte do concello de Riós.
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de do Ferro en zona de val (González Ruibal, 2006-7: 321; Aboal et al., 2002; Parcero, 2002: 382)24. Foi atopado un conxunto de obxectos de procedencia púnica e oriental, entre eles un anforisco de vidro de tipo mediterráneo (Concheiro e Vilaseco, no prelo). A importancia destas vías naturais de paso relacionadas en época romana é importante, como amosa a aparición de diversos miliarios25. Xa falamos anteriormente do posible asentamento no lugar coñecido como As Muradellas, ou Tameirón Vello (Sta. Mª do Tameirón) a medio quilómetro ao noroeste do lugar do Cichón) (Rivas e Rodríguez, 2002: 61). Segundo Rodríguez Colmenero, (1987: 523) ao pé do castro de Barxa, na actual estrada, atoparíase outro asentamento romano de chaira, e iniciaríase a denominada Calzada das Minas. Do proceso de romanización é significativa a estela funeraria aparecida no lugar de Veigadallas (O Tameirón), no río Diabredo, preto do castro das Corbizas (ou Carbizas), co epígrafe NIGER CAMALI (Rivas e Rodríguez, 2002: 74). No caso da estatua menhir do Tameirón, polo tanto, ao igual que noutras pezas do Noroeste Peninsular, é efectiva a relación con vías de comunicación e vías de auga. Ruiz-Gálvez (1998: 171-179) indica a súa presenza en zonas montañosas que responden ao mesmo patrón, pola súa localización en función de vías naturais e zonas de aproveitamento fundamentalmente gandeiro, asociadas a vías pecuarias. As estatuas-menhir do Tameirón e a de Bouça (Mirandela, Bragança) terían que ser postas en relación co val do río Mente-Rabaçal e Pentes26, mentres que no val do Támega aparecen as de Faiôes, de Chaves e a de Muíño de San Pedro (Verín), e no do Limia a de Vilar de Santos. Un último punto que queremos tratar é a relación dalgúns destes xacementos cos recursos estanníferos. O Tameirón está inserto na área mineira de Vilar de Cervos e os famosos estaños de Monterrei, que xa foran loados por Larruga (1784-1800). As minas de Barxa (A Gudiña), xunto coa de Penouta e Ramilo (Viana do Bolo) constitúen a terceira zona más importante de minería estannífera da provincia de Ourense, o que Meijide (1963: 197) denomina grupo oriental, para distinguilo do central (no val de Monterrei) e o occidental (depósitos de Montes, Beariz e Avión). Segundo o propio Meijide, o descubrimento destas minas dataría do século XVIII, tratándose de minas de casiterita integrada en filóns de cuarzo con arsénico, explotadas esporadicamente27. Prieto (1945-46: 121) mesmo recolle a referencia de traballos antigos nos xacementos de casiterita de Val Grande (A Barxa), Trabisquedo en Pentes, e Tameirón, 24 Intervención de urxencia con motivo das obras da Autovía das Rías Baixas dirixida por Ángel Concheiro (Expediente código 03.A.004.1996.003). Tanto nas novas dos xornais como nas citas aparece referido ao concello de Verín, pero o xacemento pertence ao concello de Riós. 25 Miliarios da Barxa (A Gudiña), A Esculqueira (A Mezquita), Tameirón (A Gudiña), Alberguería (O Bolo) en relación coa vía romana chamada “Calzada das Minas” e a Vía XVI (Rivas e Rodríguez, 2002: 79-80; 83). 26 Un elemento por confirmar é a posible presenza dunha estatua menhir coñecida como Pedra Espetada no lugar de Sernande (Pinheiro Novo, Vinhais, Bragança). 27 P. Hervella Puga (veciño da Gudiña) quitou durante un trienio pouco menos de 250 arrobas de mineral. En 1804 estableceu unha ferrería (Meijide, 1963: 197).
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así como as lendas asociadas28. As minas do Lombo están mesmo ao pé do castro de Barxa. Actualmente están pechadas aínda que foron traballadas ata épocas recentes, como recollemos na memoria local. A presenza de recursos estanníferos e vías de paso, é un aspecto a ter en conta para a contextualización da estatua menhir do Tameirón, xa que a aparición de este tipo de pezas en áreas ricas en minerais, como o estaño ou o ouro, sinalada por Bettencourt (2005: 171), pode ser moi relevante na súa interpretación. Consideracións finais Xa foi posto de relevo o escaso número de estelas ou estatuas menhir con contextos estratigráficos verticais coñecidos, o que motivou unha tendencia a concentrar os estudos nas propias creacións e os seus gravados e a consideralos como composicións pechadas e restos estáticos illados no tempo e no espazo (Diáz-Guardamino, 2008: 33). O mesmo ocorre no caso dos achados de “tesouros”, nos que a falta de información contextual, focaliza a atención nos propios obxectos (Comendador e Méndez, 2009). Os resultados preliminares do proxecto a desenvolver no contorno do Monte Urdiñeira veñen de amosar o interese do estudo destes lugares en micro e meso escala para dinamizar o noso actual coñecemento destes fenómenos. En síntese podemos concluír que, lonxe de ser achados illados (arqueolóxica e circunstancialmente), están en relación cun contexto arqueolóxico local, rexional e intra- rexional que os dota de contido. A contigüidade de manifestacións arqueolóxicas no lugar do Cichón podería indicar para a estatua menhir unha cronoloxía antiga do III milenio a.C., datación suxerida para os exemplares de Ataude e Tremedal que presentan o típico motivo subrectangular alongado no anverso (Bueno, et al. neste volume, recollido en Alves e Reis, 2009: 84). Sen embargo, a súa contextualización nun marco máis amplo, permite para nós propor a súa vinculación co poboamento desenvolvido na zona entre os mediados do II e inicios do I milenio a.C., aínda que sen desbotar a súa integración nun entorno xa empregado previamente para diversas actividades, incluídas as funerarias. Neste senso, como ten suxerido Díaz-Guardamino (2008), podería interpretarse a estatua como marcador dun lugar no que se realizarían rituais de conmemoración a individuos xa mortos, a través dos que o grupo reafirmaría o seu sentido colectivo mediante a memoria social. A cultura material reflicte un discurso semellante ao do consumo das elites sociais no resto de Europa para este momento, creadora de identidades mediante obxectos de difícil acceso e cunha carga simbólica semellante en amplas rexións. 28 “En el Término de Tameirón, existen dos galerías que tienen las bocas derrumbadas. Se dice que los moros sacaron oro de ellas y que lo cambiaron por leche, queso y trapos encarnados, a los que eran muy aficionados invitando al trueque con la frase: “Cristiana dame tu pobreza que yo te daré mi riqueza”. Vid. tamén Rivas e Rodríguez (2002: 93-96).
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A vinculación da estatua co cruce de importantes vías de circulación tanto en sentido norte-sur, como leste-oeste, así como a presenza de importantes recursos de estaño nos inicios do desenvolvemento da metalurxia do bronce, poderían falar do xurdimento de elites neste eido xeográfico cun interese no control do tránsito entre o litoral e a meseta, tanto de materiais coma de gando ou de bens. Un interese sobre o control territorial que seguirá sendo efectivo na Idade de Ferro e na época romana. Para consideracións máis axeitadas haberá que esperar ao procesamento do resto da información recollida na prospección, que eventualmente poderá ofertar unha achega ao coñecemento dos patróns de poboamento e de mobilidade no entorno do Monte Urdiñeira, nunha perspectiva transversal e diacrónica. A intervención do ano 2009 non só ten axudado a consolidar a idea da alta potencialidade da zona en canto aos recursos arqueolóxicos ou paisaxísticos, e as posibilidades da posta en valor dos mesmos dentro dun modelo de valorización e de desenvolvemento sostible, senón que permite tamén unha mellor valoración das circunstancias concretas do contorno, polo que é posible mellorar e axustar o deseño de futuras actuacións que, esperamos, teñan lugar nun futuro próximo. Por último, as fronteiras actuais, alleas aos fenómenos da Prehistoria, obrigan a unha máis que necesaria coordinación e colaboración entre investigadores dos dous lados da raia, con resultados habitualmente proveitosos, do que é mostra evidente este volume.
Agradecementos Queremos amosar o noso agradecemento a todas as persoas sen as que non tería sido posible este proxecto, especialmente a J. Rodríguez Cruz (Pepe); a Beatriz Vaquero, Francisco Javier Rodríguez e Mercedes Durany da Universidade de Vigo; a Lois Méndez, Mara Veiga e Francisco Fariña do Museo Arqueolóxico de Ourense; a Santiago Vieito de AKROS XIP-SLNE; a Vicente Feijoo do Proxecto Toponimia de Galicia; a Cristina Fernández, Marta Lorén, Abraham Herrero, Jose Luis Peña e ao resto do equipo da intervención, así como ás xentes de Riós e A Gudiña. Para a realización do traballo foi inestimable a axuda de Tarfício D. Maciel, Marta Díaz Guardamino Uribe, Angel Concheiro e do equipo de Arqueomalacología da Universidade de León. Finalmente agradecemos a Raquel Vilaça o seu convite para publicar este texto.
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Estampa 1 - Localización da área de estudio e da estatua menhir do Tameirón e esquema da localización de estatuas menhir do Noroeste Peninsular.
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Estampa 2 - Localización dos achados do Cichón (Sta. Mª. do Tameirón, A Gudiña).
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Estampa 3 - Vista do Cichón e localización dos achados dende o oeste (arriba). Vista da finca do Cichón dende o leste (esquerda). Vista da chaira circundante ao norte (dereita).
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Estampa 4 - (1). Vista do túmulo 1 dende o nordés. (2). Aspecto do túmulo 1 dende o norte. (3). Restos dunha posible coiraza no sector sur. (4). Detalle da acumulación de pedras a noroeste. (5). Vista dos restos do túmulo 2 e do afloramento 1 dende o leste. (6). Detalle da acumulación de pedras da posible coiraza no sector suroeste do túmulo 2.
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Estampa 5 - (1). Vista do túmulo 1 dende o afloramento 1 ao leste. (2) Vista do afloramento 1 dende o norte. (3) Detalle do bloque 1 dende o leste. (4) Detalle do bloque 2 dende o este. (5) Detalle de motivos gravados no bloque 2.
Estampa 6 - (1). Vista do afloramento 2 dende o oeste. (2). Vista do afloramento 2 dende o nordés. (3). Estrutura de pedras ao leste do afloramento 2. (4) Detalle dunha posible cazoleta no sector sur do afloramento 2. (5). Detalle dunha posible cazoleta no sector norte do afloramento 2.
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Estampa 7 - Calco e fotografías do rexistro da estatua menhir do Tameirón.
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Estampa 8 - Localización dos xacementos do contorno da estatua menhir do Tameirón citados no texto: 1. Túmulo de Val da Lagoa (Santiago de Carracedo, AG); 2. A Medorra (AG); 3. Castro da Ribeira (AG); 4. Petroglifos de Leiras da Preseira (AG); 5. Castro de Val da Cal (AG); 6. Xacemento Romano de Bouzas (S. Mamede de Pentes, AG); 7. As Muradellas (Tameirón, AG); 8. Castro de A Corbiza (Tameirón, AG); 9. Castro de O Circo (Tameirón, AG); 10. Tras do Castro (Pentes, AG); 11. Castro de Barxa (AG); 12. Fraga do Pombal (AG); 13. Castro de San Lourenzo (AG); 14. Fraga da Moura (Castrelo de Cima, Riós); 15. Castro de Cabanco dos Mouros (Castrelo de Abaixo, Riós); 16. Castro de As Cabarquellas (Progo, Riós); 17. Cista da Forxa (Progo, Riós); 18. Valdamio (Riós); 19. Pedra Vidueira (O Navallo, Riós); 20. Castelo do Navallo (Riós); 21. Castro de Pedroso (Trasestrada, Riós); 22. Túmulo de Chaira das Pozas (Trasestrada, Riós); 23. Cova das Choias (AG-Riós); 24. Localización do achado do “Tesouro” da Urdiñeira (Parada da Serra, AG).
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Mobilidade e materialidade: uma aproximação à análise da localização das estátuas-menir transfronteiriças (Norte de Portugal e Sul da Galiza) Pastor Fábrega-Álvarez1, João Fonte2, Francisco Javier González García3
Resumo O presente trabalho constitui uma aproximação à análise da distribuição das estátuas-menir do Norte de Portugal e Sul da Galiza. A finalidade deste estudo, baseado na aplicação de tecnologias geo-espaciais, centra-se no desenvolvimento e discussão de uma metodologia que permita contrastar as propostas interpretativas que relacionam a localização deste conjunto de elementos com zonas de mobilidade na paisagem. Palavras-chave: Estátuas-menir, mobilidade, zonas de passagem, Sistemas de Informação Geográfica. Abstract The present paper constitutes an approximation to the analysis of the distribution of the menir-statues of the North of Portugal and South of Galicia. The purpose of this study, based on the application of geo-spatial technologies, focused on the development and discussion of a methodology that allows us to confirm the interpretative proposals that relate the location of this set of elements with mobility zones in the landscape. Keywords: Menir-statues, mobility, passageways, Geographic Information Systems.
1 Laboratorio de Patrimonio (LaPa), Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC); pastor. [emailprotected] 2 Laboratorio de Patrimonio (LaPa), Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC); [emailprotected] 3 Universidad de Santiago de Compostela (USC); [emailprotected]
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
As estátuas-menir do Norte de Portugal e Sul da Galiza O conjunto material aqui estudado encontra-se formado por uma série de peças que têm como características gerais comuns a sua identificação como estátuas-menir, entendendo por tais aquelas peças que representam figuras humanas esculpidas de forma tridimensional, com independência de que possua ou não atributos decorativos (Sousa 1996: 12). Tendo em conta esta consideração, o conjunto encontra-se constituído por várias peças, conhecidas pela investigação desde há já algum tempo, procedentes do Norte de Portugal e do Sul da Galiza e, mais especificamente, de Trás-os-Montes Ocidental e do Sul da Província de Ourense: Faiões (Almeida, Jorge 1979: figs. 4-7), Chaves (Jorge, Almeida 1983: figs. 4-7), Bouça (Sanches, Jorge 1987: figs. 2-6), Muiño de San Pedro (Taboada Cid 1988-1989: figs. pp. 87-90), Marco (Lopes et al. 1994: fig. 2), Vilar de Santos (Museo Provincial de Ourense 2002, inclui imagem da estátua) e Tameirón (Rivas Quintás, Rodríguez Cruz 2002: 75-77; Comendador Rey, Méndez Fernández 2009 e o blog do projecto de investigação dirigido por B. Comendador Rey: http://urdinheira.blogspot.com/; González García 2009b: fig. 4a). A efeitos da análise espacial a desenvolver no presente trabalho, também incluímos, além das peças anteriores, uma série de exemplares portugueses de recente aparição e que se encontram todavia em processo de estudo e publicação: - Cruz de Cepos e Tojais (Alves, Reis 2009: fig. 6, assim como a sua comunicação no presente congresso). A última das referidas peças apresenta um escudo com chanfradura em V que a relaciona com as conhecidas estelas de guerreiro do Sudoeste Peninsular. Trata-se de uma peça vinculável com a referida tradição, pelo que estaríamos ante o exemplar mais setentrional aparecido na Península Ibérica, pois, com excepção das peças do Sul de França, nem o catálogo de Celestino Pérez (2001: 321-454) nem o de Harrison (2004: 185-325) mencionam qualquer exemplar, vinculável com a referida tradição, aparecido numa área situada tão a Norte no território ibérico. - Samardã, descoberta pelo Sr. David Cowell e depositada no Museu de Arqueologia e Numismática de Vila Real4. - Guilhado, identificada pelo arqueólogo Nuno Ribeiro (APIA) no âmbito de um estudo de impacto ambiental relacionado com a construção do parque eólico de Negrelo-Guilhado (Vila Pouca de Aguiar)5. Deixando de parte estas últimas peças que, como indicamos, ainda se encontram em estudo, tratam-se de uma série de monumentos que apresentam entre si determinadas características comuns: - O aspecto fálico de alguns: Muiño de San Pedro (Bettencourt 2005: 175), Chaves (Jorge, Almeida 1980: 8) e Bouça (Sanches, Jorge 1987: 80). 4 http://museu.cm-vilareal.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=62:estatua-de-vilarinho-da-samard&catid=14:noticias, inclui imagem da estátua. 5 http://www2.ipa.min-cultura.pt/pls/dipa/build_ficha?xcode=2185532&type=T&pagetitle=Trabalhos do Sitio
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- A presença em vários de um motivo geométrico sub-rectangular: Muíño de San Pedro (González Garcia 2009b), Chaves (Jorge, Almeida 1980: 14), Bouça (Sanches, Jorge 1987: 80), Faiões (Almeida, Jorge 1979: 17) e Tameirón (Rivas Quintás, Rodríguez Cruz 2002: 75). Motivo que também se encontra presente noutras peças portuguesas como a estela de Boulhosa (Jorge, Jorge 1990: 300 e fig. 2) e a estátua-menir de São João de Ver (Jorge, Jorge 1983: 46 e fig. 1). - A representação de armas, ausentes apenas nos casos de Muíño de San Pedro (González García 2009b), Bouça (Sanches, Jorge 1987: 81) e Marco (Lopes et al. 1994: 149-150). Estas coincidências permitem-nos agrupar dentro de uma mesma tradição, a das estátuas-menir, as peças do Sul da Galiza com as procedentes do Norte de Portugal. Este agrupamento não deve resultar surpreendente, dada a proximidade geográfica das zonas de descoberta das peças ourensanas com a fronteira portuguesa. Outro dos aspectos destacados destas peças relaciona-se com a sua particular pervivência como monumentos. Tal como já fizemos referência, algumas delas podem ter sido antes menires fálicos, posteriormente transformados em estátuas-menir (Bettencourt 2005: 175), fenómeno relativamente frequente na pré-história peninsular (Varela Gomes 1997: 270 ss.). Não obstante, estas reutilizações e transformações não terminam aqui: por um lado, o caso da peça de Chaves documenta, como apontaram Jorge e Almeida (1980: 21), dois momentos diferentes na sua transformação de menir fálico a estátua-menir, marcados pelo gravado de distintos atributos antropomorfos e armas em duas fases cronológicas distintas; por outro lado, o exemplar ourensano de Muiño de San Pedro manifesta, além da sua transformação de menir fálico em estátua-menir, uma outra reutilização e transformação quando, em época romana, foi convertida numa epígrafe funerária mediante a inclusão de uma inscrição latina (Jorge, Jorge 1990: 309; Sousa 1996: 96; Taboada Cid 1988-1989; González García 2009b). Este fenómeno de reutilização e reconversão de material pré-histórico em epígrafes romanas documenta-se também noutras zonas da península, tal e como o põem de manifesto as duas estelas de guerreiro do Sudoeste de Ibahernando, Cáceres e de Chillón, Ciudad Real (Fernández Ochoa, Zarzalejos Prieto 1994: 269; García Sánjuan et al. 2007). Algumas destas peças (Chaves, Faiões, Muiño de San Pedro) podem-se enquadrar dentro do tipo 2 de estátuas-menir do Norte de Portugal definido por Susana Oliveira Jorge (1986: vol.1, 953 ss.; tipologia seguida, entre outros, por Bueno Ramírez 1990: 94-95), enquanto que se tivermos em conta o carácter geralmente masculino destas peças, poderíamos incluí-las todas dentro do conjunto de estelas masculinas e, em concreto, dentro do subgrupo de estelas faliformes estabelecido por Almagro-Gorbea (1993: 126-128) que, como o próprio autor indica, apresenta características comuns com as peças carentes de suporte faliforme ou com as peças mais claramente antropomorfas, similitudes que se baseiam principalmente na presença, em exemplares de todos estes subtipos, do já mencionado elemento sub-rectangular. O motivo sub-rectangular presente em várias destas peças confere certa unidade
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história
ao conjunto mas, lamentavelmente, a sua interpretação resulta bastante problemática, sendo bastante difícil concertar uma identificação e um significado precisos. De feito, este motivo foi interpretado como um símbolo estandardizado de poder (Jorge, Jorge 1990: 309), como um elemento de vestuário cerimonial, como a parte traseira da bandoleira ou “suspensório” de fixação das correias que sustentavam as armas (Almeida, Jorge 1979: 17-18; Jorge, Almeida 1980: 14; Sanches, Jorge 1987: 80-81; Rivas Quintás, Rodríguez Cruz 2002: 77) ou como um colar apotropaico ou kardiophylax, comparável aos colares orientais tipo “keftiu”, símbolos de riqueza e poder, que aparecem nas estelas de Daunia, Itália (Almagro-Gorbea 1993: 126). Este tipo de motivos aparece também noutras peças peninsulares alheias a esta área geográfica, como é o caso, por exemplo, das estelas de Preixana, Lleida (Almagro Basch 1974: 23-28) ou Tremedal de Tormes (Salamanca), se bem que neste último caso aparece representado no anverso da peça (López Plaza et al. 1996: 297; para outros paralelos ibéricos ibid.: 301). Tendo em conta todos estes dados, muitas das peças deste conjunto (Muíño de San Pedro, Faiões, Bouça e Chaves) poderiam datar-se no Bronze Final ou inícios da Idade do Ferro, período ao que parece corresponder o punhal da estátua de Chaves (Jorge, Almeida 1983). Neste mesmo arco cronológico incluem-se também o capacete da peça de São João de Ver (Jorge, Jorge 1990: 309; Almagro-Gorbea 1993: 130-133; Jorge 1999: 121), elemento que inclusive foi datado num momento posterior, entre os séculos V e IV a.C. (Queiroga 2003: 85), ou os paralelos peninsulares nos quais aparece o motivo sub-rectangular. Assim, por exemplo, o exemplar de Preixana, segundo Almagro Basch (1974: 28; Almagro-Gorbea 1993: 133), situa-se cronologicamente no Bronze Final, entre 1500-1000 a.C. (Pons Brun 2003: 116), período ao qual, sem maior precisão cronológica, se atribuiu também a peça de Tremedal de Tormes (López Plaza et al. 1996: 301). Deste modo, cremos ser perfeitamente lícito agrupar, para o estudo aqui proposto, as peças anteriormente mencionadas, atendendo à sua similar cronologia (Bronze Final), ao seu aparecimento dentro de uma mesma área geográfica, ao seu carácter antropomorfo e, em concreto, masculino e à frequente presença de representações de armas. Decidimos excluir deste grupo as seguintes peças: Ermida, Boulhosa e São João de Ver. A exclusão da primeira, pese embora a sua recente consideração como representação de um personagem masculino com armadura (Bueno Ramírez et al. 2005: 19), vem dada pelo seu carácter aparentemente feminino (Baptista 1985: figs. 8-9), enquanto no caso das outras duas peças são as suas prováveis cronologias, distintas às do resto das peças e também o seu aparecimento em áreas geográficas distantes da zona em que se concentram o resto das peças, o que nos levou a não as considerarmos no nosso estudo. Boulhosa, em concreto, foi datada dentro de um contexto cronológico e cultural megalítico (Jorge, Jorge 1990: 307), contando com vários paralelos na Península, como é o caso da estela de Soalar, Navarra, à qual lhe foi adjudicada uma cronologia enquadrável dentro do III milénio a.C. (Bueno Ramírez et al. 2005: 31), ao passo que São João de Ver, como já indicamos, apresenta características que a
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vinculam com os inícios da Idade do Ferro. As interpretações do material a estudar No que respeita ao significado destas peças, assinalou-se (Sousa 1996: 95; Bettencourt 2005: 166) que a imensa maioria, pese embora a falta de contexto arqueológico, apareceu nas proximidades de cursos de água (Faiões, Chaves e Bouça) ou em zonas de fronteira entre áreas de forte contraste geográfico e que, portanto, serviram como zonas de passagem. Esta característica pode-se fazer extensiva a duas das três peças ourensanas: a estátua de Muíño de San Pedro apareceu, como indicou Taboada Cid (1988-1989: 79-80), nas proximidades do rio Tâmega, numa área transitada por duas vias romanas, enquanto a estátua de Vilar de Santos foi recuperada formando parte de um muro de propriedade a 50 m de um cruzamento de caminhos próximo ao curso da Via XVIII Bracara-Asturica (Museo Provincial de Ourense 2002). A terceira peça aparecida na província de Ourense, Tameirón, foi descoberta em Agosto de 1992 durante a realização de trabalhos agrícolas na Cabeza de Cichón, pequena elevação a quase 2 km a oeste de Tameirón e a 1 km de As Muradillas ou Tameironciños ou Tameironciños Vellos, onde se conservam construções em ruínas e numa área cursada por duas supostas vias romanas, uma delas conhecida como a Calzada das Minas (Rivas Quintás, Rodríguez Cruz 2002: 76 y 79). Esta proximidade a vias de comunicação romanas documenta-se também no caso da estátua de Marco que, segundo os autores que dão conta da sua descoberta, foi encontrada in situ na freguesia de Vreia de Jales, concelho de Vila Pouca de Aguiar, distrito de Vila Real (Portugal), junto à via romana que, unindo Emerita Augusta e Aquae Flaviae, passava pelo distrito mineiro de Trêsminas e Jales (Lopes et al. 1994: 147). Algumas destas peças poderiam provavelmente interpretar-se como elementos sinalizadores de caminhos. De facto, Sousa (1996: 96) indicou que as peças do grupo Chaves-Verín (Faiões, Chaves, Bouça e Muíño de San Pedro) apareceram todas nas proximidades de cursos fluviais: a estátua de Chaves indicando, quiçá, uma passagem do Tâmega, a de Faiões sinalizando o caminho em direcção ao norte desde Chaves, situação que também parece aplicável à estátua de Muíño de San Pedro, enquanto o exemplar de Bouça localizava-se nas proximidades do rio Rabaçal, em posição de predomínio sobre a bacia de Mirandela. Tudo parece indicar, portanto, que todas estas peças poderiam estar vinculadas ao estabelecimento de caminhos que estruturavam diferentes territórios (Sousa 1996: 97), caminhos que talvez tenham estado relacionados de algum modo com a exploração de recursos minerais (Bettencourt 2005: 170) ou pecuários dessas áreas (Ruíz Gálvez 1998: 177-178). Estaríamos, assim, ante a mesma função que outros autores atribuíram a manifestações culturais similares, como as estelas do Sudoeste, que foram interpretadas como hitos de sinalização de caminhos ou de delimitação de fronteiras entre distintos territórios (Ruíz-Gálvez, Galán Domingo 1991: 260-269; Galán Domingo 1993: 72 ss.; García Sanjuán et al. 2006: 149.), interpretação que, por outra parte, também foi extrapolada para outros âmbitos geográficos peninsulares como Navarra (Bueno Ramírez et al. 2005: 32-33).
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Seja qual for o carácter dos personagens representados nestas peças (divindades, heróis, chefes, etc.), o certo é que esta estatuária masculina é portadora de armas e de insígnias de prestígio e poder, como poderia ser o enigmático motivo sub-rectangular, o que se relaciona com o processo de hierarquização social que conheceram as sociedades pré-históricas peninsulares desde o Neolítico até ao final da Idade do Bronze, processo que parece ter estado estreitamente vinculado com a actividade guerreira, tal e como se deduz da frequente representação de armamento nas referidas peças (Harrison 2004: 165-178; Bueno Ramírez et al. 2005b; direcção na que se interpretam este tipo de manifestações noutros contextos peninsulares, como Navarra: Bueno Ramírez et al. 2005: 32, ou Cataluña: Pons Brun 2003: 115-116). Deste modo, o Bronze Final do Noroeste Peninsular parece caracterizar-se pelo aparecimento de uma elite guerreira, adoptando estas sociedades uma configuração que, seguindo a Clastres, um de nós interpretou noutros trabalhos como “sociedades com guerreiros” (González García 2008: 33 ss.; González García 2009a; González García et al. no prelo). Partindo do advento destas aristocracias guerreiras, Jorge (1999: 122.) indicou que a localização destas estátuas-menir em zonas de passagem ou em limites entre territórios pode ser um indício da mudança ocorrida no Bronze Final, em relação aos mecanismos de representação do poder, que deixam de estar incorporados nos espaços funerários, onde antes se glorificava o governante através do seu túmulo, para passarem a ser integrados nestes novos espaços rituais nos quais se assiste à heroicização de determinados indivíduos mediante a realização de outro tipo de rituais distintos ao culto da morte. Nesta mesma linha, Díaz-Guardamino Uribe (2006: 2123) referiu a possibilidade de que as estátuas-menir servissem como marcadores de lugares onde se realizavam rituais de comemoração a indivíduos já falecidos, através dos quais o grupo não só conservava a memória individual do indivíduo, mas também a memória social como colectivo. Cabe também a possibilidade, como indicou Celestino Pérez (2001: 279) para o caso das estelas do Sudoeste, que esses monumentos tivessem servido para indicar o lugar onde se efectuou o ritual funerário. A análise da distribuição espacial que apresentamos em seguida, procura, precisamente, a contrastação destas hipóteses e propostas interpretativas, extrapoladas, como já mencionamos, desde outros âmbitos peninsulares de investigação arqueológica (Sudoeste Peninsular) e aplicadas à interpretação deste conjunto de peças. A nossa proposta procura, em última instância, ampliar a linha interpretativa destas peças e contribuir a uma renovação da compreensão das estátuas-menir, complementando assim, as linhas interpretativas indicadas anteriormente (Díaz-Guardamino Uribe 2008). Fundamentos teóricos A mobilidade é uma característica inerente ao ser humano, que percebe e se desloca. Estas acções constituem, essencialmente, a forma que adopta o ser humano de relacionar-se com o meio, compreendendo-o, conceptualizando-o e intervindo sobre o mesmo.
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A arqueologia centrou-se, tradicionalmente, num aspecto concreto da mobilidade: a sua materialização, cujo referente mais directo são os caminhos. Estes podem existir como consequência de decisões mais ou menos conscientes e, por exemplo, enquanto muitos caminhos são produto da fricção do ser humano no seu incessante movimento, outros, pelo contrário, são projectos minuciosamente desenhados (e.g. uma auto-estrada). É bastante provável que, em muitos casos, os caminhos das sociedades pré-industriais se tenham materializado quase de forma inconsciente e que aquelas decisões que afectaram a sua materialização (como, por exemplo, a sua pavimentação, a construção de muros de contenção, pontes ou outros elementos associados) apenas se tenham ido adoptando à medida que se reafirmou o seu traçado. Em muitos casos, esta materialização deve-se relacionar, nestas sociedades, com um fenómeno fundamental para a compreensão da formalização dos caminhos: a sua reutilização, fenómeno que, obviamente, não é exclusivo da mobilidade. No entanto, se paramos a analisar como se produz, seremos capazes de compreender melhor a indissociável relação entre ambas. Para tal, devemos ter em conta as limitações biomecânicas do ser humano, além da tecnologia utilizada para o movimento. Os declives e os rios condicionam a possibilidade de mobilidade por um terreno, o que limita a organização que o ser humano confere ao território. Isto, por exemplo, explica em parte a reutilização de vias romanas em época medieval ou os rodados, escondidos muitas vezes na actualidade debaixo do asfalto, pois, em general, resulta sempre muito mais económico utilizar caminhos já existentes. O esforço, portanto, é um componente fundamental para entender o movimento, os caminhos e a sua reutilização. Todavia, como já insinuamos, o ser humano percebe e desloca-se, construindo o território através da referida percepção. A relação entre a mobilidade e qualquer outra formalização cultural é evidente. Os povoados, santuários ou espaços produtivos dispõem-se, em parte, em função da mobilidade (ver Fábrega, Parcero 2007 para um exemplo da organização entre povoações e caminhos) e esta organiza-se sempre em função das formas culturais próprias de cada sociedade. Deste modo, produz-se a negociação do território entre a mudança e a continuidade, uma negociação que não cessa e que se fossiliza na paisagem. A arqueologia, como já afirmamos, centrou-se, sobretudo, no estudo da materialização da mobilidade. Materialização que, em muitos contextos pré-históricos, não permite ser documentada pelo registo. A análise da relação entre o registo e a estrutura potencial de um território para o movimento oferece-nos uma alternativa que possibilita uma aproximação ao tema da mobilidade em contextos pré-históricos. Trata-se de uma aproximação que não é recente nem original, tendo sido impulsionada com a incorporação de novas tecnologias (Sistemas de Informação Geográfica) e renovada com novas propostas teórico-metodológicas como a que aqui nos ocupa. A análise que propomos não pretende reconhecer a rede viária da área estudada, mas antes analisar a relação existente entre um conjunto de localizações e a sua proximidade a zonas com maior ou menor potencialidade para fazer permeável o território. No presente caso, à diferença de outros contextos, não temos pontos-chave
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de origem e destino, tal e como podem ser, por exemplo, lugares de habitação e, por isso, a nossa aproximação potencial, neste caso, também é atemporal e, em certa medida, estrutural, tal e como se depreende das variáveis utilizadas. De que partimos então? O que é que conhecemos sobre o modo de deslocação em contextos que não conhecemos nem situamos com precisão? O conhecido é certamente pouco, mas já referimos que a capacidade de movimento do ser humano não varia significativamente nas sociedades pré-industriais. Não varia, além do mais, num terreno que condiciona fortemente o movimento e onde as variáveis que condicionam a mobilidade (declives e cursos de água) não sofreram drásticas nem significativas mudanças na escala utilizada. No presente caso, trata-se, portanto, de encarar a relação entre a localização das estátuas e a potencialidade do terreno. Uma relação que, como se verá, é realizada a partir de um modelo explícito: digital e matemático e, portanto, susceptível de ser quantificado, o que não só permite introduzir um ideal de objectivação (Fábrega 2004), mas também facilita a comparação entre as diferentes localizações das estátuas e a caracterização do terreno. Este pressuposto supõe uma grande diferença respeito às considerações já realizadas sobre a localização do tipo de peças aqui abordadas e a sua proximidade a zonas de passagem. Estas observações, na maior parte dos casos, não se fazem acompanhar de nenhum tipo de análise, ou pelo menos esta não é explícita. Por isso, deduzimos que estas considerações foram realizadas a partir da estrutura actual do território ou de referências históricas. Suspeitamos, além do mais, que as observações limitam-se unicamente às zonas de localização das estátuas. Como se verá, a nossa análise propõe, em alternativa, uma consideração homogénea de todo o espaço geográfico onde se situam as estátuas. Isto permite-nos comparar não só a localização destes elementos entre si, mas também em relação a qualquer localização no terreno. Também nos pareceu importante, além do mais, ter em conta a localização das estátuas por separado e não como um grupo, o que nos permite realizar considerações com respeito a cada estátua, embora não entraremos aqui em detalhe, já que ultrapassa, em muito, as pretensões deste trabalho e são, pela sua importância, merecedoras de um estudo à parte. Dentro deste tipo de questões vinculadas com cada peça, resulta especialmente relevante o contexto individual no qual se localiza cada uma delas. Sabemos que é bastante provável que estes elementos tenham sido reutilizados até hoje em dia, em alguns casos resituando-as e, noutros, reinventando o seu significado (como, por exemplo, no caso das estátuas de Cruz de Cepos e Marco que ainda hoje servem como elemento divisor). Em todo o caso e tal e como já adiantamos, deixamos estas considerações para futuros trabalhos que permitam matizar a situação de cada estátua. Existe, por outra parte, uma segunda razão que nos fez optar por uma análise individual de cada uma destas localizações: o facto, indicado por F. Méndez (1998), de que “tomar los objetos de trabajo de una forma conjunta produce la uniformidad de los mismos” e, precisamente, observar
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as diferenças entre cada localização é um dos objectivos do trabalho que aqui propomos, algo que, por certo, estabelece, de novo, uma clara diferença em relação às abordagens de outros autores. Gostaríamos de referir, por último, que a presente análise pretende contribuir, desde uma perspectiva metodológica distinta, ao estado da questão e, em qualquer caso, complementar as contribuições que sobre estas peças já foram realizadas pela investigação através dos trabalhos já referenciados e tratados no início das presentes páginas, nas quais apresentamos uma apreciação crítica dos trabalhos precedentes desta investigação. Agora, e depois desta breve introdução à abordagem teórica que subjaz à nossa análise, procederemos a expor a nossa proposta metodológica e, a continuação, os resultados da mesma. Fundamentos metodológicos Em termos metodológicos, a proposta de partida do nosso estudo baseia-se na possibilidade de nos aproximarmos à análise das formas de mobilidade através dos processos de simulação que permitem as ferramentas SIG. Esta ideia baseia-se numa trajectória, já bastante assente, de análise da mobilidade por meio de SIG, o que constitui uma das linhas mais frutíferas de aplicação à análise arqueológica deste tipo de ferramentas (como Llobera 2000; Fairén 2004, 2007; Grau 2004). Estas aproximações fundamentam-se na determinação dos factores físicos que condicionam o movimento, concretizados nas noções de fricção (a maior ou menor dificuldade que diferentes partes do terreno oferecem ao movimento) e custo (o esforço necessário para movimentar-se entre dois pontos tendo em conta a distância linear que os separa e a fricção do terreno). Os modelos mais recorrentes para a determinação da fricção e do custo consistem em considerar que a rugosidade do terreno (declives) e os cursos de água são os factores mais influentes (sobretudo na nossa área de estudo) e, além disso, os mais acessíveis a uma consideração quantitativa. No que refere aos dados utilizados para representar as variáveis que condicionam o movimento, o componente principal tratou-se de um modelo digital de elevações (MDE) de 80 metros de resolução, elaborado e disponibilizado pela NASA no âmbito do projecto “Shuttle Radar Topography Mission”. A partir deste modelo básico, derivaram-se todos os mapas temáticos utilizados na determinação do componente fundamental da análise de movimento em ambiente SIG: os mapas de fricção e custo (Estampa 1), para os quais se tiveram em conta como elementos principais os declives e a orientação dos mesmos, a partir do algoritmo proposto por Tobler (1993). Adicionalmente, incorporamos à análise a imagem completa da rede hidrográfica potencial da zona (determinada a partir de uma análise de drenagem), com a finalidade de definir essas zonas como péssimas para a mobilidade terrestre (para evitar que os caminhos discorram pelos cursos dos rios e respectivas zonas de encharcamento). O procedimento seguido é similar ao já apresentado com bastante mais detalhe noutros trabalhos da autoria de um de nós (Fábrega, Parcero 2007).
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O MDE permitiu-nos determinar os dois factores apontados (declives e cursos de água). Em primeiro lugar, a partir de diferentes cálculos, obtivemos uma rede hidrográfica acumulativa, isto é, uma representação da totalidade dos cursos de água existentes a partir de um modelado da rede de drenagem da área. O resultado deste tipo de determinação tem o valor adicional de proporcionar um modelo hidrográfico hierarquizado, que é amplamente utilizado como uma forma de considerar a maior ou menor dificuldade que cada rio oferece ao movimento: podemos considerar, de forma geral, que quanto maior seja uma bacia, maior será o caudal acumulado e, portanto, maior será o esforço utilizado para cruzar esse curso de água. Contudo, isto admite determinados matizes. O principal é dado pelas diferentes formas possíveis de superar cursos de água: vaus, barcas, pontes, etc. Cada uma admite diferentes variáveis naturais que facilitam ou dificultam a sua utilização e que não são função unicamente do caudal. Assim, e tendo em conta além disso a aproximação que realizamos neste caso, consideramos que o caudal acumulado não é representativo como única variável do esforço empregue para atravessar as bacias, pelo que optamos por utilizar a rede apenas com finalidade excludente, isto é, para evitar que os caminhos óptimos discorram pelas bacias dos rios que, em geral, são áreas de suaves declives e que, portanto, podem-se entender, em abstracto, como zonas com boas condições teóricas para o movimento. A forma de evitar este efeito foi atribuir dois valores em todos os pontos, equivalente a atravessar um declive de 15 graus (cursos de água com bacias de 10 a 3200 hm2, áreas húmidas, regatos e rios pequenos) e 25 graus (cursos com bacias superiores a 3200 hm2, rios principais). A segunda variável considerada no nosso modelo de factores físicos foram os declives. De forma general, pode-se afirmar que quanto maior for a pendente, maior será o esforço em atravessá-la, mas é necessário especificar um pouco mais este principio. Para tal, existem diferentes propostas, diferentes algoritmos de cálculo desenvolvidos para transformar os valores da pendente (graus ou percentagem de inclinação) em valores de custo para o movimento. Partimos do algoritmo implementado por Tobler (1993) pelas razões apontadas por um de nós há algum tempo (Fábrega, Parcero 2007). Todavia, desde o nosso ponto vista, este ou outro algoritmo não fornece uma solução completa ao problema, pois não resolvem adequadamente a representação física do movimento, já que são apenas uma relação estática (a cada ponto do terreno atribui-se um valor de esforço em função da sua pendente), onde o movimento não está devidamente representado. Atendendo ao seu carácter dinâmico, o movimento tem dois componentes fundamentais: sentido e direcção. A sua variação pode provocar que o esforço varie ao atravessar uma determinada pendente. A influência do sentido do movimento no esforço foi várias vezes considerada em análises deste tipo. É evidente que, por exemplo, o esforço não é o mesmo ao subir que ao baixar uma pendente. Existem alguns algoritmos, denominados anisotrópicos, que incorporam este factor. Contudo, neste caso optamos por uma consideração isotrópica do sentido, a partir do princípio de que os caminhos que pretendemos analisar não
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têm uma ida e uma volta determinadas. Esta consideração levou-nos a uma utilização isotrópica do algoritmo de Tobler. Mas não é apenas o sentido do movimento que condiciona o esforço. Por exemplo, o ângulo descrito ao atravessar uma pendente condiciona o esforço empregue (atravessar frontalmente um declive não supõe o mesmo esforço que avançar tangencialmente). Se observamos algumas materializações do movimento, como as estradas que sobem a um ponto situado em altura, ou o próprio movimento que descrevem os animais ao subir uma acusada pendente, podemos compreender melhor este fenómeno. Em ambos casos, a direcção do movimento evita a linha de esforço máximo, pelo que o trânsito descreve um “zig-zag” ou uma espiral concêntrica a uma cota elevada. Denominamos este factor de direcção e incorporamo-lo à nossa análise. Como é que incorporamos ambos factores? Tanto o sentido como a direcção podem ser considerados a partir do que se denomina convencionalmente por aspecto ou orientação do terreno, podendo ser directamente calculado a partir de um MDE. Modelizar de forma matemática todas estas variáveis foi uma tarefa bastante complexa, sobretudo considerando que aqui apenas oferecemos um resumo de uma discussão bastante mais profunda (para uma elaboração mais detalhada ver Fábrega, Parcero 2007; Fábrega 2006). Origem e destino Como já referimos anteriormente, um dos problemas fundamentais para abordar o presente caso de estudo é, precisamente, o desconhecimento do contexto arqueológico de cada uma destas estátuas. Por conseguinte, desconhecemos a sua relação com pontos concretos no terreno, como povoados ou caminhos. Isto limita as possibilidades de qualquer aproximação que pretenda relacionar a localização das estátuas com outro tipo de entidades arqueológicas. No caso da mobilidade, isto concretiza-se na ausência de pontos de origem e destino quotidianos, como, por exemplo, lugares de assentamento. No entanto, é possível realizar outro tipo de aproximação. O que pretendemos, como já fizemos menção, é pôr em relação os pontos-chave de mobilidade numa zona concreta com a localização das estátuas, sempre desde um ponto de vista potencial. Para tal, os nossos pontos de origem serão totalmente aleatórios, isto é, pontos calculados e distribuídos pelo próprio software sem nenhum tipo de condição que não seja o seu número (50) e estar dentro de uma zona determinada (neste caso mais ampla que a nossa zona de estudo). Quais são então os nossos pontos de destino? A resposta é nenhum, o que, em nossa opinião, melhora claramente as aproximações realizadas até agora a partir de cálculos já implementados no software disponível, fundamentalmente a partir do chamado cálculo de caminho óptimo (optimal path, shortest path). Este algoritmo resolve o caminho de menor esforço calculado a partir de um ponto de origem a um destino concreto. Este cálculo define-se segundo a mesma lógica de um caminho real, como é a existência de um ponto de origem e outro de destino, que claramente
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não discutimos. Contudo, em muitos casos o que pretendemos determinar é a relação em termos de mobilidade entre um ponto e outro. No caso dos caminhos óptimos traçados entre dois pontos resulta impossível considerar o traçado da rota de forma independente desde cada uma das localizações de origem, já que o destino está pré-determinado pelo cálculo. O cálculo que propomos, Modelo de Acumulación de Desplazamiento Óptimo – MADO (publicado em detalhe em Fábrega 2006) foi elaborado por um de nós com o fim de justamente superar estas limitações, permitindo considerar a localização de redes de caminhos óptimos desde um ou vários sítios de forma independente e sem ter em conta a localização de outras posições. Este cálculo permitiu-nos determinar teoricamente as condições de movimento desde um ponto qualquer sem um destino determinado (ou seja, constatar para onde é naturalmente mais fácil movimentar-se desde um lugar, sem que existam pontos de destino predefinidos), o qual permite encarar a relação potencial em termos de esforço no movimento de um ponto com respeito a outros de forma independente. Rumo a uma rede de mobilidade potencial Utilizando este cálculo (MADO) e a partir dos mapas de custo (segundo as pautas expostas anteriormente) calculados desde cada um dos pontos aleatórios, determinamos os caminhos naturais em termos de esforço (Estampa 2). Posteriormente, somamos os valores mais altos de cada um dos cálculos (que representam as zonas potenciais pelas quais resulta mais fácil movimentar-se), obtendo assim uma rede de mobilidade natural. Esta rede está também hierarquizada, segundo se sobreponham na mesma um maior ou menor número de caminhos. Não devemos esquecer que o cálculo foi realizado desde 50 pontos aleatórios e, portanto, é esta quantidade que representaria um ponto do terreno por onde se passaria naturalmente (em termos de esforço) desde todos e cada um dos pontos aleatórios. Estas zonas são, potencialmente, chave na mobilidade e podem ser distinguidas de outras que não o são tanto. Desta forma, classificamos a rede de caminhos naturais em três grupos: 1 (pontos de passagem nos que coincidem de 1 a 11 traçados dos 50 calculados), 2 (pontos de passagem nos que coincidem de 11 a 28 traçados dos 50 calculados) e 3 (pontos de passagem nos que coincidem de 28 a 50, todos os traçados calculados). Isto vai-nos permitir fazer distinções segundo a importância de cada um dos pontos da rede de mobilidade da zona. A Estampa 3 permite observar a existência de zonas nas quais as variáveis condicionam mais ou menos a mobilidade, enquanto em algumas zonas concentra-se claramente a mobilidade (e.g. ao longo de uma dorsal com ladeiras com forte pendente). Em outras, existe um grande número de possibilidades potenciais razoáveis (e.g. numa planície aberta). Em parte, estas situações podem ser detectadas pela hierarquização em categorias (1, 2 e 3) que fizemos da rede. No entanto, não é possível localizar as zonas de cruzamento mais reincidentes a partir da referida hierarquização. Neste sentido, as zonas de cruzamento são também pontos-chave para entender uma rede de comunicação. Um cálculo simples que
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nos permite reconhecer estas situações é o de densidade viária (Estampa 4). Trata-se de localizar as zonas nas quais existem muitas possibilidades potenciais para ser atravessadas, ou para onde convergem muitas linhas de mobilidade (zonas de cruzamento). Desta forma, isolamos os valores mais altos de densidade viária da zona, que classificamos de novo em 3 categorias: 1, 2 e 3, sendo esta última (3) a que representa os valores mais altos de densidade (aquelas zonas que potencialmente representam uma maior intensidade de cruzamentos). Trataremos a continuação de pôr em relação a localização das estátuas com as linhas de mobilidade natural e as zonas de cruzamento. Para referir-nos a ambas utilizaremos o termo “zonas de passagem”. Esta relação concretiza-se a partir da proximidade, do modo que discutimos em seguida. Longe e perto em termos comparativos Chegados a este ponto, devemos recordar a pergunta que realizamos ao início: estão as estátuas próximas ou afastadas a zonas de passagem? E a esta pergunta respondemos com outra: quanto é próximo ou afastado? Para evitar o relativismo de ambos conceitos, recorremos à comparação. A nossa perspectiva é a seguinte: as estátuas estarão perto de zonas de passagem se existirem muitos pontos no terreno que estejam mais longe e, pelo contrário, estarão longe se existirem muitos pontos no terreno mais perto a essas zonas de passagem do que as estátuas. Isto resolve-se calculando quantos são os pontos que estão mais afastados a estas zonas desde cada uma das localizações das estátuas. Comparar quantidades calculadas do mesmo modo resulta muito mais fácil. O cálculo utilizado é simples. Trata-se, em primeiro lugar, de medir a distância linear entre a situação da estátua e a zona de passagem mais próxima (Estampa 5). Em segundo lugar, trataremos de determinar quantos pontos do terreno estão a igual ou menor distância que a estátua, o que nos permitirá calcular a superfície total que ocupam esses pontos. Para determinar quantos estão mais afastados basta com calcular a diferença entre essa superfície e a área da zona de estudo. O resultado representa-se percentualmente e pode entender-se como a probabilidade que tem um ponto do terreno de estar mais longe das zonas de passagem que a estátua em questão. Definir a partir desta percentagem se uma localização está longe ou perto passa por definir um umbral. Deste modo, consideramos posições próximas como aquelas onde mais de 80% dos pontos estejam mais afastados. Por conseguinte, serão posições afastadas aquelas onde menos de um 20% dos pontos estejam mais longe). Em qualquer caso, todos os resultados das tabelas e dos gráficos que apresentamos estão expressos em termos percentuais, para que o leitor possa fazer as apreciações que bem entender. Estátuas: localização e proximidade a zonas de passagem Como já referimos anteriormente, não era objectivo deste trabalho considerar a maior ou menor longevidade histórica que podem ter as localizações de cada uma
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das estátuas. Na maior parte dos casos, situamos as mesmas a partir de outros trabalhos citados anteriormente. Noutros casos, fizemo-lo a partir de referências directas recolhidas em campo. Em definitiva, a precisão que conseguimos supera de longe a necessária para uma análise à escala proposta. Na Estampa 6 mostram-se as percentagens calculadas tal e como descrevemos anteriormente. Um primeiro exame destes resultados revela que todas as estátuas, salvo Tameirón, estão perto (mais de 80% dos pontos da zona estão mais afastados respeito a qualquer ponto da rede do que as estátuas), pelo menos, de uma zona de mobilidade potencial, seja de categoria 1, 2 ou 3. Pelo contrário, Tameirón, está significativamente longe de qualquer ponto desta rede (menos de 20% dos pontos da zona de estudo estão mais afastados de um ponto da rede do que a estátua). Algumas estátuas localizam-se em pontos bastante próximos a linhas de mobilidade principal (categoria 3) como Muiño de San Pedro ou Tojais. Outras, a linhas de mobilidade secundárias (categoria 2) como Samardã, Guilhado, Chaves ou Vilar de Santos. Um terceiro grupo está significativamente próximo a linhas de mobilidade menos recorrentes (categoria 3) como Cruz de Cepos, Faiões, Marco ou Bouça. Como se pode ver, algumas estátuas estão próximas a linhas de várias categorias (Guilhado, Samardã ou Tojais). Como dizíamos anteriormente, à margem de analisar a proximidade às linhas da rede, pretendemos analisar quais seriam as zonas potenciais mais recorrentes de cruzamento e acumulação de linhas na rede. Estas zonas resultam sempre relevantes como zonas de passagem em qualquer estrutura viária. Para tal e partindo das categorias mencionadas (1, 2 e 3), calculamos a proximidade das estátuas a cada uma delas, seguindo o mesmo procedimento utilizado com as linhas da rede. Os resultados mostram-se na Estampa 7. Uma primeira apreciação poderia ser que todas as estátuas, salvo Tameirón, Bouça e Samardã, estão significativamente perto a zonas de alta densidade viária (mais de 80% dos pontos da zona estão mais afastados respeito às zonas de alta densidade viária do que as estátuas). Novamente, Tameirón é o único caso que se localiza significativamente longe de uma destas zonas (menos de 20% dos pontos da zona de estudo estão mais afastados a uma zona de alta densidade viária do que a estátua). Algumas estátuas localizam-se perto de zonas principais de alta densidade viária (categoria 3) como Vilar de Santos, Faiões, Chaves e Guilhado. Outras, a zonas secundárias de alta densidade viária (categoria 2) como Cruz de Cepos. Um terceiro grupo localiza-se perto de zonas de alta densidade viária (categoria 1) como Tojais, Muiño de San Pedro e Marco. Em definitiva, os resultados mostram uma vinculação significativa entre zonas de passagem e localização das estátuas (exceptuando o caso de Tameirón que demonstra justamente o contrário). Esta vinculação observa-se em alguns casos (Vilar de Santos, Faiões, Chaves, Guilhado, Cruz de Cepos, Tojais, Muiño de San Pedro e Marco), tanto em relação às linhas da rede de mobilidade potencial como às zonas de
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alta densidade viária. Esta dupla vinculação reforça ainda mais a relação entre zonas de passagem e a localização das estátuas. Os resultados combinados por categorias mostram-se na Estampa 8. Conclusões e perspectivas A simulação (representação) do movimento humano pelo território entranha uma enorme complexidade. Sem um modelo matemático informatizado teria sido impossível ter em conta todas estas variáveis e regular a sua influência. Não obstante, teria sido impossível comparar as situações das estátuas entre si com respeito a outros pontos do terreno em idênticas condições. Esta já foi assinalada (Parcero, Fábrega 2006) como um dos principais contributos dos SIG desde uma perspectiva comparativa. Ainda assim, e com todos os matizes de factores físicos que o nosso modelo admite, temos que recordar que a mobilidade é um fenómeno complexo que não pode ser explicado unicamente em termos de esforço. O movimento e a sua tradução material, os caminhos, não existem aleatoriamente no espaço, senão que em função da necessidade de fazer permeável um território, permitindo a comunicação física entre determinados pontos do mesmo. Portanto, e como já referimos, o trabalho que apresentamos não está terminado. Trata-se, a partir daqui, de analisar a tradução histórica da mobilidade em relação com o modelo potencial aqui apresentado (que seguiremos melhorando). Somos conscientes de que este procedimento não nos vai fornecer uma solução final a um problema tão complexo como este: contextualizar um conjunto de suportes pétreos nos quais em algum momento foram gravados diferentes motivos. Um conjunto cuja definição é problemática em si mesma. No entanto, o que pretendemos é dar um suporte objectivo às nossas afirmações e aproximar a informação obtida à nossa interpretação. Se conseguirmos entender melhor a dinâmica de mobilidade na zona em questão, poderemos, pelo menos, reforçar esta vinculação entre mobilidade e estátuas-menir. Perceber o modo em que se estabeleceu a referida vinculação, resulta muito mais complexo. Queremos dizer com isto que defender uma relação significativa entre estátuas e zonas de passagem não quer dizer que as primeiras se constituem como elementos do viário (e.g. sinalizadores), nem sequer como referentes visuais vinculados (e.g. monumentos). A vinculação encerra muitas outras possibilidades que radicam na própria construção do território, onde a rede viária constitui um elemento fundamental que estrutura e é estruturada por muitos outros elementos através dos quais se estabelece uma vinculação. Um destes elementos pode ser as estátuas que, tal como os povoados ou as necrópoles, podem ter a sua própria vinculação a caminhos.
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Estampa 1. O mapa de fricção (à esquerda) representa de forma quantitativa a relação entre qualquer ponto do terreno e a dificuldade que supõe atravessá-lo segundo os declives e os caudais. O mapa de custo (à direita), elaborado a partir do de fricção, incorpora a direcção, sentido e distância do movimento; representa de forma quantitativa o esforço necessário em alcançar cada um dos pontos do terreno desde uma localização (neste caso o ponto é calculado de forma aleatória).
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Estampa 2 - O MADO, calculado a partir do mapa de custo, permite-nos calcular desde um ponto (neste caso aleatório) as zonas do terreno pelas quais resultaria mais fácil movimentar-se, supondo um esforço mínimo.
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Estampa 3 - Rede de mobilidade potencial hierarquizada extraída a partir dos MADO calculados desde 50 pontos aleatórios (o 3 representa aquelas linhas onde se sobrepõem mais linhas de MADO). Representa aquelas zonas pelas quais resultaria mais fácil movimentar-se.
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Estampa 4 - Cálculo de altas densidades de linhas na rede (o 3 representa as zonas de maior densidade). Representa as zonas mais significativas de cruzamento na rede.
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Estampa 5 - Estão representados a negro os pontos que estão a igual ou menor distância (595 m) do que a estátua (Muiño de San Pedro) das linhas da rede de categoria 3. Pelo contrário, estão representados a branco os pontos que estão mais afastados destas linhas do que a estátua. A percentagem dos mesmos, em relação aos mais próximos, é a que se representa nas tabelas dos gráficos de baixo (neste caso 88,57%).
Estampa 7 - Gráfico que representa a percentagem de pontos mais afastados do que cada uma das estátuas em relação às zonas de alta densidade de linhas da rede (Densidad03 representa o valor de máxima densidade).
Estampa 6 - Gráfico que representa a percentagem de pontos mais afastados do que cada uma das estátuas em relação às linhas da rede hierarquizada (zp03, zp02 e zp01). Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história 269
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Estampa 8 - Valores combinados de proximidade às zonas de passagem da rede. O primeiro número do parêntesis representa a categoria da linha da rede -3, 2 ou 1- que está significativamente perto da estátua (como dissemos, “perto”, significa que, pelo menos, 80 % dos pontos da zona estão mais afastados a uma linhas desta categoria do que a estátua). O segundo número do parêntesis indica, por idêntico procedimento, a proximidade a zonas de alta densidade viária. Em ambos casos representa-se com “-“ o incumprimento desta condição de proximidade.
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Nuevos hallazgos sobre viejas ideas. Una reflexión sobre las representaciones “atípicas” en las estelas del Bronce Final del Suroeste de la Península Ibérica. Eduardo Galán1
Resumen En los últimos años el descubrimiento de un gran número de nuevas estelas del Suroeste ha ayudado a ampliar y perfilar con mayor nitidez su ámbito de distribución, así como ciertos rasgos esenciales para su comprensión. Sin embargo, la interpretación del fenómeno no ha seguido el mismo camino. La tipología de las estelas fue establecida y desarrollada a lo largo de los años 70 del pasado siglo, pero los nuevos hallazgos a menudo desafían las convenciones establecidas en dicha tipología. Esta comunicación no pretende redefinir los fundamentos de la tipología de las estelas del Suroeste, pero sí centrar el debate en la importancia de esos elementos atípicos para la propia comprensión del fenómeno en toda su complejidad. El análisis de las estelas que se salen de las normas consideradas canónicas no puede tampoco servir de excusa para reinterpretar la totalidad del conjunto a través de lo que sin duda resultaría un prisma deformante. No obstante ni la distribución espacial de estos elementos, ni su propia variedad, resultan casuales, como tampoco su relación con otros materiales coetáneos como los hallazgos de bronce y orfebrería del Bronce Final atlántico o la introducción de las primeras importaciones de origen mediterráneo claramente detectables en las tierras del Occidente peninsular. Palabras clave: Estelas, Bronce Final, tipología, contexto, paisaje. Abstract In the last years the discovery of a great number of new stelae has helped to extend and outline with major clarity their area of distribution, as well as some features for their comprehension. Nevertheless, the interpretation of the phenomenon as a whole has not followed the same way. The main typologies for the stelae were established and developed throughout the 70s of last century, but new finds often defy the conventions they established. This paper does not try to re-define the foundations of the typology of the LBA stelae, but centre the debate on the importance of the non canonical elements for the proper comprehension of the phenomenon complexity. However, the recognition of this “atypical” stelae cannot be used as excuse to interpret the whole across a deforming mirror. The spatial distribution of these elements, and their own variety, must be connected with other contemporary materials as the bronze and gold regional metallurgy or the introduction of the first clearly detectable 1 Departamento de Prehistoria, Museo Arqueológico Nacional, Madrid. [emailprotected]
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história imports of Mediterranean origin in the lands of West Iberia. Key words: Stelae, Late Bronze Age, tipology, context, landscape.
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Introducción Es curioso que en más de cien años de intensa publicación y discusión sobre las estelas prehistóricas de la Península Ibérica no haya tenido lugar hasta ahora un encuentro monográfico. La razón estriba sin duda en la diversidad de los monumentos prehistóricos que en cada época caracterizamos como estelas o elementos asimilados. Por ello estas jornadas revisten un carácter especial, que hay que agradecer a sus organizadores, pero igualmente constituyen una ocasión para reflexionar sobre el mismo concepto de estela en la Prehistoria. Mi campo de trabajo han sido siempre las estelas más avanzadas en la secuencia de la Edad del Bronce, las que en diferentes momentos han sido llamadas losas extremeñas, estelas decoradas, de guerrero, o simplemente estelas del Suroeste. Como epígonos de una larga tradición, las estelas del Bronce Final presentan también cambios significativos respecto a sus predecesoras, en particular la pérdida de sentido antropomorfo del soporte, concebido ahora como un lienzo sobre el que desarrollar una serie de elementos que llegan a alcanzar, en casos excepcionales, un cierto sentido narrativo. Sin embargo, es importante reconocer el hecho de que la estela haya servido como soporte de dichas manifestaciones antropomorfas, desde un primer momento y en buena parte de Europa, por cuanto se liga a toda otra serie de elementos en el registro arqueológico de este período en los que late esa idea de individualización de al menos ciertos integrantes del cuerpo social, y cuyo origen convencional se sitúa en la etapa campaniforme, aunque claramente sea un proceso enraizado en un momento anterior (Robb, 2009). Quizás, esta dedicación al final de este proceso no me convierta en la voz más autorizada para plantear cual es la naturaleza originaria de las estelas de la Edad del Bronce, aunque me gustaría esbozar apenas un argumento básico. Desde mi punto de vista las estelas corresponden al momento en que el arte rupestre se separa de su soporte para hacerse móvil, y por tanto para mostrarse al espectador no solo donde la naturaleza lo permitía, sino también allá donde sus creadores deseaban que este mensaje fuera visible, independientemente por tanto de la existencia o no de paneles rocosos susceptibles de ser utilizados. De esta idea matriz se deduce la importancia del paisaje para el hombre de la Edad del Bronce, en tanto esa visibilidad diferencial solo tiene sentido para hacer notoria en el espacio la presencia de una comunidad o de un poder determinados. En mi opinión cualquier discusión sobre el uso funerario o simbólico de estas manifestaciones, aun siendo importante, es secundario a esta consideración primordial, la de tratarse de referencias visibles en el paisaje, susceptibles de ser entendidas y leídas por los contemporáneos de quienes las erigieron (Galán, 1993 y 2008). Este planteamiento no es baladí, en tanto permite orientar el estudio de las estelas en su marco, teniendo en cuenta además la falta de contextos para la inmensa mayoría de los monumentos de la Edad del Bronce que han llegado hasta nosotros, a no ser en forma de reutilizaciones. A este respecto permítaseme agregar que no resulta
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especialmente relevante la consideración del tamaño de las estelas, por cuanto las referencias en el paisaje son para ser leídas por quien conoce el código en que están “escritas”, y por tanto sabe lo que está viendo y entiende el mensaje que comunican. Además se trata de una relación con el entorno diferente a la que experimentamos nosotros, y ante todo vivida a una velocidad mucho más lenta, desarrollada fundamentalmente a pie, y para la mayoría de los individuos de las comunidades de la Edad del Bronce en un marco de referencia espacial sin duda reducido a poco más de una comarca. En el caso concreto de las estelas del Suroeste en el Bronce Final, se ha debatido mucho en los últimos años sobre su carácter o no funerario (Belén et al., 1991; Celestino, 1990 y 2001; Galán y Ruiz-Gálvez, 1991; Galán, 1993; Harrison, 2004; Murillo et al., 2005), pero ante todo se ha comenzado a tener en cuenta de forma generalizada esta realidad de su importancia en el paisaje, a tal punto que es una referencia constante en las últimas publicaciones de piezas o conjuntos, independientemente de que tal importancia apoye o critique la propuesta de que tal referencia se ejercite fundamentalmente en los puntos nodales o de control de la red viaria, o de si ella tiene por fin el control de actividades ganaderas o de otra naturaleza (Ruiz-Gálvez, 1999; Galán, 1993 y 2008; Galán y Ruiz-Gálvez, 2001; Ruiz-Gálvez y Galán, 1991; otra visión en Enríquez, 2006). En cualquier caso en los últimos tiempos nuevas evidencias, en forma de hallazgos atípicos, han venido a poner en cuestión algunos de los principios asumidos globalmente sobre las estelas del Suroeste, planteando cuestiones a las que pretendemos esbozar una respuesta en estas páginas. La tipología de las estelas del Suroeste: una historia inacabada. Para comprender en toda su dimensión este planteamiento tendremos primero que analizar la evolución de la tipología de las estelas, y las implicaciones de la misma en la comprensión del conjunto del fenómeno. Es de todos conocido que, aunque existieran esbozos previos (Ramón, 1950), se debe a Almagro Basch (1966) la primera aproximación coherente a la tipología de las estelas del Bronce Final, al separarlas cronológica y tipológicamente de las llamadas losas alentejanas. Posteriormente Pingel (1974) y Varela Gomes y Pinho Monteiro (1976-77), matizarán esta tipología proponiendo divisiones internas básicamente según el número y complejidad de los motivos grabados. Pero será Almagro Gorbea (1977), el que dará su forma definitiva a la ordenación tipológica de las estelas del Suroeste. Aunque es un principio que se encuentra implícito en todos los autores citados, es el propio Almagro Gorbea (id: 191) el que hace patente “el carácter evolutivo que esta serie de estelas evidentemente ofrece”. Tanto el prestigio del autor, cuanto la reorientación de la investigación (Blázquez, 1975; Bendala, 1977), ha hecho que ninguno de los trabajos posteriores se haya detenido en ofrecer una tipología alternativa a la ya existente. Así es frecuente que en todos los trabajos de presentación de nuevas estelas, muy numerosos entre finales de los años 70 e inicios de los 90 del siglo pasado, la descripción del monumento se iniciase o acabase
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con la clasificación que le correspondía dentro de la tipología de Almagro Gorbea, incluso aunque se reconociese en ocasiones la dudosa adecuación de la estela en cuestión a un tipo específico entre los definidos por este autor. En una visión de conjunto de las tipologías publicadas desde Almagro Basch (1966) hasta Almagro Gorbea (1977), se pueden hacer dos apreciaciones. En primer lugar, como ya se ha dicho, son tipologías que se basan en la ordenación los objetos contenidos en las estelas y, a través de sus paralelos y de la propia composición interna de las estelas, las distribuyen en subconjuntos cuya plasmación se entiende como básicamente secuencial – lo que en definitiva no es sino la esencia del método tipológico –, y por consiguiente con un valor fundamentalmente cronológico (para una crítica de este modelo véase Barceló, 1989: 381 y ss.). En segundo término se debe hacer constar que el número de estelas sobre el que estas tipologías se plantean es muy reducido respecto al que contamos en la actualidad, por ejemplo la de Almagro Gorbea contaba con apenas 35 ejemplares, algunos de ellos en estado muy fragmentario, frente al más de un centenar con el que contamos en la actualidad. A esto hemos de añadir que las estelas excepcionales por su composición, sobre las que incidiremos más adelante, eran todavía bastante escasas. Por tanto las tipologías así realizadas contaban aún con una base empírica compuesta por los monumentos que desde Rosso de Luna (1898) se venían señalando como ejemplos de una aristocracia guerrera cuya cronología fluctuaba entre los momentos avanzados de la Edad del Bronce y la Edad del Hierro (Cabré, 1923; Ramón, 1950; Almagro, 1966), es decir, panoplias acompañadas a veces por algunos otros objetos, y mayoritariamente representaciones de guerreros rodeados de su armamento y objetos de lujo (Estampa 1). A finales de los años 80 del pasado siglo se inicia una nueva etapa, señalada por la tesis de Barceló (1989), en la que los intereses de la investigación han variado sustancialmente, aunque el planteamiento general todavía es deudor de la fase anterior. Ello explica en parte que este autor, tras una minuciosa crítica a la construcción de las tipologías tanto de Almagro Gorbea, como de Varela Gomes y Pinho Monteiro, proponga nuevas bases para el estudio de las estelas a partir de los objetos contenidos en ellas, pero no llegue a desarrollar realmente ninguna alternativa. Por razones diferentes, lo mismo sucede en los estudios de Celestino (1990 y 2001), Galán (1993) o en el más reciente de Harrison (2004), donde el interés se deriva hacia la ordenación geo- gráfica y el contexto arqueológico del fenómeno en los dos primeros casos, aunque de naturaleza bien diversa, o hacia la ideológica, en el último de los autores citados. Un planteamiento similar se produce cuando el estudio tipológico se limita a alguno de los objetos representados, sin un interés directo en el conjunto de la estela. Aludiremos solamente a dos de ellos a modo de ejemplo: las espadas y los carros. En el primer caso, contamos con el reciente y minucioso trabajo de Brandherm (2007: 134155) quien incluye en su estudio de las espadas del Bronce Final ibéricas un detallado recuento de las representaciones de espadas en las estelas del Suroeste, analizando sesenta y tres ejemplos que divide en doce grupos. El autor concluye que si bien existen representaciones que pueden fecharse a lo largo de todo el Bronce Final, casi la mitad
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de las representaciones resultan demasiado esquemáticas o fragmentarias para adscribirse a algún tipo real de espada presente en el registro arqueológico. Es más, existen incluso otras que, a pesar de mostrar un aspecto tipológicamente definitorio, resultan igualmente imposibles de vincular con espadas reales, dada la mezcla de rasgos que presentan. Nos encontramos aquí con uno de los aspectos característicos de las figuraciones comunes en las estelas del Suroeste, mientras el conjunto es fácilmente legible a pesar de la simplicidad de las representaciones, son relativamente pocas las imágenes capaces de ser tomadas por representaciones fidedignas de objetos reales, incluso en aquellos ejemplos de mejor factura. La explicación de este fenómeno tiene una importancia capital, por cuanto afecta al desarrollo cronológico general de las estelas del Suroeste, tanto por la propia datación de los elementos reales representados, cuanto por la consideración de si para los propios contemporáneos la representación de rasgos concretos en los objetos era tan importante como nos lo parece hoy a nosotros, o por el contrario el grado de esquematismo de las representaciones no tiene valor cronológico en sí mismo, pues al potencial espectador le bastaba sencillamente con saber que el objeto grabado era una espada. El caso de las figuraciones de carros resulta igualmente significativo (Estampa 2,1). La mayor parte de los estudios centrados sobre el que es, sin duda, el elemento más complejo que aparece en las estelas lo han sido desde la óptica de la búsqueda de paralelos y definición de influencias culturales que justificasen su presencia en estos monumentos, así como en su carácter de vehículo a la vez de guerra y funerario (Bendala, 1977; Celestino, 1985 y 2001: 211 y ss.; Blázquez, 1986; Quesada, 1994). Todo ello ha minimizado en mi opinión un aspecto fundamental, como es la inexistencia, e incluso la incoherencia, de posibles referentes reales para los mismos en registro arqueológico del Suroeste y aun del resto de la Península Ibérica (Galán, 1993: 52), salvo utilizando cronologías realmente bajas. Sin embargo, si contemplamos las representaciones con un poco más de detalle en sí mismas, no solo como portadoras de indicadores tipológicos, apreciaremos que son las imágenes que mayor número de arrepentimientos y errores de grabado presentan, a la vez que resultan extraordinariamente homogéneas, sin que influya ni su localización geográfica ni la variante de la tipología a la que pertenezcan. Lo primero viene a cuento de la dificultad de muchos de los grabadores por ubicar una pieza tan compleja en el soporte pétreo, y más que otra consideración creo que es la razón de que la inmensa mayoría de los carros ocupen una posición inferior en el panel grabado, no obstante existan excepciones como las estelas de Cabeza del Buey I, El Viso II o Cuatro Casas, entre otras, que muestran que dicha ubicación no está predeterminada a la hora de crear el monumento. El segundo factor es el que ahora me interesa destacar. Por homogeneidad no entiendo una representación idéntica en cada caso, pues existen ejemplos más detallados que otros, y algunos incluso incompletos. Algún otro caso, como el grabado en la famosa estela de Solana de Cabañas, presenta elementos disfuncionales, como un par de ruedas en la lanza del carro (Estampa 2,2). Sin embargo, y quizás más que en cual-
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quiera de los otros elementos presentes en el elenco figurativo de las estelas, nos encontramos ante imágenes en las que es difícil apreciar cambios de convenciones que pudieran interpretarse como una deriva específica hacia la esquematización, sino más bien una apariencia similar en cualquiera de las áreas geográficas del Suroeste, incluidas las estelas-panoplia del centro del valle del Tajo. Es por ello que la interpretación de esta situación no creo que pueda hallarse en una pretendida incorporación tardía de este elemento al repertorio figurativo de las estelas, sino en su adopción como un elemento iconográfico lo suficientemente desarrollado como para no adquirir matices formales significativos ni en su vertiente temporal ni espacial. En suma se trataría básicamente de un símbolo adquirido y no creado, y no de la interpretación formal de un objeto real. Ello no quiere decir que desconociesen el carro como objeto, ni su significado como bien de prestigio, sino que sea cual sea el modelo que están copiando han abstraído sus características para crear una representación uniforme interpretable como “carro”, una convención, y por tanto se trata básicamente de un ideograma compartido en el marco de un lenguaje ideográfico común. En resumen, lo que intento plantear con estos ejemplos es el error manifiesto de tratar los objetos grabados en las estelas como trasuntos directos de objetos rea- les, pues existan éstos o no en el registro arqueológico la realidad es que estamos tratando con imágenes, es decir, ante todo con ideas o conceptos cuya interpretación debió ser fácil en el tiempo de su realización y uso, incluso posiblemente centurias después, pero que nuestro punto de vista no puede asimilar de la misma forma. Las representaciones atípicas Hasta aquí hemos hablado de las figuraciones que colectivamente identificamos con las estelas del Suroeste, no en vano conocidas igualmente como estelas de guerrero. Sin embargo en los últimos años se han multiplicado los hallazgos que complican el patrón representativo sobre el que se establecieron las bases de la tipología de estos monumentos. Nos centraremos a tal efecto tres conjuntos diferenciados: - las estelas con representaciones de más de un individuo masculino en plano de igualdad - Las estelas diademadas y aquéllas con representaciones masculinas y femeninas - las “estelas” y motivos rupestres En el primer apartado se encuadran genéricamente aquellas estelas que, sin salirse en lo esencial del elenco de representaciones comunes al conjunto de las estelas tradicionales de guerrero, incorporan un elemento básico de diferenciación con aquéllas, como es la presencia de un segundo individuo representado o incluso un número mayor de individuos, que comparten protagonismo en el panel grabado (Estampa 3,1-7). No me refiero por tanto a estelas como la de Ategua (Almagro, 1974; Bendala, 1977), complejas por cuanto en ellas parece narrarse una escena, pero que tiene un claro protagonista, sino a aquellas otras en las que dos o más representaciones de idéntica escala y peso en la composición centran el panel grabado, como las de Torres Alocaz (Oliva y Chasco, 1976),
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Valdetorres (Enríquez y Celestino, 1984), Guadalmez (Ruiz, 1986), Alamillo (Galán, 1993: 104), La Pimienta (Domínguez et al. 2005: 50-51) o Majada Honda (id.: 52-54), por solo citar los más claros ejemplos. En cualquier caso es frecuente que estas estelas “duales” presenten dificultades a la hora de adscribir a cada una de ellas los elementos armamentísticos o de prestigio representados, y por tanto dificulten igualmente su visión como potenciales ajuares figurados en piedra. Por otra parte, estelas como la de Majada Honda, o como la de Aldea del Rey III (Ciudad Real), necesitada por cierto de una profunda revisión del calco de ella publicado (Valiente y Prado, 1979), multiplican el número de actores presentes y por tanto complican su interpretación según el patrón tradicional. El caso de las estelas diademadas es igualmente representativo (Estampa 4). La estela de Torrejón el Rubio II fue el primer ejemplar conocido. Incorporada a su catálogo por Almagro Basch (1966: 86-88), quedó reducida en la tipología de Almagro Gorbea al rango de estela emparentada o relacionada con las de guerrero, pero fuera de su tipología, siendo posteriormente incluida, junto a hallazgos posteriores en su estudio sobre el conjunto de las estelas antropomorfas peninsulares (Almagro Gorbea, 1994). Admitidas posteriormente de facto por la investigación en el conjunto de las estelas del Suroeste, se las sigue interpretando a la vez como parte del mismo y como realidades diferenciadas por su origen y modelo de representación (Celestino, 2001: 233 y ss.; Santos, 2009), que las conectan con modelos muy anteriores en el tiempo. Interpretadas mayoritariamente como representaciones femeninas, sean estas consideradas de naturaleza humana o divina, no existe sin embargo acuerdo total siquiera en este aspecto (Harrison, 2004). No obstante creo que existen razones de peso para una atribución de género a estas estelas, basada tanto en la frecuencia con que tal dimorfismo sexual está presente en muchos de los conjuntos de estelas en muy diferentes regiones de la Edad del Bronce europea (Arnal, 1976; D’Anna, 1977), cuanto en el paralelismo entre los atributos representados, considerados en su conjunto - armas frente a adornos - con el contenido y diversidad de contextos de los depósitos y conjuntos coetáneos de buena parte de la Europa occidental a finales de la Edad del Bronce, en el que las armas de bronce parecen denotar un claro elemento social y de prestigio masculino, y los llamados tesoros de joyas realizadas en oro y sus paralelos en bronce, su contrapartida en el ámbito femenino (Bradley, 1990: 97 y ss.; Ruiz-Gálvez, 1988, 1992, 1995; Galán, 2009: 25-29). Esta dualidad de género creo que explica un tipo muy restringido de estelas en el que estos dos patrones de representación, el guerrero y la figura diademada, comparten protagonismo. Solo tenemos documentados dos casos, las estelas de El Viso III (Bendala et al. 1979-80: 383-385) y de Almadén de la Plata II (García et al., 2006). En el primer caso un personaje diademado aparece rodeado por otras dos figuras de guerrero, con la clásica representación de la espada al cinto del área del valle del Zújar (Estampa 5). En el segundo solo aparecen dos personajes, uno diademado y otro tocado con casco de cuernos y con espada y escudo, compartiendo idéntico rango de representación (Estampa 3,9). La importancia de estas estelas, a pesar de su singularidad, me parece digna de ser resaltada. Aunque uno de los casos ha sido interpretado por su hallador como la posible
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representación de una diarquía divina (García, e.p.), mi planteamiento es bien diferente. Las imágenes podrían corresponder más bien a escenas que reflejarían vínculos que hoy definiríamos como matrimoniales entre personajes de alto rango social, importantes probablemente en términos de alianzas políticas entre grupos vecinos, como garantía de pactos que permitiesen el desarrollo de relaciones económicas y comerciales, e incluso personales, evitando así conflictos. Esta interpretación refleja la importancia de los intercambios personales en las sociedades de la Edad del Bronce, que probablemente tuvo su continuación a lo largo de la Edad del Hierro (Martín, 1998), y da un contexto lógico así mismo a las representaciones diademadas individuales, cuyo origen puede rastrearse más allá del de las estelas de guerrero. Es por ello que en el caso de El Viso III propuse hace tiempo que nos hallábamos ante la representación de una ceremonia de intercambio, como sugiere la propia composición de la estela (Galán, 1993: 41-42), paralela estructural e iconográficamente a otras representaciones de intercambio en la historia del arte, como en la imagen de la serie de Rubens dedicada a María de Medici del desembarco de la reina en Francia (Estampa 5). El paralelo no es solo formal, pues refleja el patrón de los intercambios de mujeres de sangre real a lo largo de la Edad Media y Moderna en Europa, como los producidos entre las casas reinantes en España y Portugal o de España y Francia a lo largo de los siglos XVII y XVIII, realizados sobre la frontera, en “tierra de nadie”, sobre un río o una isla fluvial. Esta interpretación se corresponde lógicamente con la propuesta de localización preferente de las estelas en lugares significativos del territorio, como pueden ser accidentes geográficos (vados, puertos de montaña) o posibles zonas de frontera (Galán, 1993: 36-41 y 2008). Finalmente hemos de señalar en este apartado de representaciones atípicas los escasos pero significativos ejemplos de grabados rupestres emparentados con las estelas. Desde hace ya algunos años se conocía el ejemplo de las armas y escudo con escotadura representados en las rocas 29 y 53 de Cachão do Algarve (Varela, 1989: 74; Galán, 1993: 110), actualmente sumergidos bajo las aguas del pantano de Fratel. A ellos se han sumado recientemente varias figuraciones más localizadas en la prospección sistemática de un área del valle de La Serena en la provincia de Badajoz (Domínguez y Aldecoa, 2007). En concreto los grabados de escudos con escotadura y armas en la roca nº 1 de La Serrezuela de Campanario y la roca 21 de Arroyo Tamujoso, en el mismo término municipal (id: 319-320 y 384-389, fig. 667 y lám. LXI) y, lo que resulta más sorprendente, la representación de una auténtica “estela” en la roca 8 del ya citado enclave de Arroyo Tamujoso (id., 349-354, fig. 736 y lám. LI) (Estampa 6). Esta última reproduce los patrones de las estelas de su entorno, con un antropomorfo muy esquemático que porta espada al cinto, y a cuyo alrededor se han representado la lanza, el escudo y un espejo. Es cierto que este tipo de manifestaciones son susceptibles de ser vistas como copias de cronología posterior de las estelas que durante mucho tiempo debieron ser visibles en los campos del Suroeste, pero el contexto en el que varias rocas representan elementos clásicos del repertorio de las estelas, en algunos casos realizados con notable detalle, aboga por una contemporaneidad entre ambos fenómenos.
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Como planteábamos al comienzo, las estelas suponen un modelo de traslación voluntaria de lo que fueron en origen grabados rupestres (Bueno, 1990), y sin duda se trató de un proceso de larga duración. En cualquier caso me cuesta aplicar la explicación tradicional a este tipo de representaciones rupestres, difícilmente valorables con el sentido funerario inmediato de marcadores de tumbas, lo que naturalmente no excluye otros valores conmemorativos. La importancia de todas estas estelas, sean duales, multicéntricas, diademadas o rupestres, radica en la ruptura del modelo tradicional de estela de guerrero asociado a – o suplido por – sus armas y bienes de prestigio, genéricamente asumidos como representaciones de su ajuar funerario. Estas nuevas manifestaciones no solo enriquecen el repertorio de las estelas, sino que también implican otras posibilidades de interpretación, que pueden vincular las estelas a diversos ritos de paso, no exclusiva ni necesariamente relacionados con el ámbito funerario. Sin embargo, también es preciso ser prudente y no pretender dar una explicación al conjunto de las estelas del Suroeste a partir únicamente de sus individuos minoritarios, y fundamentalmente por ello “atípicos”, pero tampoco marginarlos a la hora de comprender el fenómeno a nivel global. El conjunto de las representaciones “atípicas”, que responden a los patrones expuestos anteriormente, supera el 10% del total de las estelas conocidas actualmente. Si excluimos de este total las estelas demasiado fragmentarias para obtener una lectura cabal de su contenido original, el porcentaje casi se duplica, y aún quedarían por tener en cuenta otros modelos de representación atípica, como por ejemplo los de los monumentos de São Martinho (Proença, 1905; Vilaça et al., 2004). No obstante hay que reconocer que el modelo mayoritario, es decir la representación del guerrero individualizado, representa la esencia de un sistema de valores, sea éste compartido o impuesto por una minoría, presente en las sociedades del Bronce Final del Occidente de la Península Ibérica y aun de buena parte de la Europa del mismo período. Las manifestaciones que divergen del patrón general nos permiten avanzar matices que están más allá de una concepción de las estelas limitada a la representación sustitutiva de las esquivas prácticas funerarias de la época. En ellas late la vida de una sociedad por lo demás prácticamente anicónica. Incluso sin que se acepte como válida la interpretación de los motivos grabados en el monumento de El Viso III como una ceremonia de intercambio, como aquí hemos propuesto, lo cierto es que parece claro que nos encontramos ante una escena, y al igual que en el caso de Ategua con un sentido narrativo, aunque en este caso difícil de encajar en los cánones de un ritual funerario. Del mismo modo otras representaciones duales o múltiples, sin llegar a tal nivel escénico, pudieron tener significados en otros momentos vitales tan importantes como el de la muerte, y precisar su recreación en piedra como testimonio perenne del acontecimiento. Y esta plasmación debía ser pública y visible, en el marco de una lógica de apropiación del territorio que no es ya la nuestra, pero que puede interpretarse correctamente con la ayuda de los restantes elementos del registro arqueológico en el que las estelas se integran.
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Estelas en el tiempo y en el espacio El registro arqueológico del Bronce Final en el Suroeste de la Península Ibérica está marcado por la pobreza relativa de nuestros conocimientos sobre el patrón de asentamiento en buena parte del territorio, por la discontinuidad de las manifestaciones funerarias y por la relativa abundancia de elementos metálicos, tanto en bronce como en oro, habitualmente carentes de un contexto arqueológico convencional. En realidad lo mismo puede decirse del Noroeste peninsular y de buena parte de la fachada atlántica europea (Ruiz-Gálvez, 1998: 192 y ss.). Todos estos rasgos son matizables en función de cada comarca o región que se quiera considerar, pero claramente nos encontramos ante elementos definitorios de este período. Nuestro conocimiento del poblamiento y el mundo funerario se ha ido incrementando paulatinamente en los últimos años, no obstante lo cual es difícil plantear un escenario general (Murillo, 1994; Vilaça, 1995; Gómez, 1997; Martín, 1998; Pavón, 1998). En buena medida las excavaciones siguen siendo escasas y todavía una parte de los puntos que podemos colocar sobre un mapa son hallazgos en prospección o, lo que es más problemático, lugares marcados de antiguo por la aparición de materiales metálicos característicos de este período y donde se ha dado por supuesta la existencia de población coetánea. Incluso si todos ellos son dados por buenos, aún resultan numéricamente inferiores a los que podemos señalar en los mismos territorios, salvo contadas excepciones, para el Calcolítico y naturalmente para la Edad del Hierro. Por lo que respecta a los datos funerarios su incremento ha sido aún más lento y el panorama general es muy irregular, aunque exista un número limitado de enterramientos que se puedan adscribir al Bronce Final. Sin embargo, esta pobreza relativa no parece implicar hiatus poblacionales, sino manifestar una clara tendencia a la irregularidad en la ocupación de sitios de habitación, que puedieron ser utilizados reiteradamente, pero no necesariamente durante largos períodos, y por ello la tendencia general es a contar con estratigrafías poco desarrolladas, al menos en comparación con otros períodos. Esta irregularidad no implica necesariamente una falta de organización interna de la sociedad, ni la inexistencia de poderes establecidos con firmeza. En muchos de estos sitios las excavaciones sistemáticas proporcionan frecuentes hallazgos de claras importaciones como cerámicas, ámbar, marfil o hierro en contextos precoloniales, e incluso ideas transmitidas desde el otro extremo del Mediterráneo, como son los sistemas ponderales (Beck et al. 2002; Vilaça, 2003, 2006; González de Canales et al. 2004). De la misma forma en prácticamente todos ellos se obtienen indicios de la práctica de actividades metalúrgicas, en general a pequeña escala. Se trata, en suma, de otra concepción del espacio, propia de sociedades con gran peso relativo de la ganadería en su economía, pero no por ello nómadas ni incapaces de ejercer el control eficiente de un territorio. Sin embargo, éste no se define conceptualmente como un espacio cerrado, con fronteras nítidamente delineadas al modo de las sociedades campesinas, sino que por el contrario se estructura desde el centro, salpicado de accidentes geográficos que actúan como marcas en el paisaje, y cuyos límites están
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señalados por la existencia de grupos vecinos (Ingold, 1986; Casimir y Rao, 1992). Es en este marco en el que las manifestaciones de grabado comunes en el área atlántica europea, como los petroglifos (Bradley, 1997), pero también las estelas, adquieren sentido y en el que la existencia de grabados rupestres paralelos a las estelas cobra significado. En este concepto del espacio, sociedades como las del Bronce Final generan un escenario simbólico propio, en el que ya no serán las tumbas como en el mundo megalítico las que harán patente su permanencia en el territorio, sino las estelas, tanto las que transmitan mensajes funerarios o heroizadores como las que puedan plantear otras lecturas. Pero además este paisaje se puebla de otros elementos menos visibles para nosotros, pero sin duda comprensibles en su contexto, como es el fenómeno de los depósitos metalúrgicos de diversa naturaleza que en este momento presentan un crecimiento exponencial respecto a las etapas precedentes. Los materiales metálicos, tanto los realizados en bronce como los producidos con oro, constituyen el elemento esencial de definición de los que se ha dado en llamar Bronce Final Atlántico, en el que se integra el Suroeste peninsular, si bien como una provincia manifiestamente diferente a otras como el propio Noroeste peninsular o las tierras costeras de la Europa Occidental (Galán, 2004). Esta divergencia se manifiesta en la preponderancia de materiales de armamento y de prestigio sobre los de carácter aparentemente funcional, como son las hachas. Esta circunstancia favorece la visibilidad de un patrón dual de comportamiento entre el bronce y el oro. El del bronce está constituido ante todo por espadas y otras armas, cuyo lugar de deposición prioritario son los lechos fluviales y marinos, con una frecuente asociación a zonas de vado y desembocaduras, como en el caso del gran depósito de la Ría de Huelva (Ruiz-Gálvez, 1995). El del oro, por su parte, está constituido fundamentalmente por adornos de cuello y brazaletes, a menudo formando tesoros de varias piezas, y su contexto espacial habitual son ocultaciones en tierra, en algunas ocasiones asociadas a vados fluviales (Sagrajas) o a puertos de montaña (Berzocana). Como antes he planteado, estos materiales metálicos ofrecen un contexto paralelo al de las estelas de guerrero y diademadas, mostrando similares diferencias en cuanto a la naturaleza de los objetos, armas frente a adornos, y contextos espaciales que pueden considerarse indudablemente significativos (Galán, 2009: 25-29). Finalmente me gustaría hacer una reflexión en torno al marco temporal de las estelas del Suroeste. En los últimos años las estelas han ido envejeciendo su datación y se ha hecho patente que buena parte del fenómeno se desarrolla durante todo el Bronce Final, si bien la mayor parte de los autores plantea su continuidad en los comienzos de la Edad del Hierro. Esta continuidad estaba basada en un principio en las cronologías atribuidas a los diversos elementos de prestigio de aire mediterráneo grabados en muchos de los monumentos, como peines, espejos, carros o liras, para los que se aducían paralelos vinculados a la presencia fenicia en la Península (Blázquez, 1986). Actualmente sin embargo, muchos de esos objetos se interpretan en el marco de las navegaciones precoloniales (Celestino, 2001), no obstante lo cual se mantienen cronologías bajas para el abandono de las estelas.
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Los períodos cronológicos en los que dividimos el pasado en Arqueología son indudablemente convenciones que el avance de la investigación permite desbordar con frecuencia. En el caso que nos ocupa la transición entre la Edad del Bronce y la Edad del Hierro no es un fenómeno ni corto en el tiempo ni uniforme en el espacio, y por tanto la perduración de las estelas resulta indudablemente posible. Dicho esto, hay que plantear sin embargo la utilidad de las estelas en el marco cultural de la Edad del Hierro y con qué datos reales contamos para sostener esa continuidad, y en mi opinión éstos son escasos y controvertidos. En primer lugar tenemos una serie de reutilizaciones de monumentos, bien en construcciones posteriores, como en el caso de Cancho Roano o Las Herencias II (Celestino, 2001: 387; Moreno, 1995), bien en necrópolis como la de Setefilla (Almagro, 1974: 16-21), o bien por la sobreimposición de textos escritos en la escritura del Suroeste, caso de las estelas de Majada Honda y de Capote (Dominguez et al., 2005: 52-54; Berrocal, 1987). Pero estos contextos de reutilización sólo nos hablan del uso posterior dado al soporte pétreo que fue originalmente concebido como estela, en alguno de los ejemplos como el de Majada Honda amortizando claramente el contenido figurativo de la misma, ya que para leer el texto escrito es necesario invertir la posición de los grabados. Además estos casos resultan difíciles de datar en relación con el período de uso real de la estela, y si bien resultan aceptables por su cercanía temporal, esto no parece admisible en reutilizaciones análogas como las de las estelas de Ibahernando o de Chillón (Almagro, 1966: 92-94; Fernández y Zarzalejos, 1995) con textos funerarios latinos, o la recientemente publicada de El Carpio (Martínez, 2008) embutida en una construcción medieval. En cualquier caso el valor significativo que se quiera dar a estas reutilizaciones será siempre relativo. En segundo lugar resulta sorprendente que en las estelas perdurase durante la Edad del Hierro la plasmación no sólo de valores, sino también de objetos que dejaron de ser significativos al finalizar la Edad del Bronce (Galán 2000: 1792-1793), y que no se representasen los nuevos objetos de prestigio que impuso la presencia fenicia y caracterizan el registro arqueológico del período orientalizante, en particular sus características vajillas metálicas y los nuevos tipos de fíbulas (Jiménez, 2002). Todo ello, y sobre todo su pérdida de valor simbólico en un nuevo modelo de organización del espacio, induce a pensar que la perduración de estos monumentos en la Edad del Hierro debió ser muy escasa. Su tiempo había pasado. En conclusión, nuestro conocimiento general de las estelas del Suroeste se ha incrementado notablemente en los últimos tiempos, no sólo por la multiplicación de nuevos hallazgos, algunos poco convencionales tanto en su iconografía como en su ubicación en el espacio, sino también porque la discusión a diversos niveles sobre las propias estelas como fenómeno ha renacido tras un largo período de estancamiento. Los últimos hallazgos son a la vez un desafío y un acicate para promover el debate de nuevas ideas, planteando preguntas diferentes, con el marco de referencia de un nuevo concepto de contexto arqueológico en el que situar este tipo de manifestaciones.
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Estampa 1 - Estela de Las Herencias I, ejemplo clásico de estela de guerrero con individuo rodeado de armamento (escudo, lanza, casco), fíbula y carro. (Foto J. Latova, cortesía de Juan Pereira).
Estampa 2 - 1. Representaciones de carros en las estelas del Suroeste. 2. Estela de Solana de Cabañas (Cáceres), donde se aprecia la ubicación disfuncional de las ruedas del carro. (1 según Celestino, 2001; 2 según Almagro, 1966).
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Estampa 3 - Estelas duales y múlticéntricas. 1. Alamillo (Ciudad Real), 2. Río Guadalmez (Capilla, Badajoz o El Viso, Córdoba), 3. La Pimienta (Capilla, Badajoz), 4. Torres Alocaz (Sevilla), 5. Valdetorres I (Badajoz), 6. Aldea del Rey III (Ciudad Real), 7. Majada Honda (Cabeza del Buey, Badajoz) y 8. Almadén de la Plata II (Sevilla). (1-2 y 4-6 según Celestino, 2001; 3 y 7 según Domínguez et al., 2005; 8 según García et al., 2006).
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Estampa 4 - Estelas diademadas. 1. Capilla I (Badajoz), 2. Torrejón el Rubio II (Cáceres), 3. Belalcázar (Córdoba). (según Celestino, 2001).
Estampa 5 - 1. Estela de El Viso III (Córdoba), con indicación de las líneas maestras de la composición del conjunto. 2. P. P. Rubens (1624), El desembarco de María de Medicis en Marsella (Museo del Louvre).
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Estampa 6 - Grabados rupestres relacionados con las estelas del Suroeste. 1. Cachão do Algarve (Portugal). 2 y 3. Arroyo Tamujoso (Campanario, Badajoz). (1 según Varela Gomes, 1989; 2 y 3 según Domínguez y Aldecoa, 2007).
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As estelas de Pedra da Atalaia (Celorico da Beira, Guarda) no seu contexto geo-arqueológico Raquel Vilaça1, André Tomás Santos2, Sofia Melo Gomes3
Resumo Estudam-se duas estelas casualmente encontradas no decurso do “Acompanhamento Ambiental e Arqueológico da Obra do Parque Eólico de Videmonte, na serra do Ralo, relevo que se desenvolve a sul de Celorico da Beira, nos contrafortes ocidentais da Estrela. Embora nenhuma delas se encontrasse in situ, seriam certamente oriundas das imediações, motivo pelo qual se sublinha neste contributo o contexto geográfico e ambiental, nomeadamente a grande importância do espectro visual de que dispõe o lugar. Valoriza-se também o seu achado próximo, não obstante a profunda e radical diferença entre ambas, quer nos suportes, quer nas grafias: uma estela de guerreiro a par de uma outra com motivos geométricos. Faz-se o respectivo estudo morfológico, técnico, iconográfico e simbólico, discutindo-se a sua eventual contemporaneidade no âmbito dos parâmetros cronológicos de finais da Idade do Bronze. Finalmente, explora-se a articulação destes achados com a paisagem circundante, valorizando-se quer o quadro de povoamento arqueológico regional – destacando-se pela sua proximidade o sítio de Monte Verão / Pedra Aguda –, quer os acidentes topográficos mais impressivos, como a escarpa da Penha de Prados. Atende-se igualmente o seu “carácter transgressor” relativamente às principais manchas de concentração de estelas daquele primeiro tipo. Palavras-chave: Bronze Final, Beira Interior, Estelas, Contexto, Povoado. Abstract We study two stelae incidentally found during the “Environmental and Archaeological Field Monitoring of Videmonte’s Wind Farm”, located at “serra do Ralo”, a relief that develops in the south of “Celorico da Beira”, in the western foothills of the “serra da Estrela”. Although none of the stelae was found in situ, they had certainly come from the nearby areas, reason why this contribution underlines the environmental and geographical finding context, namely the big importance of the visual spectrum of the place. The proximity of both finds is valued, despite the profound and radical difference between them, either in the support material, either in the graphic motifs: one is a stele of a warrior and the other is geometric. The morphological, technical iconographic and symbolic study is done, alongside with the discussion of 1 Instituto de Arqueologia. Departamento de História, Arqueologia e Artes da Universidade de Coimbra. CEAUCP (FCT). E-mail – [emailprotected]. 2 Parque Arqueológico do Vale do Côa, IGESPAR I.P. CEAUCP (FCT). E-mail – [emailprotected]. 3 Empresa Nemus, Gestão e Requalificação Ambiental, Lda. [emailprotected]
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Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história their possible contemporaneousness within the chronological parameters of the Late Bronze Age. Finally, these finds are related with the surrounding landscape with a special focus both on archaeological settlement pattern of that region – such as the site of Monte Verão / Pedra Aguda – and on the most impressive topographic features such as the scarp of Penha dos Prados. We also notice the “transgression status” of the first type of stelae in relation to the main concentration areas. Key words: Late Bronze Age, Beira Interior, Stelae, Context, Settlement.
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Achado e salvaguarda das estelas As duas estelas de Pedra da Atalaia foram identificadas no decurso do “Acompanhamento Ambiental e Arqueológico da Obra do Parque Eólico de Videmonte (Salgueirais, Celorico da Beira)”, da responsabilidade da Empresa Nemus, Lda. e com coordenação de um dos autores (S.M.G.), trabalhos que decorreram entre 5 de Setembro 2004 e 14 de Fevereiro 2005. Em Agosto de 2005, a Gamesa Energia Portugal S.A. tinha adjudicado o respectivo acompanhamento àquela empresa, de acordo com a directriz da Declaração de Impacte Ambiental (DIA) relativa ao procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA). Apesar da não identificação de património arqueológico em Estudo de Impacte Ambiental (EIA), a imposição do acompanhamento arqueológico decorreu como medida de precaução para a salvaguarda de todo e qualquer património que pudesse surgir ao longo dos trabalhos. O objectivo principal em fase de construção foi o acompanhamento arqueológico permanente e integral da preparação e instalação de estaleiros e abertura de caminhos, bem como de todas as operações que implicassem movimentações de terras, nomeadamente desmatações, escavações, terraplanagens, depósitos. Como complemento ao acompanhamento, considerou-se fundamental a realização de novas prospecções na área do Parque Eólico devido às alterações de visibilidade do solo, resultantes da limpeza e decapagem do terreno. Deste modo, os elementos patrimoniais identificados durante o acompanhamento provêem de duas acções distintas: do acompanhamento arqueológico da área de incidência directa, ou seja, do espaço abrangido pelas acções desenvolvidas pela empreitada, e das prospecções da área de incidência indirecta, que corresponde à área envolvente à zona de obra. Como resultado das prospecções realizadas e da avaliação da própria paisagem cultural, identificou-se um conjunto patrimonial composto por elementos etnográficos e arqueológicos. O património etnográfico reconhecido corresponde, genericamente, a uma paisagem onde o tipo de povoamento, os caminhos rurais e o parcelário assumem um papel preponderante no padrão rural local, criando uma paisagem cultural ímpar; mais especificamente, registaram-se muros de extrema de construção tradicional, gravuras nos afloramentos como marcos territoriais, marcas de extracção (pedreiras) isoladas e mós. Por sua vez, os testemunhos arqueológicos registados ao longo de todo o acompanhamento foram bastante escassos, traduzindo-se sobretudo em fragmentos cerâmicos comuns e faianças atribuíveis ao período moderno e contemporâneo e na identificação de um possível povoado pré-histórico, para além das estelas, que despoletaram o presente texto. Estas foram os únicos elementos patrimoniais sujeitos a medidas de salvaguarda. Tal decisão decorreu do facto de as peças apresentarem fissuras longitudinais, o
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que implicava urgentes medidas de consolidação, acrescido do facto de terem suscitado imediato interesse público, que as tornava vulneráveis a eventual furto. Perante esta situação, considerou-se prioritária a sua remoção para um sítio apropriado, tendo o IGESPAR determinado como local de depósito provisório o Parque Arqueológico do Vale do Côa (PAVC). Após uma primeira reunião com os técnicos do PAVC para apreciação das peças e avaliação das condições necessárias ao transporte, ficou definido que seriam transportadas na situação em que se encontravam, já que o local onde estavam depositadas (estaleiro) não oferecia as condições necessárias para proceder à sua consolidação. O estudo das estelas4 foi efectuado depois, ainda nas instalações do PAVC, pelos dois primeiros signatários, que também desenharam a peça 1; a 2 foi desenhada por Fernando Barbosa do então CNART. Posteriormente, as peças foram levadas para a Câmara Municipal de Celorico da Beira, que as tem à sua guarda, tendo também integrado a exposição temporária organizada no âmbito das Jornadas de que estas actas dão conta. Recente publicação patrocinada por aquele Município inclui fotografias e breve comentário às duas estelas enquadradas numa perspectiva de arqueologia do povoamento regional (Vilaça, 2009a: 22-24). Localização e contexto geográfico O local de achado das estelas (Estampa 1) encontra-se cartografado como Pedra da Atalaia, a cerca de 1016 m de altitude (“Carta Militar de Portugal”, escala 1: 25.000, folha 191, 5.ª edição, 1999). Administrativamente, integra-se na freguesia de Vide Entre Vinhas, concelho de Celorico da Beira, distrito da Guarda, província da Beira Alta. Durante o acompanhamento da abertura do acesso ao AerogeradorA9 e ao AerogeradorA10, a cerca de 3,5 km a sul do potencial habitat do Vilhagre e junto ao vértice geodésico da Pedra da Atalaia, recolheu-se da unidade de topo um fragmento de granito decorado, aqui designado por Pedra da Atalaia 2, com as seguintes coordenadas: 40º 34’ 29,91” N; 07º 24’ 27,81” O. Após a sua identificação foi dada particular atenção a todas as pedras da envolvente, na tentativa de se recuperar a parte em falta dessa estela. Na sequência desta acção, foi identificada uma outra estela a Oeste do AerogeradorA10, e a cerca de 170 m daquela, numa área com pinhal novo, que designamos como Pedra da Atalaia 1 e cujas coordenadas são: 40º 34’ 32,52” N; 07º 24’ 21,54” O. Neste caso, a estela, quase completa, estava tombada à superfície com a face gravada virada para baixo. 4 Concluída, com êxito, a primeira fase de salvaguarda das peças, da responsabilidade de S.M.G., tornava-se necessário proceder ao seu estudo e divulgação, tendo sido convidados para o efeito os demais autores do presente texto. Durante a fase do seu estudo, as duas estelas foram apresentadas por Marta Guardamino em reunião científica (Estelas decoradas del Bronce Final en la Península Ibérica: datos para su articulación cronológica, Sidereum Ana II. El río Guadiana en el Bronce Final, Mérida-Badajoz, 28-30 de Maio de 2008, no prelo).
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No espaço envolvente, que não ultrapassava um raio de cerca de 30 m, identificaram-se outros dois fragmentos de granito, facetados e com uma das faces polidas, possuindo secções rectangular e subcircular. Estes fragmentos, apesar de serem relativamente pequenos (o maior com 179 mm x 148 mm), foram inicialmente interpretados como fragmentos de estelas não decoradas. Em prospecções entretanto desenvolvidas pelos dois primeiros signatários, respectivamente em Setembro de 2008 e Fevereiro de 2009, e acompanhados por António Carlos Marques, arqueólogo da Câmara Municipal, verificou-se que pequenas pedras com idênticas características e naturalmente facetadas eram abundantes, o que nos suscitou algumas dúvidas quanto à classificação daquelas primeiras como fragmentos de estelas. O nome de Pedra Atalaia designa o ponto culminante da serra do Ralo (Estampas 2 e 3), relevo que se desenvolve no sentido S.SO-N.NE a sul de Celorico da Beira. Corresponde a um dos degraus dianteiros da Serra da Estrela de que fala Orlando Ribeiro ao analisar o contacto entre esta cadeia montanhosa e a superfície da Beira Alta (Ribeiro, 1954: 558). De acordo com este autor, só a tectónica explica a existência destes degraus, não sendo no entanto possível aferir se se tratam de flexuras ou de vestígios de um abrupto mais antigo e degradado, hipótese esta que levaria à constatação da existência de duas fases no levantamento da serra (idem, ibidem, 558). Por outro lado, é de reter o facto deste contacto se dar de forma praticamente coincidente com uma das linhas de fractura (a oriental) que na zona são originadas pela falha de Unhais da Serra-Bragança (Daveau, 1969: 49). A serra do Ralo encontra-se, portanto, nos limites da Estrela — uma das unidades orográficas que integram a Cordilheira Central Ibérica em Portugal —, sendo limitada a SE por uma complexa rede de nascentes que alimentam a ribeira da Cabeça Alta, uma das linhas de água subsidiária do Mondego. O limite NW é abrupto, descendo a sua vertente de forma acentuada até à plataforma do Mondego. Por sua vez, o limite NE, correspondente à ponta do esporão, vai-se desenvolvendo de forma mais suave até à Bacia de Celorico, um dos abatimentos marginais que bordejam a Cordilheira Central e por onde o Mondego descreve acentuada curva entre a sua saída da montanha e a entrada na superfície beirã (Ribeiro, 1954: 559). Quanto à sua natureza geológica, a serra do Ralo corresponde a um maciço de granito porfiróide de grão fino a médio, essencialmente biotítico, aflorando aqui e ali alguns afloramentos. Destaque-se também a presença, como já referimos, de várias lajes de contornos trapezoidais e subtrapezoidais com diversos tamanhos que facilmente se poderão confundir com fragmentos de estelas não decoradas (em algumas partes da Beira estes elementos pétreos, cuja morfologia é de origem natural, são conhecidos como “pedras bem-feitas”). No terreno é também visível a ocorrência de filões de aplito-pegmatitos (“Carta Geológica de Portugal”, Folha 17-B, escala 1: 50.000)5 relacionados com recursos estaníferos que, nesta região da Beira Alta, cor5 Infelizmente a notícia explicativa desta folha não se encontra publicada.
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respondem a uma das mais expressivas manchas (“Carta Mineira de Portugal”, escala 1: 500.000, 1960). A existência de uma considerável espessura sedimentar permite o actual plantio de pinheiro e centeio, cultura esta que ainda em meados do século XX seria a base agrícola da região a estas altitudes (Ribeiro e Santos, 1951: 61). Também de decisiva importância económica seria o cultivo da batata e do milho, culturas que curiosamente ainda identificámos esporadicamente não muito longe e a cotas pouco mais baixas (por volta dos 800 m, no Monte Verão, de que voltaremos a falar). Mas se nos ativermos apenas à vegetação espontânea encontramo-nos, de acordo com os pressupostos da Fitossociologia (Costa et al., 1998), no Sector Estrelense que, por sua vez, se integra na Província Carpetano-Ibérico-Leonesa, Superprovíncia Mediterrânica Ibero-Atlântica, Sub-região Mediterrânica Ocidental da região Mediterrânica. Dada a elevada antropização da serra, é difícil estabelecer os limites do sector e mesmo identificar a sua vegetação potencial com segurança. Contudo, a presença dos urzais de Junipero nani - Ericetum aragonensis e dos urzais mesofíticos do Genistello tridentae - Ericetum aragonensis s. l. leva a admitir que a vegetação potencial do sector se integra na associação de óptimo supratemperado Holco mollis - Quercetum pyrenaicae. Na verdade, o primeiro dos urzais referidos e, em parte, o segundo “são etapas subseriais daqueles carvalhais de carvalho-negral (Q. pyrenaica)” (Costa et al., 1998: 29). Quanto à criação de gado, o ovino seria o mais representado (Ribeiro e Santos, 1951: 68), não sendo certamente por acaso que nos encontramos numa zona privilegiada de produção do famoso “queijo da serra”. Relativamente ao clima, encontramo-nos, de acordo com Lautensach (1997: 364366), na “Província Montanhosa do Norte de Portugal”, região situada na metade norte do país entre o litoral e o centro da Península, em altitudes superiores a 800 e 1000 m. Segundo este autor, esta província caracteriza-se pela existência de Verões relativamente quentes e Invernos frios e nevosos. As precipitações variam entre os 1000 mm e os 3000 mm, consoante nos encontremos nos vales ou já nos cumes. Os nevoeiros são frequentes, em particular no Verão. Também frequentes são as tempestades. Já a humidade do ar é bastante moderada, mesmo no Verão, quando atinge os cerca de 65%. Assinale-se ainda o desenvolvimento que os recursos estaníferos de aluvião do Mondego assumem nesta região, conforme regista a “Carte Minière du Portugal” (Thadeu, 1965: 27). De grande importância é o espectro visual de que dispõe a serra do Ralo. Este é excepcionalmente amplo de NE a SW. Assim, é perfeitamente possível a observação, num ângulo que vai de N.NE a NE, da platitude da Meseta, apenas interrompida pela serra da Marofa e pelas serras de Urros e Reboredo, localizadas já a norte do Douro. No ângulo definido entre N.NE e NW reconhecem-se a serra da Nave e a superfície fundamental dos planaltos centrais da Beira Alta, rematadas ao fundo pela serra do Montemuro. Do outro lado do Douro, destaca-se ainda o limite meridional do Marão. Entre NW e SW é toda a plataforma do Mondego que se espraia frente aos nossos
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olhos. Dentro deste ângulo, a nossa visão é interrompida somente pelas restantes montanhas ocidentais da Beira que são, para além da já referida serra do Montemuro, o Maciço da Gralheira e a serra do Caramulo (Ferreira, 1978: 8). A distâncias mais curtas, deve-se salientar a visibilidade para a bacia da ribeira da Cabeça Alta (para E e NE) e para o Monte Verão, cujo ponto culminante — Pedra Aguda — terá sido ocupado durante a Idade do Bronze e Idade do Ferro e, com alguma incerteza, também em época romana (Vilaça, 2009a: 19-21). Para S e SE, a vista é ainda mais limitada pela “bela escarpa de Cabeça Alta - Penha de Prados” (Ribeiro, 1954: 558), nela se destacando o imponente afloramento portador deste último topónimo, referência indelével na região (Estampa 3). Metodologia de registo Os decalques das peças foram feitos sobre plástico de cristal transparente pouco espesso, segundo metodologia que temos utilizado (por ex., Santos et al., neste volume). Na fase de redução dos desenhos e tintagem, os limites das faces e as gravuras foram representados a negro; o limite apresenta (à escala 1:2) a espessura de 1,5 pontos; a espessura do desenho das gravuras é coincidente com a das gravuras em si; no caso do espelho a diferença de profundidade entre a terminação proximal da pega e a base foi representada com recurso a linha branca que separa as diferentes realidades. As fissuras e lascamentos naturais foram delimitados a linha ponteada cinzenta (RGB A3A3A3) de 0,5 pontos de espessura (à escala 1:2). Descrição e iconografia das peças 1. Pedra da Atalaia 1 Estela de configuração poligonal com secções longitudinal e transversal sub-rectangulares (Estampas 4 e 5). A base foi facetada de forma a obter uma forma grosso modo triangular e pontiaguda que facilitasse a implantação vertical da estela no solo. O resto da peça apresenta uma morfologia trapezoidal, diminuindo gradualmente a largura e espessura da mesma à medida que nos aproximamos da extremidade distal, sector que se encontra fracturado. As faces que se encontrariam à superfície estão bastante regularizadas e lisas, tratamento que, pelo menos na face historiada, tem origem antrópica. Actualmente a estela apresenta 138 cm de altura máxima, variando a largura entre 60 cm, do sector mais largo da base, e 36,40 cm da extremidade distal actualmente conservada. A espessura é bastante regular, andando em torno dos 21,5/22 cm. A estela foi elaborada a partir de uma laje de granito porfiróide de grão médio, essencialmente biotítico, de cor castanho-amarelada. Embora não tenha sido sujeita a análise, a sua origem é, seguramente, das imediações do achado. Encontra-se fracturada no topo, onde, decerto, existiria a gravura de uma lança. O reportório consiste, de cima para baixo, num escudo, numa espada e num
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espelho6. O primeiro é representado por três círculos concêntricos, apresentando os dois mais exteriores uma escotadura orientada à direita. O diâmetro maior, perpendicular à escotadura, tem 34,7 cm. A abraçadeira é representada por um rectângulo de cantos arredondados com o eixo maior alinhado na direcção das escotaduras. A espada, com o comprimento total de 43,2 cm, apresenta uma lâmina aparentemente pistiliforme, com a largura máxima de 6,18 cm, encimada por punho sub-rectangular, com o comprimento de 6,28 cm, delimitado por dois copos algo inclinados para a lâmina e dois apêndices exteriores no topo. O espelho apresenta o disco de forma subelíptica (8,48x3 cm), com o comprimento total de 14,28 cm. Possui pega simples, com 5,8 cm, rematada por base transversal, particularidade que parece ser inédita nas representações conhecidas. A sua superfície foi regularizada. Tecnicamente, todo o conjunto foi conseguido por picotagem. A modalidade indirecta foi seguramente usada no escudo, a avaliar pelos seus picotados mais profundos, sendo difícil identificar qual a que terá sido usada nos restantes motivos. Os sulcos apresentam negativos de contorno subcircular e profundidades que variam entre 1,5 e 2 mm. 2. Pedra da Atalaia 2 Esta peça apresenta forma subtrapezoidal, encontrando-se fracturada na base (Estampas 6 e 7). As secções transversal e longitudinal são subtrapezoidais com cantos arredondados. De altura mede 31 cm, sendo 37 cm o valor da largura na base; a espessura varia entre 12 cm na base e 6 cm no topo. Na sua elaboração aproveitou-se uma laje de granito de natureza idêntica ao de Pedra da Atalaia 1, não se podendo garantir que exista algum tipo de trabalho de preparação anterior à gravação da composição iconográfica; esse aparente tratamento poderá corresponder, simplesmente, ao que caracteriza as “pedras bem-feitas” a que nos referimos atrás. A face historiada é dominada por uma forma acampanulada de base recta reticulada no interior, com a altura de 15,29 cm e o comprimento de 17,78 cm. Pela organização do mesmo, sabemos que não foi conseguido pela justaposição simples de sulcos verticais e horizontais que iriam de uma ponta à outra do limite do motivo. Na verdade, a terceira e quarta colunas (e respectivos travessões interiores) parecem ter sido as primeiros a serem gravadas. À esquerda foram gravadas a primeira e segunda colunas. À direita gravou-se a parte da composição correspondente à quinta e sexta colunas até à 6 A nossa interpretação, com base na observação directa da peça e respectivo levantamento, difere da que foi proposta por Marta Guadarmino (cfr. nota 4), nomeadamente na representação das figuras da espada (zona do punho) e do espelho, apresentado com lâmina bífida, à semelhança das navalhas de barbear. Na tese de doutoramento desta nossa colega, entretanto concluída e que, gentilmente, nos fez chegar já este texto estava em fase de conclusão, é mantida essa leitura (Las Estelas Decoradas de La Prehistoria de La Península Ibérica, Universidad Complutense de Madrid, 2009, p. 266; 332).
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quinta linha a contar da base. O sulco que limita esta linha foi continuado até ao limite direito, sendo em seguida gravados os segmentos da direita e os restantes do topo. Na segunda figura, junto à base daquela, foram gravados dois arcos de círculo concêntricos. O superior é interrompido à esquerda pela fractura da base, terminando à direita antes de atingir aquela. Já ambas as extremidades do inferior são interrompidas bela fractura da base. Tecnicamente, os motivos foram conseguidos por picotagem, seguramente de forma indirecta, pelo menos no caso do motivo reticulado. Os sulcos apresentam profundidades que variam entre 1,5 e 2 mm. Análise comparativa, cronologia(s), contexto geo-arqueológico e valorização Como vimos, ambas as estelas encontram-se fragmentadas, o que diminui qualquer exercício comparativo e exaustivo que se pretenda fazer. Completa, a de Pedra da Atalaia 1 deveria possuir na extremidade distal, acima do escudo, e de acordo com os cânones iconográficos deste tipo de estelas, a representação de uma lança. Tudo indica que se trata de uma estela inserível no Subtipo II b (Almagro, 1966: 198; Gomes e Monteiro, 1976-1977: 311) com a clássica composição cénica de base escudo-espada-lança e outros elementos, neste caso, o espelho. Regionalmente, idêntica composição era conhecida nos exemplares de San Martín de Trevejo (Cáceres) (García de Figuerola, 1982) e de Três Arroyos (Albuquerque, Badajoz) (Almagro, 1966: 61). A estes juntam-se agora mais três: estelas de Baraçal 2 (Sabugal) (Santos et al., neste volume), Puerto de Honduras (Cáceres) (Sanabria Marcos, neste volume) e Robleda (Salamanca) (Martín Benito, 2009). No total, perfazem seis casos com estreitas afinidades iconográficas, para além da característica particular de se concentrarem numa região relativamente bem delimitada, i.e., nos e na órbita dos contrafortes da Cordilheira Central. Que significado terá esta concentração de estelas onde, às três armas clássicas, só foi permitido juntar a representação de um objecto, o espelho?7 Deixemos as armas, tema recorrentemente comentado, seja no que respeita às presumíveis origens, seja quanto à tipologia e cronologia, neste caso bem patente em trabalhos recentes (Harrison, 2004: 124-144; Brandherm, 2007: 134-155), e centremo-nos antes na representação do espelho. De simbologia ambígua, por natureza, porque é ele próprio e, simultaneamente, o que nele se reflecte, o espelho é, assim, no seu âmago, um objecto amorfo, despido, cujos conteúdos não só são mutáveis, como lhe são impostos de fora. Por isso, os espelhos são mágicos (Vázquez Hoys, 1984: 23; Celestino Pérez, 2001: 164), relacionando-se quer com a vida (e a estética), quer com a morte, ou seja, com o que é e está, e com o que ainda não é nem está, mas será. Nesta linha, defendeu-se também que os espelhos, tal como a água e os rios, seriam 7 Como é sabido, nas Beiras, o espelho também está figurado na estela II de S. Martinho (Castelo Branco), muito distinta no suporte e composição iconográfica (Gomes e Monteiro, 1976-1977: 314-315).
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“portas”de acesso ao outro mundo, o que lhes conferia valor funerário (Warmenbol, 2007: 388). Mas a tese, perfilhada por este mesmo autor, de que as figurações nas estelas interpretadas como espelhos são antes navalhas de barbear (Warmenbol, 2007: 389), já não nos parece ter sido cabalmente demonstrada, nem incontestável é a argumentação que a sustenta, conforme foi recentemente defendido (Vilaça, 2009b: 506-507). Continuando a admitir como mais correcta a interpretação clássica8, debrucemo-nos ainda na posição do espelho de Pedra da Atalaia 1. Alguns autores têm dado atenção ao posicionamento relacional dos vários elementos iconográficos entre si e com o respectivo suporte, assumindo este como a própria corporização do guerreiro. Efectivamente, nesta categoria de estelas, pautadas pela ausência da figura humana, pode visualizar-se a projecção do corpo humano, tridimensional, numa superfície plana através da distribuição dos diversos elementos representados. Assim, numa “correcta” abordagem em termos anatómicos, nunca o espelho de Pedra da Atalaia 1, aliás como o de Baraçal 2, deveriam ocupar o lugar em que se encontram, i.e. no terço inferior, em zona equivalente à dos membros inferiores do personagem que é evocado. Idêntico posicionamento encontra-se em S. Martinho II, aqui numa explícita proximidade do espelho às pernas da figura humana. Pelo contrário, o posicionamento “correcto”, i.e. ao alcance da mão, seria no terço superior e/ou mesial, como se verifica em Três Arroyos, Robleda, Puerto de Honduras e San Martín de Trevejo. A localização do espelho e a sua potencial correlação com as partes do corpo humano pouco ajudam, assim, na resolução da magna questão do carácter funerário, ou não funerário, destas estelas, problema que não se identifica porém, em nosso entender, com a função sepulcral, ou não sepulcral das mesmas. Neste caso, pressupõe-se a existência (ou não) de uma sepultura, independentemente do tipo construtivo e do ritual; as estelas teriam, antes de tudo, uma função sinalizadora. Naquele, evoca-se (ou pode evocar-se) alguém que já morreu, cuja sepultura até se pode encontrar em um outro lugar, ou em lugar algum; as estelas seriam aqui meros cenotáfios, evocativos e comemorativos. Em Pedra da Atalaia 1, e nas demais estelas antes mencionadas, o que nos parece notório é, desde logo, a adição de um elemento marginal — o espelho —, na função e significado, à panóplia guerreira presente. A variabilidade da sua localização contrasta, de alguma forma, com os cânones do conjunto lança/escudo/espada, bastante mais rígidos na sua inter-relação, comportando-se aquele como elemento algo intruso na composição cénica. Depois, deve ser sublinhado que se trata de um elemento cujos protótipos são de origem mediterrânea, devendo, por isso, articular-se com as redes de contacto atlântico-mediterrâneas desenvolvidas a partir de finais do II milénio a.C., nas quais o Centro do território português assumiu papel destaca8 Para outros comentários relativos à presença e significado de espelhos nas estelas da região em análise, vejam-se neste volume, por exemplo, os trabalhos de Santos et al., e de Sanabria Marcos, entre outros.
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do9. Finalmente, tem de ser reconhecido, entre os elementos de inspiração oriental e estritamente associados ao corpo, como pentes10, fíbulas e pinças, o papel cimeiro e recorrente da representação dos espelhos. Quanto à cronologia, Pedra da Atalaia 1 não tem de ser considerada necessariamente tardia, i.e. do séc. VIII a.C., pela presença de um espelho. É que, e não obstante o desconhecimento de referentes reais de espelhos no registo arqueológico do Centro do território português11, nada impediria a sua manipulação efectiva, ou tão-só simbólica, juntamente com alguns dos demais elementos antes mencionados (e outros), os quais provêm de contextos bem datados naquela região, podendo recuar à charneira do II-I milénios a.C. Também não valorizamos excessivamente inferências cronológicas com base na tipologia das espadas (veja-se Santos et al., neste volume), não obstante reconhecermos, a este propósito, o notável esforço de Dirk Brandherm (2007: 21-25; 135-155). Em rigor, não cremos que seja possível avançar no sentido de uma cronologia muito fina, nem tal nos parece prioritário. As estelas com as características que temos vindo a comentar conduzem-nos ao grupo das “estelas básicas” de Sebastián Celestino, conotado, preferencialmente, com a Zona I ou Serra de Gata, embora também presentes nas Zonas, II, III e IV, ou seja, Vale do Tejo-Serra de Montánchez, Vales do Guadalquivir-Zújar e Vale do Guadalquivir (Celestino Pérez, 2001: 48-57; 92). Naturalmente que a informação hoje disponível, passados que estão mais de dez anos férteis em novos achados, obriga-nos a refocalizar este quadro distributivo. No que toca o Ocidente peninsular, que aqui nos importa, sublinharíamos duas coisas. Por um lado, a transgressão da tradicional fronteira daquele tipo de estelas, i.e. além da Cordilheira Central, de que Pedra da Atalaia 1 e Robleda são responsáveis, transgressão essa que é, porém, controlada, ou seja, a região matriz, perfeitamente identificada por aquele investigador, é apenas alargada, logo, reforçada. Mas, simultaneamente, parece manifestar-se um fenómeno de dispersão e descontinuidade deste tipo de peças, agora para o NW peninsular, de que o surpreendente achado de Tojais (Cervos, Montalegre), com escudo, lança e zoomorfo, para já isolada e distante, é protagonista (Alves e Reis, neste volume). Em síntese, pensamos que este grupo de novas e velhas estelas que se organiza na órbita da Cordilheira Central — a sul e agora também a norte —, com a clássica trilogia das armas, a que se junta sistematicamente o espelho, configura uma clara e coesa diferenciação geográfica em relação a outras áreas, i.e. de um padrão de representação com sentido territorial na linha proposta por Galán (entre outros, 2000: 9 Sobre esta problemática veja-se, por exemplo, síntese recente onde se discutem os principais contributos e respectiva bibliografia (Vilaça, 2008: 105-159). 10 Não se exclui a possibilidade de ter existido a figuração de um pente ou fíbula na parte que se fragmentou da estela de San Martín de Trevejo (García de Figuerola, 1982: 174-175). 11 Admite-se que alguns dos artefactos designados como “tranchets” possam corresponder a pegas de espelhos, pelas similitudes com alguns exemplares da Sardenha. Sobre o assunto, veja-se o estado da questão em Vilaça, 2008-2009.
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1791). Que sentido é esse? As respostas encontrar-se-ão, quanto a nós, não na arqueologia das estelas, mas na arqueologia do povoamento (estelas, povoados, necrópoles, santuários, depósitos metálicos), que as estrutura e as substantiva socialmente. À relativamente fácil leitura — sabendo nós bem que não há leituras fáceis quando se lida com linguagens iconográficas — da estela de Pedra da Atalaia 1, coloca-se-nos a de Pedra da Atalaia 2, de muito mais difícil adscrição e discernimento, desde logo porque se encontra também incompleta, mas principalmente pela natureza dos motivos representados: puramente geométricos, não sabemos dizer o que representam, aspecto que se reflecte no momento de uma atribuição cronológica e cultural seguras. Assim, o estado fragmentário da peça não nos permite avaliar a totalidade da estrutura figurativa e, consequentemente, não podemos deixar de nos interrogar sobre a intencionalidade dos gravadores quanto à disposição — horizontal ou vertical — da mesma. A avaliar pelo progressivo afunilamento da espessura do suporte, tudo leva a crer que esta seria disposta na vertical. Mas valerá a pena dedicar-lhe alguns comentários, bem como à simbólica presente: uma figura reticulada. Efectivamente, os reticulados na arte rupestre são composições recorrentes ao longo dos tempos, desde determinados signos da arte paleolítica (Sauvet et al., 1977: 546, tab. I) até aos possíveis tabuleiros de jogo de cronologia histórica (Costas Goberna e Hidalgo Cuñarro, 1998), passando pela arte megalítica, por exemplo, do monumento de Antelas (Oliveira de Frades) (Castro, et al., 1957: ests. VI, VII e XI), ou por outras representações dos III-II milénios, quer ao ar livre, caso de Ardegães (Twohig, 1981), quer em gruta, como Cueva Maja (Cabrejas del Pinar, Soria) (Gómez-Barrera, 1992: 56-89), quer ainda em esteios de cistas, de que As Antas (Galiza) é exemplo (Vasquez Varela, 1985-86). Porém, é a partir do Bronze Final que os reticulados aparecem gravados em suportes de tipo laje, podendo algumas destas, a avaliar pela disposição da decoração, corresponder a estelas, isto é, serem monólitos que, originalmente, seriam colocados na vertical (Santos e Marques, 2007: 40-41). No Centro do território português conhecemos reticulados daquele último período em exemplares oriundos de ambientes funerários, como Casinha Derribada (Viseu) (Cruz et al., 1998: 51), Rochão (Viseu) (Santos e Marques, 2007), ou Cadouço (Castro Daire) (Cruz, 2001: 332). Mas também de outros contextos, não funerários, se bem que de potencial e provável valor simbólico como o do povoado de Canedotes (Vila Nova de Paiva) (Canha, 1999: 290), ou o da laje da Travessa das Escadas (Vilar Maior), neste caso de cronologia mais imprecisa, mas talvez no âmbito da Idade do Bronze (Santos, 2008: 20). De período provavelmente mais recente há que referir ainda o notável caso de Travessa da Lameira de Lobos (Castro Daire), monumento funerário-cultual definido por estrutura circular composta por 40 estelas gravadas nas faces exteriores12. 12 Monumento em estudo por dois dos autores (A.T.S. e R.V.) juntamente com Domingos Cruz e João Nuno Marques.
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Porém, ao contrário das peças conhecidas da Idade do Bronze, a de Pedra da Atalaia 2 possui uma diferença fundamental: a inscrição do reticulado numa forma acampanulada. Na verdade, os reticulados daqueloutras não são delimitados por qualquer forma. Os traços que configuram as celas terminam, digamos, “no ar”. Isto leva-nos a interrogarmo-nos, de novo, sobre a natureza da peça. Esforçámo-nos por procurar compreendê-la, integrando-a num conjunto de outros exemplares historiados do Bronze Final, nomeadamente beiraltino, e provenientes, na sua maioria, de contextos funerários. Mas não é segura essa atribuição cronológica para o reticulado de Pedra da Atalaia 2. A estela exibe ainda, abaixo do reticulado, dois arcos de círculo paralelos, incompletos, que consubstanciariam uma outra figura. Qual? Não sabemos. Dizer que poderiam corresponder a um escudo, é mera hipótese. Nesse caso, teríamos uma outra estela do Sudoeste onde, tal como se visualiza em outras, se adicionaram elementos atípicos (aqui o reticulado) de difícil interpretação. Hipótese alternativa, e igualmente não muito credível, é a de considerarmos que as duas linhas em arco de círculo simbolizariam adereços, como colares, o que nos levaria ainda mais longe em termos interpretativos. Como a sua correcta leitura implicaria uma rotação da estela em 180º relativamente à orientação decorrente da leitura que postulámos para o reticulado, estaríamos perante uma peça reaproveitada, i.e. transformada, por ter sido gravada em dois sentidos opostos, e também por isso, de cronologia de potencial longa duração. Por outro lado, em princípio, e de resto mais do que confirmado em inúmeras situações, quer pela distribuição dos motivos, quer pelo afeiçoamento da superfície e patines dos suportes, estas estelas eram cravadas no solo. Mas, e se algumas, concretamente as de menor porte, fossem só, ou pudessem ser só, poisadas? Pedra da Atalaia 2, com o topo aplanado, poderia “funcionar” também desse modo, o que não exigiria necessário enterramento do motivo reticulado quando orientada em função dos presumíveis colares. Num derradeiro esforço de compreensão, e relacionando agora os dois elementos figurativos entre si, esqueçamos aquela nossa última reflexão e voltemos a colocar a peça na posição que temos como correcta. Deixando as lajes com reticulados e circunscrevendo-nos ao mundo das estelas, a hipótese alternativa, mas igualmente incerta, é a de se tratar, num estilo muito livre, de uma estela diademada que encontraria na de El Viso V (Celestino Pérez, 2001: 401) potencial, ainda que remota, referência. Sob os dois semicírculos, existiria a cabeça da personagem evocada; em vez de um diadema semicircular com linhas radiais, como naquela, o de Pedra da Atalaia 2, de elevado esquematismo, também em arco de círculo, é mais um toucado reticulado (ou um penteado13), como que empolado ou ostentoso, tal como o que se observa nas estelas de Ciudad Rodrigo II (Salamanca) (Bueno Ramírez, 1990: 102) e Cerezal II (Cá13 As figurações designadas como diademas são suficientemente distintas, podendo englobar outras realidades de ornamentação da cabeça e cabelo, como toucados, adornos em penteados, etc.
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ceres) (Bueno Ramírez, 1987: 451), de região bem próxima da que abordamos. Enfim, tudo suposições, até porque também lhe faltam quaisquer indícios anatómicos, que muito ajudariam a entendê-la. O certo é que se trata de uma estela difícil. Enquanto Pedra da Atalaia 1 se inscreve, sem problemas, no Bronze Final, i.e. entre finais do II e inícios do I milénio a.C., proposta que, intencionalmente e conforme referimos, não pretendemos esmiuçar, a cronologia de Pedra da Atalaia 2 é mais incerta por tudo o que referimos. É bem sabido que o esquematismo dos elementos figurados que vemos nesta estela revelam natural apetência para “biografias longas” decorrentes do elevado valor sócio-simbólico que expressariam nas comunidades. Por isso, tal como quanto à interpretação e simbólica daqueles, também não dispomos de elementos para uma atribuição cronológica bem fundamentada. E mesmo tratando-se de eventual estela diademada, a sua cronologia tanto poderia ser de finais do Bronze, contemporânea das estelas do Sudoeste (e de Pedra da Atalaia 1), tal como propôs Celestino Pérez (2001: 258) e se comprovou, por exemplo, com a estela 2 de Almadén de la Plata (Sevilha) (García Sanjuán et al., 2006: 142), como anterior, tendo em conta a larga tradição indígena e duração dessas estelas14. Mais seguro e, como tal, a valorizar, é o achado das duas estelas relativamente próximas, distanciando uma da outra cerca de 165 m. Independentemente da questão da eventual maior antiguidade de uma em relação à outra, em algum momento terão sido sincrónicas. Tratando-se de entidades públicas, i.e. visíveis e socialmente partilhadas, uma não anulava a outra, mesmo admitindo que a mais antiga já nada importasse à comunidade. Importaria, seguramente, a memória do lugar, que continuaria significante. De certo modo, e neste sentido, as estelas não têm só a cronologia de..., mas a cronologia a partir de... São vários os casos conhecidos de achados plurais de estelas15 num mesmo espaço, independentemente das suas (di)semelhanças iconográficas e cronológicas, como testemunham as de Torrejón El Rubio I e II, ou as de Zarza Capilla I e II (Celestino Pérez, 2001: 329-331; 380-381), ou as de Cortijo de La Reina (Córdova) (Murillo Redondo et al., 2005), para dar alguns exemplos. Na região, são exemplo as três de S. Martinho, as oito de Hernán Pérez (Cáceres) (Almagro, 1972) e as duas de Baraçal (Santos et al., neste volume). Alguns dos achados conjuntos também englobam estelas não decoradas, como parece ter ocorrido com a de San Martín de Trevejo (Celestino Pérez, 2001: 279-280). No caso presente, e embora não tenha ficado totalmente esclarecida a existência de dois outros pequenos fragmentos de eventuais estelas, não podemos deixar de admitir a remota possibilidade de corresponderem ao que resta de pequenas estelas 14 A simbologia do diadema poderá oferecer uma diacronia ainda mais lata se admitirmos a sua figuração em cerâmicas celtibéricas, como a do vaso de Ocenilla (Sória), com figura humana diademada (ou com capacete, na opinião de Sopeña, 2005: 373) e lança na mão. 15 À semelhança de outras propostas, por exemplo para as necrópoles celtibéricas, admite-se também a eventualidade da existência de peças em materiais perecíveis, como madeira (Díaz-Guardamino Uribe, 2008: 35).
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não gravadas, ou seja, com “outras biografias”, ou testemunharem até mesmo restos de antigas estruturas desmanteladas. Mas é hipótese remota pelos motivos referidos no início deste texto. É também sabido que essas situações, e sem que haja outros dados que o possam confirmar, ou infirmar, têm conduzido a leituras de âmbito funerário e outras de cariz ritual, não funerário, antes associadas a santuários ou lugares de culto. Naturalmente que a natureza dos conjuntos — estelas com a mesma composição cénica ou com ela distinta, com a mesma cronologia ou não, para além do próprio número — são condicionantes. Todas elas são plausíveis e não necessária nem sempre contraditórias, sabendo nós muito bem que, conjuntamente com as evidências arqueológicas (e a falta delas), lidamos com entidades acentuadamente polissémicas. Mas não pondo de parte que Pedra da Atalaia 1 e 2 são referentes de momentos algo distanciados no tempo, e sem nos querermos perder no(s) significado(s) específico(s) carregados de mensagens de cada uma delas e da forma como foram simultânea, ou sucessivamente, (re)interpretados, o que fica subjacente à sua materialidade é o “sentido de lugar” na acepção fenomenológica de Feld e Basso (1996: 11)16, i.e., num entrosamento das morfologias com a experimentação e percepção sociais. Consequentemente, do que se trata é da feição memorialista das comunidades subjacentes que deram existência e sentido(s) a este tipo de materialidades (Vilaça, 2000: 39). O aparecimento conjunto das estelas de Pedra da Atalaia 1 e 2, naquele sítio específico, que deve ser considerado como o de origem das peças — i.e. o seu próprio contexto geo-arqueológico —, e a localização desse local num dos contrafortes ocidentais do maciço da Serra da Estrela, são bastos elementos para classificar estas peças como um dos mais importantes achados efectuados nos últimos anos nesta região da Beira Interior. Por outro lado, nada existindo que possa pôr em dúvida a sua proveniência, e não obstante a profunda transformação antrópica resultante da instalação do “Parque Eólico”, é desejável desenvolver, futuramente, adequados e mais intensos trabalhos de campo nas áreas envolventes imediatas, assim como nas outras plataformas e elevações mais próximas do aparecimentos das estelas, ou seja, importa atender aos respectivos contextos micro e macro. Como referimos no início, já na sequência do acompanhamento da Linha de Alta Tensão, mais concretamente na proximidade do poste 12, foram identificadas cerâmicas à superfície no sítio do Vilhagre17. Durante as prospecções foi possível per16 “Senses of place: the terrain covered here includes the relation of sensation to emplacement; the experiential and expressive ways places are known, imagined, yearned for, held, remembered, voiced, lived, contested, and struggled over; and the multiple ways places are metomymically and metaphorically tied to identities.” 17 Possui as coordenadas centrais x: 261172; y: 404439. O sistema de coordenadas utilizado é o Hayford-Gauss (Datum de Lisboa, com ponto fictício no Cabo de S. Vicente).
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ceber que o material cerâmico se cingia sobretudo à plataforma aplanada e limpa dos blocos graníticos, embora surgisse também, mas em número reduzido, ao longo das vertentes (identificação de material no acesso entre os postes 13 e 14). São de fabrico manual, embora de cronologia imprecisa, mas poderão denunciar a existência de eventual habitat. Na zona foi também identificado um afloramento com “covinhas”. Bem mais importante, e que importa articular com as estelas numa futura análise do povoamento pré e proto-histórico desta zona, é o povoado muralhado de Monte Verão/Pedra Aguda (Rapa), situado a NE da Pedra Atalaia, que lhe fica próximo. A sua contemporaneidade com as estelas (ou a estela 1) é confirmada pela presença de cerâmicas de “tipo Baiões/Stª Luzia”, de há muito conhecidas (Vilaça, 2009a: 20-21). De um ponto de vista meramente ergológico, sublinhe-se esta proximidade de um item típico da Beira Central (as cerâmicas) e de um outro (Pedra da Alataia 1) que, do ponto de vista conceptual, tem uma natureza mais meridional e interior. De momento, face aos limitados conhecimentos que temos do povoamento do Alto Mondego na charneira do II para o I milénio a.C., diríamos que aqueles dois factores são premonitórios, conjuntamente com outros globalmente contemporâneos que conduzem a uma aproximação à tecedura do povoamento da época (Vilaça, 2009a: 22). Esta região que, de um determinado ponto de vista, é interface do Centro-Sul da Beira Interior e da Beira Central — dois dos mais dinâmicos pólos de então, com múltiplas afinidades culturais, mas também com especificidades não menos importantes —, merece-nos a maior atenção, podendo ajudar a compreender, igualmente, o entrosamento da componente cultural mesetenha no mundo beirão, denunciado, entre outros, nos povoados do Caldeirão (Guarda) (Perestrelo, 2000), também relativamente próximo, a SE de Pedra da Atalaia, e um pouco mais afastado, o do Cabeço das Fráguas (Guarda)18. A riqueza mineira da região, designadamente em recursos estaníferos, deverá ter desempenhado papel estruturante na rede de povoamento. Mas junto ao povoado de Monte Verão/Pedra Aguda, na Quinta da Boa Vista (Rapa), foram ainda encontrados artefactos (taça carenada e dois machados (lingotes? de cobre) que remetem para cronologia mais antiga (Bronze Médio?) (Vilaça, 2009a: 20 e Figs. II e IV-5), o que é particularmente interessante, não só em si mesmo, mas se articulados com Pedra da Atalaia 2. É admissível que esta estela possua cronologia um pouco anterior à de Pedra da Atalaia 1, indicando, conjuntamente com aqueles materiais, que a zona era já ocupada ou, pelo menos, frequentada, i.e. com um processo de territorialização em curso. A problemática da vinculação de estelas a povoados é-nos particularmente cara e estamos profundamente convictos que deve ser caminho a explorar. Diversos investigadores chamaram já a atenção para esse binómio, por vezes espacialmente coincidente, outras vezes assumindo apenas uma relação de proximidade geográfica e de cumplici18 Além de materiais de prospecção, também os resultados de escavações recentemente realizadas neste sítio, cujos materiais estiveram, em parte, expostos no Museu Municipal da Guarda (Primavera de 2010), apontam nesse sentido.
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dade visual, como será o presente caso (Estampa 8). Algumas situações específicas têm sido analisadas com fundamento, por exemplo, a de La Atalaya de la Moranilla, Ecija (Tejera Gaspar et al., 1995), entre várias outras. É igualmente possível discuti-la na Beira, com bases empíricas, desde logo com o caso das estelas de S. Martinho, encontradas na própria área do povoado-santuário (Vilaça, 1995: 404; 2000: 38; 2004), e ainda Meimão (Penamacor) (Vilaça, 1995: 84; 402)19, Baraçal (Santos et al., neste volume) e Aldeia Velha (Vilaça et al., neste volume), para além das de Pedra da Atalaia. Considerações finais Como este texto expressa, as estelas de Pedra da Atalaia 1 e 2 constituem um caso de capital interesse, desde logo porque foi possível congregar elementos que permitem referenciar com segurança o seu local de proveniência. Um deles reporta-se ao achado próximo de ambas as estelas, proximidade que define, por si só, um contexto arqueológico para elas. O outro reside no facto de terem aparecido em meio natural, tombadas, eventualmente arrastadas, mas não de muito longe e do que teria sido o local da sua implantação. Pedra da Atalaia 1 e 2 importam ainda por consubstanciarem o achado de duas estelas. Mas mais. É o achado conjunto de duas estelas conceptualmente distintas, que tanto poderão expressar diacronia como o contrário, aspectos que não conseguimos, todavia, esclarecer cabalmente. É claro que uma e outra determinam leituras distintas, que procurámos explorar. O certo é que nem uma nem outra poderão ser entendidas como formas de expressão na paisagem completamente desconhecidas, uma vez que na região mais próxima encontramos o mesmo fenómeno consubstanciado na estátua-menir de A-de-Moura (Santana de Azinha, Guarda) (Silva, 2000). Decerto, outras mais haverá… Não menos importante é o facto do local de proveniência das duas estelas corresponder a um lugar de referência e de grande impacto paisagístico, i.e. a linha de festo da serra do Ralo, na extremidade noroeste das faldas da serra da Estrela (Estampas 1, 2, 3 e 8). Conforme descrevemos no ponto 2, o espectro visual que se detém do local de achado das estelas é notável, dominando todo um espaço envolvente, ele próprio revestindo-se de expressivo potencial cénico. A sua condição de lugar natural de passagem não deverá ser dissociada da existência das próprias estelas, nem admira, por isso que, mais tarde, uma via romana marcasse próximo o seu percurso (Carvalho, 2009:37). O sopé é igualmente percorrido por ancestral via de circulação — ainda hoje principal via de passagem obrigatória —, constituindo o sítio de achado das estelas verdadeira atalaia como bem expressa o seu topónimo. Mas a própria cumeada, visível desde a envolvência, e de muito longe também, estrutura-se como 19 Prospecções realizadas no Verão de 2009 na serra da Malcata por um dos autores (R.V.), juntamente com Marcos Osório e António Martino, permitiram recolher informação adicional que confirma a existência de dormentes e moventes na área de achado da estela, o que também já se verificara em prospecções anteriores (Vilaça, 1995: 84).
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barreira num horizonte linear, só perturbado pelo gigantesco conjunto de afloramentos da Penha dos Prados, lugar natural de referência de todos os tempos (Estampa 3). Assinalando a separação das duas unidades geo-morfológicas mais próximas — a serrana e a que se espraia na fértil Bacia de Celorico — a serra do Ralo poderá ter servido de fronteira a comunidades distintas — não num sentido apartador, mas, pelo contrário, de proximidade e reunião, porque lugar neutro —, polarizadas em torno das estelas. Ou, se quisermos, em função de um lugar de memória, que, por definição, é revisitado. Distintas comunidades deveriam, ciclicamente, acorrer a certos “pontos de encontro”, como este, de particular apetência à prática e reprodução social. A existência não de uma, mas de duas estelas, reforça, quanto a nós, esta linha interpretativa. Neste sentido, e simultaneamente, as estelas deverão ser também entendidas como marcos estruturantes na conceptualização de lugares e de territórios e na mundividência das comunidades, isto é, como sinais não só inscritos, mas igualmente incorporados na paisagem, no sentido atribuído por Ingold (1993: 156-157). Por isso, torna-se fundamental captar as suas linhas de articulação com a(s) rede(s) de povoamento regional, trabalho que exige múltiplas equipas desdobradas em prospecções e escavações que… estão por fazer.
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Estampa 1 – Local de achado das estelas (“Carta Militar de Portugal”, escala 1: 25.000, folha 191).
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Estampa 2 – Serra do Ralo vista desde a Penha de Prados (aprox. de SW).
Estampa 3 – Enquadramento paisagístico do local de achado das estelas (A), observando-se também a escarpa da Penha de Prados (B) (Foto: Danilo Pavone).
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Estampa 4 – Decalque da estela de Pedra da Atalaia 1.
Estampa 5 – Fotografia da estela de Pedra da Atalaia 1 (Foto: Danilo Pavone).
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Estampa 6 – Decalque da estela de Pedra da Atalaia 2.
Estampa 7 – Fotografia da estela de Pedra da Atalaia 2 (Foto: Danilo Pavone).
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Estampa 8 – Serra do Ralo vista desde o povoado de Monte Verão/Pedra Aguda (aprox. de NE).
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As estelas do Baraçal, Sabugal (Beira Interior, Portugal) André Tomás Santos1, Raquel Vilaça2, João Nuno Marques3
Resumo Os autores estudam e discutem as problemáticas suscitadas pelo achado recente de uma segunda estela no sítio do Baraçal, concelho do Sabugal, atribuível a finais da Idade do Bronze, tal como a primeira, conhecida desde 1984. Estas duas peças partilham iconografia afim, concretamente a tríade escudo-espada-lança, embora executada com técnica distinta. A figuração de outros elementos, como um espelho, na estela ora estudada, coloca novos problemas, discutindo-se o estabelecimento rígido ou formatado de zonas de distribuição das estelas com base na presença/ausência de determinados elementos. São tidas em conta as circunstâncias de achado das peças, técnica, iconografia e simbologia. Estabelecem-se alguns paralelos pela sua pertinência e tecem-se ainda considerações sobre os significados dos elementos representados, quer na perspectiva da “entidade” evocada pelas estelas, quer na do “observador”. A valorização de ambas as estelas insere-se no enquadramento geográfico e arqueológico numa perspectiva de arqueologia do povoamento. Palavras-chave: Bronze Final, Beira Interior, Baraçal, Estelas. Abstract The authors will present the study and argue the problematics that have risen from the recent discovery of a second stelae in Baraçal, country of Sabugal. Both stelae are attributed to the end of the Bronze Age. These two pieces share the same iconography, more particularly the three elements shield-sword-spear, though render with a different technique. The presence of other elements, more specifically a mirror, in the latest discovery, places new questions, which lead to the discussion about the importance of establishing rigid and formatted areas of stelae distribution based on the presence/absence of particular elements. The circunstances of these findings, techniques, iconographies and symbolism are taken into account. By their pertinence some parallels are established as well as some considerations about the significance of the elements represented, both in the perspective of the “identity” evoked by the steale as well as the “observer”. The assessment of both stelae is inserted in a geographic and archaeological perspective of settlement distribution. Keywords: Late Bronze Age, Beira Interior, Baraçal, Stelae. 1 Centro de Estudos Pré-históricos da Beira Alta. [emailprotected] 2 Instituto de Arqueologia. Departamento de História, Arqueologia e Artes da Universidade de Coimbra. CEAUCP (FCT). [emailprotected] 3 Centro de Estudos Pré-históricos da Beira Alta. [emailprotected]
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Introdução Não é a primeira vez que a região do Sabugal é referida no meio científico arqueológico a propósito do achado de estelas da Idade do Bronze. Na década de oitenta do século passado, Fernando Curado publicou duas delas — as estelas de Baraçal e de Fóios (Curado, 1984; 1986), cuja importância foi desde logo sublinhada e depois reiterada e ampliada, quer em sínteses temáticas sobre estelas (v.g. Martín Mompean, 1992; Galán Domingo, 1993; Alarcão, 2001; Celestino Pérez, 2001; Harrison, 2004), quer em trabalhos globalizantes sobre a arqueologia do povoamento da região (Vilaça, 1995; 2008, entre outros). Por outro lado, e embora proveniente de fora dos limites administrativos do concelho, importa referir o achado da estela de Meimão (Penamacor), a primeira de todas elas dada a conhecer (Rodrigues, 1958) e que se insere na mesmíssima problemática daquelas. O mesmo sucede com a de San Martín de Trevejo (Cáceres), neste caso, oriunda de território espanhol, embora de sítio localizado a escassos 11 km da linha de fronteira (García de Figuerola, 1982). Já durante as Jornadas a que estas actas respeitam foram apresentadas outras estelas — Aldeia Velha (Sabugal) (Vilaça, Osório e Santos, neste volume), Atalaia 1 (Celorico da Beira) (Vilaça, Santos e Gomes, neste volume) e Puerto de Honduras (Cáceres) (Sanabria Marcos, neste volume) — que evidenciam as interessantes características desta região do Centro Interior ocidental da Península Ibérica durante os finais da Idade do Bronze. E a posterior divulgação da estela de Robleda (Salamanca) (Martín Benito, 2009), com características semelhantes, reforça a excepcionalidade de uma região que, há três mil anos, se pautava (ainda) por estreitas afinidades culturais. Com este texto pretendemos apresentar o estudo de uma nova estela do concelho do Sabugal encontrada muito próximo do local de achado da referida estela do Baraçal, motivo pelo qual a designamos por “Baraçal 2” para a distinguirmos daquela que, doravante, deverá ser identificada por “Baraçal 1”. Do achado desta segunda estela logo se fez eco a imprensa (Público, 11/12/2006, p. 47; Jornal do Fundão, 14/2/2006) e, posteriormente, aquando do estudo da peça por parte da equipa4 (Cinco Quinas, n.º 76, Julho/2007, p. 18), tendo também sido referida a propósito do povoamento proto-histórico do concelho do Sabugal (Vilaça, 2008: 46-48). Metodologia de registo O estudo da efectuou-se após a limpeza da peça, efectuou-se o respectivo decalque sobre plástico de cristal transparente pouco espesso. Utilizaram-se canetas de tinta permanente vermelhas, negras e azuis, de várias espessuras; com a primeira das cores registaram-se os limites das faces historiadas (ponta M) e as fracturas, fissuras e outros acidentes naturais das peças (ponta F); as gravuras foram decalca4 Da equipa fez parte, para além dos signatários, Rui Filipe Gomes Baptista, aluno do 1.º ciclo de Arqueologia e História da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.
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das a negro com canetas de ponta M ou F, consoante o nível de pormenor exigido pelos sulcos; o azul foi utilizado para representar os picotados mais recentes. O decalque foi feito com recurso a luz rasante provinda de holofote fotográfico de 1000 wats. Este foi rodando em torno da peça de forma a garantir que todos os sulcos e picotados seriam registados. Como é sabido, para uma boa visualização das evidências gráficas, a luz deve incidir a partir de uma direcção perpendicular à orientação dos sulcos. A este trabalho seguiu-se o desenho das secções da peça à escala 1:20, em papel milimétrico. Os eixos ortogonais a partir dos quais se procedeu ao registo daquelas foram assinalados no plástico, de forma a garantir a integração de ambos os desenhos após a redução dos mesmos. A sua redução desenvolveu-se da seguinte forma: digitalização do plástico à escala 1:2 em plotter apropriada; tintagem por método informático com recurso ao programa Adobe Illustrator; posterior redução à escala 1:20 e integração das secções. Na tintagem, os limites das faces e gravuras foram representados a negro; o limite apresenta, à escala 1:2, a espessura de 1,5 pontos; a espessura do desenho das gravuras é coincidente com a das gravuras em si; as fissuras e lascamentos naturais foram delimitados a linha ponteada cinzenta de 0,5 pontos de espessura (à escala 1:2). Localização e condições de achado A identificação da estela de Baraçal 2 remonta a Maio de 2006, altura em que decorriam obras de reabilitação num imóvel sito na rua do Cimo do Povo, em pleno núcleo edificado, na zona mais antiga da aldeia do Baraçal. O monólito, dada a sua configuração e afeiçoamento, estava a servir de banco5 no pátio externo de uma moradia, com a face historiada da Idade do Bronze virada para baixo. Foi só ao retirá-lo do local que o proprietário, Sr. Luís Carlos Lages6, se deu conta da potencial importância do achado, contactando de imediato o Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal do Sabugal. Deslocando-se ao Baraçal, o Dr. Marcos Osório, arqueólogo municipal, confirmou que se tratava de uma estela do Bronze Final, entrando depois em contacto com os ora autores7. Desconhece-se por completo o primitivo lugar de origem da estela, bem como as circunstâncias em que foi colocada naquele sítio. Os familiares mais idosos dos proprietários recordam-se de verem a pedra sempre aí, tendo também servido outrora para amassar o linho e bater a roupa. Estima-se que a casa terá uns 150 anos e a memória é a de que, então, a pedra usada na construção das casas da aldeia vi5 Tal como, por exemplo, a de El Carneril, Trujillo (Cáceres). 6 Queremos deixar o nosso reconhecimento público à Sr.ª D. Amélia Lages e ao Sr. Luís Carlos Lages, proprietários do imóvel onde a peça apareceu, por todo o apoio dispensado e hospitalidade durante os trabalhos desenvolvidos. 7 Expressamos o nosso agradecimento ao Dr. Marcos Osório, quer pela informação do achado da estela, quer por todo o apoio e colaboração prestados durante a fase de estudo da mesma.
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nha da zona de Vilares, ligeiramente a nordeste do Baraçal, na encosta sobranceira ao Ribeiro do Moinho Fernandes. A povoação do Baraçal situa-se, em linha recta, a pouco mais de 4 km para norte do Sabugal, com acesso pela estrada municipal 563. Administrativamente, é sede de freguesia do concelho do Sabugal, distrito da Guarda. O local de achado é assinalado na Carta Militar de Portugal, folha n.º 215 (1:25.000) com as coordenadas UTM 29 TPE 661,88/4473,54, a 820 metros de altitude. A aldeia fica no limite superior da cabeceira de linhas de água que alimentam o vale do Ribeiro do Moinho Fernandes, afluente que corre para a margem esquerda do rio Côa, a cerca de 3 km para leste. Aquelas nascem a 860 m de altitude, formando um vale orientado a Este/Oeste, na base do qual foi identificada em 1978 a estela de Baraçal 1, a menos de 2 km para nascente do local da de Baraçal 2 (Estampa 1). À cota do ponto de descoberta da estela de Baraçal 2, em terrenos de alguma pendente, o alcance visual não é muito significativo; contudo, mais a sul, a cerca de 500 m, existem alguns relevos, a 870/880 m de altitude, de onde se obtém um excelente controlo da paisagem circundante, próxima e mais distante, e que constituem excelentes referências paisagísticas (Estampa 2). A sudeste avistam-se a Serra do Homem de Pedra e a Serra da Gata. A norte encontram-se o planalto da Guarda, o Jarmelo e, mais além, a Marofa. Mais para Poente ergue-se, imponente e isolado, o Cabeço das Fráguas. Para sul dominam as elevações da Malcata. Bem visíveis são ainda os cabeços de Vila do Touro e de Caria Talaia, ambos com ocupação da Idade do Bronze (Estampa 1). A região integra-se no planalto da Guarda/Sabugal, próximo do vale do rio Côa, que aqui ainda não é um vale pronunciado e fechado como se verifica mais para jusante, mas bastante amplo e aberto. Trata-se de uma área menos suave orograficamente do que a oriente do Côa, havendo uma menor monotonia na fisionomia da paisagem, dado que a superfície é sulcada por diversas linhas de água, recortando alguns cabeços suaves e pouco elevados, revestidos de abundantes e disformes afloramentos rochosos, dando um aspecto desolador à paisagem. O substrato geológico da região corresponde a um granito monzonítico, de duas micas, predominantemente biotítico. Relativamente à textura, é de relevar que a aldeia do Baraçal encontra-se sobre um soco de granito porfiróide de grão médio a fino (Teixeira et alii, 1962: 13-14). Contudo, imediatamente para nordeste, na zona de Vilares, o soco granítico já corresponde a um granito não porfiróide de grão médio (Teixeira et alii, 1962: 15). Este facto é de extrema importância porquanto, como veremos seguidamente, a peça pode ter sido recolhida na zona de Vilares, mas se atendermos às características geológicas da mesma, a potencial “pedreira pré-histórica” localizar-se-ia mais perto do Baraçal. Análise técnica e morfológica Os trabalhos de limpeza e registo arqueológico da estela de Baraçal 2 decor-
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reram em Julho de 2007, em casa dos proprietários8. Por uma questão de protecção, a peça tinha sido transportada para o interior da casa, pelo que o estudo foi efectuado com luz artificial. Formalmente, trata-se de uma estela (Estampa 3). É de granito de grão fino de cor acinzentada. Apresenta configuração subtriangular, secção longitudinal poligonal e secções transversais entre o trapezoidal e o sub-rectangular. A base foi facetada no sentido de se obter uma forma grosso modo triangular e pontiaguda que facilitasse a implantação vertical no solo. Praticamente completa, apresenta 1,90 m de altura máxima, atingindo a largura de 64 cm na parte mais larga; a espessura é bastante regular, andando em torno dos 24 cm. O campo gravado da peça foi previamente alisado, consistindo o repertório do anverso, de cima para baixo, no seguinte conjunto: um motivo de interpretação desconhecida, uma lança, um escudo, uma espada e um espelho. O primeiro é definido por um sulco recto vertical formando ângulo recto com um outro horizontal, que se prolonga cerca de 0,6 cm para além do limite daquele. Este é interrompido à esquerda enquanto o anterior o é no topo, situações ambas que se devem à fractura da extremidade distal da estela. A lança, com o comprimento de 48,30 cm, dispõe-se na horizontal, sendo apenas definida pela haste comprida e pela lâmina triangular situada à direita; aparentemente, a base desta última nunca foi representada (Estampa 4). A picotagem posterior a que a peça esteve sujeita não permite averiguar se o sulco que define o cabo da arma se prolonga para o interior da lâmina passando a representar também a nervura central da mesma. O escudo (Estampa 5) ocupa o lugar central e é representado por quatro círculos concêntricos, apresentando os três mais exteriores uma escotadura à esquerda; o seu diâmetro máximo é de 52 cm. A abraçadeira é representada por um rectângulo de cantos arredondados, cujo eixo forma um ténue ângulo agudo com o definido pela orientação das escotaduras. Não foram representados os cravos. A espada, com 53,30 de comprimento, apresenta-se, tal como a lança, na horizontal, mas orientada em sentido contrário (Estampa 6). Possui uma lâmina aparentemente pistiliforme, sendo encimada por punho acampanulado com dois apêndices suavemente excêntricos. O espelho (Estampa 6), também disposto horizontalmente, define-se por forma subcircular com 9,8 cm de diâmetro máximo, sendo o cabo representado por dois círculos menores, perfazendo o comprimento de 9 cm. Tecnicamente, todo o conjunto foi conseguido por picotagem indirecta com utensílio lítico de ponta romba (Estampa 7). O escudo terá sido também abrasado, como é particularmente visível no seu sector inferior. Tanto a abraçadeira des8 A estela esteve temporariamente exposta no Museu Municipal do Sabugal durante a realização das Jornadas, mas os proprietários entenderam levá-la de novo para casa, onde actualmente se encontra.
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te como o punho da espada foram ainda intensamente polidos. No primeiro caso, de tal processo resultou o alargamento dos sulcos e o acentuar da curvatura dos cantos; no segundo, para além do alargamento dos sulcos, obteve-se igualmente o reforço do estrangulamento junto dos copos. Os sulcos apresentam negativos de contorno subcircular, tendo sido regularizados posteriormente. Posteriormente, num momento em que, a avaliar pela inclinação dos impactos, a estela se encontrava já na horizontal, o sector mesial esquerdo da mesma foi intensamente picotado com utensílio de ponta romba (Estampas 5 e 7). É possível que tal pudesse ter resultado do uso da estela como base para bater o linho, conforme informação que colhemos (vide supra). No verso da peça (Estampa 7) foi identificada uma forma sub-rectangular definida por sulco com cerca de 2 cm de largura e 1 cm de profundidade, já conseguido mediante picotagem com utensílio de ferro. Esta forma tem como dimensões exteriores 56 cm de comprimento e 42 cm de largura. Na extremidade direita foi gravado um canal que junto ao rectângulo anteriormente referido apresenta uma forma subtriangular. Iconografia e análise comparativa A composição gráfica desta estela remete-nos para as designadas “estelas básicas”, características da Zona I definida por Sebastián Celestino, ou seja, da região da Serra de Gata (Celestino Pérez, 2001: 48-50; 92). Ainda que não seja correcto, de um ponto de vista estritamente orográfico, integrar o local de proveniência da estela de Baraçal 2 naquelas montanhas da Cordilheira Central, que se prolongam em território português pela Malcata, Estrela e Gardunha, e nem sequer nos seus contrafortes ou relevos adjacentes9, é certo que nos encontramos numa mesma região num sentido geográfico mais amplo. Por conseguinte, esta nova estela vem reforçar o número das que se definem pela presença da trilogia escudo-espada-lança características daquela região mas também presentes nas Zonas, II, III e IV, respectivamente Vale do Tejo-Serra de Montánchez, Vales do Guadalquivir-Zújar e Vale do Guadalquivir, definidas pelo mesmo investigador (Celestino Pérez, 2001: 48-57). A distribuição relativa desses elementos em Baraçal 2 confirma os rígidos preceitos normativos que conferem a posição central ao escudo — neste caso com escotaduras à esquerda contrariamente às da de Baraçal 1 —, encimado pela lança e, na parte de baixo, a espada, com orientação em sentido contrário à daquela. Em quase todos os exemplares conhecidos verifica-se esta discordância de orientação nas duas armas ofensivas10, o que, em termos conceptuais, poderá ser 9 A Serra da Malcata corresponde a um dos relevos residuais existentes neste sector da Meseta Ibérica. O contacto entre esta e aquela é complexo e não cabe nos limites deste texto a sua explicitação. Remetemos assim o leitor mais interessado para Ferreira, 1978: 54-55. 10 Com algumas excepções em Solana de Cabañas, Torrejón el Rubio III e IV, Meimão, Córdoba II e, aparentemente Três Arroyos. Se contarmos também com as estelas em que as espadas são representadas à cintura do antropomorfo, há ainda a referir Zarza Capilla I, Figueira e Navalvillar de Pela.
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entendido como forma de assinalar a omnipresença, a partir de um único centro definido pela principal arma defensiva11 — o escudo —, de dois campos opostos e divergentes ditados pela função ameaçadora e intimidatória da orientação das armas. Neste sentido, não nos parece que seja de relevar a falta de uniformidade na orientação das espadas e lanças entre as várias estelas, mas sim a quase sistemática divergência na respectiva orientação em cada uma delas. Assim, e circunscrevendo-nos aos exemplares mais próximos, Baraçal 2 aproxima-se, na composição das armas, das estelas de Trujillo (Harrison C15)12 e Ibahernando (Harrison C16), com lança orientada à direita e espada à esquerda, contra as de Baraçal 1, Fóios, San Martín de Trevejo, ou Santa Ana de Trujillo, com a lança virada à esquerda e espada à direita (Harrison, respectivamente C4, 5, 1, 17). Talvez seja de relevar também a elevada percentagem de vezes em que, tal como ocorre no exemplar em análise, a lança se orienta no mesmo sentido da escotadura. Na verdade, sempre que são observáveis estes dois elementos — lança e escotaduras —, são poucos os casos em que tal relação não se verifica: apenas Solana de Cabañas, Torrejón el Rubio IV, Zarza Capilla I, Figueira, Cuatro Casas, Quintana de la Serena, Benquerencia de la Serena, Cabeza del Buey I e III e Magacela (Harrison, respectivamente C22, 9, 44, 87, 70, 50, 47, 32, 34 e 48). Poderá isto ter que ver com a funcionalidade da própria escotadura, admitindo-se que seria utilizada como apoio da lança? O escudo (Estampas 3 e 5), com abraçadeira rectangular no eixo dos entalhes, e portanto representado pelo reverso, inscreve-se no mesmo modelo dos que encontramos nas estelas da Zona I. Mas neste particular, vale a pena sublinhar que não se regista uniformidade no geral das estelas, já que os escudos podem ser representados pelo reverso e pelo anverso, neste caso nos exemplares de Torrejón el Rubio III, Aldea Nueva de San Bartolomé, Navalvillar de Pela, Zarza Capilla I, Valdetorres II, El Viso III, Olivenza, Cuatro Casas, Toya, Ategua, Almargen, Figueira, Fuente de Cantos, Ervidel II, Luna e, além Pirenéus, Substantion e Buoux I e II (Harrison, respectivamente C8, 28, 37, 44, 52, 56, 65, 70, 69, 80, 84, 87, 85, 89, 93, 90, 91 e 92). Também no designado “Ciclo Artístico do Vale do Tejo”, que se inscreve na referida Zona II, encontramos a representação de armas (Gomes, 1987). A grafia do escudo da Rocha 29 do Cachão do Algarve, com escotaduras em V mas sem abraçadeira, parece ter sido representado igualmente pelo anverso. Mais recentemente foi publicada fotografia de um painel historiado de Arroyo Tamujoso (Extremadura)13, 11 Como é também admitido por diversos investigadores, o escudo pode igualmente aludir à simbologia solar. 12 Por ser o catálogo mais recente e disponível no momento em que redigimos este texto, utilizamos a seriação elaborada por Harrison, 2004. 13 Não é clara a adscrição administrativa do sítio. Localiza-se em Higuera la Real ou em Valencia del Mombuey, ambos “términos” municipais pertencentes à província de Badajoz (Collado, 2008: 322).
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onde se observam dois escudos picotados com escotaduras em V (Collado, 2008: 321 e fig. 44). Infelizmente, a foto não é clara, contudo parece-nos que também aí não se encontra representada a abraçadeira, tendo sido esta substituída por covinhas, o que faria deste painel outro exemplo com representações do anverso dos escudos. Da distinta representação dos escudos, é legítimo deduzir que se terão oposto duas soluções conceptuais distintas: a do que olha e a do que “utiliza”. Terá havido razões específicas para apresentar os escudos ora na visão do próprio, que se protege, ora na perspectiva do outro, que afronta? E tendo existido, será lícito articulá-las em função do quê? O acentuado esquematismo com que a ponta de lança (Estampas 3 e 4) foi representada, reduzida a duas linhas convergentes, lembrando mais uma ponta de seta, inibe-nos de qualquer tentativa de identificação tipológica e, consequentemente de valorização cronológica. Não é comum este tipo de representação, que se repete apenas, assim o cremos, na ponta de lança da estela de Almargen (Harrison C84), da região de Málaga, já bastante periférica geograficamente em relação aos principais núcleos. Quanto à espada (Estampas 3 e 6), possui lâmina larga, separada do punho por uma linha. Trata-se de um tipo de representação comum nas demais espadas das estelas das Zonas I e II. Mas pela primeira vez aparece na Zona I uma espada com dois pequenos apêndices no punho. O problema de uma atribuição tipológica muito específica deve também ser considerado, embora não coloque tantas limitações como a lança. Mas talvez outras de distinta natureza: as espadas seriam sempre representadas sem bainha? Sabe-se bem que nem sempre assim é, pois basta-nos recordar exemplares mais arcaicos, como os de Ataúdes (Figueira de Castelo Rodrigo) e Mouriços (Almodôvar), por exemplo, onde aquela é explicitamente representada (Vilaça et alii, 2001: 74 e Est. III-2; Gomes, 1994: 117). As bainhas não reproduzem a forma das lâminas e os punhos são também normalmente esquemáticos, já que o objectivo não era a reprodução pormenorizada dos artefactos, nem sequer uma obstinada e fiel representação. Assim sendo, ao realismo com que as armas são representadas, permitindo uma imediata identificação, há que reconhecer igualmente o acentuado esquematismo e simplismo das mesmas, portanto, factores bastante limitativos para uma atribuição tipo-cronológica muito específica, postura prudente partilhada por diversos investigadores (v.g. Galán, 2000: 1790). Por outro lado, lembramos nós ainda que, como já foi sublinhado (Vilaça, 1995: 33), utilizar no estabelecimento de cronologias finas elementos que pelo seu valor idiossincrático, como as espadas, são mais susceptíveis de uma “vida longa”, podendo ter passado de mão em mão, isto é, com uma biografia que lhes acrescentaria prestígio, é sempre um procedimento arriscado. Nestes casos, a convivência de tipos mais arcaicos com outros mais recentes poderia ter ocorrido.
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Mas Baraçal 2 não é, de facto, uma estela básica já que possui ainda, para além da figura no topo da estela, que não sabemos interpretar, a representação de um espelho (Estampa 3 e 6). A sua localização na parte inferior da estela, sob a espada, não é muito frequente, embora se repita na estela de Pedra da Atalaia 1 (Vilaça, Santos e Gomes, neste volume). Trata-se, explicitamente, de um exemplar com pega galonada, tipo que apenas tinha aparecido nas estelas das Zonas III (Vale do Guadiana/Zújar) e IV (Vale do Guadalquivir) (Celestino Pérez, 2001: 163-166). Até ao momento, a presença de espelhos na Zona I circunscrevia-se à estela de San Martín de Trevejo, o que constituía argumento de peso na defesa de uma maior antiguidade das estelas básicas, visto que se trata, como tem sido admitido, de elemento de origem oriental e tardio divulgado no âmbito das trocas Oriente/ Ocidente de inícios do I milénio a. C. Assim, as estelas mais meridionais e supostamente mais tardias eram as que possuíam representações de espelhos, para além de outros elementos de prestígio também tidos de origem mediterrânea. Esta visão de uma evolução geográfica e cronológica das estelas, de norte para sul e das mais simples, só com armas, para as complexas, com vários elementos e figuração humana, foi questionada e devidamente fundamentada por alguns investigadores considerando pertinente outra argumentação e motivações de cariz ideológico — variabilidade social e de status — para explicar a falta de regularidade iconográfica das estelas (Barceló, 1992: 269; Alarcão, 2001: 325-333; Galán, 2008). Sem pretendermos neste momento avaliar a argumentação das duas propostas, a situação presentemente conhecida exige alguma ponderação na ideia de que as estelas da Zona I se caracterizam quase exclusivamente pela presença das armas. Passa-se exactamente o contrário. Efectivamente, já na de Fóios, aliás incompleta, tinha sido identificada a possível representação de uma fíbula (Curado, 1986: 106) e a presença de espelhos tornou-se agora muito mais expressiva: à de San Martín de Trevejo, juntam-se as de Baraçal 2, a de Pedra da Atalaia 1 (Vilaça, Santos e Gomes, neste volume), a de Puerto de Honduras (Sanabria Marcos, neste volume) e a de Robleda (Martín Benito, 2009). Em Baraçal 2 devemos mesmo contar com um quinto elemento (o motivo não identificado gravado no topo da estela) (Estampa 3). Portanto, estelas com um quarto ou quinto elementos passaram a ser comuns na Zona I. Aliás, na de San Martín haveria também, de acordo com o autor, um quinto elemento “com forma de E”, talvez pente ou fíbula, que ocupava a parte que se fragmentou quando a estela foi removida do terreno (García de Figuerola, 1982: 174-175). E, quanto às de Meimão (Harrison C3) e de Hernán Pérez (Harrison C2), porque muito incompletas, não podemos, com rigor, considerá-las básicas, pois ignoramos o que está em falta. Particularmente no caso da de Meimão, com uma composição cénica conservada pouco ortodoxa nas estelas básicas (lança e espada juntas), deixa-nos em aberto a franca possibilidade de nela terem figurado outros elementos. Por outro lado, também já não é possível estabelecer uma evolução tipológica dos espelhos em função das zonas geográficas (Celestino Pérez, 2001: 165),
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visto que se reúnem na Zona I os de pega simples (San Martín de Trevejo, Robleda e Pedra da Atalaia 1) e os de pega vazada e com borlas (Puerto de Honduras e Baraçal 2, respectivamente). A questão dos espelhos, cujos protótipos mais próximos se encontram na Sardenha, é sempre delicada, desde logo ao nível da sua versão material. De elevada fragilidade, é possível que pequenos e finos fragmentos de placas de bronze possam ter pertencido a espelhos, mas o certo é que os primeiros exemplares peninsulares conhecidos datam já de inícios da Idade do Ferro. Todavia, tendo chegado do Mediterrâneo diversos elementos, designadamente fíbulas, pentes e pinças, não se afiguram muito explícitos os motivos para os espelhos não os terem acompanhado. Eventuais provas de um fabrico indígena de espelhos com pega de borlas chegam-nos através do molde recolhido à superfície no povoado da Azenha da Misericórdia (Serpa), cuja interpretação merece concordância de distintos investigadores, mas tanto poderá ser do Bronze Final como da Idade do Ferro (Vilaça, 2007: 149-151). Os espelhos envolvem ainda outros problemas relacionados com a(s) sua(s) simbologia(s). A uma origem oriental com propriedades mágicas e funerárias, ou fundamentalmente mágicas (Vazquez Hoys, 1984: 23), defendeu-se recentemente que o uso estritamente feminino deste tipo de objecto seria incompatível com o carácter viril dos guerreiros das estelas (Warmenbol, 2007: 389). Esta posição, com outros argumentos adicionais, levou à erradicação daqueles, passando as figuras até então tidas como espelhos a serem interpretadas, na íntegra, como lâminas de barbear14. Finalmente, e no que respeita ainda às duas estelas de Baraçal, diríamos que, pelos elementos representados e numa perspectiva estritamente evolucionista, Baraçal 2 seria (será?) posterior a Baraçal 1 pela presença do espelho, elemento considerado tardio, já de inícios do I milénio a.C., ainda que figure junto a uma espada de tipologia mais arcaica. Mas a sua ausência em Baraçal 1 não tem de ter uma leitura exclusivamente tipológica e cronológica, sendo também admissíveis razões de índole cultural e/ou ritual. Seja como for, do nosso ponto de vista, o que deverá ser sublinhado é a existência de duas estelas — independentemente da primazia de feitura de uma em relação à outra — que terão “funcionado” conjuntamente durante um determinado lapso de tempo, exprimindo mensagens potencialmente idênticas (ou próximas) e conferindo ao(s) espaço(s) que ocuparam um sentido particular no quadro do povoamento regional de finais da Idade do Bronze. De resto, se entendêssemos pertinente insistir na questão de uma cronologia muito precisa, mais do que a presença/ausência de certos elementos, seria de valorizar a técnica utilizada para os representar. No grupo das “estelas de guerreiro” peninsulares, e não obstante o crescendo dos achados durante a última década, Baraçal 1 mantém a exclusividade, assim o cremos, no uso do relevo (Estampa 8) 14 Veja-se discussão sobre o assunto em Vilaça, 2009.
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como técnica de representação dos motivos (não a gravação), conforme vários autores têm sublinhado, desde logo o responsável pela sua divulgação (Curado, 1984: 84). Como é sabido e tem sido igualmente sublinhado na bibliografia especializada, a utilização do relevo é indicador de arcaísmo, uma vez que é essa a técnica utilizada nos exemplares de “tipo alentejano”, datáveis do Bronze Médio, ou mesmo anterior, atendendo a alguns dos tipos de armas representados (Aubet e Serna, 1981: 245-246, entre outros). Assim, de um ponto de vista estritamente técnico, Baraçal 1 seria das mais antigas do seu grupo e, porventura, muito próxima das últimas da série alentejana. Mas se o seu carácter exclusivo no conjunto total das estelas do Bronze Final necessita ainda de cabal explicação, mais fácil é entender o recurso a uma técnica que, sendo característica dos exemplares a seu tempo designados de “tipo I ou alentejano” (Almagro, 1966), não deixou de ser igualmente utilizada em outros testemunhos beirões globalmente coevos destes últimos, como Ataúdes, onde se conjugam a gravura e o relevo (Vilaça et alii, 2001: 73), ou predominantemente este, no caso da designada “estátua-menir de Corgas” (Donas, Fundão), que tivemos oportunidade de observar em visita proporcionada pelo Museu Municipal do Fundão durante a realização das Jornadas a que estas actas respeitam. Com este novo achado, entretanto publicado (Banha et alii, 2009), reforçam-se os elementos que, a pouco e pouco, não só demonstram que “não podemos falar de ermamento da região” [i.e. a Beira Baixa ao longo de quase todo o II milénio a.C., ou seja, do Bronze Antigo e Médio] (Vilaça, 2000b: 173), como ajudam a entender o que ocorrerá na fase seguinte, de que as duas estelas do Baraçal são elucidativos exemplos. Enquadramento arqueológico e valorização cultural Como vimos, o achado da estela de Baraçal 2 ocorreu num imóvel rústico, reaproveitada como banco de quintal, o que lhe diminui, obviamente, o interesse que à partida teria caso tivesse sido encontrada em “condições primárias”. Este conceito é por nós entendido num sentido lato, que ultrapassa o de mero “achado in situ”, ou seja, aplicamo-lo àquelas situações em que há indicadores que oferecem alguma segurança quanto ao ambiente de origem. Por exemplo, o achado de uma estela numa linha de cumeada sem quaisquer outros indícios de ocupação humana, designadamente histórica, oferece bastas garantias de uma proveniência local ou muito próxima. Não é essa, porém, a situação presente. Ainda assim, há que valorizar o ambiente rural do achado e, principalmente, a existência da outra estela encontrada a menos de 2 km. Jamais saberemos se algum dia as duas estelas do Baraçal estiveram implantadas a alguns metros de permeio, ou se se distanciavam a dezenas ou mesmo centenas de metros entre si. É possível, tendo em conta diversas situações congéneres de achados formando conjuntos como as quatro de Torrejón el Rubio, as três de Valencia de Alcântara, as três de Cabeza del Buey, as seis de Capilla, etc.
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Sem nos afastarmos muito da região em que nos centramos, verificamos que nuns casos, até porque evidências empíricas assim o permitem, parece ser correcto associá-los a ambientes funerários com tumulações, como sucede com o conjunto de Hernán Pérez (Almagro Basch, 1972; Almagro Gorbea, 1977: 192). Em outras circunstâncias, e na ausência de indícios mais específicos, a associação de várias estelas num mesmo lugar poderá ser entendida como definição de espaços sagrados ou rituais (mas não necessariamente funerários), desde logo porque se verifica uma das principais evidências subjacente a qualquer acto ritual: o carácter repetitivo. Por exemplo, a situação do Monte de S. Martinho (Castelo Branco) pode ser encarada nesta linha, com os seus três monumentos definindo um possível santuário, hipótese, aliás, já preconizada por Almagro Basch (1966: 39) e que reiteradamente um de nós (R.V.) tem assumido, não obstante outros indícios arqueológicos permitirem atribuir-lhe a designação de “povoado”, o que não é absolutamente contraditório (Vilaça, 2000a: 38; 2004: 60; 2008). O próprio Tavares Proença (1905: 14) admitiu que “de son ensemble je crois pouvoir conclure qu’ils ont été l’object d’un culte” (sublinhado nosso). E, nesta linha, Jorge de Alarcão (2001: 333-334), numa reinterpretação da estela 1 de S. Martinho, avançou mesmo com a possível identificação de uma divindade — “Oipaingia” —, ladeada por dois adorantes15. Num outro registo, não descartamos a hipótese de determinados conjuntos de estelas, como estas duas do Baraçal, expressarem poderes de chefias com carácter hereditário (no seio de uma mesma família em sentido alargado, por exemplo) ou mesmo a existência de lideranças duplas, conforme já foi admitido a propósito de outros testemunhos, inclusive funerários, de que a Roça do Casal do Meio (Sesimbra) constitui supremo exemplo (Vilaça, 1995: 404-405; 2000: 38; 2008; Vilaça et alii, 2004: 160; Vilaça e Cunha, 2005: 54-55). E, continuando a presumir que as duas estelas do Baraçal formariam um conjunto (com outras, eventualmente?), coloca-se o problema do seu local de implantação original. Na depressão, junto a antigo caminho, a escassas dezenas de metros do Ribeiro do Moinho Fernandes, que conduz ao Côa, na zona onde foi encontrada a de Baraçal 1? Ou na vertente sobranceira onde se desenvolveu a aldeia e se encontrou a de Baraçal 2 (Estampa 1)? Ou talvez ainda a sua proveniência possa corresponder à linha de cumeada — situação que tantas vezes se verifica — que se desenvolve a sul, sobranceira à aldeia (Estampa 2), a escassas centenas de metros e de onde se percepcionam os povoados mais próximos e globalmente coevos das estelas, concretamente Vila do Touro e Caria Talaia (Estampa 1). Todas estas considerações não passam de suposições, tal como o é a hipótese 15 Nas recentes considerações desenvolvidas por Tejera Gaspar et alii, (2006) a propósito do conjunto de estelas do Monte de S. Martinho e da possibilidade de constituir um santuário, ignoram-se todos os contributos de investigadores portugueses a esse propósito, designadamente os de Mário Varela Gomes e de Jorge de Alarcão.
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de, originalmente, e como agora, não formarem conjunto algum, correspondendo antes a situações física e intencionalmente afastadas. No entanto, não podemos deixar de sublinhar que, tendo em conta a geologia do suporte das peças, que é o mesmo, e que corresponde ao soco rochoso das imediações do local de achado de Baraçal 116, é muito provável que tenham ambas a mesma proveniência, ou, pelo menos — o que não deixa de ser bem diferente —, que tenha sido a mesma “pedreira” a fornecer as bases para os monólitos. Num caso ou noutro, associadas ou distanciadas, estas estelas não devem ser considerados testemunhos isolados e, menos ainda, descontextualizados. E qualquer que tenha sido a sua função, ou funções específicas, Baraçal 1 e Baraçal 2 terão sido, sempre, instrumentos estratégicos integrados num mesmo sistema conceptual de percepção do espaço e de marcação de territórios por parte das comunidades que, na viragem do II para o I milénio a.C. habitaram a região. Encontradas sensivelmente a “meio caminho” entre as estações arqueológicas de Vila do Touro e de Caria Atalaia, globalmente e em parte contemporâneas, estas estelas tanto poderão ser entendidas como marcos físicos de delimitação interterritorial (Ruiz-Gálvez Priego e Galán Domingo, 1991: 269; Galán Domingo, 1993: 41) e, por isso, elementos de constrangimento aos distintos grupos humanos, como o contrário, o da sua afirmação. Em qualquer dos casos, com motivos simbólicos gravados na pedra e, por conseguinte, perenes, as estelas revelam a “faceta memorialista das comunidades” (Vilaça, 2000a: 39) na sua relação e apropriação efectiva, mas também afectiva, do/com o espaço. Localizadas nas periferias e fronteiras de territórios, poderiam ainda assumir, em determinados momentos, o papel de “pontos de encontro” intergrupais (Delgado Hervás, 2001: 349) ou de congregação social — o que não contraria a hipótese de “santuários” atrás formulada —, função que nem todos (a maioria) (d)os espaços habitados teriam capacidade de protagonizar. E, de facto, aqueles dois sítios, face ao que se conhece, não passariam de pequenos e modestos lugarejos, talvez pouco mais do que atalaias dependentes de outros povoados maiores, embora controlassem o metal. Ambos forneceram machados de bronze e, no caso de Caria Atalaia, recentes escavações confirmaram a ocupação do sítio na Idade do Bronze, incluindo os seus finais, com laivos culturais mesetenhos denunciados pela presença de cerâmicas de tipo Cogotas17. Como é evidente, preconizamos uma leitura obrigatoriamente paralela e articulada, ou seja, integral, destes vários marcos — estelas, metal e povoados —, como expressivos elementos de um processo dinâmico de produção social e identitária das comunidades no seu todo. Ainda relativamente ao potencial papel das estelas enquanto marcadores de 16 De facto, Curado encontra a primeira estela nos limites do soco correspondente à natureza de ambas as peças, enquanto a zona de achado de Baraçal 2 é caracterizada por um substrato diferente. 17 Escavações da responsabilidade de Raquel Vilaça e Marcos Osório recentemente concluídas, encontrando-se em preparação a respectiva memória para publicação.
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lugares de congregação de distintos grupos, queremos chamar a atenção para alguns aspectos relativos à iconografia que se constituem, em nosso entender, como importantes elementos de reflexão. Atrás referimo-nos a alguns deles: o predomínio dos escudos representados pelo reverso e a orientação oposta de espada e lança. Se estas evidências se podem prender com a “representação do utilizador” dessas armas e com a centralização do escudo, não podemos deixar de colocar outras hipóteses. Na verdade, e segundo a perspectiva do não utilizador — no caso, a comunidade que “observaria” —, um escudo invertido é também um escudo afuncional; duas armas que não apontam no mesmo sentido, tanto podem querer dizer que apontam em duas direcções, como não apontar a lado nenhum. De facto, muitas vezes, a disposição dos objectos nas estelas tem mais o ar de que estes se depositavam, simplesmente. Isto é particularmente evidente, por exemplo, nos casos de Torrejon el Rubio III ou de Quintana de la Serena (respectivamente Harrison C8 e 50) onde a disposição dos objectos parece caótica, como que fruto de um arremesso ao solo. Esta ideia de representação das armas de uma forma em que aparecem como “inofensivas” é particularmente expressiva quando a figura humana está presente: a espada encontra-se quase sempre à cintura — e o “quase” encontra-se aqui devido às excepções de Los Palacios (Harrison C73), em que um dos personagens segura a espada com a mão, e de Ervidel II (Harrison C89), em que a personagem principal surge com o braço direito erguido como que atirando a lança. Nas demais18, os braços ora se encontram (inertes?) paralelos ao corpo, ora se levantam de mãos nuas ao céu, em atitude de adoração. Nada, portanto, de ofensivo. No fundo, o que perguntamos é o seguinte: poderão as armas aparecer representadas de uma forma em que não denotem violência mas precisamente o seu inverso? Esta perspectiva fará perfeito sentido se admitirmos que este tipo de peças marcariam lugares de congregação social e intergrupal e, como tal, neutros e condicionados por uma série de regras, entre as quais se destacaria a proibição do uso da violência. Neste sentido, como interpretar a presença de outros objectos? Sinais de acolhimento, de exibição e de permuta de bens de particular valor (espelhos, lâminas de barbear, pinças, pentes, fíbulas, ponderais)? Incluindo também a permuta de mulheres (Ruiz-Gálvez e Galán Domingo, 1991: 270; Galán Domingo, neste volume)? Evidências de outras actividades aí realizadas (carros, instrumentos musicais)? Não deixa de ser curioso que deposições de armas, higiene, rituais do corpo, música e banquetes (estes sem sinais evidentes nas estelas, como bem observou Harrison, 2004: 62-63) são temas recorrentes em momentos de paz na Ilíada de Homero, cujas fontes mais antigas parecem recuar ao Bronze Final (Lourenço, 2005: 7). Enfim, eis algumas reflexões proporcionadas pelo achado casual de mais uma estela que, conjuntamente com outras e em estreita leitura com os núcleos de po18 A este propósito não enquadramos nem a estela II de S. Martinho (Harrison C30), em que a arma (arco) se insere numa cena de caça, nem a de Gomes Aires (Harrison C88), que consideramos de cronologia já sidérica.
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voamento coevos, i.e., na sua relação com povoados e achados metálicos, ajudam a configurar uma paisagem social simbolicamente marcada por elementos de forte impacto cultural, seja na versão intimidatória das armas, seja na distintiva, que objectos até então desconhecidos — os de âmbito mediterrâneo — proporcionariam. Por outro lado, esta estela e outras recém-encontradas na região da Guarda/ Sabugal-Salamanca/Cáceres, onde a presença recorrente de um desses elementos orientais — o espelho — condicionará a criação de novas tipologias (Celestino Pérez e Salgado Carmona, neste volume) e a própria reelaboração do conceito de “estela básica” como caracterizador da “Zona I”, conferem, definitivamente, a esta região um papel crucial na compreensão do fenómeno a que este volume diz respeito.
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Estampa 1 - Localização das estelas do Baraçal e dos povoados coevos mais próximos: 1-Baraçal 2; 2-Baraçal 1; 3 - Vila do Touro; 4-Caria Talaia.
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Estampa 2 - Paisagem, para norte (planalto da Guarda), desde o local com melhor visibilidade e mais próximo do achado da estela de Baraçal 2.
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Estampa 3 - Decalque da estela de Baraçal 2.
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Estampa 4 - Parte superior da estela de Baraçal 2, observando-se figura indeterminada e a lança.
Estampa 5 - Parte mesial da estela de Baraçal 2, observando-se o escudo.
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Estampa 6 - Parte inferior da estela de Baraçal 2, observando-se a espada e o espelho.
Estampa 7 - Estela de Baraçal 2 (verso e reverso).
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Estampa 8 - Estela de Baraçal 1. (Fotografia de José Pessoa , DDF - IMC)
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Nova peça insculturada da região raiana do Sabugal (Beira Interior, Portugal): uma primeira abordagem Raquel Vilaça1, Marcos Osório2, André Tomás Santos3
Resumo Apresenta-se o estudo da mais recente estela da região do Alto Côa, encontrada no núcleo urbano de Aldeia Velha (Sabugal), com particularidades formais e iconográficas que a distinguem das já conhecidas nesta zona e que justificam uma análise detalhada. Abordam-se em pormenor os aspectos técnicos, morfológicos e simbólicos, em especial o facto de nesta estela terem-se juntado, aos elementos clássicos, outros de difícil interpretação, geradores de uma composição figurativa complexa. Discute-se também a sua proveniência, valorizando-se a proximidade daquele núcleo urbano relativamente ao povoado proto-histórico do Sabugal Velho e ao recinto pétreo da serra do Homem de Pedra, com sugestivo topónimo que suscita diversas considerações sobre a sua natureza. Faz-se ainda a articulação da estela com os núcleos e achados proto-históricos próximos, bem como com todas as estelas conhecidas nesta zona geográfica. Palavras-chave: Alto Côa, Bronze Final, Estela, Capacete, Recinto. Abstract We present the study of the most recent discovery of a stele in the Alto Côa region, found in the urban core of Aldeia Velha (Sabugal), with formal and iconographic peculiarities that distinguish it from those already known in this area and which justify a detailed analysis. We discuss in detail the technical, morphological and symbolic aspects, especially the fact that in this stele it has been joined, to the classical elements, other ones difficult to interpret, generating to a complex figurative composition. We also discuss its origin, located near two interesting archaeological sites: the proto-historic settlement of Sabugal Velho and the stony enclosure of the Serra do Homem de Pedra, with a suggestive name which raises several considerations on its nature. We did the articulation of this finding with the cores and proto-historic findings near and all the steles known in this geographical area. Key words: Alto Côa region, Late Bronze Age, Stele, Helmet, Enclosure.
1 Instituto de Arqueologia. Departamento de História, Arqueologia e Artes da Universidade de Coimbra. CEAUCP (FCT). E-mail – [emailprotected]. 2 Câmara Municipal do Sabugal. CEAUCP (FCT). E-mail – [emailprotected]. 3 Parque Arqueológico do Vale do Côa, IGESPAR I.P. CEAUCP (FCT). E-mail – [emailprotected].
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Introdução Após a descoberta, na década de oitenta do século passado, das estelas de Baraçal e dos Fóios (Curado, 1984; 1986), e depois do aparecimento (Maio de 2006) de uma outra estela na povoação de Baraçal (Santos et al., neste volume), mais recentemente, foi identificada uma nova peça insculturada na região do Sabugal, desta vez em Aldeia Velha. Tal como aquelas, a que ora se publica é datável, genericamente, de finais da Idade do Bronze. Todavia, em termos formais e iconográficos possui especificidades que justificam particular atenção, seja pela presença de determinados motivos que aparecem representados pela primeira vez em monumentos desta natureza na região, seja mesmo pelo tipo particular de suporte. Entre aqueles, destaca-se a figura de um capacete, bem como um outro motivo que, em rigor, é de difícil interpretação. Quanto ao tipo de suporte, deve ser sublinhado que a sua concepção formal, em forma de pilar, com quatro faces bem delineadas (embora só uma historiada), a afastam dos suportes de tendência mais lajiforme, comuns à maioria das estelas4, o que lhe confere inequívoca imponência. A identificação desta peça foi inicialmente divulgada na imprensa regional, não só com propósito noticioso de carácter genérico, mas também de sensibilização da população local em relação ao património arqueológico da sua terra (Osório, 2009b). Com este texto, pretende-se agora, e ainda numa primeira leitura, dar a conhecer diversas facetas deste interessante e não menos problemático exemplar. Como veremos, várias questões ficaram em aberto, exigindo futura atenção e reanálise de determinados aspectos que não pudemos esclarecer, pelo que o presente texto deverá ser entendido como uma primeira aproximação ao seu conhecimento. Circunstâncias de achado No seguimento da surpreendente descoberta da estela de Baraçal 2 (Santos et al., neste volume), nada fazia prever o aparecimento de mais um testemunho, agora, e de novo, na zona oriental do concelho do Sabugal, não muito distante dos Fóios, onde, como vimos, tinha já sido encontrada uma estela (Curado, 1986). O interesse arqueológico do monólito foi confirmado por um de nós (M. O.), em Março de 2008, após indicação do seu proprietário, o Sr. Ulisses Fonseca Pires, morador em Aldeia Velha. No decurso de uma visita que efectuara à exposição permanente do Museu do Sabugal, informou os respectivos serviços que possuía uma pedra semelhante às estelas dos Fóios e do Baraçal, patentes na exposição. Imediatamente, tomaram-se todos os procedimentos necessários e adequados para confirmar a au-
4 Infelizmente, nem sempre as publicações existentes apresentam informações completas acerca da morfologia das estelas, nomeadamente sobre as secções, o que limita uma análise rigorosa sobre esta questão.
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tenticidade do achado, recolhê-lo e trazê-lo em condições para o Museu5. A peça encontrava-se deitada no pavimento do quintal anexo da adega do proprietário, na esquina da Rua da Calçada com a Rua do Teotónio, em Aldeia Velha. Segundo informação do Sr. Ulisses, estava aí há muitas décadas, tendo chegado a servir de suporte de pipas, mas ignora-se o seu local de proveniência original, pois já não há memória oral das circunstâncias de achado. Dizia-se que ela teria vindo do povoado do Sabugal Velho, mas tal informação poderá ter sido sugerida pelo facto de ser o sítio arqueológico mais conhecido e próximo, situado a cerca de 2 km a sudoeste da aldeia. É uma possibilidade, porém. O certo é que se trata de uma descoberta em meio urbano, tal como Baraçal 2 e, por conseguinte, com grandes limitações de estudo em termos contextuais, territoriais e paisagísticos, que se desejaria. Não obstante estes condicionamentos, justifica-se uma caracterização genérica do marco geográfico da região que, a uma macro-escala, define o seu contexto6. Localização e enquadramento geomorfológico A povoação de Aldeia Velha situa-se a cerca de 20 km para nascente do Sabugal, com acesso pela estrada municipal 551, ficando apenas a 6 km da fronteira com a Espanha. Administrativamente, é sede de freguesia do concelho do Sabugal, distrito da Guarda. O local de achado é assinalado na CMP n.º 227 (1: 25.000) com as coordenadas UTM 29 TPE 681,34/4468,26. O aglomerado estende-se pelo cume e vertentes de um relevo pouco destacado, com 890 m de altitude. Daí obtém-se um controlo visual de toda a extensa plataforma do Alto Côa, que mais não é do que o prolongamento, Beira adentro, da superfície da Meseta. Para norte, o olhar alcança o alto de Sacaparte, Aldeia da Ponte, Jarmelo e Marofa; a poente define-se a Serra Alta (um relevo com 1.100 m de altitude máxima, popularmente designado por Serra da Aldeia Velha), em cujas estribações setentrionais foi fundado o povoado do Sabugal Velho, e que se prolonga para sudoeste com o nome de Serra do Homem de Pedra, de que voltaremos a falar; para sudeste avistam-se ainda os topos da Xalma e das Mesas. A formação topográfica é contornada por diversas linhas de água, entre elas a ribeira de Aldeia Velha, que desce das encostas setentrionais da Serra Alta, atinge a cota base da plataforma mesetenha e inicia o seu percurso para norte, desaguando no Côa, a c. 22 km de distância. A aldeia situa-se na margem direita deste importante afluente do Alto Côa. A proximidade ao curso de água e à respectiva veiga de cultivo, toponimicamente denominada de Alagoa, tornam o local propício a primitivo assentamento humano, de que, porém, não são conhecidos quaisquer vestígios. Em torno do aglomerado obser5 Não podemos deixar de louvar, quer a iniciativa do proprietário ao oferecê-la desinteressadamente a uma entidade pública, onde a peça pode ser por todos usufruída, quer o empenho profissional dos funcionários da empresa municipal, bem como a disponibilização dos meios necessários para o efeito por parte da Câmara Municipal. 6 Consideramos inverosímil a hipótese de a estela não ser proveniente da região.
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vam-se diversas parcelas cultivadas com cereais, produtos hortícolas e pastagens, intercaladas com terrenos incultos, revestidos de giestas, carvalhos e alguns pinhais. O substrato geológico é dominado por granito porfiróide de duas micas, predominantemente biotítico, “de grão grosseiro com grandes e numerosos cristais de feldspato” (Teixeira et al., 1960: 11). Registam-se no interior, e sobretudo na periferia do aglomerado, abundantes afloramentos rochosos. No entanto, as serranias adjacentes são de substrato xistoso, passando a linha de contacto do granito com o xisto pela encosta norte da Serra Alta (Teixeira et al., 1960: 5). A região encontra-se integrada no chamado planalto da Guarda/Sabugal (Girão, 1951: 74), onde o elemento reinante e modelador da paisagem é a planura elevada, apenas intercalada por alguma tímida elevação e pelo declive do vale do Côa e seus afluentes. Inserida nesta plataforma topográfica, Aldeia Velha resguarda-se nos contrafortes setentrionais da serrania, estando por isso, discretamente enquadrada e ladeada a sul e poente por este acidente orográfico de elevada altitude, visível à distância (Estampa 5). Este facto possibilita que esteja protegida do lado sul e que obtenha um domínio visual da paisagem do quadrante norte. Em termos regionais, a zona convive com o sistema montanhoso da Cordilheira Central, representado em Espanha pelas Serras de Guadarrama, Gredos, Gata, Peña de Francia e Xalma, com orientação ENE-WSW, e que se prolonga pelo território português, respeitando a mesma orientação, pelas serranias das Mesas e da Malcata, continuando depois pelas serras da Estrela e da Gardunha. Conjuntamente, todas elas terão sido, desde sempre, uma importante barreira natural, mas também é sabido que, desde tempos muito remotos, tal não impediu que as comunidades a atravessassem e circulassem no seu seio através de corredores, portos de montanha, etc. O monólito 1. Metodologia de registo A metodologia de registo7 utilizada é similar à que se aplicou, por exemplo, no estudo da estela de Baraçal 2 (Santos et al., neste volume) e que recordamos sucintamente: limpeza e decalque sobre plástico de cristal transparente pouco espesso com canetas de tinta permanente de várias espessuras e cores, seja para os limites das faces historiadas (ponta M – vermelho), para as fracturas, fissuras e outros acidentes naturais das peças (ponta F – vermelho), seja para as gravuras (a negro com canetas de ponta M ou F, consoante o nível de pormenor exigido pelos sulcos). O decalque foi feito com recurso a luz rasante provinda de holofote fotográfico de 1000 wats, rodando em torno da peça, de forma a garantir o registo de todos os sulcos e picotados. A este trabalho seguiu-se o desenho das secções das peças à escala 1:20, em 7 Os trabalhos de limpeza e registo decorreram nas instalações do Museu do Sabugal em Junho, primeiro, e de novo, nos finais do mês de Julho de 2009.
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papel milimétrico. Os eixos ortogonais a partir dos quais se procedeu ao registo daquelas foram assinalados no plástico, de forma a garantir a integração de ambos os desenhos após a redução dos mesmos. 2. Análise técnica e descrição O monólito apresenta configuração sub-rectangular com ligeiro estrangulamento no terço inferior (Estampa 1). As secções longitudinal e transversal são, respectivamente, poligonal e sub-rectangular. O campo gravado da peça foi grosseiramente preparado; neste sentido, é particularmente relevante que ressaltos naturais do suporte tenham sido ignorados na gravação quer da lança quer do motivo desconhecido a que nos referiremos. Para a sua confecção foi escolhido granito porfiróide de grão médio a grosseiro de cor acinzentada, com ocorrências de feldspato de grande tamanho (granito “dente de cavalo”), predominante, aliás, na região. Actualmente apresenta 188 cm de altura, atingindo a largura máxima de 53 cm. A espessura é bastante regular, andando em torno dos 26-28 cm. Como já deixámos subentendido, a composição figurativa da peça de Aldeia Velha é complexa. Trata-se de uma “estela de guerreiro”. Aos elementos estruturais característicos das estelas básicas (Celestino Pérez, 2001) — escudo, lança e espada — juntaram-se-lhes outros, nem todos de fácil identificação, que lhe conferem um lugar pouco ortodoxo neste mundo das estelas e estátuas-menires de finais da Idade do Bronze. O repertório consiste, de cima para baixo, nos seguintes elementos (Estampas 1 e 2): capacete e sugestão de face humana, motivo multicurvilíneo, lança, escudo, espada, covinha e sulco. Como a peça se encontra fracturada no topo, o capacete (Estampa 3), de morfologia genericamente cónica, também possui a extremidade superior incompleta. Na parte central foi gravado um triângulo de base recta; sob esta e no prolongamento dos lados daquele marcou-se um sulco meândrico que poderá corresponder a decoração, viseira ou simulação dos olhos. Esta leitura não é absolutamente segura, na medida em que temos algumas dúvidas na existência de uma ligação inequívoca (embora por nós representada) entre os dois semicírculos. Imediatamente abaixo foram gravadas duas covinhas alinhadas horizontalmente e apostas no alinhamento do eixo vertical do capacete; em redor deste conjunto foi gravado novo triângulo com os lados paralelos ao interior e com a base semielíptica. Finalmente, um sulco arranca a partir do prolongamento da base do triângulo interior (do lado esquerdo do observador) e rodeia pela base todo o conjunto, desenvolvendo-se paralelamente a este. É dúbia a sua leitura. Poderia evocar a representação da barba, mas também alguma outra espécie de adereço, como uma aba horizontal em torno do capacete, representada segundo uma perspectiva semitorcida. Ignoramos o que poderá ser o motivo seguinte (Estampa 4). Apresentamos, a
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título de hipótese, uma leitura sequencial interpretativa. Orientado para a esquerda do observador, o motivo, compósito, apresenta contorno irregular com predomínio de linhas curvas, com vaga semelhança aviforme; sobre o que seria a cabeça deste último foi gravado um rectângulo de cantos arredondados; da base do que seria o peito arranca sulco curvo com a extremidade distal orientada para o centro da composição; a partir do que seria a cauda desenvolve-se sulco recurvado para o exterior, cujo terminus envolve covinha. Segue-se a composição central com lança, escudo e espada. A lança (Estampa 1), com 46 cm de comprimento, está orientada à direita e foi gravada com a lâmina ligeiramente inclinada; esta é foliforme, não apresentando qualquer nervura central; a haste é simples. O escudo (Estampa 1), com o diâmetro de cerca de 40 cm, está representado por três círculos concêntricos e uma oval com o eixo maior paralelo à abraçadeira, de forma rectangular com cantos arredondados; os três círculos têm escotaduras em V à direita, sendo que o mais excêntrico apresenta vestígios de um possível esboço circular anterior à representação daquelas; a abraçadeira tem o seu eixo maior alinhado com o das escotaduras. A espada (Estampa 1) possui 28 cm de comprimento e apresenta uma lâmina com o lado superior recto e o inferior com a ponta convexa, o que poderá indicar que se trata de uma arma de um só gume e não de uma verdadeira espada; o punho possui forma genérica de triângulo com a base virada para cima e o vértice menor adossado à lâmina, o que reforça aquela hipótese. A sua orientação é contrária à da lança8. No terço inferior do monólito gravaram-se ainda uma covinha isolada e um sulco linear que se desenvolve de forma tenuemente diagonal em relação ao eixo menor da peça. Tecnicamente, todo o conjunto foi conseguido por picotagem, com diferentes graus de profundidade. A modalidade indirecta foi usada no escudo, no capacete e no motivo desconhecido — a avaliar pelos seus picotados mais profundos (que podem atingir os 3 cm) — sendo difícil identificar qual a que terá sido utilizada nos restantes motivos. No caso do capacete é importante salientar que os motivos do interior apresentam picotados mais finos e menos profundos. A profundidade dos sulcos que definem a lança nunca ultrapassa os 2 cm; refira-se que quer a lâmina quer parte do cabo se encontram polidos. A espada é o motivo que apresenta os negativos menores e menos profundos, nunca ultrapassando 1 cm. Por outro lado, é aqui que se verifica a menor preocupação na definição do objecto, sendo mesmo muito difícil precisar a resolução gráfica da ponta. Em suma, trata-se, no seu conjunto, de técnica de gravação complexa que dificultou, em determinadas situações, uma leitura completamente segura. 3. Suporte, iconografia e análise comparativa Comecemos pela questão do próprio suporte. Não obstante a presença de mo8 Sobre esta temática, veja-se Santos et al., neste volume.
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tivos característicos das “estelas de guerreiro” ou “estelas do Sudoeste”, a peça de Aldeia Velha não é, em rigor, uma verdadeira estela. E embora se encontre historiada uma única face, a sua estrutura prismática e a evocação da representação de uma figura humana legitimam talvez como mais adequada a designação de estátua-menir9. Neste aspecto, se bem que não em muitos mais, aproxima-se dos monólitos I e III de S. Martinho (Castelo Branco), também eles com inúmeros problemas interpretativos10. Infelizmente, como já antes assinalámos, nem todas as publicações integram as secções das peças, pormenor que reputamos de fundamental. A atenção dada ao estudo dos suportes orienta-se para os tipos de matérias-primas em que são feitos — quase sempre de origem local e, evidentemente, aspecto a não negligenciar — e menos para aspectos formais. Pensamos, porém, que ao assunto deverá ser dada sempre especial atenção, particularmente quando passamos para o plano interpretativo e nos procuramos colocar na pele dos destinatários e na concepção dos hipotéticos cenários onde eram incorporados estes tipos de monumentos. Efectivamente, a tridimensionalidade da peça tem de ser tida em conta. E, mesmo que não gravadas, as restantes faces — dados os cuidados com a sua clara individualização — podem conter mensagens de menor expressividade icónica ou condicionar, de sobremaneira, a leitura total da peça, leitura essa que não se pode confinar, apenas, às gravações da face principal. O que aqui temos é a simulação de um modelo antropomorfizado (não interessa agora se guerreiro, vivo ou morto, se figura tutelar, heroicizada, ou divindade, etc.) e que não se restringe à face gravada, incorporando igualmente o próprio suporte, i.e., o corpo. A abordagem cognitiva em termos comunitários — modo como encaramos, e justificamos, a existência destas entidades arqueológicas — poderia ser feita, tal como nos acercamos de um corpo, a partir de direcções distintas e, nessa medida, o espaço cénico criado, e a sua percepção, não seria exclusivamente linear, mas circular. Devemos reter estas reflexões para quando chegarmos, mais adiante, e assumirmos, como hipótese verosímil, que não verificável, que o monólito de Aldeia Velha poderia ter integrado e polarizado um espaço circular monumentalizado em plena serra, onde a(s) comunidade(s) convergiria(m). Não menos importante é a sua dimensão, que merece ser sublinhada. Com os seus 188 cm é, conjuntamente com a estela de Baraçal 2, que atinge 190 cm (Santos et al., neste volume), dos monólitos com maior altura, superando a estatura normal de um indivíduo. Mas tendo presente a necessidade de ser parcialmente soterrada para manter verticalidade e estabilidade, é admissível (tendo também em conta a fractura no topo) que, do ponto de vista visual ficasse muito perto da estatura humana mediana. Assim, e ao contrário do simbolismo das estátuas e ícones colossais de que a História da Arte de todos os tempos e inúmeros lugares é profícua, esta proximidade dimensional no exemplar de Aldeia Velha poderá ser encarada não só em termos 9 A expressão designa, porém, realidades bastante distintas do Neolítico à Idade do Ferro. Sobre o assunto veja-se, por exemplo, Philippon, A. (dir.), 2002: 52-53. 10 Sobre o assunto vejam-se os principais contributos reunidos em síntese recente de Vilaça et al., 2004.
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técnicos e estilísticos, mas também como expressão voluntária de demonstração da entidade evocada fazer parte “dos seus”, i.e. com estatura e dimensão humanas, ou seja, da comunidade, de que é próxima e que nela se reconhece, mas — por aquilo que exibe (pelo menos armas e qualquer coisa mais) — com quem se não confunde. Neste sentido, a identidade (ou talvez melhor dizendo, a individuação) do personagem dá-se não pelo que ele é (corpo como os demais), mas pelo que ostenta. Como já referimos, em termos iconográficos o estudo interpretativo desta peça é difícil de se fazer. Nem todos os elementos estão identificados e a figura onde encontramos um capacete é complexa. A própria composição iconográfica como que nos convida a uma leitura a dois tempos. Terá ela alguma tradução também em termos cronológicos? Com efeito, a parte central do monumento integra a associação clássica das armas das estelas ditas básicas, mas essa centralidade já não equivale a protagonismo, uma vez que partilha com a parte superior, correspondente à cabeça, um notável equilíbrio. Naquele conjunto, o escudo mantém-se centralizador. Com três círculos e respectivas escotaduras, encontra paralelo próximo no escudo de San Martín de Trevejo (Cáceres) (García de Figuerola, 1982). A lança é de um tipo vulgar com ponta lanceolada, muito semelhante à de Baraçal 1 (Curado, 1984), tal como se vê em vários outros exemplares. Já a espada é de tipo menos comum, parecendo antes ser arma de um só gume com ponta curva, como um sabre. Formalmente aproxima-se da exibida na estela de Alburquerque ou Três Arroyos (Badajoz), não obstante apenas ser conhecido sumário desenho de Juan Cabré, visto que se encontra perdida. Como assinalou a seu tempo Almagro (1966: 61), neste caso é notória a sua semelhança com o machete do depósito de Lloseta (Maiorca), arma que também vemos figurada nas figurinhas de guerreiros sardos. Mas no monólito de Aldeia Velha, tal como nos de Baraçal 2 (Santos et al., neste volume), Pedra Atalaia 1 (Celorico da Beira) (Vilaça et al., neste volume), Puerto de Honduras (Cáceres) (Sanabria Marcos, neste volume), San Martín de Trevejo (Cáceres) (García de Figuerola, 1982) e Robleda (Salamanca) (Martín Benito, 2009), registam-se outros elementos que remetem a ideia da existência de uma Zona I definida por estelas básicas (com escudo, lança e espada), de acordo com a sistematização elaborada por Celestino Pérez (2001), para o campo da historiografia das estelas. O próprio autor revê o assunto numa completa e actualizada sistematização (Celestino Pérez e Salgado Carmona, neste volume). Como dizíamos, em Aldeia Velha a centralidade das três armas não é sinónimo de protagonismo. No conjunto, este é partilhado pela “cabeça” da peça onde, pelo menos, encontramos um capacete cónico. As motivações ideológicas e culturais específicas da sua inclusão são de difícil determinação, mas afigura-se, no contexto da “indumentária defensiva do guerreiro”, como complemento do escudo. Além do capacete, ou integrando-o, estão presentes outros elementos. A linha
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sinuosa inferior sugere, de imediato, uma viseira. No entanto, este artifício defensivo parece ser inexistente nos capacetes do Ocidente europeu, da Idade do Bronze Final. Por isso, inclinamo-nos mais para um elemento decorativo e simbólico no próprio capacete, que, junto com as duas covinhas alinhadas11, definiriam contornos anatómicos. Conhecem-se alguns exemplares, como o de Blainville (França) (Coutil, 1927: 363), que apresentam duas saliências circulares simétricas (equivalentes à linha sinuosa), ou como os capacetes de cornos de Vikso (Dinamarca), que ostentam olhos, sobrancelhas e nariz/bico na face frontal (Wester, 2000: 1216-1217). Independentemente destes pormenores de leitura nem sempre explícita, o facto é que se exibe um capacete de tipo pouco frequente12, visto que a primazia recai nos capacetes de cornos, os quais terão substituído os capacetes cónicos de tipologia atlântica (Harrison, 2004: 138-144; Celestino Pérez e López-Ruiz, 2006: 91). O exemplar em apreço encontra alguns dos seus melhores paralelos nas estelas da Zona II, com destaque para os de Zarza de Montanchez e de Santa Ana de Trujillo (Cáceres), este último também com crista (Almagro, 1966: 66-67 e lám. XV). Muito embora esta região não seja demasiado distante da do Alto Côa, deve ser sublinhado o registo, pela primeira vez nesta zona beirã, da representação de um capacete, tornando-a, simultaneamente, a mais setentrional de todas onde ocorre a representação de tais manifestações. Como é sabido, para os capacetes cónicos, e ao contrário dos de cornos, conhecem-se alguns, raros, modelos materiais em bronze, em solo peninsular, datáveis dos sécs. XI-X a.C. Em território espanhol destacam-se os fragmentos do depósito de Huelva, de dois tipos distintos, com e sem crista (Hencken, 1955-1956; Ruiz-Gálvez Priego, 1995: 62; 217-218 e lám. 249; Brandherm, 2008: 483). Os exemplares portugueses, de idêntica cronologia, resumem-se aos achados de Vila Cova de Perrinho (Vale de Cambra) (Brandão, 1963; Kalb, 1980: 29 e 43) e, eventualmente, do castro de Avelãs (Bragança) (Kalb, 1980: 29 e 43)13. Entre a cabeça e a ponta de lança encontra-se o motivo cujo significado desconhecemos e para o qual não identificámos quaisquer paralelos figurados ou referentes materiais (Estampa 4). Admitindo que corresponda a algo já representado nas estelas, poderíamos pensar num carro ou numa lira, mas somos os primeiros a rejeitar tais hipóteses. Como não pretendemos ter resposta para tudo, preferimos dizer, sim11 Estas covinhas poderiam representar dois pequenos orifícios ou ilhós, comuns nos capacetes, para prender uma jugular ou um francalete ao rebordo. Mas, existem outros exemplares com três ou mais orifícios no capacete que inviabilizam que este elemento fosse representado de forma tão pormenorizada. De facto estas covinhas ajustam-se mais a uma representação esquemática de narinas. 12 Entre os capacetes de tipo cónico, conhecem-se os seguintes casos em estelas: Santa Ana de Trujillo, Valencia de Alcantara III, Las Herencias I, Setefilla, Atégua, Almargen, Cabeza del Buey III e Solana de Cabañas (estes dois últimos são duvidosos, de acordo com vários autores, o que nos parece correcto). 13 Neste caso, os fragmentos são muito pequenos, o que limita, em nosso entender, a sua própria identificação como restos de capacete. Os de Vila Cova de Perrinho encontram-se em estudo por Carlo Bottaini e Alexandre Rodrigues.
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plesmente, que não sabemos o que representa, nem sequer, mesmo, se foi concluída a sua representação. Seja o que for, terá sido importante para figurar em lugar de destaque, em sintonia com os outros elementos. Por outro lado, não deixa de ser notório que, uma vez mais, nos deparamos com a presença de um objecto de difícil interpretação, quando é bem sabido que, normalmente, os motivos deste tipo de estelas se pautam por uma imediata e fácil identificação. De todo o modo, a figura de Aldeia Velha em nada se assemelha às também duvidosas que encontramos nas estelas de Esparragosa de Lares II (esquematização de lingote de pele de boi?) ou Capilla III (Celestino Pérez, 2001: 369, 374; 2008: 116). Por fim, não podemos deixar de fazer um breve registo sobre a questão da simultaneidade da representação dos diversos motivos, mesmo daqueles que são globalmente contemporâneos entre si. No caso em análise, é certo que não se verificam, do ponto de vista gráfico e com os mecanismos de controlo existentes, quaisquer indícios de ter existido mais do que um momento de gravação. Mas tal não é impossível, mesmo sem evidências empíricas. A hipótese de, num primeiro momento, ter apenas figurado a tríade escudo-espada-lança e só depois os restantes, não é de excluir. Tão-pouco a de aquela, conjuntamente com o capacete, corresponder a um “programa” de raiz, ao qual se juntou, a posteriori, o motivo não identificado, que parece “estar a mais”. É bem sabido que no heterogéneo conjunto das estelas e estátuas-menires a adição de novos elementos a outros previamente gravados, a rasura de motivos antigos — numa clara atitude de “contra-memória” —, a sua transformação, seja por correcções e adaptações pontuais, seja por profunda e completa subversão do pré-existente, inclusive com a reorientação em 180º da leitura cénica, como se verifica na de Aldea del Rey II (Ciudad Real) (Harrison, 2004: 281), foram práticas bem mais comuns do que se admitia até há algum tempo atrás (veja-se, entre outros, Celestino Pérez, 2001: 89-91; 412; Harrison, 2004: 44-51). Enquadramento arqueológico e questões em aberto A peça de Aldeia Velha encontrava-se reaproveitada, o que diminui o seu interesse e impossibilita a identificação do respectivo contexto original. Aparentemente, o estado de conservação sugere que não terá sido muito deslocada, mas é mera hipótese de fraca sustentação. Seria sempre possível recorrer ao seu transporte, mesmo em tempos mais remotos, numa carroça por exemplo, o que deixa em aberto qualquer possibilidade quanto ao seu local primário de origem14. Com base nos elementos disponíveis, afiguram-se-nos três hipóteses possíveis, mas não podemos descartar outras. A primeira é que tenha vindo das imediações do sítio onde se encontrava, por ventura da fértil zona de Alagoa, junto à aldeia, até porque não é incomum a asso14 Cfr. nota 6.
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ciação deste tipo de monumentos a veigas de cultivo, lameiros e campos de pastos. Não são conhecidos quaisquer outros registos arqueológicos nas proximidades. Na verdade, diversos autores (v.g. Galán Domingo, 1993: 35-36) têm relacionado as estelas e estátuas-menires com os mais variados recursos estratégicos, daquela ou de outra natureza, bem como a proximidade de vias naturais e caminhos ancestrais. Para esta região, já Fernando Curado tinha sublinhado, a propósito da estela dos Fóios, a importância daquelas últimas, bem como da riqueza mineira (estanho e cobre, além do ouro) de que a Beira Interior é privilegiada (Curado, 1986: 108; Vilaça, 1995: 71; 1998a: 351-352). A segunda, igualmente admissível, é a de uma proveniência mais afastada, nomeadamente da serrania, onde se situa o povoado do Sabugal Velho, com ocupação do Bronze Final e Idade do Ferro, para além da medieval (v.g. Osório, 2006). Neste caso, haveria que valorizar a proximidade de um sítio, correlação que também é possível estabelecer para outras situações, nomeadamente na região das Beiras, como a do Monte de São Martinho (Castelo Branco), onde as estelas apareceram em local com outros vestígios de ocupação humana (Proença Júnior, 1905; Vilaça, 1995: 404; 2000: 38; 2004), Meimão (Penamacor) (Rodrigues, 1958; Vilaça, 1995: 84; 402)15, Baraçal e Pedra da Atalaia, nestes dois casos numa relação espacial e visual com sítios de habitat (Santos et al., neste volume; Vilaça et al., neste volume)16. A proximidade entre estelas e povoados tinha sido já valorizada por Ana Martín Bravo (1999: 64) e discutida por Alarcão (2001: 325), assunto que recentemente também foi abordado por Enríquez Navascués (2006: 168) e Díaz-Guadarmino Uribe (2008: 38). A terceira, igualmente incerta, mas também mais ousada e, por isso, de interesse acrescido, é a que conjuga arqueologia com toponímia. Perante os dados, não podemos ficar indiferentes ao curioso topónimo de “Serra do Homem de Pedra”, designação da cumeada que se eleva a 1.135 m (marco geodésico), a cerca de 4 km para sudoeste de Aldeia Velha. É certo que o topónimo “Homem” repete-se em várias outras situações do território português, nunca associado ao aparecimento de estelas, estátuas-menires ou outros registos com figurações antropomórficas. Mas também é verdade que, no concelho do Sabugal, existe outro topónimo “Homem de Pedra” justamente na cumeada da serra da Malcata, muito próximo do local de achado da estela do Meimão17. 15 Prospecções realizadas no Verão de 2009 na serra da Malcata por dois dos autores (R.V. e M.O.), juntamente com António Martino Correia (aluno do 2.º Ciclo de Arqueologia e Território, FLUC), permitiram recolher informação adicional que confirma a existência de dormentes e moventes na área de achado da estela. 16 Situação similar configura-se para o recente achado da estela de Robleda (Martín Benito, 2009) e o povoado proto-histórico de Pico del Pozo de Los Moros, situado a cerca de 6 km a sul daquele local (Osório e Pernadas, no prelo). 17 Este topónimo vem registado no cadastro predial da freguesia da Malcata e aparece também nas cartas militares da década de 40, referindo-se à “Barroca do Homem de Pedra ou Ribeira da Porqueira”. Segundo fontes populares no local, o sítio está relacionado com o topo geodésico “Homem” (996 m), da
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Não se conhece qualquer estrutura arqueológica no local deste topónimo na freguesia da Malcata. No entanto, já no topo da serra entre as freguesias de Aldeia Velha e Soito, existem restos de um recinto pétreo subcircular18, composto por dois aneis concêntricos com um diâmetro máximo de 56,80/58 m, aos quais foi adossado, do lado norte, um curto alinhamento perpendicular recto (Estampa 6). A sua cronologia e função são indeterminadas. Também perto do sopé desta mesma cumeada, no sítio do Seixal, Cabeço Melhano, foi identificado um montículo artificial com cerca de 10 m de diâmetro, de cronologia igualmente incerta (Caninas et al., 2009: 27). Ambos os casos revelam que a serra era visitada e revisitada (?) desde tempos remotos. É certo que não podemos comprovar a associação do monólito de Aldeia Velha à Serra do Homem de Pedra, nomeadamente às estruturas circulares antes referidas, mas também parece evidente que o mesmo é “um homem de pedra” e que “homens de pedra” poderiam ser colocados no centro de estruturas pétreas, com e sem tumulus, isto é, definindo espaços monumentalizados de carácter evocativo, comemorativo, sepulcral, sagrado, ritual, etc.19. Esta questão conduz-nos ao célebre, embora longínquo, achado de Hirschlanden (Stuttgart), já da Idade do Ferro, estrutura com tumulus delimitada por anel pétreo no topo da qual se implantaria uma estátua de guerreiro (Zurn, 1971). Também recentemente foi apresentada interessante sugestão para as estelas de Almadén de la Plata (Sevilha), as quais poderiam ter feito parte de monumento tumular baixo mais antigo (García Sanjuán et al., 2006: 149). Permanecemos, porém, no campo das hipóteses… Num outro registo, deverá ser valorizada a proximidade entre os locais de achado dos monólitos de Aldeia Velha e dos Fóios (cerca de 6,5 km), e a sua equidistância Serra da Malcata, que lhe fica próximo. A estela do Meimão foi descoberta numa plataforma da vertente meridional desta cumeada, também apenas a 4 km para poente. Em visita ao local, verifica-se que os trabalhos de florestação remexeram profundamente o solo, não se detectando qualquer testemunho arqueológico. Por outro lado, a população da aldeia da Malcata não menciona a existência de quaisquer vestígios nesse cabeço, nem se recorda da razão de atribuição do nome de “Homem” ao relevo. 18 Entre 18 e 23 de Julho de 1988, um dos autores (R.V.) realizou uma pequena sondagem na Serra do Homem de Pedra a pedido do então Serviço Regional de Arqueologia da Zona Centro. O alerta tinha sido dado pelo Eng.º Fernando Curado, uma vez que acabara de ser construída uma torre de vigia de fogos, e respectiva casa de apoio pré-fabricada, sobre uma estrutura pétrea subcircular aí existente, com sugestiva construção mista de blocos de xisto e incorporação de afloramentos naturais. A torre e a casa foram implantadas sobre o anel interior, que atingiria cerca de 10,40 m de diâmetro interno e uma largura de 4 m, tendo-o destruído quase por completo. A partir da periferia deste anel e a cerca de 10,50 m formava-se o segundo anel cuja largura média rondava 5 m. A sudoeste e perpendicularmente ao anel exterior foi realizada uma sondagem de 10 x 2 m, e atingiu-se a profundidade máxima de 78 cm. Neste ponto a estrutura era constituída por pequenas lajes e pedras em xisto, a seco, tendo-se revelado totalmente estéril em termos de materiais. O local é merecedor de atenção, com meios adequados, limpeza do terreno e rigoroso levantamento topográfico (Vilaça, 1989). 19 Neste sentido é ainda interessante a referência oral para a existência, num relevo mais a norte e com menor altitude (apenas a 1059 m), do topónimo ‘Mulher de Pedra’ (informação de João Caninas e de Fernando Curado, que agradecemos) que, apesar disso, não evidencia qualquer estrutura arqueológica.
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ao recinto da serra do Homem de Pedra — entre 4,3 a 4,4 km, respectivamente nas vertentes opostas desta cumeada, certamente não por acaso. A estela dos Fóios foi encontrada acidentalmente. Mas decerto que não terá sido casual o seu achado precisamente à entrada norte da povoação, junto ao antigo caminho que faz a ligação àquela serra20. Irmanadas nas vicissitudes do acaso quanto à sua identificação, quer o monólito de Aldeia Velha, quer a estela dos Fóios, não podem ser dissociados do quadro do povoamento regional proto-histórico. Embora fixadas, imobilizadas, às estelas, como a qualquer outro monumento congénere, subjaz a ideia de movimentação, seja no sentido físico, implicando eventuais deslocações, visitações, pontuais ou cíclicas, da população, seja em termos cognitivos e cosmológicos inerentes às dinâmicas de produção e reprodução social das comunidades da Idade do Bronze regional. Os marcadores conhecidos desse povoamento resultam de alguns trabalhos de prospecção, escavação e diversos achados avulsos, mas nunca a região do Alto Côa foi sujeita a um projecto sistemático e direccionado para o seu estudo. Recordemos que nesta área encontraram-se diversos artefactos metálicos de bronze, alguns de grande qualidade e significado cultural, que manifestam, pelo menos desde finais do II milénio a.C. importante presença humana (Estampa 8): da Lageosa do Côa provêm dois machados de bronze, em Aldeia do Bispo e Vila Boa foram encontrados dois escopros, em Vilar Maior a notável espada de lâmina pistiliforme indissociável do sítio de habitat (Vilaça, 2000: 41), para além das referências, não confirmadas, ao aparecimento de fragmentos de machados em Caria Talaia (Ruvina) e Sabugal Velho (Aldeia Velha) (Vilaça 1995: 85; 2008: 45)21. Por outro lado, estão também bem identificados diversos núcleos na área mais imediata de achado da peça de Aldeia Velha. Entre eles, enumeram-se os sítios abertos em terrenos planálticos da Matrena (Aldeia da Ponte) e Carapito (Aldeia da Ribeira), bem como os assentamentos do Seixo (Alfaiates), Seixo Branco (Aldeia da Ribeira), Castelos de Ozendo (Quadrazais), Alfaiates, Caria Talaia (Ruvina) e Sabugal Velho (Aldeia Velha), que evidenciam manchas de ocupação de características homogéneas, ocupando lugares elevados, pontualmente defendidos com estruturas, e mantendo uma boa intervisibilidade (Osório, 2005; Vilaça, 2008). Destes, apenas o Sabugal Velho e Caria Talaia foram sujeitos a escavações arqueológicas. No Sabugal Velho foram detectados, no decurso de várias campanhas de escavação, restos preservados de duas edificações habitacionais e da muralha, de 4 m de largura, com provável entrada a ocidente, de acesso indirecto, guarnecida com torreões, socalcos e contrafortes defensivos. Entre o espólio exumado enumera-se cerâmica de fabrico manual ou a torno, sem traços morfológicos ou decorativos espe20 Informação já antes sugerida por Fernando Curado, a quem também devemos a chamada de atenção para a existência do topónimo “Serra do Homem de Pedra” e do seu potencial interesse arqueológico. 21 Compilando bibliografia específica anterior.
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cíficos: incisões no lábio e cepilhados superficiais; decoração impressa com penteados ondulados e entrecruzados; decoração estampilhada com semicírculos concêntricos; e ainda um conjunto de cerâmicas torneadas, de cozedura oxidante, com pastas finas e depuradas, algumas com motivos pintados em bandas de cor vínica. Destaca-se igualmente um escopro de bronze de secção quadrangular, uma fíbula de tipo Acebuchal (sécs. VI-V a.C.) e outra de tipo anular em ómega (sécs. III-II a.C). Estes materiais permitem datar a ocupação do sítio desde o final da Idade do Bronze até à II Idade do Ferro (Osório, 2006: 120). Em Caria Talaia (Ruvina), a extensão da intervenção arqueológica foi bastante menor e as condições de jazida revelaram-se muitíssimo destruídas, com ténues vestígios de estruturas e alguns materiais como mós de vaivém, utensílios e adornos de pedra polida, e cerâmicas várias, com destaque para as incisas e impressas de âmbito mesetenho. A ocupação é atribuível à Idade do Bronze, com duas possíveis fases22. Notas finais e outras considerações ainda Não obstante a existência das limitações a que nos referimos no início, o achado desta peça reveste-se de uma importância extraordinária. Desde logo, é elemento que reforça a configuração de importante núcleo de achados de “estelas do Sudoeste” em torno do Ocidente da Cordilheira Central, atribuindo-lhe (à região) papel de destaque na viragem do II para o I milénio a.C. Note-se que em termos de localização geomorfológica não se verifica unanimidade (Estampa 7), já que umas estelas se integram em plena cordilheira montanhosa (Meimão, Fóios, Aldeia Velha, San Martin de Trevejo e Hernán Pérez), enquanto outras, não serranas, privilegiaram as zonas planálticas de relevos suaves (Baraçal 1 e 2, e Robleda). Simultaneamente, confere-lhes (às estelas) uma dimensão de maior “atlantização”23, i.e. resultante do seu carácter indígena, de resto já inerente a determinados motivos representados. Por outro lado, a própria forma do suporte levanta importantes questões quanto à pretensa uniformidade de um fenómeno que em termos de percepção pode variar muito. Na verdade, para além do evidente paralelismo gráfico do conjunto espada-escudo-lança, será que podemos comparar peças que são praticamente bidimensionais (porque sob lajes) com esta cujo trabalho de “escultura” sobre a pedra lhe proporcionou uma já referida tridimensionalidade? Se a isto acrescentarmos o facto, que deve ser igualmente sublinhado, do aparecimento da mesma temática sob outras formas como seja a arte rupestre (Gomes, 1989; Vilaça, 1998b: 208 e 214; Collado Giraldo, 2008: 321; Galán Domingo, neste volume), a lógica impele a que nos afastemos das hipóteses que pretendem explicar de uma forma global e unívoca um fenómeno que só é individualizável praticamente devido a uma evidente recorrência da gravação de 22 As escavações do sítio, recentemente concluídas, foram da responsabilidade de Raquel Vilaça e de Marcos Osório, encontrando-se o respectivo estudo em preparação. 23 Em que também se insere a estela de Cervos (Alves e Reis, neste volume).
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certos motivos. Mesmo do ponto de vista técnico, e excluindo casos em que se recorreu ao relevo, como em Baraçal 1 (Curado, 1984), a gravação envolve formas diversas de peça para peça, inclusive “dentro” da mesma; poderá este facto condicionar também a mensagem a transmitir? O certo é que, como referimos anteriormente, o picotado não é homogéneo ao longo do reportório figurativo presente no caso em estudo. Será, por exemplo, uma casualidade a existência de uma diferença técnica na área do capacete? Não será esta uma das razões que tornam o motivo tão ubíquo de interpretar ao ponto de nele podermos ver uma face com capacete, um capacete antropomorfizado ou um simplesmente decorado? Não será esta ubiquidade intencional? E não ajudará essa ubiquidade, conjuntamente com a disposição dos motivos representados, a “encontrarmos” aqui um corpo onde apenas se observa um pilar? Em termos de temática, o suporte pétreo foi guarnecido com os principais atributos de um “modelo” de guerreiro da época, quer de carácter ofensivo (espada e lança), quer defensivo (escudo e capacete). É precisamente a presença do capacete, mas também do motivo indeterminado, e simultaneamente “intruso”, que isola esta peça das restantes. A questão do motivo indeterminado é importante. Pese o facto de este corresponder a algo que na época seria percebido por toda uma “zona cultural”, a verdade é que a existência de alguns motivos isolados e que não são de reconhecimento óbvio pode-nos levar a presumir a existência de diversos níveis de leitura de uma mesma peça, ou melhor, na possibilidade de se encontrarem diversas audiências em mente na altura em que o monumento foi erigido: uma com origem geográfica mais abrangente e portadora de símbolos em comum (a tríade escudo-espada-lança), outra de origem mais local, única conhecedora das referências por trás de determinados motivos. Este aspecto afigura-se-nos da maior relevância em termos de negociação da identidade e poder por parte das comunidades. Uma outra questão recorrente prende-se com a finalidade das estelas. Poderão as diferenças ao nível do suporte, da técnica e da temática corresponder a diferentes “funcionalidades”? Um importante contributo para o aprofundamento deste problema residiria na identificação do contexto original da peça sobre a qual nos debruçamos. Contudo, e infelizmente, também ela foi encontrada em condições de reaproveitamento, tal como já tinha acontecido com as demais da região, situação que nos impede de identificar os respectivos contextos originais. A confirmação de que o recinto do Homem de Pedra corresponderia ao local original da peça e o aprofundamento da caracterização deste sítio seriam de capital importância. Basta pensarmos nas diferenças deste sítio com, por exemplo, o de Pedra da Atalaia, na Serra do Ralo, para nos apercebermos da importância da questão (Vilaça et al. neste volume). Mas não podemos ignorar outras possibilidades, sendo igualmente bastante sugestiva a proximidade de um dos povoados proto-históricos mais importantes desta região, o Sabugal Velho.
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É bem sabido que são muito diversas as situações de proveniência das estelas: topo de colinas, crista de cumeadas, encostas, ambientes montanhosos, planícies fluviais, etc. Mas se pensarmos que outras estelas vizinhas e coevas cuja proveniência está bem determinada — Meimão, San Martín de Trevejo ou Atalaia 1 — têm sempre uma situação de domínio face à envolvente paisagística, então será de supor que o factor da visibilidade é importante independentemente de possíveis diferenças ao nível dos contextos específicos dos sítios. Com efeito, nesta altura, na região, o poder “residia” ou emanava n(d)o alto, mormente por aí se encontrarem as comunidades (Vilaça, 1998b; 2000). Em outro texto (Vilaça et al. neste volume) admitiu-se a hipótese de os sítios onde se encontram estas peças poderem comportar a dimensão de locais polarizadores de negociações intergrupais. Negociações desse tipo tanto se poderiam dar nos limites dos territórios (como poderia ter sido o caso de Pedra da Atalaia), em necrópoles ou em recintos de elevado valor simbólico, como seria o caso do de Homem de Pedra, se se confirmasse ser essa a proveniência da peça. Se assim tivesse sido, erguido na crista de elevado relevo e presente nos horizontes das comunidades que os testemunhos materiais atrás referidos evocam (Estampa 8), o monólito não só seria referente n(d)o espaço, como tutelaria todo um território envolvente, fomentando sentimentos de pertença e identidade. Independentemente destes aspectos, parece ser certo que, de forma directa ou indirecta, o fenómeno de territorialização, qualquer que tenha sido a sua natureza, ainda que aqui e sempre expressando poder, acaba por estar implícito. Mais que não seja, a par das mensagens veiculadas pelos contextos específicos de cada sítio e das traduzidas pelas peças (suporte + temática), o(s) território(s) foram mais um recurso manipulado pelas comunidades que erigiram e viveram estes monumentos. A integração simbólica do espaço no devir social das comunidades é, aliás, algo que no Bronze Final se observa a diversos níveis: controlo das vias de comunicação (Ruiz-Gálvez Priego e Galán Domingo, 1991; Vilaça, 1995), reapropriação de sítios anteriores — sejam estes necrópoles (v.g. Fonte da Malga, Viseu) (Kalb e Höck, 1979), sítios de arte rupestre (v.g. Fial, Tondela) (Santos, 2008), deposições de artefactos (Vilaça, 2007), ou mesmo sítios de habitat (Valera, 2008) —, etc. E, por fim, mais uma vez ainda – importa sublinhá-lo – a sintomática coincidência das estelas, como a de Aldeia Velha, com a riqueza mineira (estanho, ouro e cobre) do interior beirão rasgado por importantes corredores naturais de circulação (Vilaça, 1995: 71, 412, 420).
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Estampa 2 – Fotografia da estela de Aldeia Velha.
Estampa 1 – Decalque da estela de Aldeia Velha.
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Estampa 3 – Pormenor dos elementos existentes no topo da estela.
Estampa 4 – Pormenor de outros elementos centrais.
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Estampa 5 – O impacto da Serra do Homem de Pedra na paisagem do Alto Côa, desde noroeste.
Estampa 6 - Vista aérea do recinto circular pétreo da Serra do Homem de Pedra, a torre de vigilância de incêndios e o marco geodésico.
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Estampa 7 - Mapa de localização das estelas conhecidas na zona em torno da Serra da Gata / Malcata: 1 - Pedra da Atalaia (Celorico da Beira); 2 - Baraçal 1 (Sabugal); 3 - Baraçal 2 (Sabugal); 4 - Meimão (Penamacor); 5 - Aldeia Velha (Sabugal); 6 - Fóios (Sabugal); 7 - San Martín de Trevejo (Cáceres) ; 8 - Hernán Perez (Cáceres) ; 9 - Robleda (Salamanca).
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Estampa 8- Mapa de distribuição das estelas e do povoamento conhecido na zona do Alto Côa: 1 - Baraçal 1 (Sabugal), 2 - Baraçal 2 (Sabugal), 3 - Meimão (Penamacor), 4 - Fóios (Sabugal), 5 - Aldeia Velha (Sabugal), 6 - Serra do Homem de Pedra (Soito), 7 - Alto da Pena (Vila do Touro), 8 - Caria Talaia (Ruvina), 9 - Sabugal, 10 - Sabugal Velho (Aldeia Velha), 11 - Vilar Maior, 12 - Seixo Branco (Aldeia da Ribeira), 13 - Matrena (Aldeia da Ponte), 14 - Alfaiates, 15 - Alto do Picoto (Forcalhos), 16 - Seixo (Alfaiates) , 17 - Castelos de Ozendo (Quadrazais), 18 - Lageosa da Raia, 19 - Aldeia do Bispo, 20 - Soito, 21 - Vila Boa, 22 - Malcata.
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La estela decorada del Puerto de Honduras (Cabezuela del Valle, Cáceres) Primitivo Javier Sanabria Marcos1
Resumen En este trabajo se da a conocer una nueva estela decorada, de las denominadas de guerrero, localizada en el término municipal de Cabezuela del Valle, provincia de Cáceres. La estela se encontró en la Sierra de la Cabrera, en lo alto del Puerto de Honduras, paso natural entre los valles del Jerte y de Ambroz. Su lugar de aparición lo convierte, por el momento, en el monumento más al Noreste de la provincia y, por extensión, del foco originario de las estelas, ampliando así el área de dispersión geográfica de este tipo de manifestaciones hacia zonas más orientales donde este tipo de hallazgos permanecían ausentes. El hecho de que no se conozca ningún ejemplar más allá del valle del Jerte, concretamente en tierras de la comarca de La Vera y valle del Tiétar, nos sirve para proponer en torno al valle jerteño su consideración de espacio de frontera entre distintos territorios pertenecientes a entidades culturales diferentes. Palabras clave: Bronce Final, Estelas de guerrero, Pasos de montaña, Territorios políticos, Áreas culturales. Summary This essay announces a new decorated stele, of the so-called warrior steles, located at the municipal area of Cabezuela del Valle, in Caceres County. The stele was found at the mountain range of La Cabrera, at the top of Honduras Pass, natural passage between the Jerte and Ambroz Valleys. Its apparition place turns it, for the moment, into the most northeastern monument of the County and, by extension, from the original focal point of the steles, enlarging this way the area of geographic dispersion of this kind of expressions to more eastern areas where this kind of discoveries had kept absent. The fact that it is not known any precedent futher away from The Jerte Valley, specifically in the lands of La Vera and Tiétar Valley, can be used to suggest around the Jerte Valley, its consideration as frontier land between the different territories belonging to different cultural entities. Keywords: Late Bronze Age, Warrior steles, Mountain passages, Political territories, Cultural areas.
1 Arqueólogo, [emailprotected].
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Introducción Se tenía conocimiento de la existencia de la estela por una breve referencia en un trabajo publicado en el año 2006 por Sebastián Celestino y José Luis Blanco. Son pocos los detalles que se aportan sobre la misma, una escueta alusión a su lugar de procedencia en el Puerto de Honduras y a su inclusión en el grupo de estelas o losas de guerrero de composición básica, lo cual sirve a los autores para ampliar el área de expansión de este tipo de estelas, consideradas de las más antiguas, hacia el Noreste de la provincia de Cáceres (Celestino y Blanco, 2006: 31)2. Dado el enorme interés que suscitaba este nuevo ejemplar de estela decorada, rápidamente nos pusimos en contacto con los descubridores para contemplar la posibilidad de su traslado al Museo de Cáceres. De esta manera, en virtud de lo dispuesto en el artículo 55.2 de la Ley 2/99 de 29 de marzo de 1999 de Patrimonio Histórico y Cultural de la Comunidad Autónoma de Extremadura, el que esto suscribe, en aquel tiempo técnico arqueólogo del Museo de Cáceres, acompañado por uno de sus descubridores, D. José Luis Gurría Gascón, y de dos miembros de la Sección del SEPRONA de la Guardia Civil de la Comandancia de Cáceres, nos desplazamos al lugar del hallazgo para su traslado e ingreso en el Museo de Cáceres3. Su ingreso se produce el 19 de junio de 2008, fecha desde la que forma parte de la importante colección de estelas del suroeste que alberga este museo4. Localización La estela se localizó en la vertiente Norte de la Sierra de la Cabrera, en los Montes de Tras la Sierra, a escasa distancia del Puerto de Honduras, dentro de los límites del término municipal de Cabezuela del Valle (Cáceres). Los Montes de Tras la Sierra son una extensa y abrupta formación montañosa situada al Noreste de la provincia de Cáceres, que se extienden en dirección Noreste Suroeste, constituyendo la prolongación meridional de la Sierra de Béjar (Salamanca). Forman parte ambas, de las últimas alineaciones montañosas del Macizo Occidental de la Sierra de Gredos, que junto a las sierras de la comarca de Las Hurdes, Sierra de Gata y su prolongación en tierras portuguesas (Sierras de La Malcata y de La Estrella), conforman las cordilleras Suroccidentales del Sistema Central. Los Montes de Tras la Sierra componen un imponente macizo granítico con elevaciones que 2 El descubrimiento de manera casual de la estela se debe a Ana Hernández Carretero y José Luis Gurría Gascón (Celestino y Blanco, 2006: 92, nota a pie). 3 Quisiera aprovechar para expresar mi gratitud a José Luis Gurría Gascón y a Ana Hernández Carretero por contarme, de primera mano, las vicisitudes del hallazgo; igualmente, agradecer al SEPRONA de la Guardia Civil de Cáceres el interés mostrado, desde el primer momento, por colaborar en dicho asunto. 4 La estela pasa así, a formar parte del depósito definitivo de las colecciones de la Sección de Arqueología del Museo de Cáceres con el número de inventario D-7204, Depósito de la Junta de Extremadura. Agradezco al Director del Museo de Cáceres, D. Juan Manuel Valadés Sierra, las facilidades dadas para el estudio y publicación de la estela.
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superan los 2000 metros de altitud; es el caso del Calvitero, que con sus 2400 metros es el pico más elevado de la zona, sirviendo de límite entre las actuales provincias de Salamanca, Ávila y Cáceres, y a su vez, entre la Sierra de Béjar y los Montes de Tras la Sierra. Por debajo de los 2000 metros, pero de especial interés para nuestro estudio, se encuentran otra serie de enclaves; el nacimiento del río Ambroz está próximo a los 1900 metros de altura, mientras que El Camocho y Valdeamor con sus 1826 y 1847 metros, respectivamente, son las cotas de mayor altura en el entorno próximo al lugar del hallazgo. De esta manera, desde las estribaciones finales de la sierra bejarana, los Montes de Tras la Sierra penetran en territorio cacereño erigiéndose como una auténtica barrera natural entre los valles del Jerte y de Ambroz. El lugar exacto en el que se localizó la estela se encuentra en las faldas más septentrionales de la Sierra de la Cabrera, a una altitud de 1440 m.s.n.m. y a escasos 800 metros de distancia de la cima del puerto de la actual carretera que comunica las localidades de Hervás y Cabezuela del Valle. Sus coordenadas UTM son las siguientes: 255442/4455824. Es una zona de pronunciada pendiente con multitud de gargantas y manantiales de agua natural, precisamente la estela apareció a poco más de 50 metros de la margen izquierda de la Garganta de Honduras, cerca de su lugar de nacimiento y próximo, también, al paraje conocido como Fuente del Moro. En su descenso, la Garganta de Honduras se une a la Garganta de la Luz que irá a desembocar en la margen derecha del río Jerte, una vez que éste haya dejado atrás Cabezuela del Valle. El alto del Camocho Redondo con sus 1687 metros de altura se levanta a la espalda del lugar del hallazgo, pero son el Canchal Aguililla (1481 metros) y los Canchales Negros (1622 metros), los que se erigen como los verdaderos balcones que controlan el paso del puerto (1430 metros). Es, en definitiva, la posición dominante de la estela sobre el entorno, el dato más destacable de cuanto vengo sosteniendo, ya que su privilegiada posición en lo alto del paso natural del puerto la convierte en un referente paisajístico visual del camino de subida procedente del valle del Jerte (Estampa 1). Trabajos de contextualización arqueológica Cuando visitamos por primera vez el sitio, junto a la estela y recostada sobre una de ellas, se encontraban tres grandes piedras de granito que, a priori, podrían guardar relación con la estela. Esto era algo sobre lo que, previamente, ya habíamos sido advertidos por uno de los descubridores, Ana Hernández Carretero. Planteada la posibilidad de que las piedras pudieran haber estado asociadas a la estela y dado que nos encontrábamos ante una ocasión única de posible localización in situ de un monumento de estas características, solicitamos permiso de excavación arqueológica a la Dirección General de Patrimonio Cultural de la Consejería de Cultura y Turismo de la Junta de Extremadura con el objetivo de poder confirmar: primero, la vinculación del conjunto de piedras a la estela, es decir, si las piedras podrían haber funcionado como elemento de sujeción complementario de la estela, y segundo, y más importante, dada la funcionalidad funeraria como marcadores de tumbas que tradicionalmente
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se les ha atribuido a este tipo de manifestaciones, corroborar arqueológicamente tal supuesto (Estampa 2). A lo largo de su, ya dilatada, historia de investigación, las estelas han sido siempre consideradas elementos sin contexto arqueológico localizados de manera aislada en el paisaje. Esta situación de ausencia de contexto arqueológico convencional (Galán, 1993: 22, 31-32; 2000: 1792; 2008: 2, 7), ha dado lugar a sobrevalorar los escasos ejemplos en los que se conocía un mínimo indicio de éste, primando por encima de cualquier otro su carácter funerario, sirvan para ello los clásicos casos de las estelas de Solana de Cabañas (Roso de Luna, 1898; Almagro, 1966), Granja de Céspedes (Almagro, 1962, 1963, 1966), Setefilla (Bonsor y Thouvenot, 1928; Almagro, 1966, 1974; Aubet, 1981) y Boux I (Müller, Bouville y Lambert, 1988), o el más reciente de las estelas del Cortijo de la Reina (Guadalcázar, Córdoba) (Murillo et al., 2005: 25-34). En este sentido, sigue siendo todavía hoy excesivo el peso de estas propuestas en la investigación sobre el significado y funcionalidad última para el cual fueron erigidas las estelas. Los trabajos más recientes en los que se han dado a conocer nuevos ejemplares de estelas, los autores sí han hecho especial hincapié en el trabajo de contextualización, destacando el realizado por el grupo de la Universidad de Sevilla, encabezado por Leonardo García Sanjuán, de prospección sistemática e intensiva del entorno en el que aparecieron las estelas de Almadén de la Plata (Sevilla) (García et al., 2006). Fue esto precisamente, la posibilidad de contextualizar con metodología arqueológica el lugar de aparición de la estela, lo que nos impulsó a intervenir. Una vez que la estela fue depositada en el museo, iniciamos los trabajos arqueológicos5. Se procedió, en primer lugar, al desbroce manual alrededor del conjunto pétreo, y ya desde este primer momento, observamos que las piedras en cuestión, no eran simples calzos empleados para mantener erguida la estela, sino que se trataba de tres grandes bloques macizos de granito, muy pesados, con una morfología muy regular y dimensiones bastante similares. Dos de ellos, se encontraban parcialmente enterrados, dispuestos verticalmente, mientras que el otro afloraba por completo en superficie y se asociaban a él varias piedras de menor tamaño que le servían de calzo. Tomando como punto central el lugar donde se encontraban los tres grandes bloques de piedra, se planteó una cuadrícula de 2,5 metros de ancho por 3 metros de largo orientada de Sureste a Noroeste con respecto al Norte magnético. Desde el punto de vista estratigráfico, la excavación resultó ser extremadamente sencilla, al estrato superficial de tierra vegetal (UE. 1), le seguía un estrato de arena fina muy suelta de color amarillento claro (UE. 4), sedimento natural del terreno, propio de la descomposición del granito, roca natural que caracteriza todo el entorno. A pesar de profundizar más de medio metro en el estrato geológico, no se documentó indicio arqueológico alguno que hiciera plantear la continuidad de los trabajos. En este sentido, los resultados de la 5 La excavación se llevó a cabo los días 25 a 27 de julio de 2008. Una vez más pude contar con la inestimable colaboración de Miguel Ángel Díaz Moreno y José María Señorán Martín, a ambos mi reconocimiento.
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excavación fueron concluyentes: por debajo de la zona intervenida no apareció absolutamente nada. Quiere esto decir que, si contemplamos el lugar de aparición de la estela como el que ocupó originariamente, se tiene que concluir que, ni sirvió de marcador de tumba ni por supuesto bajo ésta se localizó un enterramiento; tampoco que los grandes bloques pétreos formaban parte de ninguna estructura compleja diseñada para enfatizar monumentalmente el sitio de enterramiento; por otro lado, lo que sí demostró la excavación arqueológica es que hubo un especial cuidado en mantener calzados todos y cada uno de estos grandes bloques, ¿el motivo?, mantener en pie visible la estela. Es importante señalar que en su parte posterior la estela tiene pintado el símbolo de coto privado de caza. Tal vez, ésta podría ser la clave para interpretar conjuntamente piedras y estela, los enormes bloques de piedra habrían sido empleados en época reciente para sostener verticalmente la estela, la cual más de 3000 años después volvería a ser utilizada para el propósito que fue concebida, erigirse en posición vertical para trasladar información a través de un código de símbolos con un significado perceptible por sus observadores. Esto, por otro lado, no invalida el que la estela pudiera encontrarse realmente in situ, más bien todo lo contrario, aprovechando para ello el tamaño que ésta ofrecía, se reutilizó con un sentido práctico actual para transmitir también un mensaje. Si acaso esto es sólo una explicación para relacionar la estela a las piedras que la acompañan, cabría preguntarse si esta asociación no es tan casual y si existiría ya en época prehistórica; si ésta pudo ser más frecuente de lo que las escasas ocasiones el registro arqueológico permite estudiar, y por último, si aceptamos, como todo parece sugerir, su localización in situ y convenimos que no posee función funeraria, parece que otro tipo de explicaciones, basadas en aspectos relacionados con su situación en el paisaje, cobran mayor fuerza a tenor de lo expuesto. Morfología, tecnología y elementos representados La estela presenta una morfología y unas proporciones excepcionalmente regulares, lo que indica un esmerado empeño por parte del tallador encargado de su elaboración. Mide 1, 24 metros de longitud, aunque originariamente debió ser algo mayor ya que el extremo superior de la estela se encuentra fragmentado. Alcanza una anchura máxima de 62 cms tanto en el tercio superior como en el inferior, mientras que en la zona central ésta es de 59 cms. También su grosor es muy regular, oscila entre 13-14 cms, siendo 15 cms el grosor máximo. Estas dimensiones confieren a la estela un aspecto esencialmente paralelepípedo bastante homogéneo (Estampa 3). Los dos laterales muestran claros signos de haber sido profusamente trabajados, más evidente en el lado derecho que ofrece una superficie completamente alisada y una sección cuadrangular. Menos elaborado e irregular es el aspecto del lateral izquierdo, aunque es aquí donde son más perceptibles las huellas o marcas dejadas por los canteros; en este sentido, tan diferente tratamiento de los laterales de las estelas, parece guardar relación con la forma de obtención del soporte de la roca madre por parte de los canteros (Celestino, 2001: 85).
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La cara frontal presenta una serie de grietas y alteraciones naturales en la mitad inferior de la estela, lo que reduce a la mitad superior el espacio para las representaciones, actualmente, debido a la fragmentación que sufre la estela en su parte superior, la zona distal resulta, sino más amplia, de similares proporciones que la destinada a grabar. La parte trasera de la estela, sin desbastar, no muestra un tratamiento especial ni grabado alguno. Para la realización de la estela se utilizó una materia prima local, el granito. Teniendo en cuenta las dificultades de preservación de las representaciones en este tipo de soporte, el grado de conservación de éstas, en el caso que nos ocupa, es bastante bueno. Son cuatro los objetos representados: tres, escudo, espada y espejo, son fácilmente identificables, por el contrario, la representación de la lanza podría ofrecer más dudas (Estampa 4). Repite un esquema compositivo conocido en otros ejemplares donde el escudo ocupa una posición predominante en el centro de la estela; la lanza siempre aparece representada longitudinalmente encima del escudo, mientras que la espada lo hace por debajo de éste. Mucho más variable resulta el sitio escogido para representar el espejo, basta con repasar las estelas en las que estos cuatro únicos objetos aparecen representados con claridad, para observar que las reglas no son tan fijas; por ejemplo, en San Martín de Trevejo (García de Figuerola, 1982) aparece representado en el lado derecho, entre el escudo y la espada; en la recientemente publicada de Baraçal (Vilaça, 2007: 150, fig. 15; 2008: 46-48, fig. VIII) debajo de la espada6; en la de Torrejón el Rubio IV (Galán, 1993: 95, fig. 22 y 98, nota a pie; Celestino, 2001: 333) encima del escudo, entre éste y la lanza; en la de Alburquerque-Tres Arroyos (Cabré, 1923) encima de la lanza; por último, en la del Puerto de Honduras, el espejo aparece representado en la esquina superior derecha de la estela, entre el escudo y el lugar que debería ocupar la lanza. Tres círculos concéntricos realizados mediante un profundo trazo inciso representan el escudo. Equidistante respecto a los extremos de la estela, ocupa la posición más destacada en el centro de la misma. A pesar de ser más irregular en el círculo exterior, por coincidir con una hendidura natural de la piedra, los tres círculos presentan la característica escotadura en V. En el interior del círculo más pequeño se representó el asidero del escudo; de forma rectangular, se encuentra alineado con las escotaduras, las cuales están orientadas hacia la izquierda. No se representaron clavos o remaches en el escudo. El escudo alcanza un diámetro de 34 cms, mientras que las medidas del asidero son 11 cms de largo por 5,5 cms de ancho. Con un trazo inciso menos profundo y ancho que el escudo se representó la espada. No aparece longitudinalmente a éste, sino que se dispuso de forma oblicua, con la empuñadura arriba y la punta de la espada hacia abajo, orientada a la derecha, aprovechando el poco espacio que quedaba para grabar por debajo del escudo. La empuñadura, con los bordes del mango paralelos, se encuentra separada de la hoja por una suave línea incisa 6 La misma posición que ocupa en la estela de Pedra da Atalaia (Celorico da Beira, Guarda) (Raquel Vilaça, André Tomás Santos y Sofia Melo Gomes, en estas mismas jornadas).
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transversal. No parece observarse remaches en el pomo. La espada se representó con una hoja considerablemente ancha. De filos rectos pasa a ensancharse hacia la mitad distal de la hoja rematando en punta. La espada presenta un largo total de 44 cms y un ancho máximo de la hoja de 5,5 cms, con una empuñadura de 8 cms de largo y 5 cms de ancho. A pesar del escaso detalle y esquematismo con el que en la mayoría de los casos se ha representado este objeto, esto no ha impedido que se ensayaran tipologías para las mismas basándose en los pocos ejemplares recuperados en el registro arqueológico7. A la derecha, por encima del escudo, se representó el espejo. Considerado un elemento de lujo producto de los contactos comerciales establecidos con el mundo mediterráneo, pasa por ser uno de los objetos que más debate ha suscitado en la búsqueda de paralelos reales al no haberse encontrado, hasta el momento, ningún ejemplar en la zona en la que se desarrolla el fenómeno de las estelas del Suroeste, ni tan siquiera en toda la Península Ibérica. Quisiera destacar que estamos ante la representación grabada sobre una estela que con mayor realismo se acerca a los tipos de espejos que en estos momentos se conocen en el Mediterráneo, fundamentalmente en la isla de Cerdeña (Italia) (Lo Schiavo, 2000: 84; Ruiz-Gálvez, 2005: 263, fig. 5). Se trata de ejemplares realizados en bronce de disco ovalado y mango calado similares al objeto representado en esta estela. Mediante un profundo trazo inciso se dibujó el mango, de 12 cms de largo por 4 cms de ancho; de forma alargada, dos círculos incisos en su interior representan el detalle del calado. Por su parte, el disco, con una forma ovalada, se realizó con un trazo inciso mucho más fino que no permite distinguir si éste se cerraba por completo en la zona de contacto con el mango. El largo total del espejo es de 23 cms, mientras que el diámetro del disco es de 11 cms (Estampa 5). Ya advertimos cómo la representación de la lanza es la que más dudas podría ofrecer. Su posición natural debería ser la de ir representada de manera longitudinal sobre el escudo; sin embargo, si recordamos, el extremo superior de la estela se encontró fracturado, por lo que en caso de haberse representado en su posición original ésta se perdió, tal vez, a consecuencia de haberse desplomado sobre el suelo. Creo que la lanza nuevamente volvió a grabarse aprovechando una grieta natural que atraviesa de izquierda a derecha el escudo por encima de la abrazadera, empleando esta vez una técnica distinta para diferenciarla de los objetos representados previamente (Estampa 5). Mediante un rebaje bastante irregular, que no parece haberse realizado por un especialista, se representó el extremo final del astil y la punta de la lanza. Aunque no impide la identificación del espejo, la lanza se extiende superponiéndose hasta el centro mismo del disco de aquél, mostrando claramente haber sido realizada con posterioridad. Obtendríamos así unas medidas totales de 44 cms de largo, correspondiendo 32 cms a la grieta que recorre el interior del escudo y 12 cms al extremo final de la lanza.
7 El caso más reciente lo encontramos en el magnífico trabajo sobre las espadas del Bronce Final en la Península Ibérica y Baleares de Dirk Brandherm (2007: 134-155).
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Recapitulación y conclusiones finales Hasta aquí hemos centrado nuestra atención, de manera particular, en aspectos relacionados con la localización, contextualización y caracterización morfológica y estudio descriptivo de los distintos objetos representados en la estela. Ha llegado el momento de analizar este nuevo ejemplar en un marco general más amplio de explicación del fenómeno de las estelas decoradas del Suroeste de la Península Ibérica durante el final de la Edad del Bronce. Con una larga trayectoria de más de 100 años de investigación desde la publicación de los primeros ejemplares, han sido numerosísimos los trabajos dedicados a dar respuesta al significado último por el cual fueron erigidos estos monumentos8. Considerados tradicionalmente elementos destinados a cubrir o marcar las tumbas de los guerreros cuyos símbolos de poder y ostentación aparecen representados en ellos, hasta el día de hoy, el registro arqueológico no ha ofrecido una prueba sólida en este sentido, dicho de otra manera, mediante metodología arqueológica, ya sea prospección o excavación, no se ha podido vincular ninguno de los lugares en los que se recuperaron las estelas con posibles zonas de enterramiento ni individual ni colectivo, entendiendo por éstas las necrópolis. La posibilidad de que la estela en estudio pudiera encontrarse en el lugar originario en la que se erigió, ofrecía una magnífica oportunidad de contrastar arqueológicamente las viejas hipótesis sobre su funcionalidad. A esto se sumaba el que asociados a ésta, se encontraran varios soportes pétreos de gran tamaño que podrían haber formado parte de algún tipo de estructura relacionada con la idea de monumentalización de la estela9. Si como creo es válida la premisa de que la estela pudiera estar in situ, los trabajos arqueológicos pusieron de manifiesto dos cosas; primero, que a pesar de que las piedras presentaban calzos para su sujeción, no había indicios claros de que éstas fueran coetáneas a la erección de la estela, y segundo, que bajo los grandes bloques de piedra no aparecieron restos arqueológicos ni nada que hiciera pensar que allí hubo un enterramiento. Me inclino a pensar que si no encontramos evidencias de enterramiento, es porque éste nunca se produjo. En conclusión, si como propongo se acepta el que la estela se encontró en el lugar en el que inicialmente se erigió y que ésta no funciona a modo de marcador de tumba, tal vez, su explicación debamos buscarla en relación con el entorno en el que ésta se inscribe, en la línea de los trabajos desarrollados por Marisa Ruiz-Gálvez y Eduardo Galán. Para estos autores, las estelas están relacionadas con lugares de paso 8 Desde el primer gran corpus de estelas de Almagro Basch (1966), antes Ramón Fernández Oxea en 1950 había realizado la primera sistematización de las existentes hasta ese momento, el interés de los investigadores por el tema no ha hecho sino aumentar. Para no extenderme excesivamente en este sentido, me remito, irremediablemente, a los trabajos monográficos fundamentales de Barceló i Álvarez (1989), Galán Domingo (1993), Celestino Pérez (2001), o el más reciente de Richard J. Harrison (2004). 9 Esta misma idea, aunque relacionada con la posibilidad de que las estelas hubieran ido hincadas en un espacio monumentalizado, tal vez de tipo tumular, quizás con carácter funerario, es la que se ha sugerido recientemente para las estelas de Almadén de la Plata (Sevilla) (García et al., 2006: 149).
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obligado en el territorio; contemplan su aparición en el paisaje no como elementos aislados desprovistos de significación, es precisamente en su particular localización en relación a caminos antiguos, en las cercanías de los vados de los ríos o en las zonas de entrada o salida a los puertos de montaña, donde encontrar la explicación a esa ausencia de contexto convencional que tradicionalmente se les atribuye a las estelas (Ruiz-Gálvez y Galán, 1991; Galán, 1993). En este sentido, el caso de la estela del Puerto de Honduras quizás sea el ejemplo más claro de la relación de las estelas con zonas de pasos de montaña. Enclavada en lo alto de la Sierra de la Cabrera, se controla desde su privilegiada posición el final del camino natural de ascenso del puerto procedente del valle del Jerte (Estampa 6-7); parece clara, por tanto, la idea de señalizar el acceso al valle de Ambroz a aquel o aquellos que desde el valle del Jerte quisieran penetrar en este territorio. De esta manera, las estelas, o cuanto menos en nuestro caso, cumplirían la función de delimitadores de territorios entre distintos grupos, de acuerdo con las ideas expresadas por Eduardo Galán. Sin temor a equivocarnos, puede describirse esta zona como un auténtico punto nodal de comunicaciones, en el que tanto de Norte a Sur como de Este a Oeste, se atraviesan y ponen en contacto extensos territorios que también en el pasado jugaron un destacado papel. Esta encrucijada natural tiene en pasos de montaña y corredores el mejor reflejo de cuanto expongo. La Falla de Plasencia, también denominada Falla Odemira-Plasencia, probablemente no sólo sea uno de los más importantes accidentes tectónicos de la Península Ibérica, sino que con toda seguridad es la más destacada incidencia orográfica de la región extremeña. Atraviesa el Macizo Hespérico en dirección Noreste Suroeste con una extensión de aproximadamente unos 550 kilómetros, poniendo en contacto el Alentejo portugués con la provincia de Ávila. Directamente relacionada con ésta se encuentra el valle del Jerte, una depresión intramontañosa que se extiende a lo largo de 80 kilómetros desde el collado de Fuentidueñas (480 metros), al Sur de la ciudad de Plasencia, hasta el Puerto de Tornavacas (1275 metros), límite entre las provincias de Ávila y Cáceres y uno de los pasos tradicionales entre la Alta Extremadura y la Meseta Norte. El río Jerte discurre encajado por este angosto valle que separa los Montes de Tras la Sierra y la Sierra de Tormantos; los primeros, a través del Puerto de Honduras dan acceso al valle de Ambroz y las fértiles vegas del río Alagón, mientras que la Sierra de Tormantos comunica el valle del Jerte con la comarca de La Vera-Valle del Tiétar por los pasos del Piornal y el Pico del Puerto. No me cansaré de insistir en la importancia que desempeña el Puerto de Honduras al convertirse en el principal paso de montaña que, de manera directa y rápida, conecta transversalmente el valle del Jerte con las tierras más Noroccidentales de la Alta Extremadura a través del valle de Ambroz. Se posee desde su cima, una imponente perspectiva del territorio circundante, no sólo de gran parte del valle de Ambroz y del río que le da nombre, sino también de la comarca de Las Hurdes y la Sierra de Gata al Noroeste (Estampa 8).
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Pero por lo que realmente adquiere relevancia el valle de Ambroz, es por constituir históricamente el paso más Occidental de la península entre la Meseta Norte y la Sur. Atravesar el Puerto de Béjar se ha considerado la manera más sencilla de acceder por tierras salmantinas hacia la Meseta Norte. Menor importancia se le ha concedido a los pasos por los Puertos de Las Batuecas-Peña de Francia (en la comarca de Las Hurdes)10 y de Perales (Sierra de Gata) (Álvarez y Gil, 1988: 308), aunque conviene recordar que a escasos 6 kilómetros de distancia al Sur del Puerto de San Martín (Sierra de Gata), apareció la estela de San Martín de Trevejo (Cáceres) (García de Figuerola, 1982), mientras que la de Hernán Pérez (Almagro, 1972), hay que ponerla en relación con las rutas de descenso que procedentes de la Sierra del Moro (Sierra de Gata) y aprovechando los corredores naturales que constituyen los ríos Árrago y Tralgas, comunican esta zona central de la Alta Extremadura con la Meseta a través del corredor Hurdes-Gata (Señorán, 2006). Profundizando algo más en estos aspectos, la estela del Puerto de Honduras es, hasta este momento, la localizada más al Noreste de la provincia de Cáceres y por extensión, del fenómeno de las estelas del Suroeste. Encuadrable tipológicamente en las denominadas estelas de composición básica (Celestino, 1990, 1995, 2001), consideradas por la mayoría de investigadores las primigenias de una larga lista que, a día de hoy, no hace sino aumentar11, esencialmente se caracterizan por representar en estos primeros momentos las armas del guerrero, lo que ha hecho que también se conozcan con el nombre de estelas-panoplia (Galán, 1993). Se distribuyen, fundamentalmente, por la cuenca del río Tajo y la región de la Beira Alta portuguesa12, aunque se ha establecido en la Sierra de Gata el foco originario del fenómeno (Celestino, 2001: 44-ss.). Desde esta perspectiva, la estela del Puerto de Honduras no sólo se aleja considerablemente de aquél, sino que con independencia de abrir futuras líneas de expansión hacia zonas más orientales en las que las estelas hoy están ausentes, creo que su importancia es mucho mayor que esta suposición de futuro. El valle del Jerte y la comarca de La Vera-Valle del Tiétar, por el momento, se encuentran fuera del área de expansión de las estelas, de igual manera, que tampoco 10 Por el momento, procedente de esta zona central del Norte de la provincia de Cáceres no se conoce ningún ejemplar de estela decorada, sin embargo, sí es una zona con tradición grabadora donde estelas-guijarro, petroglifos y representaciones de arte esquemático han sido puestos en relación con zonas de paso de caminos antiguos (Ruiz-Gálvez, 1998: 178; Galán y Ruiz-Gálvez, 2001: 269-270). 11 Buen ejemplo de ello es la celebración de estas jornadas en las que se han presentado nuevos e interesantes ejemplares, por lo que, si en el último recuento de estelas su número ascendía a 117 (Celestino, 2008a: 112), con la incorporación de las estelas de Baraçal 2 (André Tomás Santos, Raquel Vilaça y João Nuno Marques), Aldeia Velha (Raquel Vilaça, Marcos Osório y André Tomás Santos), Tojais (Lara Bacelar Alves y Mário Reis), Puerto de Honduras y Pedra de Atalaia (Raquel Vilaça, André Tomás Santos y Sofia Melo Gomes), su número alcanza ahora los 122 monumentos. 12 Recordar en este punto la existencia de dos ejemplares también con representación de escudo, espada y lanza en el valle del Guadiana, la de Almendralejo-Arroyo Bonaval (Marqués de Monsalud, 1898) y Granja de Céspedes-Badajoz (Almagro, 1962, 1963, 1966) y otras dos en el valle del Guadalquivir, Córdoba I–Cortijo de la Vega (Morena y Muñoz, 1990) y Córdoba II-Cortijo de la Ribera Alta (Murillo, 1994).
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se extienden al Norte del Sistema Central, algo que podría resultar más extraño en el caso de las tierras salmantinas, donde sí existe una larga tradición de grabar sobre soportes pétreos en etapas anteriores. Parece, pues, que en torno al Sistema Central se establece una línea que permite sugerir la idea de que más allá de constituir una barrera física natural, ésta funcionaría como un espacio de frontera no sólo política y territorial, sino, fundamentalmente, de carácter cultural. La importancia de la orografía en la delimitación de áreas culturales, es algo que ha sido puesto de manifiesto en varias ocasiones para entender la evolución del patrón de poblamiento a lo largo de todo el primer milenio a.C. en la cuenca extremeña del río Tajo (Martín, 1999, 2009). No sorprendería así, el que uno de los elementos considerados diagnósticos del mundo meseteño, la tan extendida y característica cerámica Cogotas I (Abarquero, 2005), fuera tan sólo un hecho anecdótico dentro del repertorio cerámico de los grupos que habitaban al Sur del Sistema Central (Martín, 1999: 48; 2009: 148-150). Tampoco el que al Noreste de la provincia de Cáceres, concretamente el área correspondiente a la comarca de La Vera y las tierras del valle del Tiétar, no participen de los rasgos culturales que grosso modo definen el Bronce Final del resto del territorio extremeño; a la ya comentada ausencia de estelas decoradas de guerrero, se añade la de depósitos de bronce y orfebrería (Celestino, 2008b: 108), lo que podría estar en relación con un mayor grado de afinidad de esta zona respecto al ambiente cultural propio de la Meseta Norte. Este hecho apoyaría la idea de que en torno a una vía tan transitada históricamente en dirección Norte-Sur como es el corredor del valle del Jerte, pueda plantearse su consideración de espacio de frontera entre distintos territorios pertenecientes a entidades culturales diferentes. No debe obviarse que tanto los Montes de Tras la Sierra como la Sierra de Tormantos son zonas de alta montaña, verdaderos obstáculos naturales que, aunque no infranqueables, pudieron constituir algo más que una barrera física en esta zona que hoy se inscribe administrativamente al Noreste de la provincia de Cáceres. Podría encontrar así explicación como delimitador territorial, y como propongo también cultural, la localización de la estela en lo alto del Puerto de Honduras.
Agradecimientos Quisiera, antes de terminar, hacer presente mi agradecimiento a las siguientes personas por prestarme su ayuda en la preparación de este trabajo: Fernando Flores del Manzano, originario de Cabezuela del Valle y cronista oficial de la villa, me acompañó en un inolvidable recorrido por el Valle del Jerte; el Dr. Sebastián Celestino, tuvo a bien acercarse al Museo de Cáceres para conocer de primera mano la estela, aportándome interesantes ideas sobre su interpretación; agradecer también a la Dra. Marisa Ruiz-Gálvez, el compartir conmigo su visión del mundo de las estelas del suroeste y proporcionarme la bibliografía necesaria para mejorar ciertos aspectos de este trabajo. Tampoco quiero olvidarme de Ana Cristina Rojo
Estelas e Estátuas-menires: da Pré à Proto-história Domínguez, Ana García Martín, José Miguel González Bornay, Luis Manuel Otero Saavedra Alcaide, David y José Antonio Gutiérrez Romero, Carmen Cerro, Miguel Ángel Díaz, José María Señorán y, en especial, de José Manuel Illán Illán. Pero, fundamentalmente, quiero manifestar mi agradecimiento a Eduardo Galán quien, desde el primer momento, me ofreció todo su apoyo y confianza haciendo gala de su gran generosidad, gracias Eduardo. Por último, a todos los organizadores de estas jornadas, y sobre todo, a la Dra. Raquel Vilaça, por la invitación a participar en este encuentro, dándome así la oportunidad de presentar esta nueva estela de guerrero que permanecía inédita hasta la fecha.
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Estampa 1 - Mapa de localización: lugar de aparición de la estela (representado con un círculo) y distancia al Puerto de Honduras (representado con un cuadrado) (Mapa Topográfico Nacional, Hervás (575)-Cabezuela del Vallle (576), Escala 1:25.000, IGN).
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Estampa 2 - Aspecto que presentaba la estela en el momento de su hallazgo.
Estampa 3 - Fotografía y calco interpretativo de la estela.
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Estampa 4 - Parte superior de la estela con los distintos objetos representados: espada, escudo, espejo y lanza.
Estampa 5 - Detalle del escudo con escotadura en V y espejo de mango calado (técnica incisa) y extremo final del astil y la punta de la lanza (realizado mediante rebaje y pulido). A la izquierda, paralelo de un espejo procedente de la isla de Cerdeña.
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Estampa 6 - Final del camino natural de subida al Puerto de Honduras procedente del valle del Jerte, el círculo negro representa el sitio exacto donde se localizó la estela.
Estampa 7 - Paisaje que se domina desde el lugar de aparición de la estela.
Estampa 8 - Vista que se posee del valle de Ambroz desde lo alto del Puerto de Honduras.
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Las estelas grabadas de La Bienvenida-Sisapo (Ciudad Real, España): nuevas aportaciones para la caracterización del contexto cultural del Bronce Final en el reborde suroccidental de la Meseta1 Mar Zarzalejos Prieto2, Germán Esteban Borrajo3, Patricia Hevia Gómez4
Resumen En este trabajo, por primera vez, se presentan conjuntamente las tres estelas del Bronce Final aparecidas en el yacimiento de La Bienvenida (Almodóvar del Campo, Ciudad Real), dos de ellas todavía inéditas. En primer término, se realiza su descripción y estudio compositivo, con el fin de establecer el marco de sus relaciones formales con otros ejemplares conocidos. A continuación, se aborda una valoración de la lectura de estas manifestaciones como reflejo iconográfico de las elites en la periferia tartésica. Palabras clave: Estelas de guerrero, Estelas diademadas, Bronce Final del Suroeste. Abstract This paper presents together for the first time the three Late Bronze Age stelae found in the settlement of La Bienvenida (Almodóvar del Campo, Ciudad Real), two of them never seen before. The first part of the study focuses on their description and compositional study, in order to establish the frame of their formal relations with other known examples, followed by an evaluation of these manifestations as iconographic reflection of the elites in the Tartessian periphery. Key words: Warrior stelae, Stelae with diadem, Late Bronze age in Southwest of Spain.
1 Este trabajo se ha realizado en el marco del proyecto HAR2008-04817/HIST: El paisaje minero antiguo en la vertiente norte de Sierra Morena (provincia de Ciudad Real) concedido por el Ministerio de Ciencia e Innovación y dirigido por M. Zarzalejos Prieto. Por su parte, las investigaciones arqueológicas desarrolladas en el yacimiento de La Bienvenida se encuadran en un proyecto sistemático de excavaciones subvencionado por la Dirección General de Patrimonio Cultural de la JCCM. Agradecemos enormemente a S. Celestino y R. Vilaça las facilidades dadas para incorporar esta aportación en el presente volumen. 2 Departamento de Prehistoria y Arqueología, UNED. Pº Senda del Rey, 7, 28040 Madrid, [emailprotected] 3 Proyecto Sisapo, Carretera de la Estación, 1, 13459 Veredas (Ciudad Real), [emailprotected] 4 Dirección General de Patrimonio Cultural, JCCM. C/ Trinidad, 8, 45071 Toledo, [emailprotected]
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Introducción Desde hace años, venimos defendiendo la inserción del ámbito espacial comprendido en el área suroccidental de la Meseta en unas dinámicas culturales que relacionan este territorio con los ambientes del Bronce Final conocidos y caracterizados en la cuenca media de los ríos Guadiana y Guadalquivir (Zarzalejos, 1995: 831; Benítez de Lugo et alii, 2004: 53; Zarzalejos y López Precioso, 2005: 826-830). La construcción inicial de esta hipótesis apoyaba en ciertos fósiles directores, de naturaleza fundamentalmente cerámica, identificados en contexto estratigráfico en el yacimiento de La Bienvenida (Almodóvar del Campo, Ciudad Real) desde comienzos de los años 90. Este yacimiento, ubicado en el sector centro-occidental del valle de Alcudia (Estampa 1), ha podido ser identificado con la Sisapo citada por los autores grecolatinos como gestora de la explotación de las minas de cinabrio del área de Almadén. En efecto, la cultura material de los niveles fundacionales del sondeo estratigráfico practicado en el cardo de la ciudad romana está representada por especies bastante significativas para establecer su filiación cultural, como las fuentes carenadas con decoración bruñida interna, las copas de paredes finas con decoración monocroma en rojo o un vaso a chardon (Fernández Ochoa et alii, 1994: 58-71). Andando el tiempo, similares ítems materiales comenzaron a ser documentados en otros yacimientos de la provincia, como Alarcos (García y Fernández, 2000) y Valdepeñas (Esteban et alii, 2003), contribuyendo a ratificar y asentar con argumentos cada vez más sólidos la tesis inicial. Nuestra propuesta también encontró un importante refrendo en la presencia en el sur de la provincia de Ciudad Real, de varios ejemplares encuadrables en la categoría de las estelas de guerrero del Bronce Final, que ensanchaban el horizonte geográfico de estas manifestaciones en el territorio castellano-manchego y, consecuentemente, hacían posible incluir esta región dentro de un área de parámetros culturales cada vez mejor definidos. De hecho, las primeras noticias sobre la existencia de estelas decoradas en Ciudad Real se dieron a conocer hace ya más de tres décadas (Valiente y Prado, 1977-8; Valiente y Prado, 1979). Las piezas en cuestión aparecieron en el término municipal de Aldea del Rey, dos de ellas en la margen izquierda (Aldea del Rey I y III) y otra en la derecha del río Jabalón (Aldea del Rey II). A medida que han ido transcurriendo los años, el número de estelas conocido en la cuenca alta del Guadiana se ha visto significativamente incrementado con los ejemplares de Pozuelo de Calatrava5 (Galán, 1993: 105), Chillón (Fernández Ochoa y Zarzalejos, 1994), Alamillo (Celestino, 2001: 392-393), Río Guadalmez (Murillo et alii, 2005, 9-10) y dos nuevas piezas procedentes del entorno de 5 Esta estela, en puridad, permanece inédita, ya que E. Galán (1993: 104) no facilita representación gráfica, limitándose a reproducir los datos descriptivos proporcionados por su descubridor y por el entonces Director del Museo de Ciudad Real, A. Caballero Klink, que también nos comunicó a una de nosotros el dato de su existencia, aunque resultaron infructuosos los intentos de poder analizarla directamente (Zarzalejos, 1995: 117-118).
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Almadén6 (Blanco y García Bueno, ep.), a los que se suman los ejemplares recuperados en el yacimiento de La Bienvenida y su entorno inmediato (Estampa 2). Así, en 1996 tuvo lugar la identificación de una estela en el propio yacimiento y, algo después, se halló un nuevo ejemplar a unos 2 km de este lugar (Márquez Triguero, 1998). Más recientemente, en 2004 y 2008, el solar de la antigua ciudad de Sisapo ha vuelto a ser pródigo en hallazgos de esta índole, proporcionando dos nuevos ejemplares que verán ahora la luz por primera vez7. Consideramos que esta concentración de estelas del Bronce Final en La Bienvenida añade nueva luz al papel desempeñado por este núcleo durante esta etapa de la Protohistoria, al tiempo que también contribuye a ampliar las perspectivas de interpretación de estos elementos aparecidos en relación con un yacimiento con probada actividad en este momento. Las estelas de La Bienvenida 1. La Bienvenida II La primera estela aparecida en el yacimiento fue identificada formando parte de la mampostería del muro sur del Corral de Concejo existente en el extremo meridional de la aldea de La Bienvenida (Estampa 2). Aunque no se analizó individualmente, dimos una primera noticia sobre su hallazgo en un trabajo general sobre la arqueominería de la región sisaponense (Fernández Ochoa et alii, 2002: 38-39). Su descubridor es C. Burkhalter Thiébaut, quien reparó en su existencia mientras dirigía un ensayo de dibujo técnico para alumnos de la UAM, en el transcurso de unas prácticas de campo llevadas a cabo durante la campaña de 1996 en el muro donde se reutilizó la estela. Para no introducir confusión en la nomenclatura ya asentada en la bibliografía específica, denominaremos a esta pieza “La Bienvenida II”, ya que “estela de La Bienvenida” (Márquez Triguero, 1998; Murillo et alii, 2005: 12) o “La Bienvenida I” (Fernández Ochoa et alii, 2002: 39; Benítez de Lugo et alii, 2004: 53) es el nombre que se ha dado en otras ocasiones al ejemplar aparecido en la finca de Pasaderas, a corta distancia del yacimiento y sobre el que volveremos después. A juzgar por el lugar donde se produjo el hallazgo, es evidente que la estela de La Bienvenida II se encuentra fuera de contexto, aunque también parece lógico pensar que originariamente no se hallara muy lejos del sitio donde se amortizó como elemento de construcción. La pieza, que se encuentra fracturada, conserva una longitud máxima de 69,6 cm y una anchura máxima de 45,4 cm (Estampa 3). El soporte está constituido por un bloque de basalto, material porfídico que forma parte abundante de la constitución geológica natural de este sector del valle de Alcudia. El bloque parece mostrar una cierta regularización de la superficie decorada, tal y como indica la huella de desbastado de 6 Agradecemos a A. Blanco y C. García Bueno (2009) el acceso a su texto original sobre las estelas de Almadén, que en las fechas de redacción de este artículo se encuentraba en prensa en la revista Gerion. 7 La pieza hallada en 2004 fue presentada en una ponencia general sobre el Bronce Final en el Alto Guadiana en el marco de la reunión Sidereum Ana II. El río Guadiana en el Bronce Final, albergada por el IAM en Mérida en mayo de 2008 pero, en la fecha de realización de este trabajo, las actas aún no han sido publicadas.
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un clasto circular, si bien no es posible asegurar que no se trate de un desprendimiento natural posterior a su uso protohistórico. Los diseños han sido realizados mediante una técnica de desbastado somero, con un trazo de sección en U poco profundo. De los elementos originales representados sólo se conservan parte de un escudo y una espada. El arma defensiva está constituida por tres círculos concéntricos, con escotadura en V los dos más externos. Inscrito en el círculo interior se encuentra el asidero, que ha sido representado como una línea perpendicular a las escotaduras, por lo que, una vez asido el escudo, las escotaduras quedarían visibles en uno de sus laterales. Esta forma de indicar el asidero contrasta con lo que suele ser norma en los ejemplares conocidos, donde este elemento de prensión se sitúa alineado con las escotaduras, de manera que, en la posición de ser portado, las escotaduras quedarían situadas en la parte superior o inferior del escudo. Sólo se conoce un caso semejante al de La Bienvenida en la estela de Foios (Sabugal, Portugal) y ha sido interpretado por S. Celestino (2001: 116) como un error o falta de pericia del grabador. También destaca en nuestro caso que la forma del asidero no es completamente recta sino algo elíptica, hecho inédito en la serie conocida y que quizás se deba al desprendimiento de la corteza del bloque en el proceso de talla. De ser así, este escudo podría inscribirse en el grupo Ic (escudos con escotadura y asidero recto) de S. Celestino (2001: 120), cuyo mayor número de ejemplares recae en el área Valle del Guadiana-Valle del Zújar. Por lo que respecta a la espada, el primer dato de interés es que se realizó mediante la técnica del rebajado, aspecto éste que se ha venido considerando un detalle diferenciador en comparación con los ejemplares de las zonas de Gata y Montánchez, donde las espadas se representaron contorneadas (Celestino, 2001: 87). En cuanto a su forma, la zona del enmangue carece de detalle, aunque parece que sólo se han representado los apéndices de la empuñadura con un pomo en forma de T. Por lo demás, la hoja es alargada y se estrecha hasta rematar en punta, con un extremo distal que parece mostrar semejanzas con las espadas de “lengua de carpa”. Aunque básicamente estamos de acuerdo con las consideraciones S. Celestino (2001: 103-104) sobre la dificultad para identificar tipologías claras dentro de estas representaciones sumarias8, también nos parece lícito intentar esta 8 Si bien es cierto que existen limitaciones claras a la hora de identificar tipológicamente las representaciones (tamaño del grabado, aptitud del soporte para la grabación, pericia del grabador o estado de conservación), opinamos con Brandherm (2007: 23) que un escepticismo extremo como el que manifiestan algunos autores (Murillo, 1994: 24), sitúa la investigación en un callejón sin salida. Pese a que el método de análisis basado en la búsqueda de paralelos reales e iconográficos – a veces bastante forzados – para los objetos representados en las estelas está ya agotado, no podemos negar que esta línea abrió un camino para proponer las primeras contextualizaciones culturales y cronológicas. Por más que los motivos se consideren símbolos, no se puede poner en duda su inspiración en elementos reales, de los que constituyen una abstracción condicionada por todas las variables apuntadas más arriba. De este modo, estimamos que, siempre que los ejemplares en estudio permitan realizar aproximaciones en este sentido, debe realizarse un ensayo de identificación de los elementos representados, abordando su interpretación en el marco semántico del ejemplar en estudio y estableciendo relaciones con otras piezas, con el fin de no caer en la atomización excesiva derivada de un estudio de detalle de cada caso considerado individualmente.
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identificación, siempre que se parta de una clasificación previa de los grabados de las estelas y se analicen los elementos dentro del contexto semántico de las representaciones, tal y como proponen otros investigadores (Brandherm, 2007: 23). De acuerdo con este planteamiento, esta espada podría inscribirse en la clase H de D. Brandherm (2007: 143145), que se reconoce en estelas cuya dispersión geográfica afecta mayoritariamente a la cuenca del Guadiana. Según el autor germano, la combinación de un pomo en T y hoja en “lengua de carpa” es común entre las espadas del tipo Huelva. En todo caso, esta identificación tipológica aproximativa no resulta ajena al ámbito geográfico donde nos hallamos, ya que este tipo de armamento ha sido documentado arqueológicamente en el sur de Ciudad Real, como demuestra el espléndido depósito de armas hallado en Puertollano (Fernández y Rodríguez, 2002; Montero et alii, 2002). A causa de su estado fragmentario, resulta igual de difícil restablecer la organización compositiva original de los elementos. Para tratar este asunto debemos empezar por orientar la pieza. A juzgar por la forma del bloque y la posición de las representaciones sobre el mismo, lo más probable es que el eje longitudinal original de la estela se correspondiera con el que actualmente conserva mayor longitud, ya que, en caso contrario, la pieza tendría formato apaisado, algo que no se documenta en ningún ejemplar conocido. De este modo, se observa que, pese a conservar únicamente el escudo y la espada, y aún siendo posible que en la parte perdida se representara la lanza y algún otro elemento, la pieza no posee los rasgos compositivos que caracterizan el grupo de las estelas de las zonas I (Sierra de Gata) o II (Valle del Tajo-Montánchez), ya que en éstas la disposición vertical lanza-escudo-espada parece una constante (Celestino, 2001: 137). Esta observación modifica de forma sustantiva la valoración preliminar que hicimos en su día de esta estela, considerando únicamente los elementos visibles y no su interrelación y posición compositiva (Fernández Ochoa et alii, 2002: 38). De este modo, la pieza de La Bienvenida no se sumaría a los dos ejemplares cordobeses (Cortijo de la Vega y Cortijo de la Ribera Alta) (Murillo, 1994), que ponen en cuestión el modelo explicativo que defiende el vínculo de las denominadas “estelas básicas” con las zonas I y II y, por ende, una mayor antigüedad de éstas respecto a las composiciones que agregan nuevos elementos y la figura humana9. Tampoco el diseño de la espada y la técnica de su 9 A raíz del hallazgo de las piezas de Córdoba y un ejemplar en Quintana de la Serena, el propio S. Celestino (2001: 305-306) matiza su propuesta inicial y estima “la posibilidad de que el fenómeno haya surgido en todo el espacio geográfico de las estelas”, aunque “sin embargo, dada la uniformidad evolutiva de las zonas geográficas, este hecho debe corresponderse con puntuales ocupaciones del territorio, pues es importante tener en cuenta que estas losas meridionales básicas presentan aspectos compositivos evolucionados, como armas de clara tipología atlántica, escudos claveteados o ausencia de escotadura y asidero evolucionado, caso del ejemplar de Córdoba I… por lo tanto, su existencia podría obedecer a tempranos desplazamientos hacia esas zonas meridionales”. En este caso, coincidimos con S. Celestino en que la tesis de Murillo, mantenida en otro trabajo posterior (Murillo et alii, 2005: 39), no deja lugar a los movimientos o desplazamientos de población, considerando implícitamente que las estelas son producto de grupos humanos aislados y estáticos. De hecho, en el último trabajo citado, el referido investigador descarta los movimientos poblacionales como paradigma interpretativo, proponiendo la necesidad de “buscar otras fórmulas de interrelación entre grupos con un
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ejecución se corresponden con los característicos de la Zona I y gran parte de la Zona II. Por último, no es fácil discernir si el extremo original que se conserva era el destinado a ser hincado en la tierra o el remate superior del monumento. A favor de la primera hipótesis se hallaría su acabado algo apuntado, pero no se observan indicios o huellas que permitan asegurar su hincadura, aunque tampoco podemos descartar que, de haberlas tenido, se hubieran perdido por efecto de su exposición a la intemperie a partir de su reutilización como elemento constructivo del muro moderno. 2. La Bienvenida III La segunda estela hallada en el yacimiento, a la que denominamos La Bienvenida III, fue descubierta en el transcurso de los trabajos que venimos desarrollando en la domus de las Columnas Rojas. Se identificó de forma casual durante la campaña de excavaciones de 2004, formando parte de la constitución del muro que conforma la esquina SO del cubiculum 13 (Estampa 2), mientras se realizaba el desmonte de una parte de esta estructura para proceder a su estabilización y consolidación. El soporte elegido fue en este caso un bloque de pizarra, roca, asimismo, presente de manera natural en las formaciones precámbricas que caracterizan el sustrato geológico del lugar donde nos hallamos. La pieza nos ha llegado también fragmentada y en su estado actual presenta forma de laja rectangular, con unas dimensiones máximas conservadas de 74 cm de largo, 37 cm de ancho y 11 cm de grosor (Estampa 4). Su estado de conservación es bastante deficiente. Por un lado, muestra una fractura en su lado izquierdo que secciona las representaciones y que, muy probablemente, haya que atribuir a una regularización del bloque realizada por el constructor romano para facilitar su inserción en la fábrica del muro. Por otro, presenta una pérdida por exfoliación de la mitad inferior, por lo que es posible que, además de recortar parte de los elementos conservados, haya supuesto la pérdida de otros. De la representación original sólo se conservan hoy parte de un escudo y un antropomorfo, trazados con un grabado somero de sección en U. El escudo ha perdido aproximadamente un tercio de sus proporciones iniciales. Está formado por tres círculos concéntricos, sin escotaduras en la parte conservada. En el círculo exterior se aprecian al menos cuatro remaches e, inscrito en el círculo central, se identifica un asidero en forma de I. Aunque no podemos asegurar que el escudo tuviera en origen escotaduras en V, hacemos notar las impresiones estadísticas obtenidas por Celestino (2001: 121), cuando observa que en los escudos sin escotadura es más raro encontrar ejemplares con remaches – aunque hay excepciones como Olivenza y Córdoba I – o con el asidero en forma de I, ya que suelen ser rectilíneos – si bien, se identifican ejemplares que escapan a esta tendencia (Setefilla, Torres Alocaz, Pedro Abad y Cabeza del Buey III) –. substrato cultural y social próximo y una posible complementariedad en sus bases económicas” (Murillo et alii, 2005: 43). No obstante, no consideramos cerrada la cuestión “evolutiva” de las estelas con las connotaciones cronológicas que se les ha atribuido ni descartamos que su polimorfismo ilustre variantes geográficas en el sentido que ha venido defendiendo E. Galán (1993: 78; 2008: 6). Pero también en este caso, la existencia de ejemplares apartados de su “norma” geográfica podría ser indicativa de movimientos de gentes.
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Por lo que respecta a la figura humana, ha sido representada con un diseño lineal muy esquemático. La cabeza es un pequeño círculo rebajado que remata superiormente la línea del tronco, bifurcada en la cintura para representar las piernas, que, como las manos, finalizan en largos dedos. Pese al alto grado de esquematización que posee la figura, ésta ha sido identificada como de género masculino mediante la indicación del falo, circunstancia que, sin ser demasiado común en la serie conocida, tampoco constituye un unicum, según evidencian las estelas de El Viso I (Almagro Gorbea, 1977: lám. XIX, 4), uno de los antropomorfos de Aldea del Rey III (Valiente y Prado, 1979: 27) y el personaje principal de las estelas de Ategua (Bernier, 1969: 181) y Ervidel II (Varela Gomes y Pinho Monteiro, 1977: 174). La espada al cinto se ha representado con un trazo simple, sin mayor concesión al detalle, por lo que no es posible extraer rasgos de identificación tipológica del arma. Tampoco en este caso, por razones obvias, pueden realizarse comentarios de alcance sobre la organización compositiva de la estela. Únicamente podemos afirmar que el antropomorfo se sitúa a la derecha del escudo y que el arma defensiva mantiene un mayor protagonismo jerárquico en razón de sus proporciones, claramente superiores a las del guerrero. En este sentido, las estelas de La Bienvenida II y III -como ya sucedía con la estela Aldea del Rey I- parecen romper con la tendencia de pérdida de protagonismo del escudo que, a juicio de Celestino (2001: 138), caracteriza los ejemplares de la Zona III. 3. La Bienvenida IV El último ejemplar aparecido hasta el momento en el yacimiento de La Bienvenida se recuperó en el transcurso de la campaña de excavaciones de 2008, donde pudo identificarse formando parte de la fábrica de mampostería del muro sur de la taberna que linda por el oeste con el cubiculum 13 de la domus de las Columnas Rojas, en situación muy próxima a donde se recuperó la estela de La Bienvenida III. La estrecha vecindad de la zona de aparición de ambos ejemplares (Estampa 2) y su empleo para un mismo fin inducen a pensar que, por economía de medios, los materiales usados para levantar estas estructuras romanas pudieron provenir de un área de aprovisionamiento no demasiado alejada del lugar donde se amortizan; por lo que parece lógico pensar que las piezas se hallarían originariamente en las proximidades del punto donde las hemos encontrado y, por tanto, en las inmediaciones del poblado que representa la base ocupacional del yacimiento. Esta pieza ha llegado a nosotros sumamente fragmentada (Estampa 5). A juzgar por su forma y dimensiones, parece bastante probable que los constructores romanos procedieran a la fragmentación de la estela original para obtener varios mampuestos adaptados en tamaño y forma a las necesidades de la obra en curso10. El bloque presen10 Hasta donde resulta posible, estamos atentos a la posible identificación de nuevos fragmentos en ésta y otras unidades murarias de su entorno.
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ta una forma aproximadamente rectangular, con unas dimensiones máximas de 22 cm de altura, 40 cm de anchura y 11 cm de grosor. A tenor de los elementos representados, opinamos que el fragmento corresponde al remate superior original de la pieza. El soporte empleado para la talla del monumento vuelve a ser, como en La Bienvenida II, el basalto, que proporciona un interesante contraste cromático entre el núcleo, de coloración gris oscura, y la corteza oxidada de tonos rojizos. De sus representaciones originales sólo han sobrevivido un motivo completo y restos exiguos de un segundo, ambos ejecutados mediante un desbastado somero de la superficie. El primero se corresponde con un objeto de tendencia circular, a modo de cazoleta ovalada, rematado en su parte superior por un vástago perpendicular con un ensanchamiento cuidadosamente redondeado en su extremo. La técnica de realización consistió en el rebaje completo de la silueta del objeto, que interpretamos sin ninguna duda como un espejo. A la derecha, se percibe un arco de círculo incompleto del que parten hasta seis radios rematados con pequeños círculos rebajados; uno de estos remates supera en tamaño a los restantes, aunque parece tratarse de un error de grabado que provocó el desprendimiento indeseado de una lasca de la corteza superficial de oxidación del soporte. Pensamos que este elemento corresponde a la parte superior de una diadema, lo que automáticamente inscribiría la pieza sisaponense en el capítulo de las conocidas como “estelas diademadas”. De hecho, los apéndices circulares que rematan los radios parecen remitir a la configuración de la diadema de la necrópolis de La Colombine propuesta por S. Celestino (2001: 252, fig.65) como principal referente formal para estas representaciones. Poco más podemos decir sobre la composición escenográfica, salvo que la orientación del espejo experimenta casi todas las fórmulas posibles en el elenco de estelas conocidas. En relación con el caso que nos ocupa, su representación con el mango hacia arriba está documentada en numerosos ejemplares, como Brozas (Fernández Oxea, 1950: 296), San Martinho II (Almagro Basch, 1966: 36, fig.5), Cabeza del Buey III (Almagro Gorbea, 1977: fig. 69,6), Esparragosa de Lares I (Enríquez y Celestino, 1984: 240), Valdetorres I (Enríquez y Celestino, 1984: 241), Écija I (Almagro Basch, 1974: 13), Écija III (Rodríguez Temiño y Núñez, 1985: 481), Pedro Abad (Bendala et alii, 1994: 34), Capote (Berrocal, 1986: 30) y La Bienvenida I (Márquez, 1998). A pesar del mal estado de conservación con que nos ha llegado, su sola presencia en este lugar resulta significativa, por cuanto se trata del ejemplar más oriental conocido por el momento en esta serie y porque el hallazgo está asociado con la presencia de estelas de guerrero, circunstancia que ya concurre en otros casos como Capilla I, El Viso III o Zarza Capilla II (Celestino, 2001: 241). Aunque no pensamos que sea éste el lugar para profundizar en el estudio de esta modalidad de representación, sí que conviene que hagamos algún comentario al respecto, ya que nos parece importante clarificar el marco de manifestaciones en que se inscribe la pieza de La Bienvenida. Como han puesto de relieve otros autores (Santos, 2009), y a pesar de trabajos tan destacados como el realizado por M. Almagro Gorbea (1994), existe una cierta confusión en la clasificación
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de las representaciones diademadas. En el estudio tantas veces citado de S. Celestino (2001: 242 ss.), este autor introduce algo de orden en un enmarañado panorama interpretativo que incluye, bajo denominaciones aparentemente unificadoras, una serie de manifestaciones cultural y cronológicamente bastante dispares entre sí. En el marco de las representaciones adscritas a la Edad del Bronce, S. Celestino realiza una diferenciación tipológica de base entre “estelas-guijarro diademadas” y “estelas diademadas”. Dentro de las primeras, contempla el tipo 3 de Almagro Gorbea, unificado – salvo excepciones – por el tipo de soporte (guijarros de entre 40 y 80 cm) y la fórmula representativa (figura antropomorfa con rasgos faciales y dotada de diadema, collar y, en algunos casos, cinturón). Estas manifestaciones se vienen datando a inicios de la Edad del Bronce y su área de aparición se ciñe fundamentalmente a la actual Extremadura. En el segundo grupo incorpora las “estelas femeninas tartésicas”, que coinciden con la dispersión geográfica de las estelas de guerrero y en las que “se puede apreciar una lógica y evidente evolución tipológica… algunas más cercanas a las concepciones de las estelas antropomorfas y otras, la mayoría, muy influidas por los tipos dominantes en ese momento, es decir, las estelas de guerrero” (Celestino, 2001: 248). A juzgar por la presencia del espejo, parece evidente que el ejemplar de La Bienvenida corresponde a este segundo grupo, donde la representación diademada se acompaña de objetos de ajuar o de prestigio. A partir de la muestra conocida de este grupo, nos parece pertinente la distinción que introduce M. J. Santos (2009: 13) entre los ejemplares que exhiben una representación diademada esquemática – dentro de un concepto representativo equiparable al de las estelas de guerrero individuales – y aquellos otros que presentan personajes diademados en el marco de escenas complejas. Ni que decir tiene que la fragmentación extrema de nuestra pieza impide que nos decantemos por incluirla en una u otra categoría ya que, si bien algunas estelas como las de El Viso V, Belalcázar, Capilla I y Zarza Capilla II (Celestino, 2001, 249, fig. 64) invitarían a pensar que por la entidad de la diadema podríamos estar ante la representación esquemática de un único individuo diademado, un hallazgo reciente como el de Almadén de la Plata II (García Sanjuán et alii, 2006: 139, fig. 4-5), con un importante desarrollo de la diadema en un individuo que forma parte de una escena compleja, no lo permite. Estelas halladas en el entorno inmediato al yacimiento de La Bienvenida 1. La Bienvenida I Esta estela fue dada a conocer por E. Márquez Triguero (1998) e incluida años después en un artículo que analiza nuevos ejemplares en las provincias de Ciudad Real y Córdoba (Murillo et alii, 2005: 12-13). De acuerdo con los datos del primero, la pieza fue descubierta en la finca Pasaderas, no lejos del arroyo del mismo nombre, a unos 300 m de la carretera Alamillo-Brazatortas y a unos 2 km del yacimiento de La Bienvenida. El soporte elegido en este caso vuelve a ser la pizarra metamórfica, que, como ya se ha indicado, forma parte de la base geológica de edad precámbrica que aflora abundantemente en el valle de Alcudia. Esta estela presenta unas dimensiones de 63 cm de
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anchura máxima, una altura de 54 cm y un grosor de 0,12 cm. En la ejecución de las grafías se empleó un tipo de incisión poco profunda, pero efectiva sobre un soporte blando como el que nos ocupa. La pieza se encuentra fragmentada en su extremo superior derecho, por lo que no es improbable que se haya perdido algún motivo de la composición original. Por otra parte, algunos indicios – como la forma recta de su remate inferior y el escaso grosor del soporte o la disposición de los elementos grabados – pueden hacer pensar que esta pieza no se hincó en la tierra, sino que pudo colocarse apoyada sobre un elemento posterior11. En el campo decorado se identifica un antropomorfo sometido a un rígido esquematismo, con el tronco reducido a una línea sencilla, rematada en su extremo superior por un punto rebajado que representa la cabeza y de la que parten ambas extremidades a la manera de simples trazos rectos. A la altura de la cintura, se identifica con nitidez un trazo cruzado que representa la espada con una empuñadura en forma de T y sin mayor concesión a especulaciones tipológicas. Junto al guerrero, en el lado derecho de la estela, se encuentra un escudo con tres círculos concéntricos de línea continua y un punto central. Según Celestino (2001: 123), esta modalidad representativa podría estar reproduciendo el anverso del arma, mostrando el umbo que se representa con el punto rebajado central. El citado autor destaca que este tipo de escudo (II d, escudos sin escotadura y con umbo) se registra con más frecuencia en la zona IV (Valle del Guadalquivir) que en la zona III (Valle del Guadiana-Zújar) y se constata en estelas donde el escudo pasa a tener un papel secundario, circunstancia que no concurre en nuestro caso, donde posee aún importantes dimensiones y rivaliza jerárquicamente con la figura humana. En el lado izquierdo de la estela y a la derecha del antropomorfo se percibe un motivo circular rebajado, rematado superiormente por un trazo simple, que se identifica claramente con un espejo. Junto a este objeto y cerrando la composición por este flanco se representó la lanza, cuyo astil se reduce a una línea recta que remata en su extremo inferior en una hoja ancha de forma ovalada totalmente rebajada. Por último, en el ángulo superior derecho, junto a la esquina fragmentada, se aprecia la sumaria representación de un pequeño cuadrúpedo con enhiestas orejas y hocico alargado. Su tamaño pequeño podría hacer pensar que se trata de un perro12. Aunque no suelen ser objeto de mayor comentario en los estudios sobre las estelas, lo cierto es que las representaciones de cuadrúpedos interpretados como cánidos no faltan en el repertorio conocido, poniendo en valor el afecto que sentía por ellos su dueño o, al menos, su utilidad en algunas activi11 Aunque la mayor parte de los soportes parecen haber sido aptos para su hincadura en el terreno, algunas estelas nos plantean dudas en este sentido, ya que ofrecen una forma más regularizada, con un extremo inferior de tendencia recta y una distribución de la decoración en la parte inferior que, de ser hincadas, ocultaría parte de los motivos. Sería el caso de Écija III (Rodríguez Temiño y Núñez, 1985: 481), Aldea del Rey III (Valiente y Prado, 1978), Herrera del Duque (Vaquerizo, 1989) o Cortijo de la Reina I (Murillo et alii, 2005: 26, fig.4). En el mismo sentido se pronuncian los autores que han estudiado la estela de Almadén de la Plata II (García Sanjuán et alii, 2006: 149). 12 Murillo, Morena y Ruiz no descartan que el pequeño tamaño del cuadrúpedo pudiera corresponder a la representación en segundo plano de un animal de mayor envergadura (Murillo et alii, 2005: 13).
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dades como la caza. Esto es lo que cabe deducir del hecho de que unas veces aparezcan aislados, como un elemento más de los que rodean al personaje y, por ende, inmortalizando la importancia que tuvo para el representado, como testimonian las estelas de Aldeanueva de San Bartolomé13 (Pacheco y Moraleda, 1998), El Viso VI (Ruiz Lara, 1986), Écija V (Padilla y Valderrama, 1994: 283), Ategua (Bernier, 1969: 181) y Ervidel II (Varela Gomes y Pinho Monteiro, 1977: 174). Otras ocasiones forman parte de escenas más complejas, como sucede con la excepcional representación cinegética de la estela de San Martinho II, donde figura un perro junto al cazador y otro en actitud de ataque a un cérvido (Almagro Basch, 1966: 36; Celestino, 2001: 359-360). Las estelas decoradas en el extremo suroccidental de la Meseta como reflejo de las elites en la periferia tartésica Por razones de espacio, el objetivo principal de este trabajo se centra en la presentación de los ejemplares hallados en La Bienvenida, por lo que queda fuera de nuestras pretensiones profundizar en todos asuntos planteados en el debate general que sobre estas manifestaciones se mantiene vivo desde hace más de un siglo. No obstante, sí que nos parece de rigor realizar unas observaciones al hilo de las piezas que presentamos. Estos comentarios se centrarán fundamentalmente en el contexto de aparición y en la lectura genérica de las estelas como reflejo de las fórmulas demostrativas de status empleadas por las sociedades que poblaron estas tierras en los inicios del I milenio a.C. Las tres estelas halladas en La Bienvenida (II, III y IV) constituyen, pese al estado fragmentario en que nos han llegado, una evidencia de gran interés. En primer lugar, junto con el ejemplar de La Bienvenida I, amplían el mapa de distribución del grupo integrado en la Zona III, Valle del Guadiana-Zújar, enlazando este conjunto con el de Aldea del Rey, situado más hacia el oriente de la provincia y que quedaba hasta ahora algo aislado del núcleo del Guadiana medio (Estampa 6). Pero, también, estos ejemplares señalan el yacimiento de La Bienvenida como un foco de concentración de estas manifestaciones. En este sentido, debemos empezar subrayando el valor de estos hallazgos, ya que refuerzan el significado de otros indicadores del registro material proporcionados por el yacimiento con la consistencia innegable del refrendo iconográfico. En relación con su contexto “arqueológico” de aparición, nuestras piezas no aportan nada nuevo a lo ya conocido. Las tres se han hallado en posición secundaria, reutilizadas en estructuras de época posterior. Por razones obvias, debemos pensar que su posición original debió localizarse en el área del propio yacimiento, ya parece lógico pensar que quienes amortizan estos elementos no recorren largas distancias para transportarlos, especialmente si se considera que en el entorno inmediato existe suficiente provisión de piedra de diferente naturaleza para emplear en la construcción. A partir de lo dicho cabe destacar una doble evidencia: estas estelas se encuentran en relación di13 Celestino (2001: 356) no descarta que este motivo zoomorfo corresponda a un perro; en cambio, los autores que dan a conocer esta estela opinan que puede tratarse de un caballo (Pacheco et alii, 1998: 12).
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recta con un yacimiento cuya ocupación se remonta al Bronce Final y, al mismo tiempo, coinciden en su relación con un núcleo romano. Sobre el primer asunto, seguimos sin poder relacionar las estelas con las esferas funeraria o habitacional de este establecimiento, pero sí vincularlas con la primera comunidad que elige este lugar para asentarse. Esta referencia enriquece la casuística de aparición de las estelas del valle del Guadiana realizada en un interesante estudio de J. J. Enríquez, en el que pone de manifiesto el hallazgo de ejemplares en el entorno de yacimientos del Bronce Final, aunque sin coincidir exactamente con los mismos (Enríquez, 2006: 168-169). En segundo término, la presencia de estelas grabadas en un lugar que mantiene su ocupación en época romana, aunque parezca baladí, creemos que tiene su interés, por cuanto esta coincidencia se constata en otros hallazgos de estelas registrados en la provincia de Ciudad Real, como Chillón14, Almadén I y II15 (Blanco y García Bueno, e.p.) o Alamillo16. Esta concurrencia ofrece, a nuestro juicio, argumentos para ratificar la importancia del Bronce Final en estas tierras, ya que parece apuntar el establecimiento de unas estrategias ocupacionales – y, por ende, económicas y territoriales –, que se mantendrán activas durante siglos. Otro comentario que se deriva del hallazgo de las estelas III y IV de La Bienvenida, amortizadas como material de construcción en la fábrica de un muro romano, es que estos monumentos no siempre suscitaron el fervor y el respeto de sus sucesores en la ocupación del espacio. En efecto, no ofrece duda que quienes estaban construyendo el muro sur de la estancia 13 de la domus de las Columnas Rojas y de la taberna que linda con ella por el oeste no mostraron el más mínimo reparo en fracturar y ocultar estas piedras inscritas. Esta actitud contrasta con lo que en su momento pudimos percibir en el interesante ejemplar de Chillón (Fernández Ochoa y Zarzalejos, 1994), donde existe una intencionalidad clara por parte del lapicida romano que reutiliza la estela de guerrero por respetar los grabados preexistentes17. Ya en otro orden de cosas, la distribución de estelas en el sur de Ciudad Real estaría evidenciando la cristalización de un proceso de jerarquización social, que tuvo su arranque a fines del II milenio con la apertura de las comunidades locales al mantenimiento de relaciones comerciales con grupos de origen meseteño, después con el mundo atlántico y que culmina con la consolidación de los intercambios con el foco tartésico andaluz. Por más que no podamos asegurar cual fue su función originaria, creemos que 14 Esta estela fue hallada en la finca Llano de los Roncos, en las cercanías del límite del término municipal de Chillón con la provincia de Badajoz (Fernández Ochoa y Zarzalejos, 1994). 15 Según la información proporcionada por D. José Rodríguez, la pieza apareció en el yacimiento romano denominado “Puente de las Ovejas” en la Carta Arqueológica del TM de Almadén. Almadén II se halló en el Quinto del Mesto, en las cercanías de la Mina romana del Mesto. 16 D. José Rodríguez nos informa que se encontró en término de Alamillo, frente al yacimiento de Calabazanos, en la Dehesa de Castilseras y a orillas al río Alcudia, censado en la Carta Arqueológica Almadén como una villa romana. 17 Esta misma idea ha sido posteriormente desarrollada por otros autores que analizan las reutilizaciones rituales de que han sido objeto en época romana algunos espacios o monumentos de época pre y protohistórica (García Sanjuán et alii, 2007: 7-8).
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las estelas son los iconos visibles del proceso de emergencia de unas elites que ostentan el poder político y económico, enriquecidas con la explotación de los recursos de su entorno y la fluidez de las redes de intercambio. Este papel de las estelas como reflejo de una elite social y/o económica es algo en lo que casi todos los investigadores vienen a coincidir. Otra cosa muy distinta es asignarles un significado más concreto en el ámbito de los conceptos de representación y en la mentalidad de las comunidades que las emplearon, máxime si tenemos en cuenta con qué insistencia ¿el azar? nos escamotea sus lugares exactos de ubicación. En este sentido, y aún cuando muchas de estas manifestaciones se encuentren en lugares poco significativos para realizar inferencias sobre su dialéctica con el paisaje o una “función” concreta relacionada con el ideario de estas gentes, tampoco pueden cerrarse los ojos ante hallazgos mejor contextualizados como los descritos en el caso de las estelas cordobesas de Cortijo de la Reina I y II o Almadén de la Plata I y II. De hecho, creemos que estos ejemplares refuerzan la hipótesis de que las estelas pudieron poseer un significado más polisémico que el admitido hasta el momento, en el sentido ya propuesto por otros autores (Murillo et alii, 2005: 31). Así, en unos casos es probable que tuvieran una función claramente funeraria, como sucede con Cortijo de la Reina I (Guadalcázar, Córdoba) – que se halló sobre una acumulación de cenizas y restos óseos, junto con tres vasijas de tipo B2 con referentes en las urnas de Setefilla –, o con los hallazgos del mismo tenor relacionados con las estelas de Cerro Muriano II, Ribera Alta, Solana de Cabañas y Granja de Céspedes (Murillo et alii, 2005: 27). En el caso de Almadén de la Plata, los análisis contextuales inducen a sus investigadores a plantear que pudieron haberse erigido en relación con un espacio funerario monumentalizado preexistente, concretamente un complejo megalítico, pero por esto mismo también relacionadas con una esfera de ritualidad funeraria (García Sanjuán et alii, 2006: 149). Otras veces, podrían haber funcionado como marcadores de lugares funerarios adscritos a una mentalidad de signo atlántico y, por tanto, donde no queda materialidad de los muertos pero sí un memorial de su ausencia representado por objetos o escenas claramente adscritas a la esfera funeraria (Enríquez, 2006: 158-159). Abundando más en este razonamiento y, tras desestimar la hipótesis que consideraba estos monumentos como marcadores de paso en los accidentes geográficos de las rutas de trashumancia e intercambio comercial (Ruiz Gálvez y Galán, 1991), el autor que acabamos de citar propone que la lectura última de ese “ritual funerario polivalente” sería el proceso de apropiación de la tierra por parte de las elites rurales asentadas durante el Bronce Final en la cuenca media del Guadiana (Enríquez, 2006: 160). Sin descartar que existiera, como defiende este investigador, una apropiación de tierra con interés agropecuario como mecanismo para la toma de posición y la legitimación de las elites, nosotros pensamos que también la presencia de estas manifestaciones en un área que coincide con los importantes cotos mineros de Almadén y Alcudia podría estar subrayando el interés estratégico por el control de estos recursos. Asimismo, creemos que merece un comentario el papel que se viene atribuyendo a la mujer en todo este maremágnum de teorías y reconstrucciones en clave ideológico-
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-social. Tradicionalmente, la diadema se ha considerado un atributo femenino, como ratifica su hallazgo en tumbas de este género en el área atlántica, como la ya citada de La Colombine (Champlay, Francia), o su mantenimiento en ajuares femeninos de época orientalizante de la Península Ibérica (Almagro Gorbea, 1993: 133; Perea, 200018). En el caso que nos ocupa, el verdadero problema radica en la dificultad de hallar los contactos de estas representaciones con la cultura material conocida en el Bronce Final del SO y poder extraer inferencias de género a partir los ajuares, a causa de la proverbial escasez del registro funerario de la época. Sin embargo, el repertorio iconográfico de estelas diademadas acude en auxilio de estos planteamientos haciendo una inequívoca manifestación del sexo femenino de algunos personajes diademados mediante la representación de los pechos en estelas como Capilla I, El Viso III o Belalcázar. En nuestra opinión, este argumento, presente en las propias imágenes creadas por estas sociedades, debería tener su peso a la hora de considerar que la diadema es un atributo preferentemente femenino. Pero no todos los autores en los últimos tiempos vienen mostrando posturas tan unánimes. De hecho, R. J. Harrison (2004) plantea que estas figuras pudieron representar no a mujeres sino a individuos masculinos ilustres, tocados con adornos ceremoniales y presentados en el contexto de su heroización, explicación que, a nuestro juicio, parece ir en contra de la evidencia iconográfica, o, al menos de una parte de ella. S. Celestino (2001: 256) no duda de su carácter femenino y opina que la indicación sexual en algunas estelas diademadas pudo tener su razón de ser en el proceso de esquematismo formal que adquieren estas representaciones y por su introducción en escenas complejas en las que intervendrían ambos sexos. Asumiendo también que se trata de representaciones femeninas, algunos autores han destacado el importante papel desempeñado por las mujeres en los procesos de legitimación de la estirpe, en la transmisión de linajes o en la sanción de alianzas en el marco de sistemas parenterales complejos (Enríquez, 2006: 160). Lógicamente, las lecturas realizadas sobre el papel de la mujer a la luz de estos documentos pétreos deben asumir la necesidad de añadir al sesgo de género el del rango social; o dicho de otro modo, parece incuestionable que las estelas diademadas no representan al grueso de la población femenina de estas comunidades del Bronce Final, sino sólo a aquellas que por su posición pueden acceder al empleo de la imagen como justificación y manifestación de su status. De ahí que C. Rísquez y M. A. García Luque (2007: 265) estimen que la representación conjunta de hombres y mujeres en estelas como la del Viso III pueda interpretarse como un reflejo de la equidad social de los personajes pertenecientes a las élites. Sin embargo, A. Perea (2006: 62) opina que estas manifestaciones nada tienen que ver con la demostración de roles sociales, sino con construcciones de identidad y justificaciones en el seno de familias que están iniciando un proceso de consolidación de una mentalidad aristocrática. De este modo y a su 18 De hecho, esta autora ha desarrollado en un trabajo posterior (Perea 2006: 50) la hipótesis de que lo femenino se fija metafóricamente en época ibérica a través de una serie de códigos simbólicos, cuyo origen se remonta a la etapa orientalizante y aún hasta el Bronce Final, y que se expresa por oposición a lo masculino.
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juicio, el hombre se identifica con sus atributos y posesiones (carro, escudos, espadas, espejos) y la mujer con los suyos, como la diadema o los collares, “pero siempre por contraposición a la representación masculina, porque no deja de ser una posesión más”. En un intento de contrastar interpretaciones tan opuestas como las que acabamos de expresar, hemos vuelto a contemplar las imágenes presentes en las estelas19 y a revisar las lecturas de género que sobre ellas ha realizado la historiografía que nos precede. Este ejercicio de revisión posibilita hacer las siguientes observaciones: – Existen representaciones diademadas con explícita indicación de los pechos que, de manera bastante unánime, se vienen considerando femeninas: Capilla I, Belalcázar y el Viso III (Estampa 7, nº 10-12). En la estela de Belalcázar, junto a la mano derecha se representó un elemento que S. Celestino (2001: 404) interpreta como un arma de tipología incierta y otros autores como una espada (Domínguez de la Concha y González Bornay, 2005: 22). Por tanto, en este caso se admite implícitamente que una figura diademada y con atributos sexuales femeninos pudo representarse con armas. – Un segundo conjunto de ejemplares muestra antropomorfos con tocados semicirculares (Estampa 7, nº 5-9). Entre ellos se advierten diferentes lecturas de género en función del tipo de representación del que forman parte o de los objetos con que se relacionan. Así, en Cabeza del Buey I, Capilla III y Torrejón el Rubio III, donde los antropomorfos se rodean de atributos tradicionalmente considerados masculinos20, el rodete semicircular que figura sobre la cabeza se interpreta como una posible representación del casco o algún tocado representativo (Celestino, 2001: 332, 363 y 374). Esta interpretación sorprende especialmente en el caso de Torrejón el Rubio III, donde el antropomorfo, además del “tocado”, exhibe un cinturón (Celestino, 2001: 332), elemento que se ha venido considerando femenino por antonomasia a raíz de su constante presencia en las estelas-guijarro diademadas y que se encuentra cargado de simbología de poder en los ambientes tartésicos, como han demostrado C. Rísquez y M. A. García Luque (2007: 264-265)21. Sin embargo, en la estela de Zarza Capilla III aparecen dos figuras enlazadas por el brazo y con las piernas en actitud de danza, tocadas ambas por un trazo semicircular, que, ahora sí, se interpreta como una diadema y que, por ende, “muy bien puede indicar el carácter femenino de estas representaciones” (Celestino, 2001: 384). Lo mismo cabría apuntar en relación con tres de los personajes que aparecen en el registro inferior de la 19 Las referencias se harán sobre la monografía de S. Celestino (2001) para facilitar el acceso a las imágenes y a las descripciones, pero en general las identificaciones de estos elementos son comunes a la práctica totalidad de la bibliografía relacionada con los ejemplos que comentamos. 20 Como la espada, el carro, la lanza y el escudo en el primer caso; la espada, el arco y una navaja de afeitar en el segundo; la espada, la lanza y el escudo en el tercero. 21 Resulta llamativo que en el caso de Torrejón el Rubio II (Estampa 7, nº 1), donde el antropomorfo también exhibe diadema y cinturón, no se cuestione su carácter femenino, atribución ésta que quizás se deba al hecho de ir acompañado de una fíbula y un instrumento musical (Celestino, 2001: 248-249).
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estela de Ategua, que, por oposición a otros personajes representados en la misma actitud, aparecen “con un trazo curvo contorneándoles la cabeza que las asimila a las figuraciones diademadas” (Celestino, 2001: 432). – Hemos aislado un tercer conjunto integrado por estelas en las que aparecen antropomorfos a los que se les ha indicado unas pequeñas líneas oblicuas o transversales a la parte superior del trazo que representa el tronco (Estampa 8). De ellas se dice que puede tratarse de la “esquematización de una fíbula”, como sucede en el ejemplar de Cabeza del Buey II (Celestino, 2001: 365), “un trazo perpendicular sin interpretación” en los casos de Esparragosa de Lares I y II22 (Celestino, 2001: 368-369) o, simplemente, “dos líneas oblicuas que parten del pecho”, como se constata en Navalvillar de Pela (Celestino, 2001: 370), Valdetorres I (Celestino, 2001: 390) y Écija I (Celestino, 2001: 422). Todas estas figuras – interpretadas en todos los casos como guerreros – se rodean de los elementos de la panoplia y los objetos de prestigio habituales. El reparto geográfico de estos ejemplos se centra significativamente en el grupo del Valle del Guadiana-Valle del Zújar, con la única excepción del ejemplar de Écija I. A partir de los datos expuestos, no es difícil deducir que el acercamiento al género en las estelas del SO está plagado de prejuicios. De hecho, los argumentos de base para la identificación del sexo en las figuras que carecen de rasgos explícitos, radican en una asignación mecánica de atributos masculinos y femeninos que han generado una imagen estereotipada de lo “representativo” para cada sexo, que puede estar condicionando las lecturas sobre estas sociedades. Aún cuando admitimos que el carácter sumario de las representaciones puede llevarnos a discutir sobre el sexo de los ángeles, no deja de llamarnos la atención que en ningún momento nadie llegue a plantear que las citadas líneas oblicuas pudieran ser en realidad la figuración de los pechos, posibilidad que podría tener sentido dentro del concepto esquemático que caracteriza estas manifestaciones. Obviamente, la conclusión inmediata que podría derivarse de este planteamiento sería la equidad de ambos sexos en el seno de los grupos elitistas, dando pleno sentido a representaciones como las de El Viso III (Estampa 7, nº 11) o Almadén de la Plata II (Estampa 7, nº 4), donde se admite la presencia conjunta de antropomorfos masculinos y femeninos con una misma jerarquía iconográfica23. Otra inferencia lógica sería la capacidad de la mujer para representarse rodeada de armamento y asumiendo, por tanto, una imagen y un rol generalmente asociados al sexo masculino. Obviamente, esta lectura carece de refrendo arqueológico en el registro funerario del Bronce Final del SO, pero 22 Esparragosa de Lares II (Estampa 8, nº 3) es especialmente interesante ya que presenta dos figuras, ambas con las líneas transversales al tronco y una de ellas con el mismo tocado que hemos comentado en relación con el segundo grupo. 23 Sobre la pieza de Almadén de la Plata, L. García Sanjuán (2009) propone, no obstante, un acercamiento desde una óptica diferente, según la cual la representación podría encarnar una diferencia no tanto sexual como simbólica, aludiendo a la dualidad de funciones en el ejercicio del poder entre un poder religioso y un poder militar.
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quizás haya que recordar que no se trataría de un caso excepcional en el Bronce Final europeo, tal y como se encarga de recordar P. Treherme (1995) y que volverá a constatarse en la propia Península Ibérica durante la Edad del Hierro (Izquierdo, 2007: 253). Por el momento, dejaremos sólo planteada esta cuestión como uno más de los numerosos interrogantes que se ciernen aún hoy sobre las estelas del Bronce Final del SO. Ahora bien, con independencia de todas las discusiones y aunque todavía se nos escape la función y el significado reales de estas manifestaciones, nos parece innegable que su reparto en el territorio permite esbozar las rutas que canalizan los contactos y el valor estratégico cobrado por su control, ya que a partir de ahora éste será un condicionante esencial en la elección de los emplazamientos geográficos de los centros rectores del poblamiento. Las estelas de La Bienvenida confirman el activo papel cobrado por la ruta del Valle de Alcudia durante esta etapa, ratificando lo que, en su momento, sólo podíamos intuir con datos más parcos (Zarzalejos, 1995: 122). La embocadura de esta ruta desde el área del Zújar se encuentra bien señalizada por la estela de Alamillo y las dos de Guadalmez. A su vez, la concentración del Zújar denota la actividad de la que fue una de las más activas vías de acceso al valle medio del Guadalquivir y, por tanto, uno de los principales enlaces del sector suroccidental de la Meseta con Tartessos. Por su parte, el grupo de estelas focalizadas en torno al Jabalón podría dar continuidad al camino transversal de Alcudia, conectando con éste tras franquear la Sierra de La Solana por el Puerto de Veredas. Sin embargo, parece más probable que pudieran estar en función de una ruta N-S que enlazaría con el valle alto del Guadalquivir a través de lo que será, siglos después, la Vereda de la Plata o Camino de Andalucía, que atraviesa Sierra Morena a través del paso de El Robledo (San Lorenzo de Calatrava), junto a la fundición romana de ese nombre (Domergue, 1987: 81), justo por donde lo hará también la vía romana que unió Castulo con Sisapo. La existencia de este canal de comunicación entre la cuenca alta del Guadiana y los ambientes tartésicos andaluces en época precolonial está corroborada por indicadores materiales tan elocuentes como la cerámica de estilo Carambolo hallada en Alarcos. Las estelas también están poniendo en evidencia un nuevo concepto territorial basado en el control y la apropiación de determinados recursos y de los canales que favorecerían su circulación. Las bases económicas que constituyen el desencadenante de estos procesos parecen diversas. En las tierras del Jabalón, el elemento dinamizador de la nueva situación podría ser la importante potencialidad agraria de las zonas de vega (Benítez de Lugo et alii, 2004: 61), objeto de un mejor aprovechamiento con la posible introducción de nuevas técnicas de cultivo (Pereira, 2007: 141). En el Valle de Alcudia, además de la innegable aptitud de este espacio para la práctica ganadera, pensamos que ya, desde este momento, pudo iniciarse el interés por el aprovechamiento de sus ricos recursos mineros. Recordamos a este efecto, el hallazgo de mazos mineros con escotadura, amortizados en un pavimento pétreo de época orientalizante en La Bienvenida (Fernández Ochoa et alii, 2002: 59).
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Estampa 1 - Localización del yacimiento de La Bienvenida-Sisapo (Almodóvar del Campo, Ciudad Real).
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Estampa 2 - Ubicación de los hallazgos de las estelas de La Bienvenida II, III y IV en el yacimiento homónimo.
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Estampa 3 - Estela de La Bienvenida II (Almodóvar del Campo, Ciudad Real).
Estampa 4 - Estela de La Bienvenida III (Almodóvar del Campo, Ciudad Real).
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Estampa 5 - Estela de La Bienvenida IV (Almodóvar del Campo, Ciudad Real).
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Estampa 6 - Dispersión de estelas del SO en el límite actual de las provincias de Ciudad Real, Badajoz y Córdoba.
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Estampa 7 - Estelas con figuras diademadas sin representación de pechos: 1. Torrejón el Rubio II; 2. Zarza Capilla II; 3. El Viso V; 4. Almadén de la Plata II. Estelas con antropomorfos con tocados semicirculares: 5. Capilla III; 6. Cabeza de Buey I; 7. Zarza Capilla III; 8. Torrejón el Rubio III; 9. Ategua. Estelas diademadas con representación de pechos: 10. Capilla I; 11. El Viso III; 12. Belalcázar (Todas a partir de Celestino, 2001, excepto el nº 4: a partir de García Sanjuán et alii, 2006).
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Estampa 8 - Estelas con antropomorfos con posible representación de pechos: 1. Cabeza del Buey II; 2. Esparragosa de Lares I; 3. Esparragosa de Lares II; 4. Navalvillar de Pela; 5. Valdetorres I; 6. Écija I. (A partir de Celestino, 2001).
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Nuevas metodologías para la distribución espacial de las estelas del Oeste peninsular 1 Sebastián Celestino Pérez2, José Ángel Salgado Carmona3
Resumen La aparición de un número significativo de estelas en la última década, algunas de gran valor simbólico, así como el avance en las nuevas metodologías arqueológicas, ha permitido esbozar nuevas hipótesis sobre su origen, significado y cronología. También ha aumentado el área de dispersión de las estelas, configurándose zonas más amplias y menos aisladas de lo que hasta ahora creíamos. Por todo ello, se propone una nueva tipología de las estelas atendiendo a estas nuevas características, donde los principales elementos representados cobran un especial protagonismo a la hora de su clasificación. Palabras Clave: Península Ibérica, estelas, Bronce Final, I Edad del Hierro, tipología, catálogo, simbología, estudio territorial. Abstract The appearance of a significant number of stelae in the last decade, some of them with a great symbolic value, as well as the progress on new archaeological methodologies, has allowed to propose new hypotheses about its origin, meaning and chronology. It has also increased the dispersal area of the stelae, configuring larger, and less isolated, areas than we used to think. Therefore, we propose a new typology of stelae in response to these new findings, where the main elements engraved have a special role in their own classification. Key Words: Iberian peninsula, steale, Late Bronze Age, Iron Age, typology, catalogue, simbology, territorial study.
1 El trabajo se enmarca en el Proyecto de Investigación “Entre el Atlántico y el Mediterráneo: contraste de dinámicas en la evolución histórica del paisaje en el occidente peninsular a través de la Arqueología” del VI Plan Nacional I+D+I 2008-2011 del Ministerio de Ciencia e Innovación. HAR2009-10666 2 Instituto de Arqueología – Mérida, Plaza de España, nº 15, C.P. 06800 Mérida (Badajoz), Espanha. [emailprotected] 3 Instituto de Arqueología – Mérida, Plaza de España, nº 15, C.P. 06800 Mérida (Badajoz), Espanha. [emailprotected].
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Introducción Las denominadas estelas del suroeste han sido halladas fuera de un contexto arqueológico claro, lo que ha propiciado el análisis exhaustivo de estos monumentos a través de la rica representación decorativa que exhiben, lo que a la vez ha servido para paliar, aunque siempre en parte, esa falta de información arqueológica. Por ello, los estudios tipológicos se han convertido, prácticamente desde que aparecieron los primeros ejemplares (Roso de Luna, 1898), en la mejor herramienta para encuadrar cronológicamente estas estelas, así como para interpretar su hipotético significado. Como es lógico, esa falta de contexto permite la elaboración y defensa de hipótesis de lo más variopintas, difíciles tanto de demostrar como de rebatir, lo que ha propiciado una extensa bibliografía en la que se esgrimen las ideas más dispares, aunque también es verdad que existe un cierto consenso en algunos aspectos básicos que está permitiendo un importante avance en su estudio. Por último, subrayar en este aspecto que algunos investigadores consideran que las estelas no aparecen exactamente fuera de su contexto arqueológico, sino que los hallazgos están, en la mayor parte de los casos, directamente relacionados con el lugar donde fueron hallados (Galán, 1993); es decir, que no tiene por qué existir ningún resto arqueológico asociado a las estelas, por lo que se trataría de monumentos aislados desvinculados de cualquier otra manifestación material. Así, el verdadero significado de las estelas habría que buscarlo con relación a su ubicación en el paisaje. Sin embargo, algunos hallazgos antiguos y, más recientemente, los realizados en la provincia de Córdoba, ponen en duda esta premisa (Murillo, Morena y Ruíz, 2005), lo que no invalida la evidente importancia que debió ejercer el paisaje en la ubicación de estos monumentos. A la ausencia o desconocimiento de un contexto arqueológico debemos añadir la dificultad que encontramos en la mayor parte de las estelas a la hora de identificar los tipos concretos de los diferentes elementos que exhiben, de ahí que algunas tipologías carezcan de valor por cuanto parten de premisas erróneas o deductivas, con escasa base analítica. Las estelas presentan tamaños medios relativamente pequeños salvo contadas ocasiones, lo que se traduce en pequeños espacios reservados para desplegar los objetos que se quieren grabar. También debemos tener muy en cuenta la calidad de los soportes utilizados que, por ejemplo, en el caso de los graníticos dificulta seriamente el detalle del dibujo, además de estar más expuestos a la erosión. Como es lógico, debemos tener también presente la propia pericia de los grabadores que, en numerosas ocasiones, muestran una limitada destreza artística, cuando no hay rectificaciones o añadidos que aprovechan objetos ya grabados, lo que dificulta aún más la identificación tipológica del objeto estudiado. La importancia que se ha dado a los estudios tipológicos de los objetos representados en las estelas, ha impedido analizar con la profundidad que se debería otros métodos que cada día se demuestran capaces de desentrañar algunas de las incógnitas que antes se mencionaban. Es sabido que en los años 90 del pasado siglo hubo un punto de inflexión en este sentido, incorporando a los estudios tipológicos tradicionales un análisis del territorio donde fueron halladas las estelas (Celestino, 1990; Galán, 1993), lo que sin duda enriqueció
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el discurso, además de suponer un importante avance en la investigación. En los últimos años ha surgido un nuevo impulso para profundizar en el estudio de las estelas del Suroeste gracias a nuevos hallazgos documentados, tanto en las áreas tradicionales, como en otras áreas que hasta la fecha estaban apartadas de los focos principales. Sin embargo, y a la luz de los trabajos que se han venido realizando hasta momento sobre las estelas, parecía obligado profundizar sobre algunos métodos de trabajo sólo desarrollados de forma incipiente en los últimos años, así como intentar ensayar nuevas metodologías que nos permitieran conocer mejor el porqué de su dispersión geográfica (García Sanjuán et al., 2006; Celestino et al., e.p.). En este sentido, las prospecciones intensivas en los entornos inmediatos de los hallazgos, pueden depararnos algunas claves sobre la funcionalidad de estos monumentos, si bien parece un trabajo que necesitará un largo recorrido hasta que pueda dar sus primeros frutos. Por último, y también gracias a los hallazgos realizados en la última década – una de las más fructíferas en cuanto al número de ejemplares descubiertos – hemos podido avanzar considerablemente en el estudio compositivo de las estelas, debido en gran medida a la aparición en algunos monumentos de objetos, hasta ese momento inéditos, que han servido para reinterpretar otros anteriormente estudiados. Quizá por su importancia debemos destacar especialmente la aparición de la figura diademada junto al guerrero, algo que ya se venía reivindicando en trabajos anteriores, pero que se ha confirmado en dos de los ejemplares recientemente hallados, uno en Almadén de la Plata (García Sanjuán et al., 2006), al norte de la provincia de Sevilla, y otro, aún inédito, hallado en el entorno de Almadén (Blanco y García Bueno, e.p.), en la provincia de Ciudad Real. Estos ejemplares pueden unirse al procedente de El Viso III, pero además otorgan un mayor significado a las decenas de estelas que presentan una representación diademada en exclusiva y siempre en la zona donde se produce la mayor dispersión de estelas de guerrero, lo que demuestra la estrecha relación que debió existir entre ambas expresiones sociales plasmadas en las estelas. Las tipologías tradicionales Como es lógico, no pretendemos en estas páginas hacer un análisis exhaustivo de todas las tipologías que se han ido elaborando en el último siglo sobre las estelas y los elementos que las decoran. Resaltaremos sin embargo las más importantes, las que han servido para establecer una base sobre la que se han ido haciendo variaciones a tenor de los nuevos hallazgos que se iban produciendo. La primera monografía sobre las estelas decoradas del suroeste es la que elaboró, bajo este mismo título, Almagro Basch en 1966, quien estableció dos grandes grupos, inspirándose en un trabajo anterior de Fernández Oxea (1955), que posteriormente pocos prehistoriadores han mantenido: las de Tipo I, también denominadas estelas alentejanas por la exclusiva dispersión de los hallazgos, en realidad losas decoradas con una panoplia de guerrero realizada en altorrelieve; y las de Tipo II, las estelas de guerrero y diademadas del suroeste peninsular, a las que hay que añadir un ejemplar en el noreste – la estela de Luna en la provincia de Zaragoza – y otros tres ejemplares en el sureste francés, en el entorno de
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Montpellier. Pero las denominadas “losas alentejanas” se alejan bastante tanto del ámbito geográfico, cronológico e incluso técnico de las estelas de guerrero, por lo que en ningún caso deben considerarse como el antecedente del fenómeno de las estelas. No obstante, la existencia de estas losas de la zona del Alentejo, sirven para confirmar el arraigo de una tradición de origen genuinamente atlántico en la zona, donde desde los inicios de Edad del Bronce las diferentes manifestaciones culturales se expresaban mediante grandes soportes pétreos, normalmente realizados en el granito dominante en estas áreas geográficas. Pero las estelas de guerrero y diademadas, aún amparándose en esa tradición de representar sus expresiones culturales más destacadas en soportes pétreos, nada tienen que ver con las losas alentejanas, existiendo incluso un claro hiato cronológico entre ambas manifestaciones4. Dentro de ese tipo II, Almagro Basch distingue dos grupos; el “grupo a” – también denominado por el autor como “estelas panoplia” – donde reúne las estelas con representaciones de armas y algún que otro objeto de adorno como los espejos y las fíbulas; y el “grupo b” que estaría caracterizado por las estelas donde se introduce la representación del antropomorfo (Almagro Basch, 1966: 198). Sin embargo, se aprecia un cierto desconcierto cuando el autor intenta agrupar estelas por algunos de los objetos más representativos, caso de los carros, que aparecen indistintamente grabados en ambos grupos. A pesar de la escasa validez que otorga a este primer acercamiento tipológico, renuncia a extraer conclusión alguna sobre la dispersión geográfica de las estelas, si bien ya apunta la posibilidad de que las del “grupo a” sean más antiguas que las del grupo que presentan la figura del guerrero, lo que significa que sitúa el origen del fenómeno en las zonas más septentrionales, en el entorno de la sierra de la Estrella. Cabe destacar el magnífico y conciso trabajo realizado por V. Pingel en 1974, en realidad el primer acercamiento serio a la sistematización tipológica de las estelas del suroeste. Se centró exclusivamente en las del Tipo II de Almagro, subdividiéndolo en tres subtipos: el IIa, que reunía las estelas donde sólo aparecían representados los tres elementos de las estelas básicas, es decir, el escudo, la espada y la lanza; el IIb, caracterizado por la inclusión de otros elementos foráneos que se sumaban a la composición básica; y el IIc, definido por las estelas que introducían la figura del guerrero. Si Almagro veía una innegable influencia europea en los elementos representados en las estelas, Pingel prefiere adherirse a la hipótesis de Blanco, Luzón y Ruíz Mata (1969), quienes a raíz de estudiar la estela de Ategua, en Córdoba, proponen la existencia de una dualidad entre el carácter indígena de los monumentos, a través sobre todo de los jerarcas representados, y a la presencia de la mayor parte de los objetos grabados, de origen fenicio. El desarrollo de las tipologías de las estelas coincide con la aparición de un buen número de ejemplares en los años 70 del pasado siglo. La primera es la de Gomes y Pinho (1977), quienes añaden un nuevo subtipo a la elaborada por Pingel, el IId, estelas con la figura del guerrero pero con la inclusión de escenas secundarias, como la de Ategua. Si las estelas 4 En la monografía sobre estelas de 2001 se manifestaba que F.P. Curado estaba en desacuerdo con esta afirmación, lo cual no deja de ser un error de interpretación de sus trabajos por nuestra parte, por lo que nos disculpamos.
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básicas tienen para ellos un origen claramente europeo, éste no variaría en las del subtipo IIb y IIc, justificando la presencia de elementos europeos al continuo flujo de gentes a través de los Pirineos hacia el suroeste peninsular. Sólo en las estelas del grupo IId admiten la influencia directa de la colonización fenicia, plasmada en las complejas representaciones sociales que acompañan al guerrero. La tipología más elaborada es la que publica también en 1977 Almagro-Gorbea. Aunque mantiene en general los tipos ya creados para las composiciones escénicas – si bien cambia el subtipo IId de Gomes y Pinho por otro en el que se tiene en cuenta la ausencia del escudo –, su aportación consiste en la elaboración de una compleja tipología centrada en los elementos más significativos representados en las estelas. Así, crea por primera vez tipos basados en la disposición de los diferentes elementos grabados en el soporte, donde el escudo juega un papel fundamental. Por último, desarrolla una tipología concreta para alguno de los objetos más señeros, caso del propio escudo, las espadas, las fíbulas o los cascos. A pesar de todo ello, el argumento principal para proponer una cronología de las estelas no deriva específicamente de la tipología elaborada, sino de la premisa de que las estelas de guerrero derivan de las alentejanas, fechadas en el siglo X, por lo que las estelas comenzarían a elaborarse hacia el siglo IX, mientras que el final del fenómeno lo sitúa hacia el siglo VII, coincidiendo con los túmulos orientalizantes del valle del Guadalquivir, especialmente de Setefilla, donde se halló uno de estos monumentos. Defiende la hipótesis sobre el carácter indígena de las estelas con elementos europeos en su origen; pero también admite la temprana llegada de elementos procedentes del Mediterráneo, antes incluso de la presencia fenicia, lo que le lleva a proponer una fase precolonial, que denomina Período Protoorientalizante. Si por algo se caracteriza la década de los años 80 del pasado siglo es por el número de hallazgos que se produjeron, reflejados en un buen número de publicaciones que, tras una detallada descripción de la nueva estela, se incluía sin más en el cuadro tipológico elaborado por Almagro-Gorbea. Pero el mayor interés de estos nuevos hallazgos es su dispersión geográfica, que amplía sensiblemente su ámbito, así como la identificación de objetos hasta ese momento desconocidos en la representación de las estelas. En efecto, buena parte de los nuevos hallazgos se concentran en el curso medio del Guadiana y, sobre todo, en torno al valle del Zújar, dibujándose un territorio de enorme interés para el análisis del fenómeno de las estelas. A pesar de esto, en los trabajos que se publicaron sobre esos nuevos hallazgos se eludió una mención más específica al medio físico donde fueron halladas o al potencial económico de la zona afectada, salvo quizá los trabajos de Curado (1984; 1986), donde defiende la importancia de la explotación minera de la zona del norte del Tajo para entender la presencia de estos jefes locales representados en las estelas. La introducción en nuestro país de las nuevas teorías de origen anglosajón sobre las relaciones comerciales en la Prehistoria, entre las que destaca la denominada World System, inciden de forma especialmente importante en el estudio de las estelas por cuanto representan, precisamente, el mejor exponente de esas relaciones comerciales. Sin embargo, y gracias a los tipos que se habían conformado a partir de alguno de los objetos más significativos, caso de los escudos, las espadas, las fíbulas y los cascos, se abre en ese momento una amplia
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discusión sobre las relaciones comerciales en el Mediterráneo occidental, emergiendo con fuerza la idea de lugares con un especial protagonismo para justificar la llegada de algunos objetos representados en las estelas a la península, convirtiéndose así Cerdeña en uno de los puntos más destacados de esa distribución comercial entre el Mediterráneo oriental y occidente (Fernández Miranda, 1986; Ruíz-Gálvez, 1986; Barceló, 1989). Pero sigue pesando aún más la idea de una precolonización protagonizada por agentes del Mediterráneo oriental, ya sean griegos o fenicios, capaz de introducir nuevos productos exóticos, pero sin alterar todavía la estructura socioeconómica del territorio afectado por esta nueva red comercial. El problema y la discusión sobre los diferentes aspectos de esa precolonización no han cesado desde entonces, y es precisamente el fenómeno de las estelas uno de los argumentos claves para su análisis (Celestino, Rafel, Armada eds., 2008). Un avance significativo en el estudio de las estelas es el que se produce en la última década del siglo XX, cuando se editan los trabajos que van a marcar el futuro de los estudios de estos monumentos. Se propone ahora un nuevo camino en la investigación sobre el significado de las estelas, basado en profundizar en los análisis de carácter geográfico en detrimento de las exhaustivas tipologías de los objetos representados (Barceló, 1989; Celestino, 1990; Galán, 1993), dándose por válidas las elaboradas por Almagro-Gorbea. Se configuran diferentes zonas geográficas donde se concentran estelas que, por regla general, responden a diferentes tipologías dentro de las composiciones escénicas que aparecen en los soportes, lo que parece mostrar una clara evolución cronológica desde las zonas más septentrionales del valle del Tajo hasta las más meridionales del valle del Guadalquivir; las primeras, de composición básica o con alguna incorporación aislada de algún elemento foráneo, relacionadas exclusivamente con el mundo atlántico, mientras que las más meridionales destacan por la incorporación de un buen número de objetos mediterráneos, y que podemos denominar sin ningún tipo de complejo como tartésicas (Celestino, 2001; 2009). También esta primera década de nuestro siglo ha sido especialmente prolija en hallazgos de estelas de guerrero, algunas mostrando objetos hasta el momento desconocidos, pero también nuevas composiciones escénicas que han servido para replantear algunas hipótesis sobre el significado de los personajes representados. Estos nuevos hallazgos, así como la incorporación de nuevos métodos de trabajo para ahondar en la investigación, son los que inspiran este trabajo, donde hemos querido recuperar el análisis tipológico como herramienta imprescindible para cualquier avance en la interpretación arqueológica. Propuesta tipológica La tipología que proponemos es, como no podía ser de otra manera, deudora de los esfuerzos realizados en los trabajos que hemos repasado en el apartado anterior; sin embargo, desde la última propuesta tipológica han pasado veinte años, periodo de tiempo en el que se han realizado numerosos hallazgos que han permitido, por un lado, definir mejor los espacios geográficos donde se concentran las estelas y, por otro, aumentar el número de objetos representados. Más importante aún se nos antoja la aparición de estelas cuyas composiciones escénicas nos han servido para avanzar de forma significativa en la interpretación
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de estos monumentos. El objetivo principal de esta tipología es asociar los diferentes tipos de estelas propuestos a las áreas geográficas donde se concentran. Por otro lado, el análisis detallado de los objetos más significativos que las componen, así como su presencia o ausencia, servirá para avanzar en el conocimiento de la cronología de estos monumentos, directamente relacionada con las diferentes áreas geográficas donde se desarrollan. Como es lógico, para elaborar esta tipología no hemos tenido en cuenta ni las estelas fragmentadas ni aquellas que han sido regrabadas, a no ser que ofrezcan una composición escénica clara, con la idea de emitir un resultado lo más objetivo posible. La tipología se basa, al igual que las anteriores, en la generalización a partir del motivo decorativo principal, entendiendo éste como el que está grabado a un mayor tamaño o en una posición central, por lo que los motivos del escudo y de la propia figura humana y su relación en la perspectiva jerárquica son fundamentales. Para analizar su distribución espacial se ha procedido a georeferenciar y corregir la posición de todas las estelas conocidas, con el fin de que las proporciones de distancia entre las mismas sean reales y así se puedan observar las dispersiones y concentraciones. Esta acción también permite analizar las estelas por medio de los Sistemas de Información Geográfica, lo que conlleva nuevas perspectivas y tendencias de trabajo (Celestino et al., e.p.). La tipología propuesta sería la siguiente: TIPO I – Estelas sin figura humana. A. Básicas – Escudo, espada y lanza. B. Básicas con elementos de adorno personal. TIPO II – Estelas con escudo predominante y antropomorfo. TIPO III – Estelas con igualdad entre el escudo y el antropomorfo. A. Individuales B. Colectivas TIPO IV - Estelas en las que la figura humana es predominante. A. Individuales: 1. Guerrero 2. Diademadas B. Colectivas: 1. Parejas. a) masculinas b) mixtas 2. Personaje principal y escenas. 3. Escenas
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Quadro 1: Tipología propuesta.
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TIPO I Se caracteriza por el predominio del escudo sobre el resto de objetos grabados, situándose en el centro de la composición y a un gran tamaño. Son las proporcionalmente más grandes de la serie y las que presentan los objetos grabados con mayor detalle, pero por contra son las que ofrecen menos elementos decorativos. - TIPO I.A Los monumentos de este tipo presentan una composición básica – escudo, espada y lanza –, los soportes son bastantes regulares y la decoración ocupa el centro de la pieza, separando espacios sin grabar en los extremos de la composición, lo que nos indica que estamos ante losas, seguramente para ir tumbadas y no hincadas. La distribución de las tres armas grabadas es siempre idéntica; escudo a gran escala en el centro de la losa, equidistante de los extremos del bloque de piedra; espada bajo el escudo con la empuñadura, por norma general, orientada hacia la derecha y lanza sobre el escudo, con la hoja siempre en el sentido contrario a la de la espada. El que el escudo siempre centre la decoración y el que la lanza y la espada se dispongan sobre y bajo el escudo respectivamente, indica que es el soporte en sí el que representa al ser humano, al guerrero, ocupando sendos elementos su ubicación natural como si de un retrato se tratara. - TIPO I.B La composición básica del anterior tipo se vio alterada al introducir entre los motivos grabados una serie de objetos de adorno (espejos, fíbulas) o nuevas armas defensivas (como el casco de cimera), destacando la inclusión del carro, grabado siempre en perspectiva cenital. La distribución de los grabados en el soporte también varía, situándose en la parte superior, reservando un espacio en la zona inferior para poder sustentarse hincada en la tierra, surgiendo las estelas propiamente dichas. Hay que destacar que cuando se incorporan estos nuevos elementos, éstos nunca pierden la posición real si tenemos la referencia de la figura del guerrero en la propia piedra; así vemos como el espejo y las fíbulas ocupan las posiciones superiores, a la altura del pecho u hombro, también los cascos, siempre en el extremo superior o los carros, grabados en la zona inferior, a los pies del guerrero, como si éste hubiese sido representado por la estela. Distribución: La mayor parte de los ejemplares del Tipo I se concentran entre el Sistema Central y el río Tajo. Sin embargo, hay una serie de ejemplares aislados, como el recientemente aparecido en Montalegre (Bacelar y Reis, en este mismo volumen) y otra serie de ejemplares en el Alto Guadiana y Guadalquivir. Hay que destacar una cierta tendencia direccional desde el Guadiana hacia el Guadalquivir, donde está el núcleo de Córdoba. Por subtipos, el I.A. muestra dos puntos de concentración claros: en el entorno de la Sierras de Gata y Malcata, en el Sistema Central, y en la Sierra de Montánchez, divisoria de aguas con el Guadiana. Cabría añadir las estelas aparecidas en el entorno de Córdoba, pero su número es menor y están más aisladas. Por su parte, los ejemplares del Tipo I.B. tienden a estar menos concentrados que las del tipo anterior, pero en
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zonas similares, como el grupo que se extiende desde la Sierra de la Estrella hasta el valle del Jerte o las estelas ubicadas al sur del Tajo, entre las penillanuras y las sierras. Comentarios: Creemos que, al igual que el fenómeno de las estelas es de raíz indígena, también lo son las primeras armas que se graban en ellas, entendiendo por indígena la manifestación cultural de marcado carácter atlántico. Y así debemos considerar otros objetos que se incorporan pronto a las estelas básicas como son los cascos de cimera. La incorporación de nuevos objetos de importación a estas estelas básicas, donde destacan las fíbulas, los espejos y los peines, creemos que se debe a la apertura del comercio entre el Atlántico y el Mediterráneo a través de la Meseta y los Pirineos orientales en las últimas fases del Bronce Final, paralelo en el tiempo al que se consolidará y desarrollará a través de Huelva y el Mediterráneo central, dando paso a la colonización fenicia. Es el caso de los espejos, los primeros objetos que aparecen en las estelas acompañando a los escudos, las espadas y las lanzas, bien documentados en el depósito de Lloseta, en Baleares y datados en el Bronce Final pretalayótico (Salvà, Calvo y Guerrero, 2002). También la temprana presencia de las fíbulas de codo en estas estelas básicas puede responder a una relación comercial con el suroeste peninsular, donde destaca el depósito de la Ría de Huelva, desde donde parece que se pudieron distribuir por otros puntos de la península; pero no podemos obviar que estas fíbulas también se documentan en la Meseta Norte y en la costa levantina, lo que incide en la posibilidad de que existieran dos rutas comerciales paralelas para abastecerse en las áreas de la vertiente atlántica peninsular de los primeros objetos procedentes del Mediterráneo. Por lo tanto, y en sintonía con lo que ya han defendido algunos investigadores (Guilaine y Racoul, 1996; Guerrero 2004; Vilaça 2008), creemos que el grabado de objetos de clara filiación mediterránea en las estelas, caso de los peines, las fíbulas y los espejos, así como la lira de la estela de Luna, se debe a la apertura de una ruta comercial que por el interior de la península estaba comunicada con el noreste peninsular y, desde aquí, se bifurcaba hacia las Baleares y, por otro lado, hacia el Languedoc y la costa italiana. Circunstancia que no sólo justificaría la existencia de estelas en el sureste francés y la de Luna en Aragón, sino que nos permitiría entender el establecimiento, pocos años después, de dos focos de colonización, el meridional dominado por los fenicios, y el de la costa catalana y del Languedoc, protagonizado por la presencia griega (Celestino, 2008). TIPO II Estas estelas son poco numerosas, caracterizándose por incorporar la figura humana a la composición básica del tipo anterior, aunque el escudo sigue siendo predominante en la escena. La figura humana se añadió como si de un elemento exótico más se tratase, sin embargo, su introducción alteró la composición básica, así, aunque el escudo sigue ocupando el centro del soporte, la figura humana se añade también en una posición central, aunque de menor tamaño, mientras que la espada y la lanza pasan a la zona superior. Por otra parte, el resto de los elementos se siguen situando en
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su posición “natural”, como si la estela siguiese representando el cuerpo del guerrero: casco en la zona superior y carro en la inferior. Distribución: Solo contamos con dos ejemplares de este tipo, los de Solana de Cabañas y Zarza de Montánchez, ambos en la provincia de Cáceres y en las inmediaciones de las serranías que sirven de separación entre las cuencas del Tajo y del Guadiana. TIPO III En este amplio grupo, los escudos aún mantienen una presencia preponderante en la composición escénica, pero la figura humana va adquiriendo mayor protagonismo en detrimento del propio escudo. El soporte deja de actuar como representación del cuerpo, por lo que los objetos se ubican en relación al diseño del propio guerrero grabado. El valor del escudo, aún cuando comienza a desaparecer la característica escotadura, sigue siendo muy significativo, representándose aislado tanto en la zona superior, en el centro o en la zona inferior, ocupando así buena parte del soporte, mientras que la figura del guerrero aparece rodeada del resto de armas y objetos de prestigio en su justa proporción. Se puede decir, por consiguiente, que el escudo sigue manteniendo dentro de este tipo, un fuerte valor identitario. Es muy significativo que en las estelas de este tipo se comienza a representar cascos de cuernos, que nunca aparecen en los tipos anteriores. - TIPO III.A Se trata de estelas en las que sólo se ha representado un personaje principal, aún cuando en algunas composiciones aparezca más de una figura humana, caso de los ejemplares de Burguillos, El Viso IV o Ervidel II. - TIPO III.B Se incluyen en este tipo estelas que muestran varias figuras humanas, parejas principalmente, con el mismo tamaño o con los mismos elementos asociados. Distribución: Las estelas del tipo III se concentran significativamente en el curso medio del Guadiana, en torno al río Zújar y las regiones de la Serena y la Siberia extremeñas, al este de la provincia de Badajoz. Así mismo, hay un foco muy disperso en el Guadalquivir, pero también destaca la aparición de este tipo de estelas en zonas donde no se hallaban ejemplares de los tipos anteriores, caso del Sur de Portugal y del Tajo Medio, al oeste de la provincia de Toledo. TIPO IV Las estelas incluidas en este tipo se caracterizan por el protagonismo absoluto de la figura humana sobre cualquier otro elemento. La figura puede aparecer de forma individual o colectiva; en este último caso, puede o bien formar parejas o bien
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escenas que se combinan, lo que da lugar a las composiciones más ricas de la serie. En las estelas de este tipo el escudo pasa a ser un elemento más, representado con la misma escala que el resto de los objetos y subordinado al personaje, llegando en varias ocasiones a desaparecer de la composición. Estos monumentos han sido considerados, por su complejidad compositiva y la introducción de nuevos elementos de origen mediterráneo, como los más modernos, cuando la cultura tartésica se ha asentado en el sur peninsular. - TIPO IV.A Los ejemplares incluidos en este tipo ostentan un solo personaje principal, normalmente representado a gran tamaño y en el centro del soporte. Se puede clasificar según la naturaleza del individuo representado, bien sea este un guerrero o un personaje diademado. IV.A.1 En estas estelas el personaje principal es el guerrero, que aparece rodeado de sus armas y otros objetos de prestigio en su posición natural, mientras que el carro se graba, por regla general, a los pies del guerrero o bien en lugares aislados del soporte. También es significativa la cada vez mayor frecuencia de objetos relacionados tanto con el adorno personal como con la caza, siempre en detrimento de las propias armas, con excepción del casco de cuernos, presente en cualquier tipo de representación, lo que nos hace pensar que más que un símbolo de poder guerrero, podría estar aludiendo a la representación divina del personaje, ahora influenciado por las corrientes procedentes del mediterráneo oriental (Celestino y López-Ruíz 2007; Tejera, Fernández y Rodríguez, 2006). IV.A.2 Estelas cuyo rasgo más significativo es la presencia de un elemento decorativo que parece rodear la cabeza de la figura representada. La mayoría de ejemplares presentan la característica diadema, el collar y, a veces, el cinturón. A medida que se fueron esquematizando, las estelas sólo mantuvieron la diadema como seña de identidad principal, perdiendo valor tanto el cinturón como el collar. Sin embargo, se representaron otros objetos de ajuar, como peines o fíbulas. Las estelas diademadas han cobrado en los últimos años una gran importancia. Los últimos hallazgos, realizados además en las zonas con mayor densidad de estelas de guerrero, han demostrado la contemporaneidad de estas estelas con las de guerrero, hecho de crucial importancia para ahondar en el significado social de todos estos monumentos. Ha sido mucha la literatura vertida sobre estas estelas, desde la elaborada por algunos investigadores que piensan que las diademadas son más antiguas que las estelas de guerrero por derivar directamente de las antropomorfas y de los ídolos-placa del Bronce (Bueno, 1990; Almagro-Gorbea, 1994; Barceló, 1992), hasta los que defendemos que, a pesar de una posible reminiscencia en esa etapa del Bronce Inicial, las estelas diademadas responden a un fenómeno que corre paralelo al de las estelas de guerrero (Celestino 2001; Santos 2009).
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- TIPO IV.B Se recogen en este tipo las estelas que presentan más de un personaje y en las que, al igual que las anteriores, el escudo ha pasado a ser un objeto más o incluso ha desaparecido, convirtiéndose la figura humana, en exclusiva, en la protagonista de la composición. Se trata pues, de dos personajes con diferentes atributos en igualdad de importancia. IV.B.1 Se caracterizan por presentar dos personajes principales situados en el mismo plano jerárquico. Hemos incluido en este grupo el ejemplar de El Viso III a pesar de tener tres personajes, pero es evidente que la composición escénica de esta estela responde a las mismas características que el resto del grupo. Se encuentran a su vez diferenciadas en dos clases, aquellas que al igual que el Tipo IIIB presentan dos personajes masculinos y las que muestran un personaje masculino, un guerrero, y otro femenino, con su representación diademada: IV.B.1.a – Estelas donde se representa una pareja masculina donde destaca, como ocurre en el Tipo III.B., la representación de un arco asociado a una de ellas. IV.B.1.b – Estelas con representación de un guerrero y una mujer diademada. Este último subtipo es el que suscita mayor interés, en primer lugar, porque certifica la idea de contemporaneidad con las estelas de guerrero y, en segundo lugar, porque ayuda a entender el papel desempeñado por sendos personajes representados que, en el caso de las diademadas, siempre aparece desprovisto de armas. En nuestra publicación de 2001 ya se hizo una alusión a este punto en relación a la estela de El Viso III, donde dos guerreros con espada al cinto y respectivos escudos flanqueaban a un antropomorfo tocado con una compleja diadema. Otros personajes diademados, si bien en posición marginal y formando parte de un conjunto escénico, se interpretaron también en las estelas de Ategua y Zarza Capilla III; sin embargo, ha sido el hallazgo de la estela de Almadén de la Plata I (Sanjuán et al., 2007) la que ha permitido verificar esa hipótesis, si bien el significado que dan sus divulgadores a la estela dista mucho de nuestra interpretación. Como suele ser habitual en las estelas, éste que parecía un fenómeno aislado, ha tenido un nuevo refrendo recientemente al conocerse una nueva estela en el entorno de Almadén, en la provincia de Ciudad Real, en la que se repite la misma escena; es decir, la figura del guerrero rodeado de sus armas junto a una figura diademada (Blanco y García Bueno, e.p.)5. IV.B.2 Este es uno de los tipos más llamativos, donde destaca una escena de gran complejidad encabezada por la representación del guerrero, debajo del cual se suceden otras escenas de carácter narrativo. 5 Queremos agradecer la gentileza de las autoras del trabajo Dña. Ana María Blanco Fraga y Dña. Carmen García Bueno, quienes nos han cedido el mismo y nos han mostrado las fotos de estos dos nuevos hallazgos. Así mismo, agradecer a D. Luís Mansilla, director del Museo Histórico Minero de Almadén, su amabilidad y el que nos pusiera en contacto con las autoras.
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IV.B.3 Se incluyen en este tipo las estelas en las que se ha grabado una serie de figuras con igualdad jerárquica y cierto movimiento, representando acciones reales. Lamentablemente, sólo podemos incluir en este tipo la estela de Aldea del Rey III, aunque Galán (2007: 7) ha propuesto de manera muy sugerente que la mencionada estela de El Viso III esté manifestando también una escena de intercambio. Distribución: La dispersión de los monumentos del Tipo IV se circunscribe principalmente al tramo medio de las cuencas del Tajo, Guadiana y Guadalquivir, con especial concentración nuevamente en torno al río Zújar y en las campiñas al sur del Guadalquivir. El Tipo IV.A.1. se localiza mayoritariamente en Andalucía y, en menor medida, en los cursos medios antes indicados. Por su parte, destaca el alto grado de concentración del tipo IV.A.2